Manuel Domingos Neto: Estancar a depravação que estimulou e acoitou terroristas e vândalos

Tempo de leitura: 3 min
No 8 de janeiro, os golpistas vilipendiaram a pintura “Bandeira do Brasil”, de Jorge Eduardo, de 1995. Reproduz a bandeira nacional hasteada em frente ao palácio e serviu de cenário para pronunciamentos dos presidentes da República. Foi encontrada boiando sobre a água que inundou todo o térreo do Palácio do Planalto, após vândalos abrirem hidrantes ali instalados. Foto: Reprodução g1

Estancar a depravação

Por Manuel Domingos Neto*

Soldados são indispensáveis à proteção coletiva. Merecem respeito. Sem soldados, a humanidade seria irreconhecível.

O avanço do conhecimento e dos direitos esteve associado ao exercício legalizado da violência. Não há sociedade complexa sem organizações militares.

O custeio dos que se adestram para matar ou morrer em nome de todos é inevitável.

Soldado é educado para cumprir ordens; não as recebendo, impõe a própria vontade. Ensandece.

Sem remorsos, perpetra vilanias. Chega ao extremo de pretender impor a história escrita sob a ótica do quartel. Delira, achando que a sociedade deve se orientar pelos valores do castro.

A relação do político com o soldado não pode ser baseada no medo, na mentira, no jeitinho, na bajulação, na acomodação espúria.

Soldado pode bater continência para Rolando Lero, mas não se deixa ludibriar facilmente. Admira quem fala com clareza. Respeita quem imagina estar, pelo menos, à sua altura.

A Defesa de um país demanda iniciativas transversais; perpassa todos os domínios do Estado e da sociedade.

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No Brasil, o político nunca se preparou para orientar o soldado. Assim, deixou a Defesa do país em mãos impróprias: quem se prepara para combater não pode cuidar dos mil lances inerentes à Defesa.

Não se impondo ao soldado, o político declina de sua obrigação e deixa a democracia ameaçada.

Pesquisadores, com destaque para Piero Leirner, apontam que desde 2014, pelo menos, o soldado interfere planejadamente na dinâmica política.

Entabula “sinergias” com a imprensa, juízes, religiosos e empresários. Fabrica ambientes sociais através de choques cognitivos. Em eleições mal arrumadas, alçou um desqualificado à Presidência.

Soldado não gosta da esquerda por diferentes razões. A mais relevante é a incompatibilidade entre as estruturas orgânicas e funcionais de sua corporação com reformas sociais e com a política externa soberana.

Juventude com perspectiva de ascensão social não combina com recrutamento baseado em moldes coloniais.

Valorização da mulher e respeito aos homossexuais fere sua cultura patriarcal e homofóbica.

Parcerias estratégicas alternativas estragam as relações com seus fornecedores estrangeiros tradicionais.

Ao compor seu governo, Lula declinou do comando supremo das Forças Armadas: omitiu-se quanto à política de Defesa, optou por um ministro apaziguador e entregou o comando das Forças aos primeiros colocados em listas definidas por regras corporativas. Assim, estimulou o ativismo político das fileiras.

Na busca pela ruptura institucional, o soldado estimulou e acoitou terroristas e vândalos.

No dia 8 de janeiro, os inconformados com a eleição de Lula vilipendiaram o que há de mais sagrado: os pendões da esperança que a grandeza da pátria nos traz.

Foi ao extremo da degradação moral. Isso ocorreu no lugar que concentra a maior quantidade de soldados de alta patente, da ativa e da reserva, por metro quadrado.

A indignação do brasileiro foi instantânea. Dirigentes mundiais prestaram imediata solidariedade.

De repente, Lula ganhou autoridade moral jamais registrada por um presidente da República para assumir o comando das Forças.

O comandante do Exército peitou Lula: disse ao seu representante, o Ministro da Justiça, não aceitar suas ordens. Não foi destituído, foi convidado para almoçar.

Lula disse não ter assinado uma operação de garantia da lei e da ordem por desconfiar do castro. Alguns louvaram seu alcance de vista, sua prudência.

Na verdade, Lula admitiu não deter o comando supremo. Afirmou, também, que o soldado não constitui poder moderador. Mas evitou propor a revisão do aberrante Artigo 142 da Constituição, que alimenta a depravação sem limite.

Sob aplauso contente dos democratas, alguns, sedentos de vendeta, seguiu-se a repressão aos vândalos, comandada por um interventor que admira o general Villas Bôas, ícone da movimentação golpista. Entre os aprisionados, nenhum integrante da família militar. Fiquei com a sensação de ter votado em Arthur Bernardes II.

O primeiro governara, entre 1922 e 1926, permanentemente torpedeado pelo castro. Pouco ou nada fez. Na época, o Exército batia-se entre clivagens internas explosivas. Era difícil mesmo exercer o comando.

Hoje, há unidade de doutrina nas fileiras, não há clivagens palpáveis e multidões veneram Lula.

Seria mais fácil o exercício do comando, caso o Presidente resolva assumir de fato a Chefia do Estado e estancar a depravação.

Mas o prazo para decidir é curto. Acabará quando o apoio popular entrar em declínio.

*Manuel Domingos Neto é professor aposentado da Universidade Federal Fluminense (UFF), ex-presidente da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ABED) e ex-vice-presidente do CNPq.

Leia também:

Jeferson Miola: Gradualismo e “almoço com generais”, respostas desastrosas de Múcio para a questão militar

Jeferson Miola: Dois atos do teatro da conspiração das cúpulas militares contra a democracia

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Comentários

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Zé Maria

Para se Escolher um Comandante do Exército
o Presidente da República deveria realizar um
Questionário Preliminar com 5 Perguntas:

1) Você é a favor de que Oficiais da Força [da Ativa ou da Reserva]
atuem politicamente por meio de declarações públicas, inclusive
à Imprensa?

2) Você é a favor de pôr na ilegalidade o Partido Comunista?

3) Em 1964, houve um Golpe Militar que derrubou o Presidente
do Brasil João Goulart, o Jango?

4) Você é a favor da implantação da Comissão Nacional da Verdade
para apurar os Crimes Políticos cometidos por Agentes do Estado?

5) Aliás, você concorda que no Período de 1964 a 1985 foram cometidos
Crimes Políticos por Agentes Públicos, Militares e Civis, contra Cidadãos
em Governos de Ditadores Militares?

.

Zé Maria

.

Prevaricação do Comandante do Exército

General Arruda é denunciado pelo MPF por acampamentos golpistas

MPF acatou notícia-crime de notícia-crime da Deputada Federal
Luciene Cavalcante (PSOL-SP) que cita a proteção dos militares
ao acampamento em frente ao GQ de Brasília, tido como
incubadora do ato terrorista.

“Isso tipifica crime de prevaricação com relação à atuação
[do Comandante] do Exército”

https://revistaforum.com.br/politica/2023/1/18/prevaricao-comandante-do-exercito-general-arruda-denunciado-pelo-mpf-por-acampamentos-golpistas-130257.html

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