Natália Bonavides: ‘Sou do PT e votei contra o pacote fiscal do governo’

Tempo de leitura: 5 min
Foto: Reprodução

‘Sou do PT e votei contra o pacote fiscal do governo’

Natália Bonavides, na Folha de S. Paulo

Sou a deputada federal que deu um dos três votos petistas contra a PEC que integra o pacote de ajuste fiscal do governo.

Seguem dois dedos de reflexões para o debate público sobre as medidas, a partir de um ponto de vista de um voto contra o projeto que veio de quem é de esquerda e é de situação, diferentemente da maior parte dos votos dados contra o projeto.

Afinal, pouco importam os discursos que a extrema direita entoou de forma cínica nas tribunas do Congresso Nacional: não valem um risco na água declarações de defesa de direitos sociais feitas de forma oportunista por quem, nos últimos anos, aplaudiu todas as medidas que ampliavam a desigualdade social no país.

Parte da esquerda que decidiu pelo voto contrário às principais medidas do pacote reconheceu nelas mudanças estruturantes que, materializadas, trarão consequências profundas, para muito além da contenção de gastos e de uma repercussão antipática passageira.

Acontece que os debates sobre o pacote de medidas envolveram posições não só sobre a central questão do impacto das medidas na vida da classe trabalhadora, mas também sobre qual será o impacto político das medidas na construção de um horizonte de país que rume à redução das desigualdades, ao desenvolvimento econômico combinado com desenvolvimento social e à proteção de garantias democráticas.

De forma que, longe da visão despolitizada e despolitizadora que acusa os votos de esquerda contra o pacote de serem votos fáceis e para “jogar para a galera” (até porque fomos também alvo de muitos ataques!), a posição contrária aponta uma divergência de linha política profunda. Existe um desacordo de análise.

As medidas que objetivamente foram a voto após as mudanças do Congresso realizam ajuste sem tocar no “andar de cima” e nas emendas parlamentares impositivas, que seguem absurdamente superdimensionadas.

Some-se a isso o fato de que o Congresso, para além de esvaziar as medidas que chamavam o próprio Parlamento a participar dos ajustes, conseguiu subverter a proposta de combate ao supersalários a tal ponto que o texto agora os torna legais e constitucionais, aguardando indefinidamente algum limite que venha de uma lei aprovada em data futura não estabelecida.

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Para além disso, fica evidente a existência de uma atuação chantagista do grande capital financeiro; e é pedagogicamente negativo simplesmente tratar aquilo que é aprovado nesse ambiente (de chantagem!) como se fosse uma negociação vitoriosa.

O momento após a aprovação das medidas, em vez de significar uma vitória, tem sido de já se sentir a continuidade da manipulação de ambiente, com cobranças de um novo pacote sem que sequer se tenha avançado em temas como os supersalários ou taxação da renda dos mais ricos.

As alegações de que o “mercado” não seria um bloco monolítico, e que estaria até agindo sob uma suposta irracionalidade, esquecem que o coração do poder especulativo tem sim, e muito, a capacidade de manipular e até criar tendências geradoras de instabilidade; e que esse mesmo setor tem lado político, chegando a ter incidido para melhorar os números do mundo das finanças quando o presidente Lula esteve hospitalizado.

Assim, e com tais medidas de final de ano aprovadas, o “mercado” (um conjunto mínimo de pessoas que defende os interesses dos mais ricos e poderosos do país e de fora dele) testa e consegue se assegurar de que basta chantagear para obter um aprofundamento de medidas contra a classe trabalhadora brasileira, sem querer sequer que se inicie qualquer debate sobre os setores privilegiados e subtaxados.

E não vejo nenhuma razão para achar que, mesmo com os bons números da economia, que promete terminar o ano de 2024 com cerca de 3,5% de crescimento do PIB, esse setor não continuaria utilizando os mesmos instrumentos de que dispõe, tanto mais quanto continuar percebendo que dá certo.

Àqueles que, de forma desonesta, acusam posições de esquerda contra o pacote de ajuste fiscal de se situarem em um mundo imaginário em que o mercado não existe e não faz pressão real, não custa lembrar: o problema de estar sempre em busca de conciliar, sem maiores resistências, com as condições que seriam ideais para o capital financeiro, é que as condições ideais para o capital financeiro são: sem o presidente Lula e com a direita (ainda que seja a extrema) na Presidência da República.

O resultado dos ajustes desse tipo (e como a Faria Lima sabe disso!) caminha para minar as condições políticas do governo e seu apoio popular; e tem o condão de frear a melhoria na vida do povo, ao mesmo tempo em que aumentam as chances de vitória da extrema direita no país.

Aliás, já que tem sido comum tocar no tema da governabilidade, das eleições de 2026 e até de uma suposta deslealdade ao companheiro Lula vinda daqueles que divergiram, é importante que se saiba que há discordância profunda da tese de que a aprovação das medidas ajuda o governo e suas chances de reeleição.

Na verdade, em um médio prazo que não tarda, fortalece um ambiente em que a extrema direita terá clima para ganhar espaço, com tudo de antipovo e autoritarismo que isso implique.

Há, ainda, um contexto político que torna essa conjuntura de final de ano (pautado por cortes e repercussões que clamam que já venham mais cortes antipopulares) ainda mais sofrível.

Poucas semanas atrás, dois fatos extremamente relevantes em nosso país ganharam os noticiários e rapidamente baixaram de audiência, ofuscados pelo debate do pacote de ajuste fiscal.

O primeiro, a revelação de que a tentativa de Jair Bolsonaro e militares de alta patente de dar um golpe envolveu até mesmo um plano para assassinar o presidente Lula, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, e o ministro do STF Alexandre de Moraes.

A repercussão foi bem aquém da gravidade do que se descortinou, e, aliás, pouco capital político parece ter tirado dessas mesmas altas patentes militares, visto que seguiram dando o tom na negociação de um projeto que estendesse o ajuste fiscal às Forças Armadas; e até divulgaram (a Marinha, no caso) um insubordinado vídeo com mensagem crítica à ideia desse projeto do governo, e ainda insinuando que o povo brasileiro viveria só se divertindo e sem trabalhar (que desconhecimento da escala 6 x 1…).

A envergadura do plano de golpe, do qual se tem cada vez mais detalhes, sem dúvidas deveria fazer com que os balanços e análises sobre este 2024 que se encerra trouxesse a pauta “sem anistia” como a prioritária do ano de 2025.

E o segundo fato, também há algumas semanas, o governo Lula 3 operou um feito digno não só de comemoração, mas de reconhecimento político à altura.

Ainda que com todos os desafios que vivemos hoje em relação aos preços dos alimentos, que a reforma tributária finalmente aprovada pelo presidente vai isentar de tributação, e atingimos o menor índice de pobreza e miséria que se tem registro.

Não é por termos nos habituado a ver Lula fazendo coisas que nunca antes foram feitas na história que deveríamos perceber essa conquista com apatia.

Sempre que quebrarmos recordes de menor índice de pobreza e fome no país, isso deve ser considerado histórico e digno de comemoração, e era essa a notícia —muito mais do que os debates sobre o próximo ajuste fiscal— que deveria estar tendo o maior destaque nos balanços e avaliações de fim de ano.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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Comentários

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Zé Maria

.

“O aacréscimo de 1% da SELIC aumenta o
gasto com a Dívida Pública +de R$ 40 Bilhões.

A Medida na prática Retira dos Mais Pobres
para Dar aos Mais Ricos.

Então, que ‘Equilíbrio Econômico’ [sic]
o ‘Calabouço’ traz com o Corte de 40 Bi
nos Programas e Investimentos Públicos ?”

Caê Cavalcanti (@cae_pessoa)
https://www.instagram.com/p/DD2L5fOve_y/c/18307314469203642/

.

Zé Maria

.

A Professora de Economia da FEA/USP LAURA CARVALHO
coloca a Verdade no Ar de forma Didática e Verdadeira na
‘gRoubo news’:

“Penso que farão o que for preciso para tirar Lula da disputa em 2026.
Incluindo introduzir o caos na economia, como estamos vendo” …

Thread:

“1. A crise do dólar não é por conta da situação fiscal do Brasil,
até porque o governo Lula conseguiu reduzir o déficit público
de 87 bi em 23 para 57 bi este ano.
E o pacote de corte de gastos aponta para uma economia de 55 bi,
o que não é pouca coisa.

2. A crise do dólar tem duas vertentes.
Uma internacional, aumento dos juros
nos EUA na expectativa de Trump.
Outra nacional,que foi o anúncio da isenção
do IR para quem ganha até 5 mil reais.
Motivo da movimentação do ‘mercado’
que causou a desvalorização do real.

Somando as duas vertentes,explica-se
o dólar acima de 6 reais.

3. O problema do dólar é o mais complicado
pois ele impacta a inflação.
A especulação com o dólar é um forte instrumento
de chantagem econômica sobre o governo.
E o Banco Central demorou muito para atuar
na contenção da moeda estrangeira.

4. Um pacote de corte de gastos é necessário
para o Brasil, mas não que impacte a população
mais pobre.
Cortar BPC, cortar salário mínimo, cortar abono
é absurdo pois tira de quem já não tem nada.
Um bom pacote de corte de gastos deveria mexer
nas isenções fiscais que hoje estão na casa
dos 100 bilhões de reais.
Muitos dos setores que gozam de isenção fiscal
não geram empregos nem contribuem no crescimento
econômico.
Esses setores são poderosos e a corda do corte de
gastos acaba arrebentando no lombo da população.

5. Outra, seria cobrar imposto de quem não paga.
Lucros e dividendos empresariais, grandes fortunas,
offshore etc.”

https://x.com/jose49729680/status/1870911340698869971
https://x.com/jose49729680/status/1870911344414732419
https://x.com/jose49729680/status/1870911347388822005
https://x.com/jose49729680/status/1870911351016804431
https://x.com/jose49729680/status/1870911353663242715
https://x.com/jose49729680/status/1870911356389728345

.

Zé Maria

Brilhante!

Seria Importante que o Presidente Lula, agora que está em Convalescença, aproveitasse o Tempo Disponível para ler a Mensagem de Alerta da Deputada Federal do PT do Rio Grande do Norte, Natália Bonavides, refletindo com Profundidade e Paciência, que lhes são Características, sobre as Conseqüências Políticas desse ‘Oba-Oba Ridículo’ promovido
nas Hostes Governamentais e Partidárias Apontadas pela Magnífica Parlamentar Petista.
.
.
Excerto

Assim, e com tais medidas de final de ano aprovadas,
o “mercado” (um conjunto mínimo de pessoas que
defende os interesses dos mais ricos e poderosos
do país e de fora dele) testa e consegue se assegurar
de que basta chantagear para obter um aprofundamento
de medidas contra a classe trabalhadora brasileira,
sem querer sequer que se inicie qualquer debate sobre
os setores privilegiados e subtaxados.

E não vejo nenhuma razão para achar que, mesmo com
os bons números da economia, que promete terminar
o ano de 2024 com cerca de 3,5% de crescimento do PIB,
esse setor não continuaria utilizando os mesmos instrumentos
de que dispõe, tanto mais quanto continuar percebendo
que [a Chantagem] dá certo.

Àqueles que, de forma desonesta, acusam posições de esquerda
contra o pacote de ajuste fiscal de se situarem em um mundo
imaginário em que o mercado não existe e não faz pressão real,
não custa lembrar: o problema de estar sempre em busca de conciliar,
sem maiores resistências, com as condições que seriam ideais para
o capital financeiro, é que as condições ideais para o capital financeiro
são:
sem o presidente Lula e com a direita (ainda que seja a extrema)
na Presidência da República.

O resultado dos ajustes desse tipo (e como a Faria Lima sabe disso!)
caminha para minar as condições políticas do governo e seu apoio popular;
e tem o condão de frear a melhoria na vida do povo, ao mesmo tempo em que
aumentam as chances de vitória da extrema direita no país.

Aliás, já que tem sido comum tocar no tema da governabilidade, das eleições
de 2026 e até de uma suposta deslealdade ao companheiro Lula vinda
daqueles que divergiram, é importante que se saiba que há discordância
profunda da tese de que a aprovação das medidas ajuda o governo e suas
chances de reeleição.

Na verdade, em um médio prazo que não tarda, fortalece um ambiente
em que a extrema direita terá clima para ganhar espaço, com tudo de
antipovo e autoritarismo que isso implique.

Íntegra em: https://bit.ly/4j4AVAX

https://www.viomundo.com.br/politica/natalia-bonavides-sou-do-pt-e-votei-contra-o-pacote-fiscal-do-governo.html
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Nota:

O Espaço Aberto pela Folha à Deputada Federal Norte-Riograndense do PT
Não foi favor Nenhum, pois trata-se de um Legítimo “Direito de Resposta”
Usufruído pela Magnífica Parlamentar de Esquerda, Natália Bonavides,
à Nota Canalha da Coluna Painel e Contra o Editorial Infame desse Jornal
Neoliberal Fasci-Paulista, conforme observado pelos Dirigentes Nacionais
do Partido dos Trabalhadores, Valter Pomar*, verdadeiramente de Esquerda,
e Contraposto pela Deputada Federal Gleisi Hoffmann **, Presidente do PT.

*(https://t.co/OBNEJoj2zA); (https://x.com/VIOMUNDO/status/1870912527519105456)
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