Para Tarso Genro, governos devem baratear as tarifas
Segunda, 17 de junho de 2013
do Valor, via site da Unisinos, sugestão de Antônio David
Um dos principais dirigentes nacionais do PT, o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, entende que a presidente Dilma Rousseff, também do PT, e os governos estaduais são responsáveis por “apontar soluções” para os protestos contra as tarifas de ônibus que vêm sacudindo as principais capitais do país nos últimos dias. A saída, afirma, é baratear e aumentar a qualidade dos serviços de transporte coletivo, o que “não poderá ser feito sem apoio direto do governo federal, com vultosos recursos para as prefeituras e também para os Estados”.
A reportagem é de Sérgio Ruck Bueno e publicada pelo jornal Valor, 17-06-2013.
Em entrevista, Genro afirma que as manifestações têm grande apoio popular e não podem ser desautorizadas nem descredenciadas pelas “violências” cometidas por uma minoria. Em Porto Alegre, onde 23 pessoas foram detidas por vandalismo no protesto de quinta-feira, a orientação dada à Brigada Militar foi de não reprimir os manifestantes pacíficos, mas buscar a responsabilização dos depredadores. Para ele, a repressão é a pior maneira de enfrentar as manifestações.
Na opinião do governador, os partidos políticos não dirigem os movimentos contra as tarifas porque estão em “franca superação” no que diz respeito às questões relacionadas à juventude. Ele diz que as manifestações que ocorrem no Brasil e em países como a Turquia são essencialmente reformistas e buscam a inclusão das pessoas na sociedade consumista, que “ao mesmo tempo estimula e nega” o acesso para a maior parte da população.
Eis a entrevista.
Em sua opinião, quais as origens das recentes manifestações contra as tarifas de ônibus nas principais capitais do país?
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As origens me parecem evidentes. São os novos protagonistas políticos da juventude, vinculados a redes, aos serviços, ao subemprego, estudantes libertários, trabalhadores do comércio, jovens autônomos e também “semimarginais”. Eles buscam melhor qualidade de vida material, de lazer e de fruição cultural, que a nova sociedade consumista ao mesmo tempo estimula e nega, permanecendo o contraste entre a opulência dos ricos e da classe média alta, de um lado, e o resto do povo, de outra. Creio que o preço e a situação do transporte coletivo nas regiões metropolitanas unifica tudo isso numa luta imediata, convincente e de grande apoio popular.
Como os governos estaduais e o governo federal devem agir para resolver o problema?
Os governos devem apontar soluções, barateando as tarifas e dando qualidade ao sistema [de transporte coletivo]. E isso não poderá ser feito sem apoio direto do governo federal, com vultosos recursos para as prefeituras e também para que os Estados participem das soluções. A qualidade de vida nas metrópoles já está na agenda do governo federal. Creio que ele deve, agora, tratar desta questão imediata das tarifas e da qualidade do sistema de ônibus.
Quem são os responsáveis pela violência registrada nas últimas manifestações? Os próprios manifestantes ou as polícias militares?
Nestes movimentos, em qualquer época, sempre entram pessoas que acham que estão fazendo uma revolução ou que são simplesmente violentas e dirigem sua revolta mais como vingança do que como estratégia política de vitória no contexto do que está realmente em jogo. Estes, na verdade, não se importam em melhorar a vida concreta do povo, pois acham que o capitalismo não tem condições de fazer isso. Mas estes são uma minoria e o movimento não pode ser desautorizado nem descredenciado por isso.
Mas os ditos “excessos” das polícias têm sido apontados como causas da violência. A repressão também estimula os protestos?
Pode tanto estimular como acabar com eles, se a população achar que a repressão foi justa. Esta é a pior maneira de terminar com as manifestações. Aqui no Rio Grande do Sul a ordem que eu dei para a Brigada Militar foi a seguinte: só ataquem para se defender, não reprimam nenhuma mobilização social, mesmo que sejam provocados por estes indivíduos, que na verdade querem fazer uma vítima, de preferência que não seja do seu grupo.
Entre terminar com uma depredação de algum bem e bater em algum inocente, que simplesmente está protestando pelos seus direitos, não batam em ninguém e fixem as responsabilidades pela depredação através de filmagens, para que depois eles respondam a inquérito. Aqui, o próprio movimento social ficou indignado com as depredações e violências cometidas por uma minoria.
E como o senhor avalia a atuação da polícia de São Paulo na quinta-feira?
Não quero avaliar o que foi feito e o que fará o governador [Geraldo] Alckmin [PSDB], até porque ele não é do meu partido e qualquer contribuição minha certamente seria vista por ele e sua equipe como uma intromissão. Apenas digo o que penso para o meu Estado: o fato de provocadores e violentos interferirem não torna o movimento ilegítimo. Se os próprios jovens não tomarem providências paras excluí-los, pagarão politicamente por isso e, ao longo do processo, o movimento será esvaziado e derrotado. E assim a nossa democracia perderá mais uma oportunidade para evoluir, porque as ruas não foram ouvidas e também não souberam se fazer ouvir.
Qual o papel dos partidos de esquerda, incluindo o PT, na organização desses protestos?
Não há nenhum partido dirigindo estes movimentos, que são organizados e estruturados nas redes sociais. Se partidos de esquerda estiverem participando e tentando dar uma direção ao movimento é positivo, pois aí será mais fácil negociar para achar soluções. Mas creio que nenhum partido dirige este processo. Até porque os partidos, com suas formas de organização fundadas em programas exclusivamente de classes, não compreendem, na sua maior parte, que a própria luta de classes, hoje, se realiza de maneiras completamente diversas da época moderna. Os partidos, em geral, estão em franca superação, tanto nos moldes organizativos tradicionais, como nas questões programáticas que dizem respeito à juventude, não somente da nova classe média, quanto das demais camadas jovens das novas classes trabalhadoras, dos setores mais modernos e qualificados tecnologicamente.
Mas os partidos podem agir para reverter essa superação?
Os partidos podem e devem agir, não somente a partir do Estado e dos governos, mas também a partir da reorganização das suas formas de luta e da sua renovação programática. E, sobretudo, através da reestruturação – para quem é de esquerda – da sua utopia, que na minha opinião deve combinar os princípios socialistas que foram forjados por dentro das promessas do iluminismo com a democratização do Estado na produção de políticas públicas. Também devem combinar a democracia representativa com a participação direta da sociedade.
O que há de semelhante entre os protestos contra as tarifas de ônibus no Brasil e movimentos como o “Occupy Wall Street” e as manifestações na Turquia?
Estes movimentos são movimentos de inclusão das pessoas na sociedade de classes. Embora alguns usem uma linguagem revolucionária contra o capitalismo, as suas propostas são essencialmente reformistas: taxa Tobin [uma taxa sobre as movimentações financeiras globais proposta pelo economista americano James Tobin], fim da especulação, transporte de qualidade, sustentabilidade ambiental, organização urbana, defesa da paz, manutenção dos direitos sociais-democratas, culturais e raciais.
O que efetivamente preocupa é que a integração econômica do mundo, monitorada e induzida pelo capital financeiro especulativo, pode não ter flexibilidade para responder a estas reformas. Aí teremos um longo processo de lutas e anomias na Europa e na América Latina. Uma espécie de 1968 pós-moderno, capaz de proporcionar um conjunto de lutas anticapitalistas anárquicas que desembocarão numa saída autoritária ou ditatorial, de esquerda ou de direita, pois o mundo terá que ser rearrumado pela força, embora a maioria – e eu me incluo nela – não aceite nem queira isso.
É preciso que as forças democráticas e de esquerda, em geral, pensem que, com estes movimentos, estamos perante uma oportunidade de revigoramento do projeto democrático moderno. É um problema e uma oportunidade, que só será benéfica para a democracia se a vida nas grandes concentrações metropolitanas – geradas pelo desenvolvimento capitalista anárquico e predatório – melhorar muito para todos e não somente para 10% da população. Uma retórica revolucionária não induz à revolução, mas pode ajudar a reformar radicalmente a democracia.
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Comentários
Vlad
Perdeu o bonde, mustache.
Mesmo o oportunismo, nos dias de hoje, tem de ser muito rápido.
O movimento cresceu. Não é mais só transporte. É corrupção, ineficiência e falta de respeito, etc….por enquanto.
Urbano
O Tarso Genro bem que poderia falar sobre a atuação do psol, juntamente com os punkers, nesse oba-oba… Sorte do PT ter se livrado deles, inclusive do decano. Quanta decrepitude…
Leonardo
Ufa! Até que enfim uma análise mais clara sobre os fatos…
Hildermes José Medeiros
Na realidade, a imensa maioria dos trabalhadores não paga passagem. Pagam nas roletas com o que recebem dos patrões em dinheiro, vales, cartões (pagamento antecipado) etc. para se utilizar do transporte de ida e vinda para trabalhar, inclusive os trabalhadores domésticos. Os patrões podem descontar do trabalhador 6% do valor da passagem. Há também subsídios dos estados e municípios aos aposentados, estudantes, deficientes, policiais e bombeiros. E é desse jeito, porque de outra feita não seria possível ter o trabalhador à disposição, por uma única e exclusiva razão: uma passagem de R$ 3,20 significa 20% do líquido recebido por mês pelo trabalhador de salário mínimo. É humilhante. Quando está desempregado é o maior sufoco para conseguir o da passagem. Na prática, a passagem, para aqueles de carteira assinada já é R$ 0,20. Houvesse uma legislação adequada, os valores pagos pelos patrões ao trabalhador poderiam via fiscal ser pagos diretamente aos governos que pagariam as concessionárias. Cessaria essa intermediação realizada pelo trabalhador, que passaria a se efetivar através dos governos. Dessa forma seria possível a passagem na roleta ser de apenas R$ 0,20. O problema é como tirar a montanha de dinheiro que hoje gira nas mãos das concessionárias, grandes financiadoras de campanhas políticas. Haverá choro e ranger de dentes.Há também a ser visto o problema dos trabalhadores autônomos e prestadores de serviço. É por aí, ou as ruas continuarão rugindo, cujo ruído aumentará na medida em que as eleições se aproximem.Embora o problema seja estadual e municipal, repercutirá muito mais no plano federal. A mídia já se encarregou desse tarefa e a repercussão é forte no país e até já está sendo internacionalizada.
Marcelo de Matos
Parabéns, você aprofundou a discussão. É assim que se faz: temos de compreender o problema e buscar soluções. Sou ignorante em matéria de transporte público; não só nisso. Minha faxineira costuma dizer: são cem reais e mais duas “conduça”, seu Marcelo. Está aí: os domésticos cobram a “conduça” à parte, ou a incluem no preço. Outra coisa que minha faxineira sempre diz e me deixa encucado: Só as mulheres trabalham, seu Marcelo. Os homens ficam em casa cuidando das crianças. Eu tomo o ônibus para vir para cá e só tem mulher.
Antonio Lopes
Tarso e todos os leitores: a Dilma fez a parte dela abaixou 10% os impostos federais sobre as passagens dos transportes coletivos urbanos . Em SP capital o ônibus custava 3 reais com a desoneração de 10% iria para 2,7 reais e o Haddad deveria ter deixado a passagem em 3 reais configurando um aumento superior a 10% sem alterar o valor final. Mas o Haddad cresceu o zóio no aumento e levou na cabeça, é bom para ele aprender que deveria ter congelado a tarifa e colaborado com a Dilma para diminuir a inflação.
Alemao
E o dinheiro sai da onde? Da educação? Do saneamento básico? Da infraestrutura? Da saúde? O país tem problemas muito maiores a vencer, mas é claro que se o interesse do governo não fosse único e exclusivamente continuar no poder sobraria mais grana para se investir no que o país realmente precisa, mas que? Vamos perdoar 1 bilhão em dívidas na África para que as empreiteras doadoras de campanhas continuem mantendo o Lula na backstage…
renato
Um vizinho meu me devia um dinheiro!
Não podia pagar, mas ele tinha um grande terreno ao lado, onde plantava para seu custeio.
Conversei com ele e arrendei suas terras, plantei milho, e em pouco tempo estava colhido e vendido,pagfuei um pouco a ele e abati o resto da divida.
Com a divida paga, hoje eu e ele plantamos, colhemos e vivemos bem.Uma renda extra.
Mas agora tem um Chines, querendo comprar o terreno, bem como um americano e um alemão. Acho que vou perder minha renda extra, bem como vou ter que comprar milho para dar as minhas galinhas que comprei com a venda do milho.
Fora o cavalo que vou ter que vender para os chineses, já que não tenho onde colocar.
Acabou o extra…Fiquei sabendo que um tal d Alemão que ficou fazendo a cabeça do meu vizinho…..Cabra invejoso.
rodrigo
Muito boa! parabéns pela visão e humor rs
Alemao
Sempre ao final do ano eu coloco uma meia na árvore de natal e no dia seguinte tem sempre um presente…
Marcelo de Matos
Tarso Genro diz que os partidos não dirigem os movimentos contra as tarifas. Há direção, sim. Por que partidos como PSOL, PSTU e PCO levam suas bandeiras nas manifestações? É idílica a ideia de que as manifestações que ocorrem aqui ou na Turquia são “espontâneas”, coisa de jovem. O fator direção é essencial. Há tempos assistimos a isso. No governo Franco Montoro, há 30 anos, ainda no regime militar com João Figueiredo presidente, tivemos manifestações dessa natureza. Os populares pulavam as catracas para não pagar o metrô. Nas filas de ônibus havia empurra-empurra e os passageiros entravam sem pagar, inclusive pelas janelas. A PM chegava e sentava o cassetete. Foi assim que o movimento arrefeceu, inclusive tiveram fim os saques a supermercados. A época era de crise e desemprego em massa, diferente do que ocorre agora. Se no governo Montoro houve repressão sistemática, agora ela é pontual. As manifestações podem durar mais tempo. Há projetos políticos em jogo e isso dará uma margem de manobra maior para os manifestantes.
Leo V
Um pouco de lógica:
o que tem a ver levantar uma bandeira ano meio da manifestação com dirigir uma manifestação?
Que as manifestações não são fruto de espontaneísmo, mas de militância, isso eu concordo.
O que o Tarso percebe, e o que o corre de fato, de maneira geral, é que não são os partidos que estão atraindo essa juventude.. essa militância que consegue atrair a juventude , grosso modo, não vem dos partidos.
João Vargas
Quando o PT ganhou pela primeira primeira vez a prefeitura de Porto Alegre com Olívio Dutra em 1988, o seu primeiro ato como prefeito foi intervir nas empresas de ônibus. O transporte coletivo em POA pode ser dividido em antes de Olívio e depois de Olívio. Fez uma transformação radical obrigando as empresas a modernizarem as frotas e dar um tatamento digno aos usuários e trabalhadores do setor. Hoje assisto ao Haddad defender as empresas de ônibus de São Paulo em detrimento dos usuários e sinto uma grande nostalgia do velho PT.
Julio Silveira
João você tocou num ponto ne nevrálgico, com o qual concordo contigo.
Concordo com tudo isso que você coloca em sua citação sobre o Olívio Dutra, esse petista diferenciado, um sujeito autentico, que me levou a ter afeição por essa sigla no passado. Mas aonde ele está? respondo, no ostracismo dentro do partido, usam-no hoje mais como um estandarte, uma lembrança, um troféu. Mas de fato ele sofreu foi um expurgo a brasileira. Ele não é a face que o PT quer mostrar o PT quer ser palatável para seus adversários do passado e esses preferem o Tarso, que identifico como um falastrão, personalista e oportunista. Esse não me engana, tenho dito é um Burguês metido a socialista.
augusto2
o Tarso, voce esta falando de geraldinho alkmin? ou so da ala majoritaria do Pt que não é a sua?
as tarifas são interconexas e o metro+cptm dele transportam de 3 a 4 milhoes todo o dia.
Willian
Conselheiro Acácio.
Marcelo de Matos
As matérias postadas aqui e alhures costumam ficar no campo das proposições inconclusas. Há um confronto de ideologias em que nenhuma ideia aflora. O jornalista Bob Fernandes se diz favorável aos vaiadores porque o estado está investindo em estádios. Então, o que tem de ser feito para que o estado não precise mais fazer esses investimentos? Mudar a estrutura de nossos clubes sociais transformando-os em empresa? Isso se tornou tabu depois que a Lei Pelé foi escamoteada no Congresso pela bancada da bola, diga-se de passagem, com apoio do PT. E o passe livre, agora não o dos jogadores, mas, o dos usuários de transporte? Os estados federados têm condições de bancar? Essa questão tem de ser decidida pelo Congresso, não pelo “governo”. O sistema constitucional brasileiro estriba-se no protagonismo da iniciativa privada. Em Cuba foi implantado o passe livre, mas, não sei se o estado oferece transporte de boa qualidade. O estado tem carências em vários setores, como saúde, educação, segurança. Daria para reservar boa parte das verbas para o transporte público?
Leo V
Tarso Genro é um dos poucos políticos com tato, e antenado nas coisas que acontecem.
Sem dúvida ele entende muito melhor o que está acontecendo em relação á grande maioria dos jornalistas e políticos.
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