Erika Hilton: ”Estamos ‘reféns’ das plataformas; para sair do ‘labirinto’, temos que atuar também no território”
Tempo de leitura: 5 minErika Hilton: esquerda está ‘refém’ das big techs e sair desse ‘labirinto’ exige ocupar as ruas
Deputada do Psol cobra mais atuação do campo democrático na redes sociais, embora veja limitação de alcance
Por Lucas Weber, no Brasil de Fato
A deputada Erika Hilton (Psol-SP) foi a única personalidade no meio político que conseguiu fazer frente à onda de fake news que atacaram a medida da Receita Federal que aprimorava a fiscalização sobre o Pix.
O vídeo da parlamentar ultrapassou 100 milhões de visualizações poucos dias depois de ser postado. A publicação foi uma resposta direta ao material postado por Nikolas Ferreira (PL-MG) que trazia desinformação sobre a normativa do governo.
Hilton relata que recebeu uma enxurrada de ataques transfóbicos, misóginos e racistas momentos após a publicação. Um deles citava que a deputada seria alvo de um projeto “Ronnie Lessa 2.0”, fazendo referência ao assassino condenado e preso da vereadora Marielle Franco.
“O ódio, a misoginia e a violência transfóbica e racista com a qual eu fui tratada e sou tratada constantemente nas redes sociais é uma característica do fato de eu ser uma mulher transsexual, negra, ocupando um espaço que os homens acham que deveria ser apenas deles. Tendo a ousadia, como diria Carolina Maria de Jesus, e a coragem de falar aquilo que eu acredito que deve ser falado”, afirma em entrevista ao afirma em entrevista ao programa Bem Viver, que você pode ouvir aqui.
Apesar das ameaças constantes, a deputada defende que é importante a esquerda aprender a se comunicar na internet e combater frente a frente as mentiras disseminadas. Ao mesmo tempo, ela defende que “nossa luta não começa na internet”.
“A nossa luta é real, a nossa luta é no território, a nossa luta é com as pessoas. A internet é um instrumento poderoso e precisa ser usado por nós também para ampliar a nossa voz e para nos ajudar a chegar e alcançar cada vez mais espaços”, defende.
“A nossa atuação também precisa estar para além das redes sociais. É isso que vai nos sustentar diante dessa era trevosa que nós vamos passar daqui pra frente.”
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Confira a entrevista na íntegra
Brasil de Fato: A senhora segue recebendo ameaças e ataques por conta do vídeo publicado combatendo as fake news do Pix?
Érika Hilton: Infelizmente as ameaças seguem chegando e essa é uma demonstração do que é o Brasil da barbárie, do ódio, da intolerância.
O vídeo que eu produzi é uma resposta a um vídeo produzido por um outro outro parlamentar, que viralizou também. [Mas], seu vídeo não recebeu nenhuma onda de ameaças de morte ou ataques à sua pessoa. Teve contrapontos, pessoas dizendo “isso é mentira, fake news, isso não é verdade”.
Do lado de cá, ao tentar trazer a verdade e expor os pontos que para nós são essenciais, nós fomos tratadas com a brutalidade e a violência que vocês puderam acompanhar, sejam através das ameaças de morte e exaltações a projetos de execução como “Ronnie Lessa 2.0”, como tiveram a coragem de dizer que era preciso fazer comigo.
Mas a vida me preparou muito para estar no lugar onde eu estou hoje. Ser uma mulher como eu, negra e travesti no primeiro país do mundo que nos mata, último a abolir a escravidão e com tantas reparações a serem feitas, é como se fosse uma espécie de preparatório para sobreviver a todo este ódio que a gente enfrenta na política.
Então, estou bem. Estou tomando todas as medidas cabíveis para que esses criminosos, bandidos, sejam responsabilizados, encontrados e paguem pelos seus atos e sigo do lado certo da história, que é a verdade, que é colocar os fatos da maneira como eles devem ser apresentados, sem manipulação das ideias, sem tentar induzir ao erro ou sem tentar mascarar a verdade para confundir aquele ou aquela que acessa a informação.
Como lidar com o fato de que as redes sociais são comandadas por bilionários que demonstraram alinhamento com a extrema direita, principalmente na figura de Donald Trump? É um túnel sem saída para esquerda?
Nós estamos, sim, num labirinto, eu não diria um túnel sem saída, em algum lugar tem que haver saída. Concordo que estamos reféns dessas grandes empresas de comunicações, porque é através dessas plataformas que nós nos comunicamos.
É muito difícil que a gente consiga pensar algo que o caminho seja “não usemos mais essas plataformas”. Isso pra mim é inviável, não é possível, porque significaria abandonar esse território para que ele vire essa terra de conspiração, fascista, odiosa, escrota que eles querem transformar.
Então, de fato, nós temos um cenário muito difícil, porque nós sabemos que esses algoritmos serão manipulados para fortalecer as ideias que eles querem que se fortaleçam e enfraquecer as ideias que eles querem que enfraqueçam, mas nós precisamos nos manter ativo nas redes, tentando driblar essa manipulação do algoritmo e lembrando que a nossa luta não começa na internet.
A nossa luta é real, a nossa luta é no território, a nossa luta é com as pessoas. A internet é um instrumento poderoso e precisa ser usado por nós também para ampliar a nossa voz e para nos ajudar a chegar e alcançar cada vez mais espaços.
A nossa atuação também precisa estar para além das redes sociais. É isso que vai nos sustentar diante dessa era trevosa que nós vamos passar daqui pra frente
Quais são as expectativas para a PEC que combate a escala 6×1?
Olha, nós não protocolamos o texto ainda em 2024 por conta da presidência da CCJ, que era bolsonarista raiz e uma mulher muito preocupante do ponto de vista da política dos direitos humanos, das minorias sociais e tudo mais.
Então nós preferimos segurar esse protocolo, porque nós tínhamos a sensação, eu tinha certeza, de que se nós protocolássemos naquele momento a CCJ iria dar um jeito de indicar um relator péssimo e destruir o projeto logo ali.
Esse ano há a possibilidade de que a Comissão de Constituição e Justiça não esteja radicalizada da maneira como esteve no ano passado. E a nossa ideia então é protocolar o texto, conversar com o presidente da CCJ, para tentar a indicação de um bom relator para esse texto, e procurar o presidente da casa, que provavelmente será o deputado Hugo Motta (Republicanos-PB).
Essa é a nossa pretensão. Talvez não consigamos, neste ano, aprovar já de imediato, mas que a gente consiga avançar tanto no protocolo, quanto na Comissão Especial e nas articulações que são necessárias.
Voltando aos ataques que a senhora vem recebendo. Como você imagina que seria a repercussão caso aquele vídeo tivesse sido feito por um parlamentar colega seu, mas um homem branco, por exemplo Guilherme Boulos? Os ataques seriam na mesma intensidade?
Olha, é muito difícil a gente achar que homens brancos de classe média ou homens brancos de maneira geral sofreriam o mesmo tratativo que uma mulher negra travesti, isso jamais aconteceria.
Obviamente que os ataques aconteceriam, as ameaças poderiam acontecer. O Guilherme Boulos, por exemplo, como você citou, na campanha para prefeito, precisou revisar sua segurança, porque sofreu uma série de ameaças, mas ninguém falou das suas características físicas.
É muito diferente a maneira como nós somos tratados.
Os ataques e a violência são outros, porque a maneira como se nutre o ódio sobre os grupos também são outros, e nós somos um grupo gratuitamente, profundamente odiado, intolerado, que está aqui tratado para ser morto, linchado, e é esse o tratamento que eu sinto que recebi nas redes sociais.
É uma tentativa de morte do sujeito, da subjetividade. Então eu acho que isso não acontece com os homens brancos, porque acho que eles têm a capacidade de se representar no todo e a sua identidade é respeitada e validada.
Isso acontece com grupos que são tratados como menos dignidade, com identidades que não são validadas, não são respeitadas e podem facilmente ser atacadas porque são frágeis diante do olho da sociedade.
Então, não acho que isso aconteceria, como não acontece. O ódio, a misoginia e a violência transfóbica e racista com a qual eu fui tratada e sou tratada constantemente nas redes sociais, é uma característica do fato de eu ser uma mulher transsexual negra, ocupando um espaço que os homens acham que deveria ser apenas dele, tendo a ousadia, como diria Carolina Maria de Jesus, e a coragem de falar aquilo que eu acredito que deve ser falado.
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Comentários
Zé Maria
Entidades Sindicais Entram com Ação Judicial Contra
Demissões em Massa da Corsan Privatizada
Sindicatos das Categorias dos Trabalhadores
na Área de Tratamento de Águas e Saneamento pedem a Suspensão das Demissões Imotivadas
Integra em:
https://www.brasildefators.com.br/2025/01/23/entidades-sindicais-entram-com-acao-na-justica-pela-suspensao-de-demissoes-da-corsan
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