Idibal Pivetta recebe prêmio por defesa de perseguidos políticos
Tempo de leitura: 3 minpor Conceição Lemes
14 de fevereiro de 1981. Os presos da cadeia pública de Jacareí, interior do Estado de São Paulo, se rebelam. Franz de Castro Holzwarth, advogado e defensor dos direitos humanos se propõe a intermediar o motim e se oferece para ficar como refém no lugar de um policial militar. Acaba assassinado pela própria polícia.
26 de outubro de1976, auge da ditadura militar. Agentes da repressão, civis e militares, de armas na mão, cercam a sede da Ordem dos Advogados do Brasil – seção São Paulo (OAB/SP). O prédio está sob ameaça de bomba. Lá dentro se realiza um ato em desagravo ao colega Idibal Pivetta, que ficara 60 dias preso, sendo 37 incomunicáveis.
Seu escritório foi violado, sua casa invadida. Nela, foram apreendidos como “subsersivos” a resenha histórica A Força Expedicionária Brasileira na Itália, os livros O Inimigo do povo, de Ibsen, Os miseráveis, de Vitor Hugo, e Palavras sobre a Inquisição, de Spinosa, entre muitos outros, e a letra da Internacional, o hino comunista. No inquérito apareceu um “revólver que o advogado carregava na cintura”, lado a lado com a Constituição e códigos.
“No transcorrer do processo, essa arma serviu de prova, sim, mas para mostrar como autos de busca e apreensão são forjados de forma vil e tacanha”, relembra Pivetta, que fez oralmente a sua própria defesa. “Primeiro, em São Paulo, perante a 2ª Auditoria de Guerra. Depois, no Superior Tribunal Militar.”
Foi absolvido por unanimidade por coronéis, almirantes, brigadeiros e generais. A sentença registrou que o auto de busca e apreensão – motivo de sua prisão e do processo – fora forjado pela autoridade.
“O objetivo dos agentes da ditadura era intimidar a maioria dos advogados que militava na Justiça militar, para que deixássemos de exercer a profissão nessa área”, continua Pivetta. “Não conseguiram, continuamos resistindo.”
Ainda bem. Nos anos militares, atuou como advogado do então metalúrgico e sindicalista Luiz Inácio da Silva, hoje presidente Lula, de Sebastião Salgado (fotógrafo), Franklin Martins (jornalista e ministro de Comunicação Social), Augusto Boal (dramaturgo), Ricardo Zaratini (engenheiro e ex-deputado federal pelo PT-SP), Ivan Valente (deputado federal pelo PSOL-SP) e Carlos Eugênio Paz (escritor e músico).
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Mais de 800 perseguidos políticos foram defendidos – muitos gratuitamente – por seu escritório, que contava com os advogados Paulo Gerab, Airton Soares, Belisário dos Santos Jr., Joaquim Cerqueira César, José Carlos Roston e Miguel Aldrovando. Não à toa é o nome mais lembrado quando se fala de advogado de perseguidos políticos.
No final de maio, quase 34 anos depois, muitos deles se reencontraram na OAB/SP por um motivo bem diferente do de 1976. A solenidade de entrega do XXVI Prêmio Franz de Castro Holzwarth de Direitos Humanos da OAB a Idibal Pivetta. Dois nomes indissoluvelmente associados a partir de agora.
“Esse prêmio é um dos mais importantes que recebi na vida”, festeja. “Primeiro, porque é homenagem ao advogado Franz de Castro, um abnegado na defesa da justiça e dos direitos humanos. Segundo, pois me traz ao encontro de tantos amigos.”
Pivetta foi aplaudido de pé pelos colegas.
“Idibal é um combatente de vários fronts”, afirma Airton Soares, colega de profissão, amigo e companheiro de quase 40 anos de batalhas. “Onde Idibal se intromete, no bom sentido, ele sempre tem boas idéias, posições avançadas. É assim na advocacia, no teatro, nos órgãos da sociedade civil. É um revolucionário que faz da sua existência uma luta permanente.”
A propósito. Ao final da solenidade, o Teatro Popular União e Olho Vivo, fundado por César Vieira, nome artístico de Idibal Pivetta, e o Grêmio Recreativo Samba do Bule se apresentaram, cantando a música “ Cidadão Samba” de autoria do homenageado.
Comentários
Rosana Bullara
Desde 1977, quando ingressei na USP e depois, em 1979, no Partido Comunista do Brasil, andava com o telefone do que, carinhosamente chamava de meu advogado: Idibal Pivetta.
Era muito "menina", mas, me sentia segura com aquela figura forte que, por várias vezes, acompanhei no "Teatro União e Olho Vivo" (belíssimo nome). Porém, foi depois de meu rompimento com o PC do B, já no PRC, Partido Revolucionário Comunista (uma dissidência, partido pequeno, de vida curta) por volta dos anos oitenta que, ao ser detida com mais dois camaradas por estar colando cartazes na USP que, realmente, precisei (precisamos…) acordar o Pivetta. E ele veio rápida e prontamente, dando segurança aos três militantes conduzidos a terrível delegacia 51, numa pavorosa rua sem saída, que terminava num matagal sem fim, um breu, de onde achávamos que não sairíamos. Saímos e intactos, pelas mãos do que eu continuo chamando, carinhosamente, de "meu advogado", embora não tenhamos mais nos visto. Creio que, para muitos, nos piores momentos, ele esteve presente: sério, forte e calmo. Obrigada a esse eterno advogado de tantos.
Márcia Bassetto Paes
Tive o privilégio de ter Idibal Pivetta como advogado quando fui presa em abril de 1977. Idibal tinha a preocupação, não só em ser um excelente e destemido defensor dos presos políticos. Ia muito além ofertando amizade e conforto, inclusive aos familiares, num momento em que a ditadura nos queria frágeis fisica e emocionalmente. A superação de traumas e dificuldades psicológicas decorrentes das torturas e condições da prisão, muito devo ao carinho de Idibal. Justíssima homenagem.
Márcia Bassetto Paes
Tive o privilégio de tê-lo como meu defensor quando fui presa em abril de 1977, por isso assino embaixo do comentário de Jhumberto. Idibal não só foi excelente e destemido defensor de presos políticos. Foi amigo e conselheiro quando a condição imposta pela ditadura nos queriam frágeis emocional e físicamente. O meu processo de superação das condições traumáticas a que fui submetida muito deve ao cidadão e amigo Idibal Pivetta. Justíssima homenagem.
Ronaldo Almeida
Esta homenagem veio tarde. Idibal foi o maior defensor de presos políticos do último período ditatorial no Brasil. Foi também o mais honesto. Nunca buscou alavancar carreira política pela sua atuação e sempre fugiu dos holofotes. Não que isto teria sido condenável, seria grande sua contribuição ao debate pós-ditadura no parlamento. Preferiu atuar nas comissões de anistia. Sua história é irretocável. Foi meu advogado em duas ocasiões, numa delas através do Paulo Gerab. Foi, ainda, advogado da minha companheira. Somos eternamente gratos a esta grande homem que é o Idibal Piveta.
jun
Obrigado Idibal:
Grande compositor, teatrólogo, diretor e advogado nas horas vagas em defesa de boas causas.
José Martinez
São homens como esses que nos mostram que o Brasil pode e será grande, fraterno e humano. Parabéns ao Grande Advogado.
Carlos
Que a história de Pivetta seja levada ao conhecimento de todos os diretórios/centros acadêmicos de Direito.
rogerio delamare
Salve, Salve!!!! É uma inspiração para continuarmos a luta que não cessa.
Ivanisa T. Martins
Um grande abraço a Idibal Pivetta e a Airton Soares. São dois grandes brasileiros.
graciela
conceição, que texto exuto…valeu. coloquei no facebook….mais alguns, se não o conheciam, terão um breve histórico…muito bem feito.
obrigada
graciela rodriguez
MARISA DUTRA
PARABÉNS AO IDIBAL PIVETTA, PARABÉNS AO CESAR VIEIRA, PARABÉNS AO TEATRO POPULAR UNIÃO E OLHO VIVO!!!
MERDA…. MERDA…. MERDA….!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Gerson Carneiro
E não há uma cidade, uma rodovia, um viaduto, uma rua, uma praça… uma viela sequer denominada "Idibal Pivetta".
Só denominam a coisa pública justamente com nomes de quem tem o dever de servir sem aparecer (políticos).
Jairo_Beraldo
Veja a TV Camara e a TV Senado, que verá como eles se acham…fazem falácias, com aquilo que nada mais é que suas obrigações!
Albany Sampaio Jr.
Azenha, desculpe a minha ignorância, não conhecia a história desse bravo cidadão BRASILEIRO, com letras maiusculas e muito orgulho. Sou advogado em Salvador, e me entristece muito a omissão da OAB em casos cruciais, como os dois HCs ao Dantas e a perpetuação do Durso como presidente da OAB de São Paulo. Lendo essa história, senti orgulho de ser advogado. Obrigado por me ensinar essa parte da nossa história.
Jairo_Beraldo
E mais que Pivetta, Sampaio, é Dr. Franz de Castro Holzwarth.
Nivaldo Marques
Parabéns ao grande Idibal de Almeida Piveta! Fomos colegas no curso de dramaturgia da EAD antes do golpe e ele já mostrava toda a sua coragem e idelismo motivando a todos nós!!
Jhumberto
Que alegria ter a oportunidade somar o meu aplauso a esta mais que justa, embora tardia, homenagem a este grande ser humano e grande brasileiro que e' o Idibal Piveta.
Quando estive preso, em 1972, foi o escritorio do Idibal que me defendeu atraves do seu companheiro Airton Soares. Eu nao tinha condicoes de pagar, e mesmo assim recebi a assistencia juridica que necessitava sem nenhum problema. Evidentemente tenho profunda gratidao aos dois pelo socorro juridico naqueles tempos negros.
O trabalho realizado pelo escritorio do Idibal, com um bom numero de jovens advogados idealistas, foi uma das paginas mais relevantes da historia da luta pela democracia no Brasil durante a ditadura militar, e da historia da luta por direitos humanos e politicos entre nos.
No ano passado, depois de muitissimos anos sem ve-lo – eu o conhecia mais do que ele a mim, devido ao grupo de teatro amador que era o seu hobby, e que eu acompanhava e ate' ajudava como voluntario nos anos 70 e 71 – tive a oportunidade e a honra de me encontrar com o Idibal para tomarmos um cafe, em Sao Paulo. Modestia 'a parte, eu ja' tive a oportunidade nesta vida de encontrar um bom numero de "remarkable men", no sentido espiritual da palavra. Desse ultimo encontro que tivemos, eu e o Idibal, sai com a sensacao nitida, com aquele sentimento bom e profundo no coracao confirmando que eu havia estado na presenca de um ser humano extraordinario e um dos brasileiros mais "remarkable" da nossa geracao.
Idibal, que Deus continue iluminando seus caminhos, te abencoando, fortalecendo e te fazendo muito, muito feliz.
Parabens por esta homenagem mundana que enobrece todos aqueles que souberam reconhecer o seu valor, um Ponto de Luz em Sao Paulo e na Humanidade.
ricardo silveira
Parabéns! Belo registro! Idibal Piveta merece. É muito importante homenagear aqueles que tiveram a coragem de lutar ao lado dos peseguidos pela Ditadura Civil-Militar que infelicitou este país por tanto tempo.
Paloma
Bravo!
Degas
Pelo muito que fez, inclusive em favor de amigos pessoais meus, mais que endereçar-lhe cumprimentos pelo merecido prêmio, reverencio-me em respeitosa gratidão.
Luiz Alberto Sanz
Homenagem mais do que justa! Idibal foi também meu advogado, de minha companheira, Maria Odila Rangel (absolvida) e de meu filho João Luiz, nascido no exílio, a quem negaram registro e passaporte. Idibal é incansável.
Francisco Boni
inspirador.
Flavio Lima
Palmas e mais palmas!
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francisco.latorre
lutador. e artista.
aplausos. mais aplausos.
..
Conceição Lemes
Jairo, uma correção: aquele advogado não fazia parte do escritório. Obrigada. Abs
Jairo_Beraldo
Ainda bem, Conceição! Ainda bem!
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