J. Carlos de Assis: Na política econômica, nem uma coisa, nem outra
Tempo de leitura: 4 minManchete da Folha a respeito da política econômica do governo Dilma
03/06/2013
A única coisa que salva a política econômica é a ameaça de uma pior
Ao lado da incapacidade de implementar uma política de investimento público que arrastasse o privado, a política econômica não se livrou da burrice do tripé juros altos, superávit primário elevado e câmbio solto herdada de FHC.
J. Carlos de Assis, na Carta Maior
Os ciclos de alta e baixa das economias dependem muitas vezes menos dos homens que das circunstâncias internacionais. Contudo, a crise na qual começa a mergulhar a economia brasileira é uma crise que se explica pela péssima condução da política econômica.
Mais do que isso, é uma crise de ausência de política econômica em aspectos críticos centrais para o desempenho da economia brasileira num contexto internacional mal aproveitado, no início, e não adequadamente enfrentado agora.
Não sabemos para onde o mundo vai. E não sabemos para onde o Governo nos quer levar.
Vivemos nos anos 2002 a 2008, como se fosse eterno, o miniciclo fabuloso das commodities que elevou para níveis inéditos os preços e as quantidades por nós exportadas de matérias primas minerais e agrícolas, puxados pela China.
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Entregamo-nos ao conforto de acumular reservas sem nenhum esforço, pois, obviamente, isso não dependia de genialidade dos condutores da política econômica.
Mantivemos, com Meirelles, taxas de juros basicas escorchantes, a despeito da confortável situação externa em reservas. Quando veio a crise de 2008, fizemos, sim, alguma coisa realmente inteligente: o Tesouro repassou em dois anos ao BNDES algo como 180 bilhões de reais para financiar investimentos em 2009 e 2010.
Junto veio a desoneração fiscal de produtos duráveis de consumo. Foi apresentada como política anticíclica, e realmente funcionou no caso dos automóveis.
Acontece que a indústria automobilística se tornou “dependente” da desoneração, e o Governo acabou como refém dela. Como conseqüência, estamos com nossas vias públicas, nas grandes metrópoles, entupidas de carros, sem escoamento e sem alternativa de adequados serviços públicos de transportes.
O lado do investimento público propriamente dito ficou totalmente relegado a segundo plano, ou bloqueado por razões burocáticas e judiciais. Ao mesmo tempo, insistiu-se na política de geração de superávit primário.
Numa situação em que o setor privado parou de investir, mesmo com os estímulos da desoneração, a acumulação de superávits primários tem efeito necessariamente contracionista, já que o Governo está retirando da sociedade, via impostos, mais do que lhe está devolvendo em forma de investimentos e compras.
Por isso, sobretudo por isso, temos um Pibinho.
Com a desoneração fiscal e a auto-imposta geração de superávit primário, os ortodoxos presentes no Governo – já que nossa política econômica continua sendo dominada pelo conflito entre ortodoxia e heterodoxia, sendo o ministro Mantega nem uma coisa nem outra – começaram a advertir que o Estado estava quebrado e não podia, ele mesmo, liderar o processo de desenvolvimento com investimentos públicos.
Decorreu disso a prevalência no espírito de nossa Presidenta da ilusão de que fará desenvolvimento de infraestrutura no Brasil com PPP (Parcerias Público-Privadas).
Essa ilusão vai passar logo, diante da frustração revelada pelos fatos: o setor privado não quer PPP, que gera obrigações (mesmo a partir de empréstimos a baixo custo); quer simplesmente fazer grandes obras públicas a fundo perdido, receber pelos contratos e pular fora. Foi assim que se fez infraestrutura no Brasil e no mundo, e não será agora que isso vai mudar.
Como conseqüência, temos 7,5 mil quilômetros de rodovias e ferrovias licitadas na foram de PPP e para as quais não apareceu ganhador. O resultado disso tudo é que não temos investimentos adequados em infraestrutura. Certamente que temos uma política de assistência social efetiva e que merece todo o apoio da sociedade.
Contudo, é uma ilusão pensar que uma política assistencialista, por mais justa que seja, vá sobreviver indefinidamente se a base da estrutura da economia afunda, e com ela as classes médias. Veja a Europa Ocidental: o “consenso” imposto pela Alemanha em torno de políticas de “austeridade” nada mais é que a destruição do Estado de bem estar social nos paises vítimas.
Ao lado da incapacidade de implementar uma política de investimento público que arrastasse o privado, a política econômica não se livrou da burrice do tripé juros altos, superávit primário elevado e câmbio solto herdada de FHC. Não entendeu que isso só deu certo por conta dos chineses, como observado acima.
Em conseqüência, deixamos o câmbio valorizar na hora errada, prejudicando a médio e longo prazo nossa indústria de manufaturados e, em especial, a de bens de capital. Agora tudo conspira contra nós: a queda da balança comercial, a inflação que a mídia exagera, o câmbio e até o juro, que voltou a ser o expediente “sujo” para o equilíbrio externo e interno.
Do ponto de vista ideológico, capitulamos à essência da agenda neoliberal: a Fazenda assumiu o discurso e a prática da desoneração tributária, sem se dar conta de que o Estado mínimo é justamente isso, um meio de os ricos pagarem menos impostos; assumiu também, em conseqüência, a retórica de que é o setor privado, não o Governo, que irá liderar o investimento; confia nos juros para controlar a inflação, com “vergonha” de atacar heterodoxamente pontos essenciais da inflação como a indexação de preços de serviços públicos que ainda contamina a economia, bem como a questão de estoques de produtos agrícolas de largo consumo.
Da presidenta Dilma, que tem formação econômica, espera-se que intervenha na política econômica para o bem do Brasil e a salvação de nossa juventude. A ideia, posta em circulação por “O Globo”, de que o Governo já deu 2013 como perdido e vai se concentrar no ano eleitoral de 2014 é uma intriga, um insulto à opinião pública.
Acho que a Presidenta será reeleita mesmo com zero por cento de crescimento do PIB, algo bastante provável, com Mantega na Fazenda e com Tombini no BC.
É que no momento em que escrevo ouço, de meu escritório, um pronunciamento eleitoral de Aécio Neves pela TV da sala: ele diz que o Governo gasta mais do que arrecada, e que o destino do Brasil, além de cortar gastos públicos, depende de gestão!
A mesa está pronta. Façam suas apostas!
J. Carlos de Assis é economista, professor de economia internacional da UEPB e autor, entre outros livros, de “A Razão de Deus” (ed. Civilização Brasileira).
PS do Viomundo: Ao trazer a direita para dentro do governo, Dilma Rousseff aprofundou a ambiguidade que paralisa. Nem com os indígenas, nem com os ruralistas. Nem com os gays, nem com os evangélicos. Nem uma coisa, nem outra.
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Comentários
Marcelo de Matos
Mostrando, mais uma vez, que no Brasil direita e esquerda ocupam a mesma trincheira para atacar o governo, o autor fala em “pibinho”. Não sei se fez biquinho como os apresentadores da Globo. Não dá para dizer isso, nem por ignorância, nem por má fé. O Economista, órgão da classe, destaca: “Brasil deve voltar a ser a 6ª economia em 2013 e chegar à 5ª até 2016”. Vejam bem: isso não é pouca porcaria. Um país desses não tem pibinho, de forma alguma. Tem é um tremendo pibão.
Nelson
“Do ponto de vista ideológico, capitulamos à essência da agenda neoliberal: a Fazenda assumiu o discurso e a prática da desoneração tributária, sem se dar conta de que o Estado mínimo é justamente isso, um meio de os ricos pagarem menos impostos…”
É isso aí. O Sr José Carlos de Assis também não engole aquele lorota de que enfiamos o pé na bunda do FMI.
Kazuhiro Uehara
E porquê a rede bobo está dando tanto destaque ao movimento passe livre?
Willian
Por que eles estão parando a principal avenida da principal cidade do país.
Kazuhiro Uehara
E porquê a rede bobo está dando tanto destaque ao movimento passe livre, em o JN? Que Encobre a contribuição dos demotucanopps no aumento da passagem de ônibus.
Nelson
Ao que eu saiba, o Sr José Carlos Assis não faz parte do PIG, ou do time dos que torcem para que o pior aconteça, para que tudo dê errado. Mas ele mostra que também não é daqueles que, ao enxergarem as coisas erradas, simplesmente, por conveniência, viram para o outro lado.
Italo
Como diria Requião a Dilma sai deste corpo FHC
Fabio Passos
Falou e disse!
Apostar em ppp, privatizacoes, leiloes de petroleo e alta de juros e o fim da picada.
Fabio Passos
O Estado precisa ser o motor da economia.
Fazer. Nao apenas assistir.
LEANDRO
“Vivemos nos anos 2002 a 2008, como se fosse eterno”Esse é o ponto. Foram 8 anos de vento a favor e nada foi feito, agora a farra acabou, a China tá pior e nossas industrias destruídas. Essa é a herança que recebeu, Dilma.
Urbano
E não foi por acaso aquele nhenhenhém com o ferrando henriqeaux danoso… Aquela conversa, numa alegria de pai e filha que não se viam há muitos anos, foi tão proveitosa para ele, que a partir disso se deu ao direito de defendê-la da má herança que herdou do Eterno Presidente Lula (coisa que só os cretinos da oposição ao Brasil veem). Quando vi aquela cena, um mau presságio se assomou em minha mente.
Rose PE
A Presidenta Dilma pode até as próximas eleições ( 2014), no entanto, terá que rala muito, estou esperando qual será seu discurso em 2014, não poderá mais usar a retórica da “privatização”, pois é o que vem fazendo no seu governo, privatizando tudo. Só sei uma coisa, nós, brasileiro, estamos sem opção para votarmos no ano que vem, ao meu ver. Voto nulo.
jaime
… a MÍDIA os acoberta porque faz parte do mesmo sistema. Mas alardeia a distribuição das migalhas aos pobres.
jaime
Não poderia ser mais preciso. E saber que o PT já inspirou livros sobre suas administrações municipais, lá no primórdios. A mulher é economista!! Fracamente, o que é que andam ensinando? Dinheiro do BNDES pra formar “empresários campeões”!! Ohhh! Isso sim é uma inovação: a bolsa empresariado!
A maior produtora de riquezas que existe é a empresa privada. Mas aumente um pouco o zoom: 1º – deixada a iniciativa privada à sua própria sorte, ela é também a maior distribuidora de miséria que existe. Fornece um dono de iate para cada milhão de favelados – se não houver um Estado para intermediar e gerenciar a distribuição da riqueza. 2º – as grandes empresas (as VERDADEIRAMENTE GRANDES – não as pequenas), aquelas ditas e propaladas eficientes, têm sua “eficiência” em grande parte em consequência das benesses que recebem do Estado; detém a propriedade do Estado e o gerenciam por seus prepostos eleitos como políticos. Fruem e usufruem dos impostos pagos pelo cidadão em benefício da acumulação de seu próprio capital e a MÍDIA
assalariado.
Sr. J. Carlos de Assis coloca diz no post que: “Não sabemos para onde o mundo vai. E não sabemos para onde o Governo nos quer levar.” Sim, a social democracia, travestida de socialista, toda vez que desce do muro da história, desce pela direita. Deem um olhada na Europa, a solução encontrada pela chamada 3ª via.
Ora, será que o senhor quer nos passar a ideia de que vivemos numa sociedade criacionista. Portanto, não materialista. Como sabemos o modo de produção capitalista é uma teoria de sociedade matemática uma ciência exata. Onde as classes em luta tem interesses e objetivos econômicos opostos. Ou seja, se uma ganha a outra perde. Sim, é a luta do (CAPITAL X TRABALHO), conhecida também como luta de classes.
Aos mesmo tempo que o senhor diz que não sabe para onde a economia vai, nas linhas posteriores do seu texto, citas varias atitudes econômicas do governo social democrata petista, na linha do tempo. Fala como que a economia mundial e do Brasil estivessem ao deus dará, sem raiz ideológica, dependendo de uma solução extra terrena. Esse tipo de analise é ruim, pois confunde as massas uma vez que como se sabe a ideologia baseada no modo de produção capitalista tem (COMEÇO, MEIO e FIM).
1) (COMEÇO) >> este modo de sociedade onde os donos dos meios de produção, conhecidos também como donos do capital se apropriaram e expropriam as riquezas naturais do planeta (portanto, de todos nós) e, por tabela, por esse intermédio, também (EXPROPRIOU e EXPROPRIA) as riquezas produzidas pelos assalariados e da sociedade como um todo, para acumulação de capital e riquezas produzidas pelo suor coletivo mas, (EXPROPRIADA) pela burguesia capitalista ‘nacional’ e internacional.
2)(MEIO) >> Ora, uma vez os donos do capital se apossam, expropriam um bem comum planetário que, na linha do tempo, se legaliza e se legalizou, através de seu filho dileto, a qual conhecemos como Estado: O que esperar desse cavalo de troia? Ficamos todos reféns de um grupo de proprietários burgueses, que tem como meta única explorar o povo e a nação, segundo seus interesses de lucros para acumulação de riquezas. Para com isso nos manter, a todos, eternamente na condição de explorados por essa nefasta ideologia causadora de todas as guerras, em nome de um suposta democracia.
3) (FIM) >> Observem, as crises são do modo de produção capitalista e não de Estado (governo da vez) como as elites através de seu alto falante PIGuiano tanto nos manipulam. Para Marx, Lênin, Rosa Luxemburgo, Gramsci entre tantos pensadores socialistas, para o capital os fins justificam os meios. O Estado e suas instituições burguesas é o fim em si mesmo é a sua casamata, última fortaleza do capital. São ferramentas e braços a qual os parasitas e as elites se escondem, se camuflam, se dissimulam, boicotam a economia, chantageiam, até dão golpes de Estado, através de seus braços armados, para fazer valer a sua ditadura capitalista, travestida de “Estado de Direito’.
Tudo isso, o governo da governabilidade faz para manter está classe social de 5% da população na condição de exploradores, repressores e mantenedores da ordem, da ordem capitalista. Em contradição com a violência, desordem social e do Estado constituído, a qual o capital se impõe como ideologia e valores sociais de “democracia”.
Socialismo ou Barbárie!
Paulo Agostinho
Completando: o diabo é não entender que, sem abrir canais de investimentos (as PPPs), a taxa de juros (e toda essa macroeconomia madrasta) não vai ser derrubada. Não estamos tratando de “espiritismo”, mas de economia! Eta keynesianismo de araque, esse que anda por aí. Recomendo vivamente que se leia o brilhante Ignácio Rangel para se entender alguma coisa do que se está passando na economia brasileira sob o governo Dilma!
Silvana Magalhães
Azenha, nenhuma palavra sobre o Movimento Passe Livre (MPL)? será que é porque o prefeito é do PT?
Vamos dar uma força ao Movimento Passe Livre, ninguém aguenta pagar essa tarifa de ônibus na cidade de São Paulo.
Cadê as promessas de campanha do prefeito petista?
Mardones
Bem lembrado. É uma oportunidade para discutir o que o PT colocou em prática em termos de política pública para o transporte coletivo nos últimos 10 anos no Brasil. E a proposta da Haddad para São Paulo. Aparentemente, não querem entrar nesse debate. Quando era pedra, o PT tinha solução para quase tudo. Agora que é vidraça, abraça as políticas de direita sem vergonha nenhuma.
Tomudjin
É por isso que eu pensei em sugerir, à Dilma, que não se deixasse levar pelo pelo discurso sazonal do tomate.
damastor dagobé
vc chegou a pensar numa coisa dessas??? como pode ter uma ideia tão ousada, tão radical??? e não pensou nas consequências para a humanidade se tal monstruosidade fosse levada a cabo???ahhh os jovens e sua sede de aventuras…
Marcelo de Matos
É difícil governar o Brasil sem formar coligações. Às vezes é preciso ajustar o que, em princípio, é inajustável. Nem os evangélicos formam um grupo homogêneo. Pesquisa já demonstrou que eles não formam um bloco, mas, muitas vezes, votam de forma bem diversificada. Os gays e índios, citados no PS do Viomundo, também não costumam ter unidade. Cada cabeça de índio ou gay é uma sentença. O governo precisa de coordenação política e jogo de cintura para costurar acordos no parlamento. Formar um bloco parlamentar homogêneo, talvez, só quando o PSOL chegar ao governo.
tiago carneiro
ahahhaah ensaia? Pra mim ela já comecou tucana.
Mineirim
Caramba! Esse P.S. do Viomundo foi demais!
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