Pedro Ekman: Governo enterrou de novo o debate da regulação da mídia?

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ricardo berzoini. foto: marcelo  camargo/agência Brasil

Em audiência na Câmara dos Deputados, Ricardo Berzoini evitou falar sobre regulação da mídia. Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

O governo enterrou de novo o debate da regulação da mídia?

por Pedro Ekman, no Intervozes

No segundo turno da campanha eleitoral do ano passado, Dilma Rousseff sinalizou que, finalmente, levaria ao debate público o tema da regulação da comunicação. Afirmou, inclusive, que faria a regulação econômica da mídia. Logo no início do novo governo, o novo ministro da pasta, Ricardo Berzoini, reiterou a proposta e chamou a sociedade civil para dialogar. Então, disse que as ações em torno do tema começariam em março. Mas parece que o que era um compromisso político mais uma vez foi abandonado.

Nesta quarta (29/04), o ministro participou de audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara dos Deputados. Por mais de duas horas, discursou sobre a agenda do Ministério das Comunicações. Ao ser questionado sobre a necessidade de um novo marco regulatório, o ministro respondeu apenas que a liberdade de expressão deve ser exercida em equilíbrio com os demais direitos consagrados na Constituição Federal. Ele não tocou no tema da abertura do debate com a sociedade, ausência que confirma o que a própria presidenta Dilma havia sinalizado no início deste mês. Então, em entrevista coletiva a blogueiros, ela afirmou que não há a menor condição de abrirmos essa discussão neste momento, por conta de toda a situação. A frase, registrada pela jornalista Cynara Menezes, foi seguida pela seguinte pérola: me disseram que vocês estão para apresentar um projeto de lei de iniciativa popular, que estão colhendo assinaturas. Não sei como ele é, nunca vi mais gordo, mas acho que pode ser interessante.

Pelo visto, mais uma vez, o governo abriu mão de travar o debate e promover políticas em uma área fundamental para qualquer sociedade democrática.

Ao mesmo tempo em que continuaremos cobrando os compromissos firmados anteriormente pelo governo, seguiremos a pautar a necessidade de regulação da mídia. Isso porque os meios de comunicação ocupam no sistema democrático, hoje, o lugar importante do debate sobre temas de interesse público. Em uma sociedade como a em que se vive em 2015, tomar decisões em praça pública com centenas de milhões de pessoas ao mesmo tempo não é algo factível. A Internet talvez um dia permita isso, mas, com o nível de exclusão digital que temos, este cenário continua distante. O papel de mediação ainda é desempenhado pelos meios tradicionais, como a televisão.

Aliás, foi para enfrentar o problema da impossibilidade de reunir todos fisicamente em um espaço público comum que inventamos dois instrumentos: o sistema de representação política e a comunicação social eletrônica, ambos descritos e definidos na Constituição Federal. O Congresso Nacional passa a ser o lugar central dos debates, do qual participam com direito a voto os representantes eleitos da sociedade. Já por meio do rádio e da TV, a sociedade obtém o conhecimento de informações para tomar suas decisões, como eleger representantes ou sair às ruas para protestar contra o que percebe estar errado.

Vale notar que tanto o Congresso como os canais de rádio e TV são espaços públicos. A Constituição Federal fez questão de defini-los assim, pois eles são estruturantes do sistema democrático representativo. O problema é que a política brasileira privatizou o espaço público ao longo de sua história, favorecendo os interesses privados em detrimento dos interesses públicos e republicanos. Os representantes do nosso Parlamento são eleitos com campanhas milionárias, financiadas por corporações que passam a ter seus interesses verdadeiramente representados no Congresso. As cédulas de dólares e reais substituem as de votação em importância, corrompendo a estrutura do sistema. Da mesma forma, os canais de rádio e TV são entregues a poucas empresas privadas, que definem o debate político e cultural do país.

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Para termos ideia do impacto da concentração de mercado no debate público, podemos analisar a discussão que ocorre neste momento sobre a possibilidade da redução da maioridade penal. Como será a reação de uma sociedade que é bombardeada diariamente por programas policialescos e telejornais que veiculam crimes cruéis supostamente cometidos apenas por adolescentes? Com adolescentes condenados na praça pública da TV, sem sequer ter o direito constitucional da presunção da inocência, a sociedade se vê impelida a apoiar a redução da maioridade penal, já que esse é o caminho mostrado como razoável diante dos fatos que foram selecionados para serem levados ao debate.

Não à toa, a Comissão Especial da Câmara dos Deputados que discute a Proposta de Emenda à Constituição (PEC)171/93, que propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos, aprovou esta semana a convocação dos jornalistas Marcelo Rezende (TV Record), José Luiz Datena (Bandeirantes), Rachel Sheherazade (SBT) e Caco Barcellos (Globo) para uma audiência pública sobre o tema. Os três primeiros são recorrentes defensores da mudança e usam a televisão para divulgar suas ideias com veemência. Isso sem que o Ministério das Comunicações, por exemplo, os puna por, entre outros casos, incitar à violência, como feito por Sheherazade ao comentar ação de “justiceiros”, no ano passado. A falta de vontade política do governo, aliás, se dá não apenas quando ele se nega a travar o debate estrutural da comunicação, mas também quando se nega a fazer o que deveria e já pode ser feito com as leis existentes no país.

Diante desse cenário, a democracia existe no papel, mas não se realiza na prática. O artigo 220 da Constituição define que não pode haver monopólio ou oligopólio na comunicação social eletrônica. A Globo, no entanto, controla 70% do mercado, faturando sozinha mais do que todas as demais empresas de comunicação. Isso acontece porque o Congresso Nacional nunca elaborou leis definindo mecanismos que impedissem a formação de monopólio. Por que o Congresso tem sido omisso nas suas obrigações? O artigo 54 da mesma Carta Magna determina que deputados e senadores não podem ser donos de concessionárias de serviço público (o que inclui canais de rádio e TV). No entanto, a família Sarney, os senadores Fernando Collor, Aécio Neves, Agripino Maia e Edson Lobão Filho são apenas exemplos das dezenas parlamentares que controlam inúmeras emissoras em seus estados.

Criar leis que tornem viáveis os objetivos constitucionais é justamente o que se chama de regulamentar a Constituição, um passo fundamental para a regulação do sistema de comunicações do país, para que o jogo democrático possa ser justo e equilibrado. No entanto, congressistas e grandes emissoras de TV definem a regulação da mídia como cerceamento da liberdade de expressão e como um ataque de um suposto governo autoritário, que quer impedir críticas à sua gestão. Isso acontece porque as corporações de mídia, ao reconhecerem a possibilidade de um cenário em que terão que dividir o bolo que sempre comeram sozinhas, atacam a proposta e provocam medo na sociedade, para que ela também reaja contra a medida.

Podemos tirar, se achar melhor

Muitas vezes, o mais importante não é o que se comunica, mas aquilo que se deixa de comunicar. Recentemente, as redes sociais foram surpreendidas por uma notícia que foi ao ar com uma nota do jornalista ao editor que dizia: podemos tirar, se achar melhor. A frase estava inserida após um trecho da reportagem que ligava o esquema de corrupção da Petrobras ao governo FHC. O diálogo entre um jornalista e um editor é algo absolutamente trivial, mas, ao expor a preferência de se levarem ao debate público algumas informações e não outras, ele provocou a reflexão sobre quantas notas não foram tornadas públicas e quantas informações foram simplesmente retiradas do debate.

O fato de que a mídia tem lado, posicionamento e opinião contraria o discurso corrente de que os meios são técnicos e sempre optam pela melhor forma de informar. Tendo isso claro, fica fácil perceber que um cenário de mercado altamente concentrado, onde apenas poucos empresários decidem o que toda a sociedade vai debater, é algo mortal para uma sociedade que se pretende democrática.

Regular a mídia não é censura e nem coisa de comunista. Países não comunistas como a Inglaterra, a França, a Alemanha e até os Estados Unidos regulam as comunicações de maneira mais determinada que o Brasil. Enquanto os donos do The New York Times não podem ser os mesmos donos de uma emissora de TV, em Nova York, porque a regulação americana coloca limites à propriedade cruzada dos meios de comunicação, aqui os donos da Globo podem ter canais de TV, rádio, jornais, editoras, gravadoras e outros tantos veículos, sem qualquer limite.

Se, no Brasil, as emissoras de TV questionam na Justiça a Classificação Indicativa (mecanismo de regulação de conteúdo para proteger as crianças de cenas impróprias), na Suécia a publicidade infantil é absolutamente proibida. Estados Unidos e Suécia estão longe do projeto comunista e nem por isso definem regulação como censura.

Entendendo que a solução para esse problema não virá espontaneamente do Congresso Nacional e cansada de esperar por um governo que decida enfrentar a questão de fato, a sociedade civil brasileira elaborou e colhe assinaturas para o Projeto de Lei da Mídia Democrática (aquele que a presidenta disse desconhecer). Vários meios alternativos e outras iniciativas de comunicação, além de ações diversas das organizações sociais, buscam fomentar esse debate. Se, com todo o esforço da sociedade em pautar o assunto, ele não aparece na TV e no rádio, é porque certamente alguém achou melhor tirar. E isso sim é praticar censura.

Pedro Ekman, jornalista, é membro do Coletivo Intervozes.

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Comentários

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ejcs

Um erro pensar que uma regulação prejudicaria a mídia em geral, mesmo pq eles tem todas as armas de pressão pra fazer valer seus interesses. Ocorre é que querem derrubar o Governo pra se apossar do Estado, e mais ainda do dinheiro do contribuinte. Se uma regulação vier, só virá quando os donos da mídia perceberem que serão engolidos pelos concorrentes estrangeiros (todas as Teles, empresas de internet, etc). Só que aí já será tarde. Pra eles e suas empresas poderia ser o fim, com o consolo que sairão ricos, ainda, do processo, mas sem poder algum no final..

José Carlos Vieira Filho

O Berzoini é ministro. Faz parte de uma equipe de governo que tem uma chefe, e, naturalmente, executa a sua (dela) política.

FrancoAtirador

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A Tecnocracia Governamental capitulou politicamente.
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Edgar Rocha

Por que o título está em forma de pergunta???? Não vai sair regulação da mídia coisa nenhuma! Não neste governo. Nem em nenhum outro. Aqui também não vai ter Siryza, nem Podemos, nem nada que se possa confiar, capaz de aglutinar forças contra a inércia petista (pra dizer o mínimo) ou o golpismo fascista da direita. Quem tentar vai conseguir, quando muito, aglutinar as forças opostas a si. E sem força alguma pra enfrentamento. Não há estratégia, não há quadros para executar. Os que saem às ruas, tanto pro bem quanto pro mal, não fazem nada senão imitar movimentos externos pra poder fazer belas selfies e mostrar pro mundo que são descolados. A única coisa positiva que vejo neste momento, sem querer rasgar seda, apenas dando o devido reconhecimento, é a atuação de blogs sujos como este aqui. Ao menos, temos informação suficiente para questionar, acompanhar e saber quem é quem neste jogo político sujo em que se vão as esperanças. Mas, será que basta? Pergunta retórica, claro.

Acho que podemos medir a gravidade do momento ao vermos quão desarticulados estão os mecanismos de organização e ação social. A grande maioria está comprometida de alguma forma com este sistema de cooptação e engessamento dos agentes sociais. Seria preciso algo que fomentasse o desapego ao passado, aos vínculos, que forçasse uma tomada de atitude, uma declaração de autonomia de pensamento. Todos nós precisaríamos de um espaço em que se pudesse, de maneira sincera apresentar os pontos de vista e propor ações concretas de mudança. Aqueles que se encontram mal representados deveriam ter espaço para sugerir pautas, reivindicar a devida lisura das instituições, forjar espaço, criar fatos relevantes capazes de aglutinar ainda mais as forças em torno do tema. Deveria haver estratégias de exposição nacional e internacional da realidade.

À época da ditadura, ao menos no final, se as coisas não eram mais fáceis, ao menos eram melhor articuladas. Me lembro de um movimento muito interessante ocorrido aqui em Itaquera, em 1985, para o fechamento de um lixão que atingia a toda a região do Parque do Carmo e São Mateus. Foi a organização comunitária e a articulação em torno de uma causa justa que forjaram a vitória. Quarenta e nove dias acampados na porta, revezando, fazendo empate diante de caminhões, enfrentando a prefeitura do Covas. Por incrível que pareça, ao final do processo, o lixão foi fechado, criou-se a APA do Carmo, com direito a reportagem no Jornal Nacional!!!! De raspão, poucos segundos, mas que saiu, saiu.

Vão dizer que os tempos são outros. Concordo. É tempo de calar a boca e acatar as desculpas esfarrapadas em nome da causa (perdida). Mas, se no macro tá tudo dominado, por que não articular o micro, levar a luta adiante, conjurar a todos que poderiam colaborar? O discurso do pensar grande e ver a conjuntura já está morto. O grande foi alcançado e isto não impediu o retrocesso. O grande agora, nada pode diante de panelaços, artimanhas no Congresso, ação do judiciário… Eles pensaram no micro. Articularam-se todo este tempo enquanto a esquerda negligenciava e esnobava os interesses de seus pequenos colaboradores.

Mas, ainda há muito o que reivindicar. Só não fazem mais direito porque isto incluiria pressionar e criticar lideranças e representações. Dilma acha que não é o momento pra discutir a Mídia. O PT, com certeza também acha isto. O PSDB e os outros, não precisam achar nada. O PSOL acha que não, mas só discute da USP pra cima. Cria do PT. Questiono, por fim o seguinte: o que poderia ter acontecido se aluta do Pinheirinho, por exemplo, fosse levada até o fim? Por que param no meio? Por que se esquecem?

Panino Manino

“A situação faz da discussão e da relação da mídia, assim como a constituição prevê, uma necessidade urgente. Porém devido a situação não há condições para o debate.”

É preciso pelo menos motivo que não pode.
Por que esse pessoal não morre e vai para o inferno logo? Sério, digo isso com toda sinceridade. Do jeito que está já está muito ruim, e esse pessoal faz de tudo para piorar a situação. Não apenas protegem como ainda financiam e se fazem de covardes em qualquer ataque.
Cadê as mães dessa gente para dar a surra de vara de goiaba que tanto necessitam? E não é que é o Pedro mesmo? Vivendo e aprendendo.

    Julio Silveira

    Cidadão, provavelmente jovem, indignado como você, me pergunto todos os dias. Pará que essa gente se mete a besta de querer ser politico se não for para tentar melhorar a vida da cidadania? para que servem, se não conseguem dar condições minimas de fazer a cidadania acessar um marco civilizatório minimo nesse seculo XXI? Deveriam se envergonhar, entregar seus bonés, pela incompetência demostrada, e, como o numero dois do filme, pedir para sair. Hoje a principal argumentação para encobrirem fraqueza, omissão, a covardia, a parceria, sim a parceria mais que comprovada deste governo com o sistema que diziam terem surgido para combater, governo que veste camuflagem de esquerda. E pegam seus robôs ( por que da forma como tratam críticos sinceros, críticos da omissão e de tudo que faz da politica atual um antro eles fazem uso de robôs partidários, não há outra denominação) e se valem do chamamento a todos, esses críticos, indistintamente, de coxinhas, jogando a todos na mesma vala comum, no melhor modus operandi do conservadorismo politico para fazerem ouvidos de mercador. Aprenderam a ser portar como seus antagônicos, a má cultura fez suas bocas entortarem, sem vergonha usam as mesmas técnicas de constrangimento antigas utilizadas pelas ralés politicas que sempre dominaram o Brasil. Aprenderam a fazer discursos vazios, promessas vãs e a falsear a realidade.

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