Jair de Souza: Libertações na Palestina escancaram assimetrias do genocídio. VÍDEO

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Cessar-fogo escancara outro brutal contraste. Os palestinos libertados de prisões de Israel (imagens no topo) chegam a Gaza doentes, com membros amputados, sinais de tortura, negligência médica e privação de comida. Já os reféns do Hamas, ao serem liberados, apresentam condições razoáveis de saúde. Os flagrantes da liberação de Omer Shem Tov são históricos. Ele tem 21 anos, sofre de asma e doença celíaca e foi libertado após 505 dias de cativeiro. A preocupação da família era de que não recebesse alimentos sem glúten nesse período. Mas as imagens de Omer Shem Tov (na parte inferior, beijando a testa dos combatentes do Hamas, falam por si. Fotos: Captura de telas de vídeos

As assimetrias do genocídio

Por Jair de Souza*

Como parte das condições para o estabelecimento de um cessar-fogo no conflito em Gaza, uma das medidas acordadas foi a troca de um certo número de palestinos detidos em prisões israelenses pelos cidadãos israelenses que estavam sendo mantidos como reféns por parte da organização da Resistência do povo palestino conhecida como Hamas.

Nesta oportunidade, pôde-se evidenciar mais uma das aberrantes assimetrias que vêm caracterizando este conflito desde que o mesmo foi desatado há mais de 75 anos, quando os colonizadores de origem europeia, organizados sob a direção de sionistas também europeus, decidiram ocupar aquelas terras e montar ali seu próprio Estado.

Mas, como o povo palestino já vivia por ali há milênios, os sionistas europeus decidiram que eles teriam de ser expulsos, ou eliminados. E é a isto que eles têm se dedicado com afinco desde, pelo menos, a metade do século passado.

Porém, trata-se de um confronto marcado por grandes e inocultáveis assimetrias. Primeiramente, do ponto de vista militar, o sionista Estado de Israel está entre as potências mais bem armadas de todo o planeta. Suas forças armadas, conhecidas pelas siglas IDF, são financiadas como nenhuma outra pelos Estados Unidos, pela Alemanha e por todos os grandes países da Europa ocidental.

Já os palestinos estão quase que inteiramente desarmados, dispondo nada mais do que algumas poucas armas que lhes chegam a duras penas por contrabando.

Em decorrência do anterior, uma outra assimetria que se torna impossível de não ser observada é o número de mortos de cada parte nos confrontos que vão acontecendo.

Se nos limitarmos tão somente ao período iniciado em 7 de outubro de 2023 até o presente, vamos nos dar conta de que pelos cerca de 1.100 israelenses que perderam a vida em função das ações armadas, o número de palestinos já ultrapassou a casa dos 62.000, ou seja, uma proporção quase que de 62 mortos palestinos por cada morte israelense. Uma nítida assimetria.

Agora, com a consecução das primeiras trocas de prisioneiros, outra assimetria assombrosa se fez visível. O estado físico e mental dos prisioneiros em poder de cada bando.

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Enquanto a maioria dos cidadãos israelenses que foram liberados podiam ser vistos e percebidos como tendo sido tratados dentro de um nível apropriado de humanidade, os palestinos que saíam das masmorras israelenses se mostravam mais parecidos a zumbis, a mortos-vivos, em razão da precariedade de suas condições de saúde e mental.

É sobre este último aspecto que o vídeo deste enlace trata (embaixo).

Por isso, recomendamos que o vejam com atenção, que discutam com o maior número possível de outras pessoas o significado do que está ali exposto, e procurem divulgá-los a quantas mais pessoas puderem.

*Jair de Souza é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

 

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Zé Maria

Mais uma Demonstração da Canalhice
do Discurso da Mídia Pró Sionista Global.

Zé Maria

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“O Racismo Moderno como Projeto de Engenharia Social”

Ao abordar o racismo antissemita na construção da ideologia nazista, Hannah Arendt possui ideias similares as de Zygmunt Bauman.

Para ela, o racismo como ideologia é fundamentalmente contraditório:
se, por um lado, ele só foi possível devido ao imperialismo, o desenvolvimento
técnico e científico e outros aspectos tipicamente modernos, por outro lado,
ele vai totalmente em desacordo com as ideias [humanistas] pregadas na
Revolução Francesa, de igualdade entre os homens e solidariedade entre
os povos. [Origens do Totalitarismo. São Paulo: Companhia das Letras, 1989]

Para Bauman, no entanto, o racismo é um produto estritamente moderno,
que só foi possível devido ao avanço da ciência, da tecnologia e das formas
de poder estatal.

O racismo moderno é um projeto de engenharia racial (…):
uma necessidade de melhorar a raça para o presente e não para o futuro.
Para isso, são identificadas as raças inferiores e utiliza-se linguagens
técnicas e biológicas:
as raças a serem exterminadas trazem doenças, cargas genéticas
inferiores, pestes, vírus e bactérias.
Para não contaminar o projeto de uma sociedade perfeita, precisa-se que
essas pessoas parem de se reproduzir e que sejam exterminadas.
Como Goebbels havia dito, ― “a questão judaica é uma questão de higiene política”.
As vítimas são desumanizadas, o vocabulário muda para que não se perceba
que se tratam de seres humanos, de pessoas iguais a nós, mas sim de
“Figuren” [do alemão: “Figuras”; “Sombras”; “Personagens Fictícios”].
As vítimas desumanizadas são isoladas e a violência desaparece das vistas
do cidadão comum.
A violência não deixa de existir, ela apenas está localizada, contida, concentrada.
A produção social da distância nos mostra que se o sofrimento está longe,
se não o vemos, não nos importamos:
se não vemos os efeitos práticos de uma ação, dificilmente teremos
uma crise moral.

Bauman nos lembra que o extermínio não pode ser emocional.
Para ser bem-sucedido, ele não pode contar com apelo emotivo,
pelo contrário.
A população alemã não aceitava bem atos de violência explícitos,
não gostava de assistir os judeus sendo espancados, suas lojas
sendo queimadas, suas sinagogas destruídas.
Para dar conta de um projeto de genocídio tão grande, era necessária
distância, indiferença, a transformação da violência em uma prática
puramente técnica e burocrática, e a transformação do assassino
em um mero agente sanitário.

“Não havia ‘turba‘ suficiente para a violência;
a visão do assassinato e da destruição desgostava
um número equivalente aos que inspirava,
enquanto a maioria esmagadora preferia
fechar os olhos, tapar os ouvidos e, sobretudo,
pôr uma mordaça na boca.
A dizimação em massa foi acompanhada
não de comoção emocional, mas de um silêncio
mortal de indiferença.
Não era motivo de júbilo, mas de desinteresse público,
que ‘se tornou uma corda a mais no laço que apertava
inexoravelmente centenas de milhares de pescoços‘.
O racismo é política primeiro, ideologia depois.
E, como toda política, precisa de organização,
administradores e especialistas.
Como todas as políticas, sua realização requer uma
divisão do trabalho e um afastamento eficaz da tarefa
dos efeitos desorganizadores da improvisação e do
espontaneísmo.
Requer que os especialistas não sejam perturbados
e tenham liberdade para executar sua tarefa.”
[Zygmunt Bauman. “Modernidade e Holocausto”; p. 94.]*

Bauman explica que o genocídio moderno não é um genocídio como qualquer outro na história da humanidade.
Além de ser um genocídio que prevê uma quantidade absurda de pessoas
sendo exterminadas, ele se difere por ser um genocídio com propósito.

Não é um fim em si, mas um meio para atingir um fim, e o fim é uma sociedade
‘perfeita’, ‘saudável’, ‘bonita’.
Exterminar a parte doente da sociedade é apenas um meio para atingir
um ‘belo jardim’, é uma proposta de ‘Engenharia Social’.

Segundo ele, “é difícil, talvez impossível, chegar à ideia do extermínio
de todo um povo sem uma imaginação racial, isto é, sem uma visão de defeitos endêmicos e fatais por princípio incuráveis e capazes, além disso, de se propagarem, caso não controlados”.

Hannah Arendt entende a ideologia como a lógica de uma ideia, como a
explicação do mundo através de um postulado.
O racismo por si só não é uma ideologia, ele só se torna ideologia quando
o mundo é explicado através da luta entre ‘raças’ ou ‘entidades imaginárias’
[arianos x não-brancos; europeus x imigrantes; cristãos x não-cristãos ou
estadunidenses de origem europeia x imigrantes não-europeus].
A ideologia tem a pretensão de explicar o passado, o presente e o futuro,
e não tem nenhum compromisso com a realidade:
se não é verdade que os judeus são responsáveis por uma conspiração
mundial para acabar com a raça ariana, então vamos modificar os fatos
para que isso seja verdade.
Sendo assim, o totalitarismo elimina o espaço público onde a liberdade
pode aparecer.
O terror totalitário elimina a relação entre os homens e a relação ‘entre eu
e eu mesmo’ (o ‘dois-em-um’).
E a ideologia, por fim, elimina a relação com a realidade e com a capacidade
de pensar.

Bauman explica que o mundo moderno é feito por homens e que os perigos
para a humanidade não estão concentrados em uma caverna escura cheia
de monstros.

Pelo contrário: o ‘inferno’ é o que um homem pode fazer a outro homem.
O Mal não está concentrado nas guerras e nos regimes totalitários,
ele existe como uma realidade paralela e não apenas à ausência do Bem.

O Mal é silencioso, invisível, tipicamente moderno.
Ele está à espreita de todo ser humano e ataca toda vez que desviamos
o olhar, que não prestamos socorro, que não temos sensibilidade à dor
de outro ser humano, que não temos empatia.
E esse é um mal muito mais perigoso do que o mal produzido por demônios
e monstros.

O sociólogo polonês alerta:
‘como seria bom se só os monstros fossem capazes de atos monstruosos, afinal, contra monstros, estamos bem protegidos.
Mas estamos bem protegidos contra nós mesmos?’

*[Depois da 2ª Guerra Mundial,a expressão ‘Holocausto’ surgiu
(na Literatura e na Mídia) como uma particularidade do genocídio
nazista, para que ele não tenha o mesmo significado dos outros
genocídios da história da humanidade.
A palavra [utilizada pelos judeus] vem do grego ‘Holokaustos’ e faz referência a algo queimado sendo oferecido aos deuses como sacrifício,
e se popularizou após 1970 como a forma de denominar o massacre dos
judeus pela Alemanha nazista relacionado aos crematórios dos campos
de extermínio.
Alguns autores, como Giorgio Agamben, se recusam a usar o termo ‘Holocausto’ para denominar o extermínio dos judeus, por não aceitar
a equiparação bíblica [no Antigo Testamento (Pentateuco=Torá)]
com o que aconteceu em Auschwitz, preferindo a utilização da palavra
hebraica ‘Shoah’, que quer dizer ‘calamidade'[tal como Nakba no Árabe].
A insistência do conceito ‘Holocausto’ no texto diz respeito a sua utilização
por Zygmunt Bauman em sua proposta de tratá-lo como um fenômeno
moderno, e pelo embasamento da extensa produção que consolida
o ‘Holocausto’ como um conceito aplicável.
Como aponta Dominick LaCapra, mais importante do que a fixação por
um termo ou outro, é a compreensão do caráter indizível do acontecimento
dos campos de extermínio, e a limitação de qualquer termo para a explicação do que aconteceu nos Campos de Concentração Nazistas.
(Para mais sobre a terminologia Cf.:
AGAMBEN, Giorgio. “O Que Resta de Auschwitz”. São Paulo: Boitempo, 2008;
LACAPRA, Dominick. “Representing the Holocaust: History, Theory, Trauma”.
Cornell University Press, 1994;
DANZIGER, Leila. “Shoah ou Holocausto: a Aporia dos Nomes”.
Arquivo Maaravi: Revista Digital de Estudos Judaicos da UFMG.
Belo Horizonte, v. 1, n. 1, out. 2007. ISSN: 1982-3053)]

Íntegra em:
“Black Mirror e a Cegueira Moral da Modernidade”
Por Maria Visconti Sales (UFMG):
https://www.academia.edu/38441954/Black_Mirror_e_a_cegueira_moral_da_Modernidade

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