Da Grécia à Espanha
A crise se espalha
por MIKE WHITNEY, no Counterpunch, em 19.06.2012
“A economia grega está verdadeiramente quebrada. Os circuitos do crédito estão tão profundamente danificados que mesmo as empresas eficientes e lucrativas ficaram trancadas para fora do mercado de capitais… Enquanto isso, os novos cortes de gastos…. darão às forças da recessão novo impulso. Para encurtar uma longa história, não há dúvida de que isso vai simplesmente prolongar a morte agonizante da economia social grega”.
– Yanis Varoufakis, economista, Universidade de Atenas
O eleitorado grego mudou o capitão do Titanic, mas o navio ainda está afundando. Que diferença fizeram as eleições? Nenhuma.
O desemprego continua a crescer, os déficits continuam a se expandir e a economia está em frangalhos. Tudo está fundamentalmente igual, com uma exceção, o vencedor (Antonis Samaras, da Nova Democracia) continua firmemente comprometido em manter o curso e cumprir os termos dos resgates, enquanto o perdedor (Alexis Tsipras, do Syriza), rejeita as medidas de austeridade definidas pelo Memorando de Entendimento e promete renegociar o acordo com a troika (a Comissão Europeia, o FMI e o Banco Central Europeu).
A vitória de Samaras por pequena margem significa que a Grécia vai receber mais ajuda financeira (empréstimos em prestações), mas terá de implementar outra onda de cortes selvagens dos gastos sociais, desta vez no valor de U$ 11,5 bilhões. Estes cortes vão inibir ainda mais o crescimento, o que vai diminuir a arrecadação, levando a déficits ainda maiores. Quando o governo for incapaz de atingir o alvo de redução dos déficits (como todos esperam), os políticos da União Europeia vão suspender o resgate e a crise vai ser novamente deflagrada. É um círculo vicioso que só pode terminar com a Grécia deixando a zona do euro e retomando o drachma.
Assim, o que acontece em seguida?
Os líderes da Nova Democracia vão tentar juntar um governo de coalizão com outros partidos pró-austeridade (como o PASOK) enquanto tentam obter concessões magras para estender os empréstimos existentes e reduzir a taxa de juros de outros.
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Alguns analistas acham que a troika vai tentar ser mais flexível nos termos do resgate para reduzir as crescentes tensões sociais, mas isso não parece provável.
A chanceler alemã Angela Merkel derrubou a ideia de reduzir a dívida ou agir com menor rigor com a Grécia horas depois do anúncio dos resultados da eleição. Conforme disse a agência de notícias Reuters:
“A chanceler alemã Angela Merkel disse na segunda-feira que o novo governo grego tem de cumprir os compromissos assumidos com credores internacionais. Falando a repórteres na reunião do G20, Merkel disse que enfraquecer as promessas de reformas depois da vitória por pequena margem dos partidos pró-austeridade seria inaceitável”.
Merkel não vai dar qualquer moleza à Grécia. Ou os objetivos de redução do déficit são atingidos e a Grécia cumpre com suas obrigações, ou os empréstimos serão suspensos. “Paga ou cai fora”: esta é a mensagem de Berlim. A julgar pela reação dos jornais alemães, o jogo duro de Merkel é muito popular em todo o espectro político. Olhem os editoriais de segunda-feira. Isso é do centro-direitista Frankfurter Allgemeine Zeitung:
“O eleitorado grego está obviamente dividido. Mas o país precisa de um governo que tenha o poder e a coragem de aprovar e implementar reformas inescapáveis: um governo capaz de convencer o povo de que seu país precisa de uma renovação fundamental. Não será fácil formar tal governo — ‘não será fácil’ é subestimar o problema. Os próprios dias vão demonstrar quanto será difícil”.
Isso do Financial Times Deutschland:
“Os gregos precisam reafirmar as reformas. Não devem isso apenas aos europeus, dos quais recebem ajuda, mas devem a si próprios. A população precisa entender que não pode voltar ao estado de coisas pré-crise”.
Finalmente, do conservador Die Welt:
“A chanceler Merkel insiste em responsabilidade compartilhada. Ela enfatiza que a austeridade e as reformas são a forma de resolver a crise da dívida europeia. Esta clareza causa desconforto mesmo em muitos alemães. Ainda assim chegamos a esta conclusão, que na verdade é banal, dentro de um contexto político crescentemente volátil. A Alemanha está demonstrando força, sem tentar dominar, e ainda assim é punida com desprezo. Se Angela Merkel mudasse o rumo, se ela cedesse às críticas, isso não seria bom para a Europa ou para a Alemanha”.
Reformas, reformas, reformas. Os comentaristas alemães amam reformas, por isso admiram a sua reformista chanceler, Frau Merkel. Mas onde tais reformas — que são comumente chamadas de ‘medidas de austeridade’– funcionaram? Em qual país a consolidação das dívidas, os ajustes estruturais, a privatização e a destruição dos sindicatos levou ao fim da recessão ou a uma forte recuperação? Irlanda? Espanha? Portugal? Itália?
Os dados sugerem que as políticas de Merkel não funcionam e é por isso que tantos dos economistas mais importantes do mundo atacam a austeridade como contraproducente.
Assim, como é que estes “especialistas”ainda pensam que estão certos quando dois anos de experiência demonstram que estão errados? Olhem as taxas de risco. Olhem os bancos. Olhem o desemprego. Olhem o PIB. Por todo padrão objetivo, a política fracassou. Isso já não é um ponto a ser debatido. Os fatos falam por si.
Na terça-feira, enquanto os líderes das maiores economias do mundo se encontravam em Los Cabos, no México, para a cúpula do G20, um leilão fracassado da dívida da Espanha disparou o alarme, relembrando a cúpula do fato de que a crise permanece irresolvida.
Aqui, de um despacho da Reuters:
“A Espanha pagou um preço recorde para vender dívida de curto prazo na terça-feira, ficando mais próxima de se tornar o maior país europeu a ficar alijado dos mercados de crédito. Os crescentes custos espanhóis demonstram os defeitos do acordo europeu para emprestar aos bancos da Espanha até 100 bilhões de euros. Eles também ilustram como os problemas da Europa são muito mais profundos que os da Grécia, que escapou do precipício da moratória depois das eleições parlamentares de domingo…”(Reuters).
A taxa de risco dos papéis espanhóis permanece acima de 7%, depois de atingir o recorde de 7,28% ontem. Economistas acreditam que qualquer coisa acima de 7% é insustentável.
Assim, enquanto um incêndio foi apagado na Grécia, outro surgiu na Espanha. É apenas uma questão de tempo antes que o chefe do Banco Central Europeu, Mario Draghi, seja chamado a reabrir o Securities Market Program (SMP) para voltar a comprar a dívida da Espanha, com o objetivo de reduzir as taxas de risco e evitar um colapso.
Por que a crise se espalha? E por que se mudou para a Espanha que, afinal, até 2007, tinha um balanço que parecia melhor que o da Alemanha? Tinha um dívida pública menor, nunca tinha violado as regras de déficit da zona do euro e tinha consistentes superávits.
Por que a Espanha? O problema não é com a Espanha. Nem com a Irlanda, Grécia, Portugal ou Itália. É a união monetária, em si.
Os criadores da zona do euro foram advertidos de que uma união monerária sem união política e fiscal não funcionaria, mas foram adiante assim mesmo. Agora estão tentando corrigir o euro inflingindo dor nos membros da UE, (desvalorização interna), já que a única outra opção seria criar os Estados Unidos da Europa, o que requereria realizar referendos em todos os 17 países. Eles sabem que suas chances de sucesso seriam bem pequenas, por isso nem querem tentar, o que explica o uso de band-aids improvisados, até que um dos países membros se retire da zona do euro e a corrida em direção à porta comece.
MIKE WHITNEY lives in Washington state. He is a contributor to Hopeless: Barack Obama and the Politics of Illusion (AK Press).
PS do Viomundo: Existe um nexo entre a crise, o fracasso da Rio + 20 e a fase neocolonialista do supercapitalismo financeiro. O centro vai predar ao mesmo tempo os assalariados e os países detentores de recursos naturais valiosos (vide Líbia e Venezuela), para fechar as contas. Jamais aceitará novos padrões de consumo que ameacem a multiplicação do capital.
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Comentários
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[…] Mike Whitney: Na Grécia, de volta à estaca zero […]
Lucas Cardoso
Azenha, você já escreveu algum livro? Se não, pretende escrever? Eu digo isso porque os PS do Viomundo são uma das partes mais interessantes do site. Por exemplo, “fase neocolonialista do supercapitalismo financeiro” é um conceito original, se não estou enganado, e fascinante.
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