A homenagem de Sandra a Rodrigo Bossi, delegado que desmascarou as farsas do grupo de Aécio: Não seria justo uma despedida em silêncio
Tempo de leitura: 7 minpor Conceição Lemes
O ano de 2020 começou mal.
Rodrigo Bossi de Pinho, ex-delegado da Polícia Civil de Minas Gerais, encantou-se, como diria Guimarães Rosa.
Um câncer de esôfago, agressivo e com metástases, diagnosticado em fevereiro de 2019, levou-o no primeiro dia de janeiro.
Ele tinha apenas 51 anos.
À frente do Departamento de Fraudes, o delegado Bossi e equipe (ele a valorizava muito) conduziram as investigações que desmascararam uma farsa de mais de uma década envolvendo a turma do tucano Aécio Neves (ex-governador, ex-senador, atualmente deputado federal).
Eles demonstraram tanto a inocência do jornalista Marco Aurélio Carone, editor do NovoJornal, quanto do ex-lobista Nílton Monteiro.
Eles tinham plena convicção de que Carone e Nilton foram vítimas de uma organização criminosa que operou em Minas Gerais para perseguição política.
Carone ficou preso preventivamente de 20 de janeiro a 4 de novembro de 2014.
Nilton, de maio de 2013 a 4 novembro de 2014.
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Em 14 de junho de 2018, voltou a ser encarcerado devido à condenação em segunda instância. Foi solto em 20 de dezembro do mesmo ano.
Meu primeiro contato com o doutor Rodrigo Bossi foi em 20 de março de 2018, via whatsapp.
Disse-lhe que gostaríamos de entrevistá-lo sobre as delações de Marcos Valério e Nilton Monteiro (ele começava a tocá-las) e principalmente a respeito das megapressões que estava enfrentando.
Pudera. Estava lidando com todo o esquema de corrupção montado pelo grupo político de Aécio, com ramificações na Polícia Civil, Ministério Público Estadual e Poder Judiciário.
Na sequência, trocamos estas mensagens:
— Gostaria muito de dar a entrevista, mas estão boicotando. Toda entrevista tem que ter autorização da Ascom [Assessoria de Comunicação]. Não estão liberando.
— Boicotando, como?
— Não estão me deixando falar. Têm o rabo preso. E, ainda por cima, estão conchavando para as eleições.
— Eles negam a entrevista e mandam eu dar a desculpa de que estou indisposto, tive um problema na família etc.
O delegado Rodrigo Bossi mexeu talvez no maior vespeiro do sistema político-judicial-policial mineiro, até então intocado.
Tanto que, àquela altura, já estava sendo perseguido dentro da instituição, atacado pela mídia local e por deputados suspeitos de corrupção. Até ameaçado de morte pelo delegado Márcio Nabak, ele foi.
Mesmo diante de todo esse massacre, esferas maiores do governo Fernando Pimentel (PT) não liberavam o delegado para dar entrevista e colocar as coisas em pratos limpos.
Tampouco o defendiam.
Também não se moviam para conseguir direito de resposta às calúnias recebidas por ele.
— Minha esposa está muito puta com tudo o que está acontecendo e vem escrevendo no Facebook — disse-me.
Na época, Sandra Fagundes Fernandino, é o nome da esposa, indignada com o ataque recebido pelo marido via O Estado de Minas, reagiu com um texto contundente em seu perfil do Facebook:
Depois da morte chocante em que tentaram calar a Marielle Franco, hoje a bala foi disparada para calar meu marido, Rodrigo Bossi de Pinho, delegado chefe do Departamento de Fraudes da Polícia Civil de MG. Investigando fraudes cometidas nos processos que invalidaram a famosa “Lista de Furnas”, Rodrigo vem sendo perseguido por muitos, inclusive por membros e representantes da própria Polícia Civil, que direta ou indiretamente poderão ser afetados pelas suas investigações.
Em casa, já estamos acostumados com boatos e informações inverídicas que correm nos bastidores da Polícia.
Entretanto, o que me choca ainda mais, é ver o jornal Estado de Minas, se prestar a este tipo de perseguição baixa, sem fundamento, ouvindo um delegado que presidiu o inquérito no passado e que, provavelmente, está se sentindo ameaçado. E a reportagem vem bem no momento em que Marcos Valério assina a sua delação com o Dep. de Fraudes, garantindo ter provas que comprovam fatos da investigação.
É chocante como parte da nossa imprensa ainda se presta ao papel infame de garantir o poder dos poderosos a qualquer custo e de desprezar a sua função primordial de informar a população. A foto [de Rodrigo com Nilton] foi tirada por um policial da Fraudes, que ao ser flagrado pelo próprio Rodrigo foi questionado, em tom de brincadeira, se ele iria vender a foto ao Márcio Nabak. E provavelmente foi o que aconteceu … mas Rodrigo não se importou em requisitar a foto, pois não tem relação pessoal nenhuma com o delatante da foto e nada tem a esconder.
Mas a grande ironia da reportagem ficou para a sua última linha … em que menciona que o delegado Rodrigo não se pronunciou … A VERDADE É que ele nunca foi procurado pelo Estado de Minas para se defender. Se o Estado de Minas fosse um jornal sério, teria trocado esta última informação por INFORME PUBLICITÁRIO.
Mesmo sabendo que a provável resposta seria não, consultei as instituições.
Solicitei a entrevista à assessoria de imprensa da Secretaria de Defesa Social de Minas Gerais.
Frisei que o doutor Rodrigo havia concordado, mas que me alertou que era necessário antes a autorização da Ascom.
Disse também que ninguém da imprensa em Minas estava conseguindo entrevistar o delegado e perguntei: Existe restrição da própria instituição?
A assessoria de imprensa da Secretaria de Defesa Social enviou a demanda do Viomundo para a Ascom da Polícia Civil.
A resposta foi não, é claro.
Isso aconteceu pelo menos umas três vezes.
Infelizmente, além de alvo dos ataques do pesado esquema de Aécio Neves, doutor Rodrigo foi vítima do governo Pimentel, que sequer lhe deu o apoio prometido para levar adiante as investigações.
Diante de tudo isso, fiz-lhe a pergunta óbvia: Por quê?
Rápido, respondeu: Conceição, o Governo Aécio não acabou!
Rodrigo Bossi sempre teve o apoio incondicional de sua amada Dinha (é como ele chamava Sandra).
Era só elogios à sua aguerrida e bela mulher, queridíssima companheira de vida.
Certa vez falando sobre toda a força que Dinha lhe dava, ele deixou escapar: “Nós nos amamos loucamente”.
Leiam, abaixo, a bela homenagem de Sandra e entendam por quê.
Sandra: Tudo o que Rodrigo fazia tinha muita intensidade. E talento, um homem de muitos talentos. Tocava qualquer instrumento musical, cozinhava como um chef, surfava, jogava tênis, resolvia qualquer problema de informática ou mecânica … era só algo lhe interessar que ele executava com maestria. Fotos: arquivo pessoal
Belo Horizonte, 02 de janeiro de 2020.
Despedida do Rodrigo Bossi
Não seria justo nos despedirmos do Rodrigo Bossi de Pinho em silêncio. Um homem de apenas 51 anos que teve uma vida tão intensa e admirável.
Um adolescente rebelde, que abandonou a escola. Virou bailarino, aprendeu a tocar guitarra, foi punk.
Aos 21 anos decidiu mudar de vida, se casou pela primeira vez e foi viver nos EUA.
Trabalhou na limpeza de supermercados até se alistar na Força Aérea dos EUA. Serviu por 2 anos, incluindo uma temporada numa base da Arábia Saudita durante a Guerra do Golfo.
Com o fim do casamento, a solidão o fez retornar ao Brasil. Voltou com duas medalhas de honra ao mérito.
Recomeçou com uma nova namorada, fez um lindo filho chamado Pedro. Trabalhou como professor de inglês e vendeu filtros de água para se sustentar. Com o fim do casamento, ingressou na Faculdade de Direito.
Foi aí que nos encontramos, ele com 29 anos e uma bela bagagem de vida, eu com 20, ainda virgem.
E apesar de tudo diferente, assim como na história de Eduardo e Mônica, nos apaixonamos e nos comprometemos com um amor que se mostraria maior do que tudo o que ainda havia de ser enfrentado.
Juntos nos formamos, ele se tornou advogado e eu arquiteta. Ele se tornou delegado, nos casamos, tivemos um outro lindo filho chamado Júlio. Trabalhamos, lutamos, nos divertimos, brigamos e fomos grandes companheiros por 22 anos.
E como definir o Rodrigo, o Bossi, em algumas palavras …. um homem de grande coragem, que nunca se acovardou diante das dificuldades.
Era tão inteligente, que as vezes era difícil seguir seu raciocínio.
Um homem de muitas opiniões, de muitas verdades e de poucas dúvidas. Um homem que não tinha medo de falar o que pensava e de exigir o que era direito.
Tinha sim defeitos e dificuldades, como qualquer pessoa, mas a intensidade e a ingenuidade do seu ser deixava tudo à mostra, suas frustrações e a sua inquietude. Não escondia nada de ninguém, mesmo que isso às vezes o prejudicasse.
Intenso …. alguém que recém o conhecera, me disse que ele era intenso.
Sim, esta era uma das suas principais características. Tudo o que ele fazia tinha muita intensidade.
E talento, um homem de muitos talentos: tocava qualquer instrumento musical, cozinhava como um chef, surfava, jogava tênis, resolvia qualquer problema de informática ou mecânica … era só algo lhe interessar que ele executava com maestria.
Assim também foi sua atuação na Polícia Civil. Sempre brigou pelo que acreditava.
Logo no início se chocou contra a corrupção interna, gritou aos quatro ventos que não aceitava dinheiro de advogado para soltar malandro e que também não aceitaria prisões arbitrárias da PM ou esquemas internos de extorsão.
Na divisão de homicídios resolveu cada caso como se fosse único, inteiramente dedicado ao cumprimento da justiça.
A divisão de Fraudes, entretanto, foi o seu grande desafio. Uma investigação que envolvia grandes nomes da política mineira num vergonhoso caso de corrupção no qual a própria polícia civil foi protagonista. E como sempre, ele se entregou de corpo e alma.
E por ser assim, ingenuamente honesto, sofreu com sindicâncias, com denúncias caluniosas na corregedoria e com uma campanha de difamação comandada por deputados estaduais.
Apesar de eu ficar apavorada com cada um destes golpes, ele sempre se mantinha determinado a manter sua postura e seu trabalho.
Neste último ano, com o diagnóstico de um câncer agressivo e em estágio avançado, pudemos refletir e conversar sobre a sua vida.
Ele desejava que a sua investigação não fosse engavetada e que em algum momento a verdade pudesse vir a tona e os culpados devidamente julgados.
Ficou uma certa mágoa da Polícia Civil, pela falta de apoio institucional e pela conduta de colocar panos quentes na corrupção interna. Também se questionou algumas vezes se valeu a pena desistir da carreira na Força Aérea Americana.
E foi neste momento que o lembrei que a razão do seu retorno ao Brasil havia sido a solidão de ser um imigrante e que a sua maior conquista ao voltar foi, sem dúvida, as muitas amizades e a família que ele construiu.
Não conheço ninguém que tenha tantos amigos fiéis e que seja tão querido quanto o nosso amado Rodrigo Bossi de Pinho.
Que ele descanse em paz e que saiba que viverá para sempre em nossos corações.
Sandra Fagundes Fernandino
Comentários
a.ali
e se vão os éticos, os que acreditam, os que tem caráter…como já disse deve de ter um mundo paralelo em algum canto do universo e para lá el@s são pinçados …
que haja paz e luz em sua caminhada, rodrigo. coragem e entendimento a sua familia.
Elias Grifo Rezende
– Descanse em paz e na certeza que deixou um grande legado.De homens assim que o Brasil precisa.Que Deus o tenha em bom lugar.
Ednei José Dutra de Freitas
AÉCIO NEVES, O DESCENDENTE PODRE DE TANCREDO NEVES, VERGONHA DE MINAS GERAIS, EM PARCERIA COM OS CRIMINOSOS, O GOVERNADOR FERNANDO PIMENTEL, DO PT, E A OMISSÃO DA NOTÍCIA PELO JORNAL ESTADO DE MINAS.
Sou mineiro, embora resida no Rio de Janeiro, mas nunca deixei de me preocupar com meu estado natal, onde reside toda a minha família. Publiquei esta matéria no blog tribunadainternet.com.br
Ultra-Resumo do artigo:
Rodrigo Bossi, ex-delegado da Polícia Civil de Minas Gerais, “encantou-se”, como diria Noel Rosa.
Um câncer de esôfago , agressivo e com metástases, diagnosticado em fevereiro de 2019, levou-o no primeiro dia de janeiro. Ele tinha apenas 51 anos.
À frente do Departamento de Fraudes, o delegado Bossi e equipe conduziram as investigações que desmascararam uma farsa de mais de uma década envolvendo a turma do tucano Aécio Neves (ex-governador, ex-senador e atualmente deputado federal).
Por isso Rodrigo Bossi de Pinho foi perseguido anos pela gang de Aécio e pelo criminoso Governador Fernando Pimentel , do PT, e os delegados parceiros de Bossi, em vez serem apoiados pelos seus pares e pelo governador de Minas Gerais, mediante as acusações com provas que colheram, colocaram os delegados que investigaram Aécio na prisão , e com a conivência de omissão de notícia do jornal Estado de Minas.
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