Alexis Tsipras, líder oposição opositora grega, defende a criação de um novo Plano Marshall para a Europa. Foto: Vitor Sion/Opera Mundi
Em meio à série de cortes que o governo grego aplicou para tentar sair da crise econômica, surgiu neste ano, nas eleições gerais de junho, uma voz divergente. Aos 38 anos, o líder da coalizão opositora Syriza, Alexis Tsipras, por pouco não desbancou o primeiro-ministro Antonis Samaras com a proposta de parar com as medidas de austeridade.
Em visita ao Brasil durante esta semana, quando se reuniu com dirigentes de quatro partidos da esquerda do país, Tsipras concedeu entrevista exclusiva ao Opera Mundi. Ao falar sobre um eventual governo sob sua liderança, hipótese que considera “provável” para 2016, o jovem político grego defende a criação de um novo Plano Marshall para a Europa, com fortes investimentos públicos para diminuir o índice de desemprego.
Assim como na campanha do primeiro semestre deste ano, Tsipras não defende a saída da Grécia da Zona do Euro. Mas alerta que, se o governo grego adotasse essa alternativa, a Alemanha também deixaria a moeda comum “no dia seguinte”.
Leia a entrevista completa, na qual o opositor de Samaras faz críticas à chanceler alemã, Angela Merkel, e prega a união dos países do sul da Europa.
Opera Mundi: Como líder da coalizão opositora na Grécia, qual a importância de vir à América do Sul para se reunir com partidos de esquerda de Brasil e Argentina?
Alexis Tsipras: É uma ação simbólica e de grande importância. A América do Sul e a Europa são muito diferentes, principalmente devido às características da União Europeia. Logo, é difícil copiar qualquer tipo de modelo bem-sucedido daqui. No entanto, a imprensa e políticos conservadores europeus costumam dizer que não há alternativa além das medidas de austeridade. E vários países sul-americanos, como Brasil, Argentina, Bolívia e Venezuela, têm adotado práticas contra essa corrente e mostrado que há solução, sim, sem que a população precise perder a dignidade.
OM: E na Europa? Qual a possibilidade de se fazer alianças na esquerda, com partidos que rechaçam as medidas de austeridade?
AT: Na Europa não é muito fácil fazer alianças neste momento com outro governo. Mas seria muito importante formar alianças com outros partidos de esquerda, com o objetivo de combater o neoliberalismo. Mantemos um contato muito próximo, por exemplo, com Jean-Luc Mélenchon [candidato da Frente de Esquerda nas eleições presidenciais francesas], mas ele não está no governo. Cm isso, fica difícil implementar as medidas que desejamos.
OM: Qual o balanço que vocês fazem das eleições deste ano? O crescimento foi um sucesso ou não ter chegado ao poder por tão poucos votos foi considerado um fracasso?
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AT: Em termos gerais, foi um fracasso, porque estivemos muito perto de vencer e acabamos perdendo por pressão da mídia e das forças capitalistas. Em uma análise mais minuciosa, foi uma grande vitória, pois saímos de 4% para quase 30% [nas eleições de junho, o Syriza obteve 26% dos votos].
O ponto é que, mesmo com o nosso avanço, quem mais perdeu foi a população grega. O atual governo prometeu interromper as medidas de austeridade. Eles não cumpriram a promessa e esse é um dos motivos pelos quais estão perdendo apoio entre os gregos e no Parlamento, onde já não têm maioria absoluta. O problema é que, pela Constituição, eles ainda ficarão no governo por mais 3,5 anos. Se o governo deles continuar com essas medidas, não teremos mais um Estado grego para governar em 2016.
OM: Além do crescimento da Syriza, a última eleição na Grécia também apresentou um aumento no número de eleitores do partido neonazista Aurora Dourada. Qual a avaliação que o senhor faz deste grupo? Quais são os riscos?
AT: É um fenômeno muito perigoso. Estamos insatisfeitos com esse crescimento, pois os nazistas mataram muitos gregos na Segunda Guerra. Esse aumento só pode ser explicado pela crise social e pela situação econômica que vivemos. Temos que proteger a população e nosso sistema político deles, porque a agenda é passar por cima dos outros, principalmente dos imigrantes.
Antes das eleições, um dos líderes do Pasok [que faz parte da coalizão governista] veio me dizer que estava triste com o avanço do Aurora Dourada. E então eu respondi: “Não fique triste, porque vocês são responsáveis por isso, com a implementação das medidas de austeridade”.
OM: Durante a última campanha eleitoral, o senhor defendeu o fim das medidas de austeridade e a manutenção da Grécia na Zona do Euro. Qual a melhor alternativa defendida pela coalizão para diminuir as taxas de desemprego?
AT: O ponto crucial é interromper as medidas de austeridade. Quando uma pessoa está doente e seu estado de saúde piora mesmo tomando remédio, você tem que mudar o remédio. Renegociar a nossa dívida com as instituições responsáveis. Não só nós devemos fazer isso, mas os outros países do Sul da Europa também. Defendo uma espécie de novo Plano Marshall, com investimentos maciços do setor público para criar empregos. Não é uma solução fácil, mas seria importante ter um governo que resistisse e fizesse isso na Europa. O Syriza pode ser a chama que vai reacender a Europa.
OM: Recriar uma moeda nacional na atual conjuntura é uma alternativa, diante da inflexibilidade da Alemanha?
AT: A Grécia é um país pequeno e sua economia não representa mais que 4% da União Europeia. Por que fazem tanto barulho por causa da Grécia? Por que os outros países simplesmente não seguem em frente, independentemente da nossa decisão? Com certeza não é porque eles são pessoas legais e amáveis. É porque eles não podem fazer isso e dependem de alguma forma de nós. De qualquer maneira, seria muito difícil sobrevivermos sozinhos, não só para nós, mas para qualquer país europeu. Mas, se a Grécia decidir sair da Zona do Euro, tenho certeza que a Alemanha também sairá, no dia seguinte.
OM: Sobre a Alemanha, você acha que Angela Merkel pode perder as próximas eleições, em 2013?
AT: Não. Se eu pudesse escolher, votaria em Peer Steinbrueck [do Partido Social Democrata], mas acho que não faria muita diferença. Todos têm a mesma política na Alemanha. Independentemente de quem ganhar, o outro lado pode fazer parte da coalizão. O verdadeiro inimigo de Merkel não está dentro da Alemanha. O inimigo dela somos nós, do Syriza.
OM: O que o senhor acha de Portugal, Itália, Grécia e Espanha serem tratados como PIGS por parte da imprensa mundial?
AT: Sem dúvida, não é uma expressão educada, mas temos que admitir que estamos todos no mesmo barco, com a indispensável necessidade de tentar brecar o neoliberalismo. Por isso a importância de fazermos alianças. Temos os mesmos interesses. Merkel e a Alemanha não querem um sonho europeu, com todos os países bem. Eles só querem uma união germânica com a qual têm muito a ganhar.
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Comentários
RicardãoCarioca
Duvido que a Alemanha sairia do Euro por causa da Grécia.
Aline C Pavia
Também acho que a Alemanha está c*** e andando para a Grécia.
francisco niterói
A alemanha conseguiu com o euro aquilo que Hitler tentou com as armas: dominar a europa.
Nao que eu seja contra o euro, muito pelo contrario. Mas a moeda unica foi desvirtuada para ser gancho de financistas e politicas neoliberais.
Deu no que deu.
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