Os 30 anos da morte de Mané Garrincha, que inspirou o Ôôôôôôôlé

Tempo de leitura: 4 min

Arte & Cultura| 20/01/2013 | Copyleft

Trinta anos sem o gênio Mané Garrincha

No dia 20 de janeiro de 1983, há exatos 30 anos, morria Manuel Francisco dos Santos, o Mané Garrincha, no Rio de Janeiro. Por causa disso, “Deixa Falar: o megafone do esporte” sai hoje em edição extraordinária para lembrar Mané e uma de suas criações: o Olé, através de um texto clássico de João Saldanha, à época (1958) técnico do lendário time do Botafogo.

Raul Milliet Filho, na Carta Maior

“OLÉ” NASCEU NO MÉXICO

(Texto extraído do livro Os Subterrâneos do Futebol, de João Saldanha, lançado em 1963 pela editora Tempo Brasileiro)

O Estádio Universitário ficou à cunha. Cem mil pessoas comprimidas para assistir ao jogo. É muito alegre um jogo no México. É o país em que a torcida mais se parece com a do Rio de Janeiro. Barulhenta, participa de todos os lances da partida.

Vários grupos de “mariaches” comparecem. Estes grupos, que formam o que há de mais típico da música mexicana, são constituídos de um ou dois “pistões” e clarins, dois ou três violões, harpa (parecida com a das guaranias), violinos e marimbas.

As marimbas são completamente de madeira, mas não vão ao campo de futebol, sendo substituídas por instrumentos pequenos. O ponto alto dos “mariaches” é a turma do pistão, do clarim e o coro, naturalmente. No campo de futebol, os grupos amadores de “mariaches” que comparecem ficam mais ativos em dois momentos distintos: ou quando o jogo está muito bom e eles se entusiasmam, ou, inversamente, quando o jogo está chato e eles “atacam” músicas em tom gozador. No jogo em que vencemos ao Toluca, que estava no segundo caso, os “mariaches” salvaram o espetáculo.

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O time do River era, realmente, uma máquina. Futebol bonito e um entendimento que só um time que joga junto há três anos pode ter. Modestamente, jogamos trancados. A prudência mandava que isto fosse feito. De fato, se “abríssemos”, tomaríamos um baile.

Foi um jogo de rara beleza. E não foi por acaso. De um lado estavam Rossi, Labruña, Vairo, Menéndez, Zarate, Carrizo. De outro, estavam Didi, Nilton Santos, Garrincha etc. Jogo duro e jogo limpo. Não se tratava de camaradagem adquirida em quase um mês no mesmo hotel, mas sim da presença de grandes craques no gramado. A torcida exultava e os “mariaches” atacavam entusiasmados.

Estava muito difícil fazer gol. Poucas vezes vi um jogo disputado com tanta seriedade e respeito mútuos. Mas houve um espetáculo à parte. Mané Garrincha foi o comandante. Dirigiu os cem mil espectadores. Fazendo reagirem à medida de suas jogadas. Foi ali, naquele dia, que surgiu a gíria do “Olé”, tão comumente utilizada posteriormente em nossos campos. Não porque o Botafogo tivesse dado “Olé” no River. Não. Foi um “Olé” pessoal. De Garrincha em Vairo.

Nunca assisti a coisa igual. Só a torcida mexicana com seu traquejo de touradas poderia, de forma tão sincronizada e perfeita, dar um “Olé” daquele tamanho. Toda vez que Mané parava na frente de Vairo, os espectadores mantinham-se no mais profundo silêncio. Quando Mané dava aquele seu famoso drible e deixava Vairo no chão, um coro de cem mil pessoas exclamava: “Ôôôôô”! O som do “olé” mexicano é diferente do nosso. O deles é o típico das touradas. Começa com um ô prolongado, em tom bem grave, parecendo um vento forte, em crescendo, e termina com a sílaba “lé” dita de forma rápida. Aqui é ao contrário: acentua-se mais o final “lé”: “Olééé!” – sem separar, com nitidez, as sílabas em tom aberto.

Verdadeira festa. Num dos momentos em que Vairo estava parado em frente a Garrincha, um dos clarins dos “mariaches” atacou aquele trecho da Carmem que é tocado na abertura das touradas. Quase veio abaixo o Estádio Universitário.

Numa jogada de Garrincha, Quarentinha completou com o gol vazio e fez nosso gol. O River reagiu e também fez o dele. Didi ainda fez outro, de fora da área, numa jogada que viera de um córner, mas o juiz anulou porque Paulo Valentim estava junto à baliza. Embora a bola tivesse entrado do outro lado, o árbitro considerou a posição de Paulinho ilegal. De fato, Paulinho estava “off-side”. Havia um bolo de jogadores na área, mas o árbitro estava bem ali. E Paulinho poderia estar distraindo a atenção de Carrizo.

O jogo terminou empatado. Vairo não foi até o fim. Minella tirou-o do campo, bem perto de nós no banco vizinho. Vairo saiu rindo e exclamando: “No hay nada que hacer. Imposible” – e dirigindo-se ao suplente que entrava, gozou:

– Buena suerte muchacho. Pero antes, te aconsejo que escribas algo a tu mamá.

O jogo terminou empatado e uma multidão invadiu o campo. O “Jarrito de Oro”, que só seria entregue ao “melhor do campo” no dia seguinte, depois de uma votação no café Tupinambá, foi entregue ali mesmo a Garrincha. Os torcedores agarraram-no e deram uma volta olímpica carregando Mané nos ombros. Sob ensurdecedora ovação da torcida. No dia seguinte, os jornais acharam que tínhamos vencido o jogo, considerando o tal gol como válido. Mas só dedicaram a isto poucas linhas. O resto das reportagens e crônicas foi sobre Garrincha.

As agências telegráficas enviaram longas mensagens sobre o acontecimento e deram grande destaque ao “Olé”. As notícias repercutiram bastante no Rio e a torcida carioca consagrou o “Olé”. Foi assim que surgiu este tipo de gozação popular, tão discutido, mas que representa um sentimento da multidão.

Já tentaram acabar com o “Olé”. Os árbitros de futebol, com sua inequívoca vocação para levar vaias, discutiram o assunto em congresso e resolveram adotar sanções. Mas como aplicá-las? Expulsando a torcida do estádio? Verificando o ridículo a que estavam expostos, deixam cada dia mais o assunto de lado. É melhor assim. É mais fácil derrubar um governo do que acabar com o “Olé”.

Não poderia ter havido maior justiça a um jogador que a que foi feita pelos mexicanos a Mané Garrincha. Garrincha é o próprio “Olé”.

Dentro e fora de campo, jamais vi alguém tão desconcertante, tão driblador. É impossível adivinhar-se o lado por onde Mané vai “sair” da enrascada. Foi a coisa mais justa do mundo que Garrincha tivesse sido o inspirador do “Olé”.

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Comentários

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FrancoAtirador

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Não sei se foi o melhor jogador do Brasil e do mundo.

Mas Garrincha foi o maior driblador de todos os tempos.

O Mané driblava a vaca, o touro, o toureiro e a cadeira.

(http://www.youtube.com/watch?v=xuYh6If9A6s)
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Garrincha – alguns dribles

(http://www.youtube.com/watch?v=ASBIVvT7IPk)

“De onde apareceu esse cara? Contrata logo, senão nunca mais vou poder dormir sossegado.”
Nilton Santos, considerado o maior lateral-esquerdo do futebol brasileiro, à revista Placar, junho de 1992, sobre o que teria falado logo após Garrincha passar a bola por entre as suas pernas, no 1º treino do jogador no Botafogo. O técnico era Gentil Cardoso.

“Foram os 3 minutos mais fantásticos da história do futebol e a mais assombrosa aparição na ponta-direita desde Stanley Matthews.”
Gabriel Hannot, sobre o início da partida contra a União Soviética, na Copa de 1958, na qual se tornaram titulares Pelé e Garrincha, que fariam uma sequência de brilhantes jogadas que culminaram com o gol de Vavá. Revista Placar 1072, de Junho de 1992.

“Se ele é considerado meio burro, não posso fazer a menor idéia do que, para os brasileiros, é ser inteligente.”
Cronista esportivo de Londres. Revista Placar 1072, de junho de 1992.

“De que planeta viene Garrincha?”
Jornal chileno El Mercúrio. Revista Placar 1072, de junho de 1992.

“Em 50 anos de futebol, jamais apareceu um jogador como ele”
Jornal inglês Daily Mirror. Revista Placar 1072, de junho de 1992.

“Se há um deus que regula o futebol, esse deus é sobretudo irônico e farsante, e Garrincha foi um de seus delegados incumbidos de zombar de tudo e de todos, nos estádios.”
Carlos Drummond de Andrade, sobre a forma como Garrincha jogava.

http://dezdedinhos.blogspot.com.br/2008/07/garrincha-alguns-dribles.html

Marcio H Silva

62, então com sete anos soltei bombinhas para comemorar o bi campeonato. Não entendia nada mas soltei as bombinhas dadas pelos primos maiores.
Cresci escutando meus primos nos debates de quem era melhor Garrincha ou Pelé, e até hoje comparam os dois caras…..o orgulho, bem, o orgulho é que os dois são daqui do Brasil, conterrâneos, compatriotas, o resto não importa.

Marcio H Silva

“No hay nada que hacer. Imposible”
– Buena suerte muchacho. Pero antes, te aconsejo que escribas algo a tu mamá.

Estas duas resumem tudo……….

Isidoro Guedes

Não tive o prazer de ver Garrincha jogando (nasci um ano antes da Copa de 1962, quando o Brasil sagrou-se bi-campeão mundial – a segunda copa em Garrincha destacou-se). Tão previsível quanto genial, o mago das pernas tortas foi realmente um jogador que fez história nos gramados mundiais. Foi um dos maiores jogadores de todos os tempos, e não fosse tão ingênuo (e por vezes irresponsável) não tenho dúvida que poderia ser até maior que Pelé (que sabia se preservar melhor fora de campo).

Urbano

Inesquecíveis, antes do filme principal que seria seguido pelo seriado, os dribles mágicos do carioca Garrinha, ao som da magia musical do pernambucano Luiz Bandeira.

jhospeh da silva

Nasci 15 anos atrasado, vi Pelé, não vi Garrincha.

Meu pai viu ambos, e eu só o vi chorar duas vezes na vida, uma em 1974 no jogo contra Ponte Preta quando Pelé deixou o Santos (e a Seleção) para sempre; a outra em 1983 quando viu no Jornal Nacional a notícia da morte de Garrincha.

Naquela hora ele me disse que se Pelé era o Rei, Garrincha fora o Cristo do Futebol.

Eu ainda era quase um menino e levei décadas para captar a sutileza da metáfora.

Gerson Carneiro

Há 30 anos fora convocado para a Seleção Celestial.

Eu me lembro exatamente aonde eu estava e o que eu fazia quando ouvi pelo rádio a notícia da convocação. Foi um daqueles momentos em que guardamos para a eternidade.

Mané Garrincha, melhor que Messi.

    Marcio H Silva

    Querido Gerson, voce estava comendo Buxada de Bode na casa de cheirôooooso!
    Um abraço…….

Gerson Carneiro

Malandronna é malandronna, e Mané é Mané.

Gerson Carneiro

Malandronna é malandronna, e Mané é Mané.

Julio Silveira

Mais felizes foram aqueles que assistiram ao mané, esse que foi o maior jogador de futebol brasileiro de todos os tempos.

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    Gerson Roque

    Estou muito emocionado!!
    Não sei se foi o maior. Com certeza foi o mais fantástico, que o futebol já teve!
    Que os Deuses o guardem num lugar muito especial!

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