Patrick Mariano: 2015, um ano que começou mal, quiçá não terminará

Tempo de leitura: 4 min

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Pescador chora ao ver peixes mortos no Rio Doce (Foto: Herone Fernandes Filho/ Instituto Últimos Refúgios)

Pescadores, estudantes e tiranos

por Patrick Mariano, especial para o Viomundo

A conjuntura brasileira tem se equiparado àqueles sonhos estranhos, cheios de flashes, onde tudo acontece ao mesmo tempo. É a difícil arte da bricolagem dos elementos que ao tentar observá-los e arriscar compreendê-los, não ficamos imunes ao sofrimento das suas consequências.

É a Polícia que reprime com bombas jovens secundaristas, são os ribeirinhos à procura dos corpos de seus entes queridos e dos peixes de um rio destruído pela irresponsabilidade de grandes empresas e, ao mesmo tempo, um tirano que ataca a democracia brasileira para se ver livre de um processo de cassação.

O assassinato de cinco jovens com 111 balas no Rio de Janeiro sacramenta a certeza de que estamos sobre o império da irracionalidade.

É a triste sina de um ano que começou mal e ainda não terminou, quiçá não terminará. Na política, começou mal por uma guinada irresponsável do governo Dilma aos cânones neoliberais e pelo vácuo político e ideológico que permitiu aos seus pés.

***

Roberto de Souza, de 16 anos, Carlos Eduardo da Silva Souza, 16, Cleiton Corrêa de Souza, 18, Wesley Castro, 20, e Wilton Esteves Domingos Junior, 20, tinham saído para comemorar o primeiro salário de Roberto como jovem aprendiz no Atacadão de Guadalupe.

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O primeiro salário do primeiro emprego e 111 balas. Algumas delas entraram sobre a estrutura de um carro simples, cravejaram sua lataria e outras incontáveis perfuraram seus braços, abdomens e seus rostos.

Cento e onze oportunidades para uma reflexão profunda quanto à violência institucionalizada, protegida e estimulada pelos donos do poder. Ainda que houvesse ali alguma possibilidade de erro no sentido de entender se tratar de alguma ameaça, por que 111 disparos? Qual o limite entre o erro e o gozo mórbido que avilta e despersonaliza a dignidade humana daqueles policiais e que termina por arrastar a nossa própria nesse cipoal?

O pescador Benilde Madeira mora com o filho e a mãe de 81 anos em Aimorés (MG). É ele quem estampou a foto em preto e branco com os olhos cheios d’água à margem do rio Doce e compartilhada por milhares de brasileiros dias atrás. As lágrimas que corriam pelos sulcos da sua desgastada pele era uma tentativa involuntária de lavar aquela lama toda que havia matado os peixes que o sustentavam e de recuperar o rio, razão da sua própria existência.

Por fim, essas balas e lágrimas se somam à dor de jovens que semana passada foram presos na Câmara dos Deputados ao encenar uma peça de teatro que denunciava as razões da tragédia ambiental de Mariana/MG e o projeto de lei que tipifica o terrorismo. Presos pela violenta e irresponsável polícia de Eduardo Cunha.

É aí que esses personagens todos se encontram. Um ano de Eduardo Cunha na presidência de um dos poderes da República significou o avanço desmedido da violência contra a mulher, contra os povos indígenas, contra jovens pobres e negros, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade.

Cunha representa – e isso não é nenhuma novidade – os interesses de grandes grupos empresariais, da bancada da bala, dos ruralistas, da radicalidade religiosa, mas sobretudo a si mesmo. Uma triste e lamentável figura. É o condutor de uma visão tacanha e oportunista do Brasil, verdadeiro retorno ao sono da razão, como nos diria Goya.

Triste e lamentável figura que atingiu o ápice ao se utilizar de alguns minutos para um pronunciamento em cadeia nacional de TV. Como não tinha nada a dizer sobre o Brasil, nem sobre o futuro, a montanha pariu um rato. Atrapalhado entre teleprompters e luzes de estúdio, preso em sua própria pequenez não conseguiu se colocar como líder, nem mesmo se projetar. Apenas olhares vazios e um discurso que reflete a ausência de qualquer profundidade, para além dos seus dotes de um vendedor astuto de um mercado persa. Apenas isso e nada mais.

São alguns dos elementos de um país que ainda tenta se encontrar. Absorto entre uma política de inclusão social, desenvolvimentista e de valorização do salário mínimo do projeto de Lula e o flerte com a mediocridade neoliberal de Joaquim Levy, com parte da sua burguesia encarcerada por um processo surreal e prenhe de ilegalidades ainda não conseguiu atravessar a ponte entre um passado escravocrata e machista para uma democracia inclusiva e ativa.

E a democracia, que deveria ser uma construção perene, incessante, solidária e pedagógica é atingida pelas 111 balas disparadas contra os corpos de Cleitons e Wyllians, pela prisão de estudantes em São Paulo e por cada lágrima de pescadores que se estatela sobre o leito do rio Doce.

Democracia que é ferida, também, pelo projeto de lei que tipifica o terrorismo e pelo processo de impeachment deflagrado por Eduardo Cunha contra a primeira mulher eleita presidente do Brasil. Sintomático que o mesmo Eduardo Cunha, autor de projeto de lei que ataca o direito das mulheres, tente se colocar como algoz da mulher mais importante do Brasil. Sem qualquer estatura moral e ética, se vale do cargo para atingir a honra inquestionável de Dilma Rousseff.

Entre pescadores, estudantes e tiranos, a democracia opta pelos primeiros. Ainda que tenha de alguma forma que absorver as lágrimas de familiares de jovens assassinados ao comemorar o primeiro salário ou de pescadores que perderam o rio.  Absorver lágrimas para encontrar algum sentido em sua própria existência.

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Comentários

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FrancoAtirador

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O Ano foi só uma Volta a mais do Planeta Terra ao redor da Estrela Sol.
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    FrancoAtirador

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    O Cronômetro e o Calendário são Meras Convenções
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    criadas para enquadrar a Seqüência Natural da Vida.
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gabi_lisboa

Belo texto para nossa feia realidade.

Urbano

Dentro do próprio caos há o xis da solução. Neste momento não será diferente, pois teremos os nomes e sobrenomes de uma parcela dos bandidos da oposição ao Brasil, justamente durante a votação do anúncio de mais um crime hediondo (a destruição de uma Nação inteira) do bando, ao qual deram o nome de cirurgia impítima. Agora se vai haver alguma autoridade decente e destemida para tomar as devidas providências, aí a dúvida é quem impera. Impera porque para apenas um cruzaram os braços, imagine-se então para dezenas.

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