Jeferson Miola: Carestia de alimentos ameaça governo na eleição de 2026

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Foto: Ricardo Stuckert/PR

Carestia de alimentos ameaça governo na eleição de 2026

Por Jeferson Miola, em seu blog

A perda de popularidade do governo advém, em grande medida,

[1] do mal-estar estrutural da população, exacerbado pela anabolização do extremismo pelas big techs; mas, também,

[2] devido à quebra da confiança e da credibilidade do governo, agravada pelo efeito PIX; e, ainda, e conexo a isso,

[3] em consequência da carestia do preço dos alimentos.

A inflação dos alimentos atinge duramente a maioria populacional que sobrevive com enorme dificuldade devido à baixíssima renda: 38% da população brasileira ganha até um salário mínimo, 32% ganha entre um e dois salários mínimos, e 20,5 milhões de famílias [53,9 milhões de pessoas] recebem em média 671,21 reais por mês do Bolsa Família.

Essa parcela majoritária da população, que corresponde à enorme maioria do eleitorado lulista, consome pelo menos 40% do salário mínimo para comprar uma cesta básica alimentar simples e modesta. Por isso a carestia de alimentos ameaça seriamente o desempenho do governo na eleição de 2026.

Ainda há tempo para reverter este cenário desfavorável, mas o governo precisa agir urgentemente e com ousadia, “pensando fora da caixa” neoliberal, como analisa a professora Isabela Weber, da Universidade de Massachussets.

A eliminação de impostos de importação de nove tipos de alimentos mostrou a preocupação central do governo com a inflação e seu empenho em combater a carestia, o que é relevante, mas tem efeitos praticamente nulos.

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Além disso, a política de estoques reguladores de alimentos foi destruída no período fascista-militar do Bolsonaro, e nos dois anos do governo do presidente Lula a CONAB recém começou armazenar produtos com o resultado da safra recorde.

A situação fica ainda mais preocupante porque a inflação dos alimentos é um fenômeno mundial pós-pandemia, e tem se mantido persistentemente, sem sinais de arrefecimento imediato.

E tem outro aspecto complicador, que é a “internacionalização” dos preços dos alimentos inclusive de consumo popular, equivocadamente equiparados a commodities quanto à lógica econômica. Mesmo no caso de produtos não exportáveis ou não exportados, os preços domésticos são referenciados nos preços no mercado mundial, independentemente dos custos locais de produção.

Para reverter a carestia no Brasil, o governo Lula está desafiado a seguir outro caminho que não o das amarras da austeridade, dos juros altos e do ajuste fiscal dogmático.

O Nobel da Economia Joseph Stiglitz esclarece que “a inflação atual é diferente da inflação normal. Essa inflação, a inflação pós-pandemia, é diferente da inflação que o Brasil e o mundo tiveram no passado. Esta é sobretudo uma inflação do lado da oferta”.

Na visão dele, “juros altos são contraprodutivos neste caso. Eles pioram a situação”, por isso os governos precisam empregar outras medidas para combater os altos preços e preservar o poder aquisitivo da população.

O presidente mexicano López Obrador, por exemplo, adotou uma série de medidas que seriam consideradas “drásticas” pelo “mercado”, por serem de fora da caixa da ortodoxia neoliberal. Com isso, ele conseguiu conter a alta desenfreada dos custos de alimentação, e elegeu sua sucessora com 60% dos votos e maioria congressual.

O custo total das políticas anti-inflação no México foi de 1,4% do PIB do país em 2023, cerca de 20,4 bilhões de dólares – o que significa, portanto, que combater inflação é uma política pública que requer prioridade orçamentária.

Lula não conseguirá implementar medidas efetivas para aliviar o preço dos alimentos se ficar engessado pelo austericídio fiscal e pela política monetária recessiva do Banco Central.

O governo precisa agir urgentemente neste momento de emergência social causada pela inflação dos alimentos, e que poderá levar dezenas de milhões de pessoas a uma situação de insegurança alimentar e fome.

Os governos do México e da Espanha se libertaram das amarras do figurino neoliberal e produziram políticas bem-sucedidas de preservação do poder aquisitivo das respectivas populações. Com isso, asseguraram as vitórias eleitorais dos seus governos – ver aqui e aqui as medidas executadas por López Obrador e Pedro Sánchez.

Por razões guerreiras e medievais; ou seja, por motivo nada nobres; a União Europeia flexibilizou as regras fiscais para aplicar 800 bilhões de euros –5,5 trilhões de reais, o equivalente à metade do PIB brasileiro– em gastos de guerra nos próximos cinco anos.

Diante disso, é de se perguntar ao rentismo, à Faria Lima, aos tecnocratas das finanças; enfim, aos parasitas financeiros, se eles criticarão se o governo Lula flexibilizar regras fiscais para proteger milhões de brasileiros do risco de insegurança alimentar e de fome causados pela inflação mundial do preço dos alimentos.

Com qual moral, afinal, as oligarquias e sua mídia atacarão o governo por agir nessa situação de emergência social, enquanto aplaudem os governos europeus que explodem seus orçamentos em nome da guerra, da russofobia e do supremacismo ocidental?

A carestia de alimentos ameaça seriamente o desempenho do governo Lula na eleição de 2026, e “o mercado” sabe disso.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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