Marcelo Zero: A União Econômica Euroasiática e os desafios do Brasil

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Bandeira da União Econômica Eurasiática. Imagem: Wikimedia Commons

A União Econômica EuroAsiática e os Desafios do Brasil

Por Marcelo Zero*

Com o governo Trump, anuncia-se uma potencial onda mundial de protecionismo comercial, a qual poderá ter efeitos muito negativos na economia global.

Segundo a UNCTAD, “à medida que a incerteza comercial cresce, a cooperação global e as políticas equilibradas permanecem como fatores críticos. Embora as medidas de estímulo da China e a inflação mais baixa em algumas regiões possam apoiar o comércio, o protecionismo e as mudanças de políticas nas principais economias continuam sendo riscos importantes.

O desafio em 2025 é evitar a fragmentação global, na qual as nações formariam blocos comerciais isolados.”

Na economia brasileira, em específico, gargalos protecionistas e essa possível “fragmentação global” poderão se agregar a uma taxa de juros real já bastante elevada, reduzindo o crescimento e a geração de empregos.

A situação criada por Trump representa, portanto, um desafio para o Brasil, que poderá se estender para além do setor siderúrgico.

A relativa estabilidade e o multilateralismo que se seguiram ao fim da Guerra Fria estão agora sendo substituídos por uma era multipolar, caracterizada pela ascensão de potências regionais, mudanças de alianças, nacionalismo econômico e ênfase em segurança nacional.

A paralisia do sistema de solução de controvérsias da OMC, causada intencionalmente por Washington, já em 2017, torna o comércio internacional uma espécie de “território sem regras” que, prejudica, em particular, os países mais frágeis, que terão de se submeter a embates bilaterais com países mais fortes, particularmente com os EUA.

Felizmente, há alternativas a explorar.

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O nacionalismo e o protecionismo trumpista poderão acelerar algumas tendências estruturais do comércio internacional que já vinham se verificando.

Entre elas, podemos destacar as seguintes:

A China deverá fortalecer a sua tendência de se tornar o principal parceiro comercial para a maior parte dos países do mundo, à medida que seu comércio com o “Ocidente” diminui.

Laços mais fortes com mercados emergentes de rápido crescimento estimularão o crescimento do comércio chinês.

O Sul Global deverá emergir, cada vez mais, como uma força comercial mundial, impulsionada pelas potências da Índia e do Sudeste Asiático. O comércio Sul-Sul também aumentará.

O crescimento do comércio entre a União Europeia e a China deverá caminhar para uma relativa estagnação do seu crescimento, à medida que o bloco europeu se torna mais dependente de parceiros econômicos de longa data, como os EUA e o Japão, juntamente com outros mercados emergentes como Índia, Turquia e África.

A formação crescente de blocos e alianças regionais deverá se consolidar, com a consequente regionalização das cadeias produtivas.

O Brasil pode e deve explorar essas tendências, pela via da diversificação de suas parcerias estratégicas, particularmente com o Sul Global de um modo geral, e mais especificamente com o Sudeste Asiático, a Índia e a África, bem como pelo investimento na integração regional.

Claro que tudo isso já está no “radar” da diplomacia brasileira, que, neste terceiro governo Lula, vem fazendo muitos esforços, nessa direção onde as oportunidades são mais amplas.

Não obstante, a perspectiva de uma paz na Eurásia, com o possível levantamento das sanções contra a Rússia, abre um outro leque de oportunidades.

Uma delas pode ser a União Econômica Euroasiática. Esse bloco, composto por Armênia, Bielorrússia, Cazaquistão, Quirguistão e Rússia já estabeleceu acordos de livre comércio com Camboja, Egito, Índia, Irã, Marrocos, Paquistão, Tailândia, Tunísia e Vietnã.

São 183 milhões de pessoas e um produto interno bruto de US 2,4 trilhão.

Embora não tenha, obviamente, a relevância atual da UE, o potencial de intercâmbio do Brasil com esse bloco é substancial. Afinal, trata-se de um grande produtor de energia e de fertilizantes.

Ademais, Rússia e Bielorrússia têm competitividade em muitas indústrias e domínio tecnológico em áreas estratégicas.

Em 2018, o MERCOSUL e a União Econômica Euroasiática assinaram um importante Memorando de Cooperação Econômica e Comercial com a União Econômica Eurasiática (UEE), que pavimentava o caminho para um possível acordo de livre comércio entre os dois blocos.

Com a guerra e as sanções não houve, infelizmente, avanços significativos com tal propósito.

No entanto, com a nova conjuntura, este caminho pode voltar a se descortinar para o Brasil e o Mercosul.

Deve-se salientar que a União Econômica Euroasiática tem a perspectiva estratégica de ser o embrião logístico da Grande Parceria Eurasiática (GPE), conectando várias plataformas regionais, como a Organização para Cooperação de Xangai (OCX) e a ASEAN.

A Nova Rota da Seda, recorde-se, tem, como ponto nevrálgico, a Ásia Central, que conecta a Europa com o resto da Ásia.

Por conseguinte, é algo que a diplomacia brasileira, pragmática e racional, poderia levar em consideração.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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