PGR diz que Bolsonaro era o chefe do golpe; Moraes aponta ataques em série à democracia
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Denúncia do golpe: os argumentos da PGR para denunciar Bolsonaro e mais sete
O ministro Alexandre de Moraes, relator do processo no STF, apontou ataques em série à democracia. As defesas do ex-presidente e de seus aliados apresentaram os seus argumentos sobre o caso
Por Fernanda Vivas, Márcio Falcão, g1 e TV Globo — Brasília
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou, nesta terça-feira (25), a primeira sessão para analisar se deve ser recebida a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros 7 acusados de participação na tentativa de golpe de Estado em 2022.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) — órgão de cúpula do Ministério Público Federal que atua em casos criminais que tramitam no STF — é a autora da denúncia e apresentou suas considerações sobre o caso.
A sessão desta terça-feira no STF já contou com:
- O ministro Alexandre de Moraes, relator do processo no Supremo, que leu o documento que lista as condutas de Bolsonaro e dos demais acusados. O ministro afirmou que foram feitos ataques sucessivos e coordenados ao Estado Democrático de Direito;
- A argumentação do procurador-geral da República, Paulo Gonet;
- As defesas dos acusados e de Jair Bolsonaro, esta representada pelo advogado Celso Vilardi. Vilardi afirmou que “não se achou absolutamente nada” contra o ex-presidente.
Os argumentos de Paulo Gonet
A apresentação dos argumentos da Procuradoria, chamada de “sustentação oral”, foi feita pelo procurador-geral, Paulo Gonet, e durou 30 minutos. Durante a fala, ele:
- citou a conduta de Bolsonaro na disseminação de ataques às urnas;
- lembrou a reunião ministerial de julho de 2022, em que se falou de “uso da força”;
- citou as ocorrências após o segundo turno das eleições, como os acampamentos que pediam intervenção militar;
- relembrou que “a resistência dos comandantes militares lhes custou o recrudescimento de campanhas públicas de ódio”;
- citou o 8 de janeiro, o ataque às sedes dos Três Poderes;
- afirmou que “nem houve supressão de dados em detrimento das defesas nem, tampouco, pode-se invocar o ‘document dumping’ [uma tática de fornecer um grande volume de documentos sem a devida organização, dificultando a análise]”;
- disse que fatos citados pelo ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, estão confirmados por outros elementos de prova.
“A documentação encontrada nas ações policiais permite situar a data de 29 de julho de 2021 como aquela em que Jair Bolsonaro deu curso prático ao plano de insurreição”, afirmou Gonet.
“Nesse dia, [Bolsonaro] realizou transmissão ao vivo das dependências do Palácio do Planalto pela internet, em que retomou críticas já provadas insubsistentes ao sistema eletrônico de votação. A partir daí, os pronunciamentos públicos progrediram em agressividade aos poderes constituídos”, prosseguiu o procurador-geral.
Em outro momento, Paulo Gonet frisou: “A decisão dos generais, especialmente dos que comandavam Regiões, e do Comandante do Exército de se manterem no seu papel constitucional foi determinante para que o golpe, mesmo tentado, mesmo posto em curso, não prosperasse.”
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Gonet lê denúncia e diz que 29 de julho de 2021 marcou ‘curso prático’ de plano de golpe
O relatório da denúncia que havia sido apresentado por Gonet traz os seguintes argumentos para alguns dos crimes que implicam Bolsonaro e seus aliados. Veja abaixo:
- Golpe de Estado;
- Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; e
- Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União.
Veja também os detalhes do julgamento, que acontece entre esta terça e quarta-feira.
Golpe de Estado
No documento da denúncia, Gonet descreve que a “responsabilidade” pelos atos contra a ordem democrática são de “organização criminosa liderada por Jair Messias Bolsonaro”.
As ações seriam baseadas em um “projeto autoritário de poder”.
Essa atuação criminosa estaria “enraizada” na estrutura do Estado e com “forte influência de setores militares”.
O texto ainda menciona que tal organização teria “ordem hierárquica” e “divisão de tarefas” entre os seus integrantes.
Ainda segundo a procuradoria, a organização criminosa esteve em atividade entre julho de 2021 e janeiro de 2023.
“As práticas da organização caracterizaram-se por uma série de atos dolosos ordenada à abolição do Estado Democrático de Direito e à deposição do governo legitimamente eleito”, continua.
Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito
A procuradoria cita uma sequência de atos que buscaram romper a normalidade da sucessão do governo Bolsonaro. Por exemplo:
- a manipulação indevida das forças de segurança pública para interferir na escolha popular; e
- convocação do Alto Comando do Exército para obter apoio militar a decreto que formalizaria o golpe.
A investigação diz que a ruptura institucional foi complexa e exigiu um “caminho para o crime” elaborado e extenso.
Este caminho incluiu “narrativas contrárias às instituições democráticas, a promoção de instabilidade social e a instigação e cometimento de violência contra os poderes em vigor”.
“A organização criminosa seguiu todos os passos necessários para depor o governo legitimamente eleito”, diz a denúncia. Este objetivo não se concretizou, continua, por “resistência dos Comandantes do Exército e da Aeronáutica”.
Sobre o crime de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito, a PGR diz que a organização criminosa, liderada por Bolsonaro, minou “os poderes constitucionais diante da opinião pública” e incitou “a violência contra as suas estruturas”.
A procuradoria acrescenta que as instituições democráticas tornaram-se vulneráveis em “pronunciamentos públicos agressivos e ataques virtuais, proporcionados pela utilização indevida da estrutura de inteligência do Estado”, afirma a procuradoria.
Dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União
Sobre os crimes de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, com considerável prejuízo para a vítima e deterioração de patrimônio tombado, a PGR considerou que a organização criminosa “direcionou os movimentos populares” e “interferiu nos procedimentos de segurança necessários”.
‘A organização criminosa esbanjava acusações mirabolantes nas redes sociais’, diz Gonet
Rito do julgamento
Antes da fala de Gonet, o relator do processo, o ministro Alexandre de Moraes, leu seu relatório. Na ocasião, Moraes fez uma descrição detalhada do caso.
Na introdução da sua fala, o ministro afirmou:
“A natureza estável e permanente da organização criminosa é evidente em sua ação progressiva e coordenada, que se iniciou em julho de 2021 e se estendeu até janeiro de 2023. As práticas da organização caracterizaram-se por uma série de atos dolosos ordenadas à abolição do Estado Democrático de Direito e à deposição do governo legitimamente eleito.”
Depois de Gonet, os advogados dos acusados apresentaram os seus argumentos. Cada representante teve 15 minutos, em ordem a ser definida pelo presidente da Primeira Turma do STF, Cristiano Zanin.
Na sequência, o relator, Alexandre de Moraes, começa a votar sobre as chamadas questões preliminares – são questionamentos processuais levantados pela defesa, como competência do colegiado para julgamento, por exemplo.
Depois, os outros quatro ministros da Primeira Turma votam sobre as preliminares. Apresentam seus votos nesta ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, que preside o colegiado.
O relator, então, analisa o mérito da denúncia, ou seja, se manifesta diretamente sobre o pedido de abertura de ação penal.
E, finalmente, os demais ministros votam no mérito. Apresentam seus votos nesta ordem: Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.
Em resumo, o colegiado vai decidir se o caso deve prosseguir e se transformar em uma ação penal. Se isso ocorrer, os envolvidos serão réus e vão responder a um processo na Corte.

Paulo Gonet dividiu os 34 denunciados em grupos. O núcleo crucial da organização criminosa liderada, segundo a PGR, por Jair Bolsonaro — Foto: Jornal Nacional/ Reprodução
Denúncia
A denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e aliados por participação na tentativa de golpe de Estado em 2022 foi apresentada em fevereiro deste ano pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Com base em investigações realizadas pela Polícia Federal — reunidas em um relatório entregue no fim do ano passado —, a PGR apresentou ao Supremo cinco pedidos de abertura de ação penal.
Os 34 denunciados foram divididos pelas cinco acusações. Um dos documentos tem 12 nomes; outro tem 8 nomes. Um terceiro pedido tem 7 nomes. Os outros dois pedidos têm 6 e um nome, respectivamente.
Estará em análise pelo colegiado a denúncia que envolve o político do PL e outras 7 pessoas.
São elas:
- Jair Bolsonaro, ex-presidente;
- Alexandre Ramagem, ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
- Almir Garnier Santos; ex-comandante da Marinha do Brasil;
- Anderson Torres; ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal;
- General Augusto Heleno; ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência;
- Mauro Cid; ex-chefe da Ajudância de Ordens da Presidência;
- Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa; e
- Walter Souza Braga Netto, ex-ministro da Casa Civil.
Crimes
O órgão de cúpula do Ministério Público apontou que houve cinco crimes:
- abolição violenta do Estado Democrático de Direito: acontece quando alguém tenta “com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais”. A pena varia de 4 a 8 anos de prisão.
- golpe de Estado: fica configurado quando uma pessoa tenta “depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído”. A punição é aplicada por prisão, no período de 4 a 12 anos.
- organização criminosa: quando quatro ou mais pessoas se reúnem, de forma ordenada e com divisão de tarefas, para cometer crimes. Pena de 3 a 8 anos.
- dano qualificado: destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia, com violência e grave ameaça, contra o patrimônio da União, e com considerável prejuízo para a vítima. Pena de seis meses a três anos.
- deterioração de patrimônio tombado: destruir, inutilizar ou deteriorar bem especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial. Pena de um a três anos.
O que levou a PGR a denunciar
Na denúncia apresentada ao STF, o procurador-geral Paulo Gonet afirmou que o ex-presidente Bolsonaro liderou uma organização criminosa que praticou “atos lesivos” contra a ordem democrática e que estava baseada em um “projeto autoritário de poder”.
A acusação apontou que o ex-presidente, junto a Alexandre Ramagem, o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, o ex-comandante do Exército Paulo Sérgio Nogueira e o ex-ministro da Casa Civil Walter Souza Braga Netto formaram o “núcleo crucial da organização criminosa”.
Segundo a PGR, “deles partiram as principais decisões e ações de impacto social”, ou seja, a série de ações para tentar impedir a mudança de governo.
O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid também fazia parte desse núcleo – atuava como “porta-voz” de Bolsonaro e transmitia “orientações aos demais membros do grupo”.
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