por Marcos Coimbra, em CartaCapital
Vamos imaginar que o Congresso aprovou e a presidenta Dilma Rousseff sancionou uma lei alterando o nosso sistema eleitoral. Que não vingou a proposta de passarmos para o voto distrital, mantivemos o voto proporcional, mas que adotamos o chamado voto em “lista partidária fechada”.
Vamos ainda imaginar que isso aconteceu antes de outubro de 2013, e que a nova lei previa que entraria em vigor imediatamente. A eleição de 2014 seria realizada sob sua égide.
Isso quer dizer que escolheríamos deputados federais e estaduais de uma maneira diferente da que conhecemos desde 1945, quando começamos, na prática, a votar como agora. Mesmo durante a ditadura, preenchemos esses cargos – e os de vereador –, usando outro princípio, o voto nominal.
A diferença entre os dois está expressa em seus nomes. No atual, escolhemos basicamente uma pessoa. No novo, um partido.
Na verdade, em ambos, o voto é simultaneamente no indivíduo e na legenda. Nossa legislação eleitoral estabelece, a rigor, o voto em “lista partidária aberta”, ao exigir a filiação partidária dos candidatos – não aceitando o chamado voto avulso – e permitir o voto de legenda. E somam-se os votos dos candidatos de cada partido para calcular o número de vagas a que têm (individualmente ou em coligação) direito.
Se adotássemos o voto em lista fechada, teríamos um hibridismo semelhante. De acordo com o que se discute, ele não seria dado, puramente, aos partidos, mas a uma relação de candidatos, conhecida pelos eleitores. Seria possível dizer que o voto continuaria a ser dado indiretamente a determinados indivíduos.
O certo é que seria uma mudança importante. Hoje, a vasta maioria dos eleitores pensa na pessoa em quem vai votar, escolhendo-a entre as inúmeras opções que lhe são oferecidas. Fica assim, nem que seja com a ilusão, de que escolhe seu “representante pessoal”.
No sistema novo, o voto seria em uma lista de nomes previamente ordenada pelo partido. A “representação direta” desapareceria.
Adotada a novidade, a primeira reação seria de forte desagrado da opinião pública. As pesquisas mostram que a população não gosta da ideia. A discordância chega a 80%.
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Quando, em pesquisas qualitativas, se pergunta o por quê, os depoimentos revelam sentimentos de perda, de subtração. O eleitor acredita que ao não poder votar em determinada pessoa seu direito ficaria menor. Passaria a ter um voto de segunda classe, que delegaria aos partidos a decisão sobre a representação.
A segunda reação contrária viria das correntes políticas que acham melhor o sistema atual. Algumas o defendem convictamente, questionando o voto em lista fechada com base nas teorias clássicas da representação. Outras,comoo ex-governador José Serra, apenas por conveniência, acreditando que a mudança prejudicaria seu partido. Outras ainda preferem o status quo somente por não saber como ficariam no novo sistema.
Quem valoriza os partidos não tem dúvida sobre a superioridade do voto em lista fechada. Nele, as disputas eleitorais deixam de ser competições entre indivíduos. Os verdadeiros protagonistas da vida política passam a ser os partidos.
O eleitor aprende, na prática, que a política não é o domínio das singularidades, mas da ação coletiva organizada. Ele não é obrigado a encontrar, no cardápio de individualidades, uma em particular. O que lhe cabe é escolher um grupo, um conjunto de pessoas que, coletivamente, se propõe a representá-lo, com uma plataforma explícita.
Existe quem concorda com isso, mas acredita que “não estamos prontos” para ele. Que nossos partidos (salvo exceções de praxe) são frágeis e coronelistas demais, que a adoção do voto em lista fechada cristalizaria o poder de cúpulas partidárias enferrujadas e autoritárias.
É provável que isso seja verdade. Mas a única maneira de os forçar a mudar é lhes dar tanta importância que seus atuais dirigentes não teriam como se opor.
Se viéssemos a adotar o voto em lista fechada (puro ou combinado com o voto nominal), muito provavelmente modernizaríamos a legislação partidária e estabeleceríamos algum tipo de cláusula de barreira, para limitar o número de partidos com representação no Congresso, evitando o multipartidarismo caótico de hoje em dia.
Em relação ao modelo que temos, seria um avanço.
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Comentários
Filipe Rodrigues
Partido que elege o presidente tem que ter maioria confiável no parlamento para conseguir comandar o país e nomear gente competente na administração pública.
A maior praga política brasileira se chama presidencialismo de coalizão, partidos que tiveram vitórias consideráveis no executivo não repetem essas vitórias no legislativo e ficam reféns dos partidos fisiológicos no Congresso para aprovar seus projetos.
A Lista fechada transforma nosso presidencialismo um pouco parlamentarista.
Pedrôncio
Como nenhum sistema eleitoral é perfeito (as vantagens de uns e outros são mutuamente excludentes), cada país adota aquele que responde melhor aos anseios da sociedade. As vantagens e desvantagens devem ser pensadas de acordo com aquilo que se deseja obter e com os problemas que se quer eliminar.
No caso do Brasil, creio que a população, de modo geral, não se sinta representada pelos vereadores/deputados/senadores. O nosso sistema eleitoral permite que o eleitor saiba em quem está votando, mas não saiba quem está elegendo. Quem elabora as listas é quem decide, de fato, quem vai "representar" a população. O voto em lista fechada ameniza, mas não elimina, o problema do "legislador oculto". No sistema atual, o eleitor sequer sabe quem o seu voto vai eleger. No sistema de lista fechada, o eleitor sabe ao menos que se quiser eleger o candidato A vai votar também, indiretamente, nos candidatos B, C, D e E.
Discordo da tese de que se deva aumentar o poder dos partidos. Seria muito bom se todos os partidos existentes fossem de fato ideológicos, mas não são e nem poderiam ser: existem atualmente quase 30 partidos registrados no Brasil. TRINTA! Façam um esforço e tentem nomear trinta "ismos" (comunismo, socialismo, liberalismo, etc.) que possam ser ideologias representadas por essas legendas.
Acho mais urgente aumentar o sentimento de representatividade da população e fazer o povo saber em quem votou e quem foi alçado ao poder em seu nome. Isso aumenta a responsabilização do cidadão pelo que acontece na vida política do país e permite um amelhoramento gradual da qualidade dos nossos parlamentares. Quando um deputado for pego em falcatruas, o cidadão que não votou nele pode ter a consciência tranqüila de que também não ajudou a elegê-lo indiretamente, como acontece no sistema atual. E quem votou expressamente nesse candidato vai repensar seu voto nas eleições seguintes. Não há meio termo: ou o cidadão votou e elegeu o corrupto ou não votou nem o elegeu.
Particularmente, sou favorável ao sistema dito "voto único transferível", em que o eleitor vota nominalmente em um candidato e elabora livremente sua lista, por ordem de preferência, podendo escolher até mesmo candidatos de diferentes partidos. Esse sistema tem o inconveniente de ser longo, aparentemente complicado e desestimulante, o que o torna de difícil aceitação pela população. Mas é o único que conjuga o máximo possível as vantagens do voto distrital (o eleitor efetivamente votou em quem foi eleito) e do voto proporcional (representatividade de minorias).
Mas, acima de tudo, a maior urgência eleitoral no Brasil é O VOTO FACULTATIVO. O infeliz que vota nos Tiriricas da vida (e acaba elegendo sabe-se lá quem) não o faria se não fosse obrigado a sair de sua casa num domingo de sol para votar. Ainda que se mantenha o voto tal como é no Brasil, o simples fim dessa aberração democrática (?) chamada voto obrigatório já contribuiria para melhorar a qualidade do legislativo nacional.
Étore
Moderadores
Os últimos três comentários que escrevi de uma semana para ca – todos a partir de um botão Responder – não foram publicados. Não eram ofensivos, nem trollagem. Qual foi o motivo da censura ?
Conceição Lemes
Étore, nenhum comentário seu que chegou até aqui foi vetado. abs
Ninguém
Voto em lista fechada só se tiver primárias EM TODOS OS PARTIDOS com voto SECRETO dos FILIADOS. O processo poderia ser feito na mesma data para todos os partidos. O TSE se encarregaria da votação e da apuração, como nas eleições.
Daniel
Pra mim é abrir a porteira pra bandidagem: basta se candidatar no partido mais votado na última eleição.
Luiz Augusto Campos
A reforma eleitoral se apresenta como solução para política brasileira. É curioso notar que uma tendência propõe que se adote para o legislativo o voto majoritário (erroneamente chamado de "distrital), enquanto outra tendência clama pelo fechamento das nossas listas. Ou seja, cada tendência quer defender um sistema eleitoral que a beneficie particularmente, sem pensar num regra de jogo que produza mais isonomia no jogo político. Além disso, as justificações são quase sempre etéreas: é preciso fortalecer partidos, é preciso reduzir o número de partidos, é preciso acabar com a transferência de votos, é preciso trazer de volta as "ideologias" para a política etc. Ora, esses anseios ou podem ser resolvidos por simples leis (cláusula de barreira pode ser revista) ou buscam resolver problemas vivenciados por todas as democracias ocidentais. Boa parte a crise política vivida na Europa está ligada justamente à lista fechada, que aumenta a sensação de impotência que do eleitor. O que este poderia fazer se o PT sempre apresentar Rui Falcão como cabeça de lista? Mesmo que eu simpatize com certos quadros do partido, só me restaria aceitar colocar Rui Falcão primeiro e rezar para que os outros votos atinjam meu candidato predileto. Além disso, a lista fechada é um convite a inúmeras estratégias de anulação da vontade do eleitor. Quase todas as listas costumam ter uma ou duas celebridades no meio. Elas servem para puxar voto sem serem eleitas. Para o bem ou para o mal, a eleição de Tiririca e Enéas expressaram uma vontade do eleitor, que não seria mais respeitada na lista fechada. De todos os grandes sistemas disponíveis, o de lista aberta ainda é o que mais impede a crise de representação que assola as democracias.
Pancho Villa
O que sei é que a maioria dos partidos, senão todos, estão esvaziados de ideologia, o que é imprescindível para um funcionamento razoável da lista. Entregar-lhes o expediente da lista fechada agora, como se encontram, não traria benefício algum, como dizem os que argumentam que isso aumentaria a força dos partidos na atuação política e minimizaria o efeito do caciquismo; que isso aumentaria a observância dos seus programas, ideologias, práticas. Hoje, vão para a lista aqueles nomes chancelados por "expectativa de vitória" e, quase sempre, isso signfica aquele sujeito que tem costas largas, lobby pronto, resumindo: dinheiro (lícito ou não). Os demais, os sem-chance, são peões que só contribuem com o aumento do coeficiente eleitoral. Portanto, na prática, a tal lista fechada já existe e de maneira perversa.
O mais importante, para agora, é estabelecer o financiamento público EXCLUSIVO de campanha, acompanhado de uma legislação eleitoral de extremo rigor que assegure o repartimento correto, previsto em lei, para os partidos; que apure com o mesmo rigor a aplicação desses recursos pelos partidos a fim de evitar que fulano fique com mais dinheiro pra usar, ou que o dinheiro suma; e que impeça um esperto de turbinar sua campanha com recurso de caixa-dois.
Marcio H Silva
Sou contra qualquer tipo de caixa preta….
FrancoAtirador
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Creio que o ideal é o voto em lista combinado com o nominal.
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José Vitor
O voto em lista fechada não vinga no Brasil, a rejeição é muito grande. Acho perda de tempo discutir. Agora, o perigo mesmo é o voto distrital, que a escória política brasileira anda defendendo.
Étore
Pelo teu argumento também não vale a pena discutir o voto distrital já que a aceitação é muito grande.
O que as pessoas querem é um despachante de luxo que consiga verba para suas cidades, e é exatamente nisso que o voto distrital transformará todos os deputados (hoje alguns ainda trabalham de forma federativa).
José Vitor
Pelo teu argumento também não vale a pena discutir o voto distrital já que a aceitação é muito grande
A aceitação do voto distrital não é muito grande. O que eu vejo é gente escória como Serra e Reinaldo Azevedo fazendo pregação do voto ditrital para seus fanáticos seguidores. Se não fosse isso, duvido que seria muito discutido na rede.
Claidisson
O PT defende lista fechada porque não tem nomes de destaque em seu quadro. O PT é o Lula e o Lula é o PT ponto final. Sem o Lula o PT é um zero à esquerda, acaba.
betinho2
"Claidisson"
Já vi você escrever esse mesmo trololó e nhenhenhém fernandino, porém com outros apelidos. Pede sugestão que podemos indicar uns apelidos mais originais que CLAIDISSON…rsrs
Vlad
Isso é verdade.
Alexei_Alves
É mesmo, não tem nomes… deve ser por isso que tem o maior número de deputados, um dos maiores números de senadores, governadores e disparadamente o maior número de militantes. Ah… sem falar na PRESIDENTA do Brasil, que muitos da direita fazem um esforço enorme para esquecer a que partido ela pertence. É o partido com maior trânsito nos movimentos sociais, sindicatos, com maior número de filiados e com maior aprovação popular, com mais de três vezes a aprovação do segundo colocado. É também o partido com mais renovação de nomes, com os quadros mais jovens, ao contrário dos partidos de direita, que são dominados pelos mesmos velhos caciques desde sempre e são incapazes de trocá-los, por mais decadentes que eles estejam, pela propria estrutura interna centralizadora destes.
PT acabar? Vai sonhando, meu caro… vai sonhando que é de graça.
zezinho
Concordo com o Claidisson. Se não fosse o Lula o PT nao seria o que é hoje. Sem Lula nao há PT.
luiz pinheiro
Mas também é verdade que sem PT não haveria Lula.
betinho2
Em princípio eu sou a favor do voto em lista. Porém existe um enorme risco de surgirem listas tendo como cabeça de chapa Tiriricas (não vai aqui demérito, somente exemplificação), Mulher Melancia e congêneres, além de outras figuras para puxar voto. Portanto deve haver um critério para que não se filiem, de última hora,pessoas sem nenhuma "praxis" política, apenas para cabresto de votos.
Filipe Rodrigues
betinho2, esses candidatos exóticos que citou concorrem por partidos que graças a Deus seriam varridos da política brasileira se a lista fechada fosse adotada no Brasil (PR,PSD, PTN,PRP,PMN,etc).
A Lista iria beneficiar os partido maiores (PT, PMDB, PSDB) e partido que carregam uma marca apesar de pequenos (PV, PCdoB). Essa seria a maior vantagem do sistema, partidos ideológicos, que tem uma história e projetos para o país ganhariam enquanto as legendas de aluguel perderiam.
A figura do puxador de votos ela ocorre quando o voto é em lista aberta, um candidato com apelo midiático é bastante votado e por causa do quociente eleitoral elege alguem menos votado do partido ou da coligação (outra coisa que deveria acabar). Na lista fechada, os nomes mais qualificados e grandes lideranças de cada partido se beneficiariam, o risco maior é de fortalecer o caciquismo (mesmo com a eleição direta dos filiados na escolha dos candidatos).
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