Resposta da Rede Sustentabilidade publicada no blog do Nassif:
Por Tasso Azevedo
Circula há alguns meses na internet um documento sem autor identificado que se propõe a identificar as origens da rede onde estaria inserida Marina Silva. A narrativa tenta ordenar e criar vínculos inexistentes entre vários fatos para explicar uma teoria da da conspiração que seria a origem da Rede Sustentabilidade.
Em essência o texto apresenta as seguintes teses:
* O manejo florestal sustentável seria uma tentativa de depredar de forma dissimulada os recursos florestais da Amazônia e as concessões florestais representam a entrega das florestas para os depredadores em detrimento das comunidades locais.
* A defesa do promoção de valor econômico para floresta em pé e o pagamento por serviços ambientas como incentivo para sua conservação seriam parte de uma estratégia neoliberal de mercantilizar os recursos naturais.
* A promoção de uma economia verde onde forças de mercado proporcionam o uso sustentável dos recursos naturais seria uma ofensiva do capitalismo neoliberal na Amazônia.
* Instrumentos como o Cota de Reserva Legal seriam um golpe na reforma agrária porque grandes áreas de floresta não poderão ser desapropriadas como improdutivas.
* Promover alianças de empresários, trabalhadores, ambientalistas e movimentos sociais não seria nada mais do que cooptação destes últimos pelo poder econômico.
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O texto me cita com o seguinte enredo: tendo fundado e dirigido o Imaflora, instituição que trabalha com certificação de manejo florestal, teria ido para o governo para defender os interesses escusos do setor madeireiro articulando a lei que criou a figura das concessões florestais. Não satisfeito teria então saido do governo para montar um fundo para investir nestas mesmas empresas fora do governo.
Como sou citado nominalmente no texto como um dos articuladores destas maldades achei de deveria expor, de forma transparente a minha visão sobre estes pontos.
Entendo que as florestas prestam enormes serviços à população global (regulação hídrica e climática, proteção da biodiversidade, proteção do solo entre outros) e aqueles que ajudam a mantê-las também prestam um serviço a sociedade.
Eu acredito que conservação da floresta e o bem estar das populações que dependem diretamente dela se dará mediante quatro grandes estratégias
(i) definir e proteger unidades de conservação das diversas categorias; (ii) garantir o reconhecimento, demarcação e efetivo suporte para terras indígenas, território quilombolas, reservas extrativistas e demais formas de reconhecimento dos direitos das populações tradicionais; (iii) promoção da governança sobre a gestão do território, incluindo porém não se limitando às ações de monitoramento, controle e fiscalição; e (iv) incentivo e promoção da produção rural sustentável (como o manejo florestal) e as cadeias de valor associadas através de instrumentos de pesquisa e desenvolvimento, treinamento e capacitação, investimento de risco e financiamento, regulação tributária e fiscal e pagamento por serviços ambientais.
Nada disso é dogma. Estou pronto a ser convencido de que estas não são boas estratégias ou mesmo de que conservar a floresta não constitui um serviço para sociedade. Mas tenho forjado esta convicção com base nos esforços que me envolvi nas ultimas duas décadas.
Através do FSC, uma organização cujo DNA esta na co-criação envolvendo setores empresarial, ambiental e os movimentos sociais foram criados os padrões para a certificação florestal, que avaliam a aplicação das práticas de manejo ambientalmente adequadas, socialmente justas e conomicamente viáveis.
Com base nestes padrões implementamos os primeiros modelos de certificação florestal, envolvendo projetos comunitários e empresariais, todos conduzidos com transparência, repetidos processo de consulta pública e total transparência dos resultados, pré-condicionantes e condicionantes. Mais de 3 milhões de hectares foram certificados em florestas naturais no Brasil desde 1997.
Em 2003 tive oportunidade de participar mais diretamente do planejamento e implementação de políticas públicas no setor florestal participando do governo do Lula na Diretoria do Programa Nacional de Florestas. Já no primeiro ano de governo juntamente com vários colegas (Salo, Marcelo, Carlos, Flavio, Bazileu, Hummel, Juliana… só para citar alguns) montamos uma operação que em menos de um ano praticamente acabou com a máfia do mogno no Brasil, apreendendo milhares de m³ de madeira e destinando os produtos da apreensão para constituir o Fundo Dema (homenagem a líder comunitário do Pará assassinado em conflito contra madeireiros ilegais) gerido pelas organizações sociais da região onde o mogno era extraido ilegalmente. Desde 2004 centenas de projetos das comunidades locais foram apoiados com recursos do Fundo Dema.
Ainda durante 2003 identificamos que quase a totalidade da exploração florestal na Amazônia vinha acontecendo de forma irregular em terras públicas, em muitos casos inclusive com planos de manejo aprovados, mas que eram inválidos. Todos os planos de manejo em florestas públicas foram suspensos ou cancelados e ficou claro a urgência de se definir um marco regulatório para a gestão das floretas públicas que representam pelo menos 75% das florestas na Amazônia.
Em 2004, novamente promovemos o encontro de empresários, movimentos sociais, trabalhadores, academia e ONGs para formar a CONAFLOR – Comissão Nacional de Florestas com o objetivo de propor um novomarco regulatório para a gestão das florestas públicas de forma a garantir que elas permanecessem florestas e continuassem publicas.
A CONAFLOR não só foi o local onde se gestou – através de amplo processo de consulta pública — o Projeto de Lei como os representantes dos diversos setores foram fundamentais para pressionar pela aprovação da lei no Congresso Nacional.
Esta lei entre outras coisas criou um procedimento inédito de destinação das florestas públicas para uso sustentável, com garantia de prevalência absoluta dos usos pelas comunidades locais, como criou o Serviço Florestal, o Cadastro Nacional de Florestas Públicas, o processo de concessão florestal e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal.
Este processo de ruptura do círculo vicioso da exploração ilegal do mogno e revisão da gestão de floretas publicas foi uma das inspirações para a criação em 2004 do Plano de Prevenção de Combate ao Desmatamento na Amazônia (PPCDAM) que, envolvendo 13 ministérios, sob coordenação da Casa Civil e do MMA, gerou uma estratégia em três eixos
(i) regularização e ordenamento fundiário; (ii) monitoramento e controle e (iii) suporte a atividades produtivas sustentáveis.
Juntamente com dezenas de pessoas participeindeste esforço que resultou na apreensão de mais de 1,4 milhão de m3 de madeira ilegal, a prisão de mais 700 contraventores, o cancelamento de mais de 60 mil títulos de terra grilados, a criação de um sistema de alerta mensal do desmatamento, a criação de quase 50 milhões de hectares de Unidades de Conservação – inclusive triplicando a área de Reservas Extrativistas — e dezenas de outras ações que permitiram ao longo dos últimos 8 anos reduzir o desmatamento de 27 mil para menos de 5 mil km2. Ainda é muito, precisa cair muito mais, mas sem dúvida é um tremendo avanço.
A queda do desmatamento levou à maior redução de emissões de gases de efeito estufa produzida por qualquer país na última década e isso permitiu criarmos um mecanismo de captação de recursos internacinais para ajudar a multiplicar ações de controle do desmatamento e promoção da conservação e uso sustentável da Amazônia. Assim foi montado o Fundo Amazônia, que gerido pelo BNDES é o maior fundo de conservação da floreta do planeta e já apoia mais de 40 projetos de larga escala envolvendo instituições de pesquisa, comunidades locais, ongs, movimentos sociais, setor empresarial e poder público.
O aporte feito por doadores ao Fundo Amazônia não implicou em créditos de carbono de qualquer natureza por acreditarmos que esta é uma contribuição nossa ao planeta e ao clima.
Na Caatinga, o Serviço Florestal, através do Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal, investiu fortemente na promoção do manejo florestal como alternativa econômica sustentável para os assentamentos e hoje milhares de famílias em mais de uma centena de assentamentos tem no manejo da caatinga uma das suas principais fontes de renda e sustentabilidade. Os assentamentos com manejo são os que mais conservam o bioma da caatinga.
Nos últimos anos, atuando na sociedade, lutamos fortemente para manutenção das conquistas do Código Florestal mas fomos derrotados no Congresso e prevaleceu uma lei que reduz as áreas protegidas, amplia as possiblidades de desmatamento e reduz dramaticamente as áreas a serem recuperadas.
A Cota de Reserva Ambiental (CAR) – instrumento ja previsto no Código Florestal anterior com nome de Cota de Reserva Florestal – teve sua aplicação excessivamente ampliada (exemplo, pode aplicar em outro outro estado) e esta foi mais uma derrota. Um dos poucos avanços foi o reconhecimento em lei do Cadastro Ambiental Rural (CAR), instrumento criado em 2008 como parte das medidas do PPCDAM.
Poderia continuar listando as iniciativas e processos que justificam a minha crença nas quatro estratégias que menciono no início do texto.
Estou certo de que a restrição às práticas ilegais, antiéticas e depredatórias, associado a forte estimulo a uma economia em bases sustentáveis que valorize a floresta em pé e reconheça de forma objetiva aqueles que contribuem para manter e conservar os recursos naturais de que todos dependemos é o caminho para um mundo mais justo e sustentável.
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Comentários
Assalariado
Parei de ler aqui: “Circula há alguns meses na internet um documento sem autor identificado”
E Aqui ” narrativa tenta ordenar e criar vínculos inexistentes entre vários fatos para explicar uma teoria da da conspiração que seria a origem da Rede Sustentabilidade”
Um artigo ridículo desse no blog só mostra o quão desesperado estão.
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