Temores no momento em que Beijing usa seus bilhões para comprar recursos
por SARAH ARNOTT, no diário britânico Independent, em 02/10/2013
A China está despejando outros U$ 7 bilhões na indústria petrolífera do Brasil, reacendendo temores de um “arrebatamento” global de recursos naturais
A empresa estatal Sinopec fechou um acordo com a Repsol da Espanha, ontem, para comprar 40% de seus negócios no Brasil, dando à maior companhia petrolífera da China acesso às reservas da empresa no país estimadas em 1,2 bilhão de barris de petróleo e gás.
O altíssimo preço — que dobra o valor da empresa em relação a estimativas anteriores — é um sinal da determinação da China de pagar qualquer coisa para garantir suas necessidades futuras de energia e evitar distúrbios sociais.
A Sinopec dará à empresa financiamento para garantir todos os atuais projetos de exploração, inclusive em dois campos na bacia de Santos.
O negócio com a Repsol não é o primeiro da China no Brasil. Em fevereiro do ano passado, a Sinopec fez um empréstimo de U$ 10 bilhões à Petrobras, a companhia estatal de petróleo, em troca da garantia de fornecimento de 10 mil barris diários de petróleo pelos próximos dez anos.
É uma sequência de negócios similares fechados em todo o planeta.
Enquanto boa parte do mundo desenvolvido sofre com as dívidas assumidas depois da crise financeira, a China continua sua onda de compras globais de proporções sem precedentes, arrebatando de tudo, de reservas de gás e petróleo a concessões mineradoras e terra arável, com suas vastas reservas de dólares.
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Apenas este ano, as companhias chinesas gastaram bilhões de dólares para comprar participação nas areias betuminosas do Canadá, em minério de ferro da Guiné, em campos de petróleo em Angola e Uganda, numa empresa petrolífera da Argentina e numa empresa de gás australiana.
“A China é rica em gente mas tem poucos recursos, e quer estabelecer fornecimento próprio de matéria prima em vez de comprar no mercado aberto”, Jonathan Fenby, um especialista em China e diretor do grupo de pesquisa Trusted Resources, afirmou.
Mas é uma estratégia que está causando ansiedade em outras partes do mundo. Rumores em semanas recentes de que a Sinochem, da China, poderia tentar comprar a canadense Potash Corporation causaram temores de que os chineses estão tentando controlar o mercado global de fertilizantes.
Da mesma forma, quando o preço das ações da BP despencou, depois das críticas de Barack Obama sobre o vazamento de petróleo no Golfo do México, houve preocupação de que a empresa acabaria na mão dos chineses.
De forma ainda mais explícita, quando a gigante do alumínio Chinalco estava tentando comprar a anglo-australiana Rio Tinto no ano passado, anúncios de TV protestando contra o esquema bancados pelo líder da oposição no Senado traziam a frase “mantenham a Austrália australiana”.
“As aquisições dos chineses estão cada vez mais no radar político”, diz Robin Geffen, executivo em chefe da Neptune Investment Management, que controla um importante fundo de investimento na China. “Os nervos ficam à flor da pele quando as pessoas sentem que suprimentos que poderiam afetar a segurança nacional seriam ameaçados se a China comprasse tudo”.
Ao contrário das teorias de conspiração, a China não está em busca de dominação mundial. Viu seu crescimento econômico maciço de 10% ao ano mantido praticamente nas últimas três décadas e embora espere por uma queda para menos de 10% nos próximos anos — como resultado de uma queda na demanda por exportações chinesas — os recursos naturais exigidos para sustentar mesmo um crescimento moderado são prioridade total.
A China já é o segundo maior consumidor de petróleo do mundo e o consumo está bem acima da produção interna. A Neptune estima que a China vai precisar comprar duas empresas do tamanho da BP a cada ano, nos próximos 12 anos, para dar conta de sua crescente demanda doméstica por energia. A demanda anual por eletricidade está crescendo o equivalente a toda a produção do Reino Unido.
“Os números são massivos, massivos”, diz Mr. Geffen. “O negócio com a Repsol e todos os outros que vimos em anos recentes são estratégicos, para garantir a estimada demanda futura”.
Mas, apesar da preocupação de que a China vai controlar mercados e inflacionar preços, o mundo desenvolvido tem interesse em que a China tenha uma estratégia bem sucedida.
Apesar da preocupação com mudanças no equilíbrio global do poder, o crescimento econômico continuado da China será vital para tirar o mundo da recessão — e será assim no futuro.
A ameaça de instabilidade política se o crescimento chinês diminuir também tem implicações globais. “O mundo todo precisa da China para nos ajudar a sair da recessão e evitar distúrbios locais”, diz Ian Sperling-Tyler, sócio da consultoria Deloitte e especialista em gás e petróleo.
Mas preocupações ainda existem sobre o envolvimento da China em países com dificuldades políticas, particularmente na África. A China não se preocupa com a política de seus parceiros de negócios. Segue uma fórmula simples: oferece preços premium e investimentos maciços em infraestrutura em troca de concessões de longo prazo em recursos-chave.
Existem vários negócios bem documentados no continente — inclusive uma sociedade de U$ 2,5 bilhões com a Tullow Oil, do Reino Unido, em Uganda, além da produção marítima em Angola e na Nigéria. E o impacto positivo evidente é a nova infraestrutura, inclusive hospitais, portos, rodovias e ferrovias construídas com a entrada de dinheiro chinês.
Mas a China também está envolvida em países mais controversos da África. Foi alvo de fortes críticas em 2008 pela venda de armas ao Sudão, um grande parceiro comercial que se negava a ajudar a resolver a crise humanitária em Darfur.
A China também foi acusada de pagar milhões de dólares para convencer líderes africanos a repudiar Taiwan nas Nações Unidas, embora isso não tenha sido provado. Porque a maioria dos negócios é feita entre governos, é difícil ter clareza sobre a extensão dos relacionamentos.
PS do Viomundo: Conhecemos bem de perto a atuação dos chineses na África. A descrição do artigo acima é correta. Os negócios feitos entre governos, muitas vezes obscuros, causam protestos aqui ou ali — por exemplo, na Zâmbia. A China livrou as elites locais das condicionalidades impostas pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) e ofereceu projetos de infraestrutura. Porém, a construção é feita por empresas chinesas, muitas vezes com mão-de-obra chinesa, outra fonte de ressentimento local. A proximidade geográfica, especialmente da costa oriental da África, representa a promessa de grandes negócios para África do Sul, Moçambique, Tanzânia, Quênia e Sudão, dentre outros.
Mas os investimentos são diversos e muitos deles essenciais, fazendo com que a imagem dos chineses seja majoritariamente positiva. Por exemplo, chineses construiram represas para coletar água de chuva em Cabo Verde:
Diáspora cabo-verdiana (27) from Luiz Carlos Azenha on Vimeo.
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Comentários
Helenita
Conhecem aquela lei primitiva, antiquíssima e cruel de cortar a mão ou o braço, que vigora em países da África??? Pois é, quem diria, vem de um decreto monárquico do Rei Leopoldo da Bélgica, a civilizada, elegante, escrupulosa Bélgica sobre os infelizes países por ela colonizados! E o que não diremos da Inglaterra, que colonizou, espoliou e martirizou os povos dominados, não só da Africa, mas também da Ásia, Oriente Médio e Caribe!
Maldita Europa, já sucumbe tarde!
Francisco
A China cuida da China, os EEUU cuidam dos EEUU e assim por diante.
O problema é quando vamos começar a cuidar de nós mesmos, como prioridade.
Com uma ressalva importante:
Cuidar de si não quer dizer não pactuar, não compartilhar, pelo contrário: fazer negócio com países “adultos” de forma “adulta” (autonoma, soberana) é natural e desejável.
O problema é o complexo de bacteria…
francisco.latorre
independent?..
vou de pagina12.
sudamerica ou império?..
..
http://tijolaco.com.br/index.php/jornal-argentino-diz-o-que-aqui-nao-querem-ver-libra-e-o-brasil-se-afastando-dos-eua/
..
e o paulo nogueira. de londres. no diário do centro do mundo.
vai de áfrica. dambisa moyo. economista.
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/por-que-e-bom-torcer-para-que-a-china-ganhe-o-leilao-de-libra/
Por que é bom torcer para que a China ganhe o leilão de Libra
Paulo Nogueira
Uma questão tem sido virtualmente ignorada — ou deliberadamente distorcida — no controvertido leilão do campo de libra: a presença da China.
É a chamada boa notícia.
Torcemos para que a China ganhe. É o melhor parceiro que se pode ter hoje. Em seu excelente livro “The Winner Take All”, que relata a corrida organizada e bem-sucedida chinesa em busca de recursos naturais que garantam seu futuro, a economista Dambisa Moyo mostra como a China rompeu o paradigma ocidental nessa área.
Tradicionalmente, o ocidente promoveu guerras para tomar posse de áreas ricas em recursos naturais. Por meio das bombas, estabeleceu relações que eram absurdamente desfavoráveis para os países plenos de recursos. Veja o que os Estados Unidos fazem há anos no Oriente Médio, por exemplo, para assegurar petróleo.
A China, por ter uma natureza diferente, foi por outro caminho, demonstra Dambisa. Busca recursos naturais tendo por base uma relação em que ambas as partes ganhem. (Na brilhante definição do intelectual britânico Bertrand Russell, feita há cerca de um século depois de uma temporada na China, é um ‘país artista’, não feito para guerras.)
O papel da China na África ilustra perfeitamente isso. Dambisa, economista de prestígio internacional, está familiarizada com o quadro: é natural da Zâmbia.
Em 2002, conta ela, a China deu 1,8 bilhão de dólares para países pobres africanos. O dinheiro foi empregado em coisas como o treinamento de 15 000 profissionais africanos, a construção de 30 hospitais e 100 escolas e o aumento de bolsas de estudo para estudantes. “Dois anos antes, a China perdoara dívidas de 1,2 bilhão de dólares de países africanos”, narra Dambisa. “Em 2003, perdoou mais 750 milhões de dólares.”
O comércio bilateral entre a China e a África subiu de 10 bilhões de dólares em 2000 para 90 bilhões em 2009.
“A China oferece uma alternativa à África ao assistencialismo”, disse Dambisa numa entrevista recente à revista Época. “Estimula o comércio e o empreendedorismo, e cria empregos nas regiões em que está presente. É uma troca ou simbiose. A China é muito melhor para a África do que os Estados Unidos ou a Europa.”
Não é à toa que os países africanos, como mostram pesquisas, prefiram amplamente as parcerias com a China, e não com os americanos ou as potências europeias.
No Brasil, como se vê no livro de Dambisa, a China já é também um parceiro fundamental. Nos seis primeiros meses de 2010, a China multiplicou por 10 seus investimentos no Brasil e os elevou para 20 bilhões de dólares. Com isso, os chineses se tornaram os principais investidores internacionais no Brasil, à frente dos Estados Unidos. A China é hoje, além disso, o principal parceiro comercial do Brasil.
Faltam ao Brasil recursos para explorar rapidamente o petróleo de Libra? Pena. Que se busquem parceiros, e entre estes não poderia haver ninguém melhor que os chineses.
É patética, obtusa e demagógica a reação de líderes como Serra. “Agora vamos ficar numa relação de uma quase colônia da China, um neocolonialismo do Brasil em relação aos chineses, o que me parece incrível”, disse Serra esta semana.
O que diria ele se a parceria estivesse prestes a ser travada com os americanos? Você pode imaginar. Incrível mesmo é alguém ainda dar ouvidos para o bestialógico neonacionalista de Serra.
..
china imperialista.
tem graça.
..
Gil
A China cuida das empresas chinesas e da mão de obra chinesa, mas surpreendente, não é mesmo.
“A China não se preocupa com a política de seus parceiros de negócios”.
Não me faça rir, desde quando estes imperialistas dos EUA e da Europa se importam com isso.
Desde quando exigem democracia para comprar ou investir nos países, se fosse assim não comprariam petróleo da Arábia Saudita e das outras monarquias absolutistas do golfo pérsico.
Apoiaram e continuam apoiando golpes de estado e ditaduras no mundo inteiro
A America Latina quase toda já passou por ditaduras e golpes, que depois das experiências mal sucedidas na Venezuela, Bolívia e Equador, se tornaram mais “sofisticados”, como em Honduras ou Paraguai.
E que eu saiba a China não esta patrocinando golpes de estado, se não ajuda a formar um mundo mais democrático, também não atrapalha, diferente de estadunidenses e europeus.
Finalizando, não foi a China quem invadiu a África com seus exércitos para levar para Europa todas as suas riquezas, de fato a China é que foi invadida para ser espoliada por educados e civilizados europeus.
Luís Carlos
O desespero e pânico gerado pelas compras da China são daqueles que tem muito a perder com o novo tabuleiro econômico do mundo. Os EUA quebrados, praticamente falidos e sem credibilidade, muito próximos do calote postergado para fevereiro de 2014, enquanto a China, que tem mais de U$ 1 trilhão em reservas vais as compras se preparando para o calote estadunidense. A economia mundial está prestes a viver grande mudança, com o eixo econômico mundial girando para o oriente. Os EUA farão de tudo, inclusive usar seu arsenal assassino contra o mundo, como já faz desde muito, mas em busca de energia em qualquer parte do mundo a ser pilhada e saqueada, inclusive o Brasil, daí espionagens recentes. O Brasil escolhe seu grande parceiro comercial e, talvez bélico contra a grande ameaça econômica e armamentista estadunidense: a China.
Valmont
A China assume um discurso contrário às intervenções políticas e militares que caracterizam a prática estadunidense no mundo, desde a 2ª Guerra Mundial.
A diplomacia chinesa tem defendido a autodeterminação das nações e a multipolaridade contra a atitude intervencionista unilateral do Xerife do Mundo.
Mas que ninguém se anime com visões humanistas e românticas. O jogo é entre águias e leões.
Gil
Destaco: “A China é rica em gente mas tem poucos recursos, e quer estabelecer fornecimento próprio de matéria prima em vez de comprar no mercado aberto”
Entenda-se por “mercado aberto”, as indústrias financeiras dos EUA, Reino Unido, e da Zona do Euro, que ganham muito dinheiro especulando com as matérias primas
Mardones
Quando o articulista fala da parte ruim dos investimentos chineses na África, parece que esquece a atuação de outros impérios econômicos e seus males. Por acaso, os EUA e a Inglaterra fazem boas ações quando o assunto são seus negócios mundo afora? Por que a China faria diferente?
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