Fátima Oliveira: Urge um pacto civilizatório para cuidar de nossas crianças e nossos idosos

Tempo de leitura: 3 min

por Fátima Oliveira, no Jornal OTEMPO

Por ocasião do Dia Internacional da Mulher, 8 de março, cansada de responder, anos a fio, à pergunta “Quando é o dia do homem?”, dizia que são todos os outros dias do ano. Agora, radicalizei. Gozações com o Dia da Mulher não merecem nada além de solene desprezo. Sei, vivemos sob a égide do machismo, embora haja homens de novo tipo – que reconhecem a cidadania de segunda categoria das mulheres e que outras questões originárias do patriarcado perduram.

No Brasil, conquistamos a igualdade nas leis. Urge concretizá-la na vida, tarefa inglória sem que o Estado assuma, em palavras e atos, desmontar as estruturas arcaicas, materiais e mentais, do patriarcado, cultura nefasta que perpetua a educação diferenciada (menina é assim e menino é assado!), assim como elevar a consciência de quem crê que cuidar de crianças e de pessoas idosas é tarefa sagrada, respectivamente, de mães, filhas e/ou outras mulheres da família.

A educação infantil é direito da criança e dever do Estado, inscrito na Constituição de 1988, referendado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1994) definiu a educação infantil – creches (0 a 3 anos) e pré-escola (4 a 5 anos e 11 meses) – como a primeira etapa da educação básica. Ressalto um aspecto prático da função social da educação infantil, que é minorar a sobrecarga de trabalho que recai sobre as mulheres mães quanto ao cuidado com a prole (higiene, alimentação e conforto emocional).

O Brasil é cruel no tocante ao cuidado com idosas/os, obrigação tradicional de mulheres, com arranjos familiares cada vez mais incompatíveis com tal tarefa. A completa ausência de equipamentos públicos para cuidar de pessoas idosas saudáveis que exigem cuidados de terceiros ou inválidas é a regra num país que aumentou bastante a expectativa de vida e o número de famílias pequenas e cada vez menores, mas que finge viver no tempo em que uma das filhas era escolhida para ficar solteirona para cuidar dos pais na velhice!

Dar alta hospitalar a uma pessoa idosa com sequelas incapacitantes para a vida autônoma é um processo doloroso e patético, muitas vezes tendo-se de recorrer às autoridades policiais e judiciárias, com a família alegando que não tem como levar para casa! O governo fecha os olhos para o contingente cada vez maior de pessoas idosas, pois o Brasil está na fase 4 da transição demográfica, exigindo cuidados 24 horas, aos quais, como regra geral, as famílias contemporâneas são impotentes para responder com a dignidade necessária, seja de tempo e/ou financeiramente.

Equipamentos públicos de educação infantil e cuidados na velhice exigem investimentos governamentais compatíveis com a demanda, considerando-se que nem todas as crianças nasceram em famílias que podem pagar cuidados, seja tendo alguém em casa para tanto, seja em instituições particulares especializadas. O mesmo se aplica a pessoas idosas.

Avalio que o governo Dilma promoverá uma revolução cultural de grande vulto se contemplar o acesso a cuidados públicos para a faixa etária de 0 a 5 anos e 11 meses e para idosas/os, via pacto civilizatório com cada uma das 5.000 e tantas prefeituras e todos os Estados e territórios, para assegurar educação infantil a todas as crianças, assim como apoio nos cuidados às pessoas idosas.

Sem a definição política de superação de tais descasos nos três níveis de governo (municipal, estadual e federal), o patriarcado assume ares de eterno no lombo das mulheres.

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Comentários

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Murdok

Tenho 55 anos e já penso la na frente. Toda iniciativa neste sentido é bem vinda. São necessárias políticas públicas. Este ano é ano de eleições para prefeitos e vereadores. Que tal cobrarmos a inclusão de políticas para a terceira idade nas agendas dos candidatos?

Urge um pacto civilizatório para cuidar de nossas crianças e nossos idosos | FalaRioGrande.com.br

[…] Via Viomundo […]

Vera Silva

Fátima, você acertou na mosca.
Às mulheres sempre coube cuidar as crianças, dos doentes e dos idosos da família mesmo que à custa de sua saúde e de sua vida particular.
Quando chegava sua vez de ser cuidada era muito comum ser jogada às traças como a tia chata.
As creches de 0 a 4,11 anos e as comunidades para os idosos e dependentes por doença deveriam ser prioridades do Estado. Urgente!
Ando preocupada com isto. A questão do alto custo de residência adaptada, alimentação especial, pagamento de empregados para atendimento é preocupante. Eu, por exemplo, não tenho muito tempo para esperar. Já sou idosa.
Com criança é pior ainda: há necessidade de rapidez, os primeiros 2 anos de vida são cruciais.
No caso das crianças, seria necessária também a conscientização dos homens quanto à paternidade responsável. E não é o que vejo e leio: os homens ainda não se preocupam em transar com camisinha sempre. A gravidez ocorre e eles correm da raia, acusam as mulheres de dar o golpe da gravidez ou matam a mulher.
É urgente uma campanha nacional para o exercício da responsabilidade masculina com a criança que ajudou a gerar. Não é possível que a parternidade continue a ser OPTATIVA (só é filho, se o homem quiser registrar e cuidar) enquanto a maternidade é obrigatória.

SILOÉ-RJ

É o que está em curso. É só aguardar mais um pouco.

    Gina

    O que está em curso? Poderia ser mais explícita? Estamos esperando desde 1.500, ou não? Mas vc pde para esperar exatamente o que? Aguardo sua resposta.

    SILOÉ-RJ

    Li no estatuto do idoso as modificações criadas em 2011 e li no blog do planalto, e no café com a presidenta, as melhorias que serão implantadas ainda nesse ano com relação aos idosos e assistêcia materno infantil, creches, incluindo a Rede Cegonha amplamente debatida aqui.

Márcia Arruda

Fico a pensar porque as autoridades da política não entendem uma equação tão elementar como essa dos cuidados públicos para ciranças e para a velhice. O Brasil vai muito mal das pernas no assunto. Não há universalização de creches e para a velhice nada, a não ser uns asilos de caridade aqui e outro acolá; não queremos caridade, mas políticas públicas, que podem ser de diferentes tipos, segundo a necessidade, desde casa-dia, a asilos, apoio em determinados momentos, etc.

renato

Negativo,o único dia do homem é o dia que ele vira papai noel, e é só a zero hora do dia 24/12.
Não é para ridicularizar o homem, é uma brincadeira.
MAS que a mulher é algo melhor, ah isto é.
Basta ver uma mulher com um filho no colo, fica horas a fio na mesma posição sem largar o filho.
Põe na mão do homem e veja o que acontece.Passa para a mulher.

beattrice

Muito me alegra ver que uma voz respeitada como a da Fátima Oliveira se levanta para lembrar que os idosos no Brasil estão fadados ao abandono ou à cadeia familiar da enfermidade.
Ao abandono caso não tendo meios ou quem se responsabilize por seus cuidados, à cadeia familiar da enfermidade caso exijam cuidados prolongados, paliativos ou rotineiros, o que engendra doenças físicas e psíquicas em seus cuidadores.
Nem a assistencia privada e nem a pública dirigem seu olhar aos idosos, e considerando que muito se diz de uma sociedade conforme ela trata seus idosos, a nossa é indecente.

pperez

Ainda a pouco vimos uma reportagem na TV que mostrou como os cadeirantes são tratados no transporte publico!
Imagine os idosos, crianças e as mulheres!
Todos presas faceis nessa selva de pedra onde (infelizmente) impera a Lei de Gerson!
A conscientização de respeito às Leis e,sobretudo, ao ser humano ainda está amadurecendo em nossa sociedade machista e altamente preconceiutuosa

edson

Creio devemos rever os asilos para pobres no Brasil. São lares com espaços ínfimos onde abarrotam os idosos "abandonados" pelos filhos às vezes por falta de condição financeira e às vezes por desvio moral. Nestes espaços que na maioria, acredito administrados por ONGs que recebem "subvenções" das prefeituras e em alguns casos, não raros, possuem uma diretoria compostas por corruptos que utilizam do apelo "idoso carente" para surrupiar tais subvenções como ocorre nas APAEs (busquem as subvenções para essas entidades pelo país afora e vejam o que esse $$ poderia fazer se realmente aplicado). O incrível disso tudo é que as vezes alguns municípios mantêm estádios de futebol totalmente vazios e inertes… espaços que poderiam suficientemente ser construídos lares com conforto térmico para que recebam seus parentes nas visitas e praças centrais onde os idosos poderiam conversar, jogar seu Bingo (sem $$$$ de fato), seu jogo de damas, etc, vamos dizer que os asilos deveriam ser como os condomínios de casas horizontais: com direito a jardins nas casas e ruelas arborizadas.

    Arimateia Lobo

    Correto. Apoiado! Entendi que a autora fala de uma Política Pública de Cuidados quer na velhice, que para crianças (que já consta como parte da Educação Básica, creche e pré-escola), que não tem cobertura 100%; as creches mal chegam a 20% e a pré-escola deve estar batendo em quase 90%.
    Para cuidados com idosos que dependem de cuidados mais constantes e muitos até 24 o Estado tem lavado as mãos. E a longevidade só tem aumentado. Está mais do que na hora de o governo assumir a sua parte nos cuidos. Como disse a autora a família mudou muito, hoje em dia não há mais aquela montanheira de mulheres à disposição.

    Arimateia Lobo

    Pensando rapidinho, em torno de minha avó e meu avô havia , entre filhas, noras e irmãs deles, pelo menos umas vinte mulheres.
    Estou com 57 anos e minha mãe teve dois filhos e duas filhas e cada um de nós, dos homens, também só dois filhos; as irmãs, cada uma com uma filha; as outras irmãs de minha mãe e do meu pai também já adotaram o modelo de família bem pequena. Eu que não tenho filhas, não posso contar com ninguém, fora o Estado porque dinheiro para tanto eu não acumulei.

vera

Muito bom o texto, absolutamente verdadeiro em todos os pontos. abraço, vera

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