Fátima Oliveira: No município, governo de coalização é fracasso

Tempo de leitura: 3 min

O povo lá de cima e o povo lá de baixo: 50 anos depois…

por Fátima Oliveira, no Jornal OTEMPO
Médica – [email protected] @oliveirafatima_

As últimas eleições pautaram discussões acirradas sobre a política de alianças, ou coligações eleitorais. Relembrando que partidos políticos são partes do que pensa uma sociedade, jamais significam ou representam o todo. Nunca é demais refrescar a memória sobre a política de alianças eleitorais ser legítima na democracia. Logo, fazer alianças não é crime.

Criticar alianças é um direito, mas condená-las em si é desconhecer que elas não são um fim, mas um meio para, pois aliança é “ato ou efeito de aliar-se pontualmente para um fim específico e imediato”. Em uma aliança, nenhum partido abre mão do seu programa, pois o acordo é temporário, conjuntural: indicar uma mesma candidatura e eventualmente estabelecer um governo, paritário ou não, de coalizão – acordo político para um fim comum, como governar juntos.

Um governo de coalizão nacional, como pretendeu ser o governo Lula, por exemplo, é desafio inerentemente complicado no presidencialismo brasileiro, em que o cargo de presidir a República assume ares de poder imperial, de reinado e de divindade. No âmbito do município um governo de coalizão é tarefa fadada ao fracasso, por conta das miudezas do cotidiano local e da história de vida de cada ser político.

O “conversê” acima introduz uma memória pessoal. Na noite de 7 de outubro passado, o meu irmão Gil, que mora em Imperatriz (MA), era só alegria ao telefone: “Aqui, o Madeira foi reeleito. A melhor é que, meio século depois, ganhamos as eleições em Graça Aranha: o prefeito é Nilton, filho de Crezo e de Ana”.

Retruquei: “Então, não ganhamos. Dona Terezinha Damasceno, a mãe de Crezo, não era do nosso lado; era do povo lá de cima !”. Ele: “Agora é do povo lá de baixo “.

Meu irmão saiu de Graça Aranha criança; não entendia o que eu dizia. Lamentei com meus botões: “Esperar tanto para eleger um prefeito e nem é um legítimo do povo lá de baixo !”.

Pense numa longa espera: Graça Aranha virou município em 10 de outubro de 1959. Eu estava com 6 anos, mas a nitidez do foguetório à alta madrugada é como se tivesse sido ontem: a notícia foi trazida pelo padrinho Beleza, o chefe político “do povo lá de baixo”, que foi candidato a prefeito na primeira eleição e a perdeu para Nacor Rolim, “do povo lá de cima” – acho que em 1962, já que o município só foi instalado em 18.11.1962. Desde então, “o povo lá de cima” não perdeu eleição para prefeito até 2012, com a eleição de Josenewton Guimarães Damasceno, vulgo Nilton, do PDT, da coligação Agora é a vez do Povo (faltou o “lá de baixo”!), formada por PRB/PDT/DEM/PSB/PSDB/PCdoB/PTdoB).

Traduzindo: no fim da década de 50, a rigor, em Graça Aranha, havia uma rua, a do Comércio (o resto era chamado de “ponta de rua”), onde moravam as pessoas remediadas, dividida politicamente em “lá de cima” e “lá de baixo”, a um ponto que até as crianças eram ensinadas a nem pisar na calçada dos “contras”!

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Nem namoro era permitido entre os “lá de cima” e os “lá de baixo”! É irracional, mas, há poucos anos, uma sobrinha, que nem conhecia Graça Aranha, chegou toda melosa: “Tia, tô namorando fulano de tal, de Graça Aranha”. Não titubeei: “Essa gente não presta! É o que seu avô diria se fosse vivo!”. Meses depois: “Tia, o vovô estava certo: esse povo lá de cima não presta”.

Na cultura política local, pouca coisa deve ter mudado, independentemente de qual partido, pois, lá, partido é mero detalhe sem valor: vota-se, em Graça Aranha, ainda no “povo lá de cima” e “no povo lá de baixo”.

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Comentários

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Arnaldo Marques

Dra. Fátima,
Talvez escreveste sem conhecer que o povo lá de baixo e de lá cima, não passam de um mesmo conluio, se não vejamos em relação ao atual Prefeito eleito, um grande latifundiário, seu pai Crézio vereador/empresário, sempre esteve coligado com um dos ex prefeitos Lino Marques, com o próprio Nacor, citado, sua mãe Ana da tradicional(na cidade) familia Damasceno, de grandes posses, seu irmão o falecido Jínior, foi presidente da Camara, e com contas reprovadas, teve apoio na sua eleição da ex vice prefeita do candidato derrotado Edivânio, em troca de uma secretaria, portanto lá não há divisão, o que há na pequena cidade, sua terra natal, são leões que se aproveitam de recuros federais para assim poderem mostrar poder e engordar suas contas bancárias. Triste daquele que toma partido.

Alberto

Juliano, já que não entendeu a finalidade da crônica, tentarei ampliar a sua compreensão. Em primeiro lugar é a narrativa de uma memória, por conta de uma vitória, a eleição do primeiro prefeito pelo povo lá de baixo. O artigop demonstra como é a política no Brasil profundo típico. Meio século depois da eleição do primeiro prefeito de Graça Aranha, a briga política se centra em dois grupos: os lá de baixo e os lá de cima. A autora ainda nos brinda com uma introdução sobre a política de alianças, por sinal um texto primoroso.

Eline

Eis o que é Graça Aranha-MA:
Mesoregião: Centro Maranhense
Microregião: Presidente Dutra
Área de Graça Aranha: 271 Km²
Habitantes por Km² (2006): 22.95
Pib anual da Cidade (2006): R$ 9.612.000,00
Pib per Capita (2006): R$ BRL 1.545,34
Arrecadação anual em Impostos (ISS, em 2006): R$ 36.000,00
CEP de Graça Aranha: 65785-000
Saúde de Graça Aranha em 2005:
Estabelecimentos de Saúde total => 6

Transportes de Graça Aranha em 2006:
Automóvel – Tipo de Veículo => 31 automóvels
Caminhão – Tipo de Veículo => 10 caminhãos
Caninhonete – Tipo de Veículo => 13 caninhonetes
Micro-ônibus – Tipo de Veículo => 4 micro-ônibus
Motocicleta – Tipo de Veículo => 208 motocicletas
Motoneta – Tipo de Veículo => 47 motonetas
Ônibus – Tipo de Veículo => 2 Ônibus

Juliano

Ô Azenha e tu sabes onde fica Graça Aranha? Lugarzinho sem nenhuma importância, fora que lá nasceram os dois únicos médicos nascidos no lugar até hoje: Fátima Oliveira e Sebastião Madeira, reeeleito agora prefeito de Imperatriz-MA, que pelo que disse o irmão da Dra. Fátima Oliveira era também do “povo lá de baixo”, já que ele estava tão alegre. Enfim, parece que o povo lá de baixo está exilado. Também pudera, meio século de taca, nin guém aguenta. Deixou a cidade pro povo lá de cima; aí virou o que é. Graça Aranha tem 6 140 hab. IBGE/2010. IDH: 0,571.
Do que se sabe até hoje só teve prefeito ladrão. Vamos ver se esse eleito agora tem um pouco de vergonha e não roube.
Mas o que eu gostei mesmo foi da menção da Dra. Fátima ao pai dela para sua sobrinha. Ela falou o que achava, mas arrancou o avô da menina da catacumba para falar em lugar dela. Coisas das famílias mais antigas e de brios do sertão profundo do Maranhão.

Juliano

Não entendi a finalidade do artigo. Sei que são memórias, até bem escritas, mas de resto, sobra o quê?

    Luiz Carlos Azenha

    Ô, Juliano, e precisa tudo ter “finalidade”? abs

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