Eliara Santana: No JN, centro limpinho e cheiroso, esquerda demonizada e as construções para 2022
Tempo de leitura: 5 minPor Eliara Santana
COMEÇA 2022 – CENTRO SIMBÓLICO E OS DERROTADOS À ESQUERDA E À DIREITA
Por Eliara Santana*
O Balanço do segundo turno das eleições municipais no JN evidenciou aquilo que já vinha se delineando em termos do discurso midiático: a construção simbólica de uma ideia de centro e a eliminação de polos – à esquerda e à direita.
Obviamente, o contexto é bastante dinâmico, sobretudo no Brasil, mas essa ideia de centro será o mote que vai orientar a construção da narrativa para 2022, não tenho dúvida.
Simbolicamente, o centro projetado pelo discurso midiático será aquele capaz de aglutinar de ACM Neto a Luciano Hulk, passando por Rodrigo Maia, Eduardo Paes, Bruno Covas, Joao Doria e Sergio Moro, apenas para citar alguns.
Não haverá qualquer tipo de nuance, e a ideia central será a de que esse espectro busca o equilíbrio, a acomodação, o progresso do país, defende a ciência, é contra radicalismos, pois o brasileiro está cansado e quer a rotina de volta.
Esse grande espectro que canaliza o desejo nacional, portanto, elimina a ação e atuação dos polos – esquerda e direita –, que não cabem mais nessa proposta equilibrada de reconduzir o Brasil à linha da civilidade e do progresso.
Portanto, raramente ouviremos mais referências a um “Centrão”, essa ideia perniciosa, ou conceitos como centro-direita.
Tudo é Centro, tudo é equilíbrio, foi esse o recado das urnas.
Esse centro ressignificado será o novo grande repertório – ao lado da corrupção, que não vai desaparecer, mas pode perder força – na narrativa da retomada da reconstrução nacional pós-pandemia e com vistas a 2022.
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E a edição do JN de ontem (30-11) marca muito bem esses novos arranjos no jogo e essa nova arquitetura da narrativa do discurso midiático (pensando na relação do discurso com o contexto, na forma de levar os conceitos e os fatos, na reconstrução das cenas e dos atores políticos).
Algumas sinalizações são basante expressivas:
1 PLACAR DE BOLSONARO FOI NEGATIVO
Para essa nova ideia de centro vingar, esse ator incômodo precisará ser “eliminado”, ou seus efeitos, atenuados.
Jair é fruto também da articulação desses núcleos de poder, imprensa corporativa incluída, para afastar o PT do poder.
Cumpriu em parte sua função, começa a se soltar demais e precisará ser reconduzido à insignificância de onde veio.
Será difícil porque ele gostou muito de brincar de ser presidente e não vai sair do play. Aposto em capítulos interessantes na novela.
Na edição de ontem, o JN sedimentou essa ideia da derrota de Jair – “Placar de Bolsonaro foi negativo”, com uma reportagem ampla mostrando as movimentações do presidente no primeiro turno e suas “derrotas acachapantes”, na ideia de que o apoio do presidente Bolsonaro não se reflete nas urnas.
“Nas capitais, ele tinha 4 candidatos; três perderam”, e a sequência mostra os candidatos e as derrotas.
Prossegue a reportagem: “O apoio de Bolsonaro, que nas eleições de 2018 foi decisivo, agora perdeu força. Especialistas afirmam que as críticas ao isolamento durante a pandemia geraram resistências e incertezas nos eleitores. E que, por isso, eles escolheram candidatos moderados, rejeitando extremos e optando pelo equilíbrio”.
Observem aí o funcionamento do discurso na colocação das ideias de rejeição de extremos e opção pelo equilíbrio, sempre segundo especialistas, esses sujeitos ocultos que definem conceitos importantes no discurso midiático.
2 “É POSSÍVEL FAZER POLÍTICA SEM ÓDIO”
Essa foi a fala de Bruno Covas, um novo ator com destaque no roteiro de centro, sintetizando o que aprendeu na campanha e relembrando o avô, Mario Covas.
Obviamente, o mote “política sem ódio” já está lançado e cumprirá um papel relevante tanto na desconstrução da esquerda quanto na desconstrução da direita (a extrema-direita que incomoda, pois o restante se tornou “centro”).
E além de não ter ódio, o centrista raiz precisa mostrar que obedece a ciência e pensa na população.
Portanto, o destaque anuncia: “Após eleições, Bruno Covas faz reunião com secretariado para discutir pandemia”.
Pandemia que, durante a campanha, estava controlada em São Paulo e, curiosamente após o resultado favorável, recrudesce de forma tão imediata.
Mas o que interessa é que o prefeito que não faz política com ódio e obedece a ciência, além de distribuir cesta básica durante a campanha, já se prontificou a trabalhar para resolver o problema. O centro faz assim.
Destaque também para o ex-prefeito e novamente eleito Eduardo Paes, no Rio. A tônica do discurso foi bastante semelhante à fala de Bruno Covas, chamando ao diálogo, para combater a pandemia etc.
Outro que mereceu espaço à parte foi João Campos, do PSB, devidamente registrado tomando café da manhã ao lado da amada e sorridente Tábata Amaral.
Cena fofa dos cidadãos de bem. Ele falou dos planos, dos desafios, da reconstrução de Recife. Mas nenhuma perguntinha sobre as fake news na campanha.
3 “DERROTADOS: À ESQUERDA, LULA; À DIREITA, BOLSONARO
Lula é o outro ator que precisa ser definitivamente afastado da novela para que o roteiro de centro dê certo.
O vaticínio da derrota à esquerda deflagra isso. A depender dos movimentos, o repertório corrupção voltará com força.
Na reportagem sobre a nova configuração de forças, ficou clara a grande constatação que vai nortear os discursos midiáticos:
“Segundo analistas, o grande vencedor das urnas este ano foi o centro. No balanço das eleições, foram derrotados, à direita, Bolsonaro, e à esquerda, Lula”.
Retorna portanto a construção, no plano da narrativa, de que os dois se equivalem em polos opostos – são radicais em igualdade de condições, pouco importando as nuances
. Essa construção dos polos radicais que se equivalem começou a ser feita em meados de 2018, no primeiro semestre, antes da greve dos caminhoneiros (em maio de 2018), exatamente colocando Bolsonaro e Lula como os radicais dos polos que precisavam ser eliminados. Está voltando.
4 MUDA A RELAÇÃO DE FORÇAS ENTRE OS PARTIDOS
“Os partidos de linha ideológica de centro foram os maiores vencedores nessas eleições municipais”, anuncia Renata, com um sorriso de quase alívio.
A reportagem de 4 minutos passa a mostrar então os vencedores “de centro” – DEM, PSD, PP, REPUBLICANOS, PP, MDB – numa tabela que tem também o PSDB, que perdeu prefeituras.
E, em destaque a constatação: “O PT foi o grande derrotado nessa eleição. Pela primeira vez desde a redemocratização, não elegeu nenhum prefeito de capital e perdeu 71 prefeituras. Caiu de 254 para 183. Mas nomes de outros partidos de esquerda ganharam protagonismo”.
E foram mostrados os exemplos de Boulos em São Paulo, Edimilson em Belém e Manuela em Porto Alegre.
Pela voz de autoridade do cientista político José Álvaro Moisés aparece a perspectiva de centro-direita e centro-esquerda – do PSDB, MDB ao PDT –, cujos partidos são os chamados a “dialogar”, a buscar “algum nome, ou alguns nomes que sejam capazes de empalmar essa perspectiva e oferecer uma alternativa nova aos eleitores”.
Estou ansiosa pra ver a “alternativa nova” (sic) vinda do MDB…
Ou seja, são essas agremiações as que se dispõem ao diálogo na busca pela reconstrução do país no pós-pandemia.
Segundo a reportagem, “o recado dos eleitores é que existe espaço nos partidos de centro-direita e centro-esquerda para o diálogo”.
5 MORO FOREVER
O ex-juiz, ex-ministro e atual advogado não apareceu na edição, mas não está esquecido.
O silenciamento positivo vai operar – como no caso da nova atribuição de Moro (que vai trabalhar em consultoria que presta serviços para a Odebrecht…), que não mereceu nem alguns segundinhos na edição do JN.
E Moro continuará ali como o herói ilibado na luta contra a corrupção – sempre uma função relevante para 2022. Sem contar os bate-papos com Luciano.
A novela “Rumo a 2022 com o centro e sem radicalismos” começou. Aguardemos os próximos capítulos…
*Eliara Santana é jornalista e doutora em Estudos Linguísticos pela PUC/MG
Eliara Santana
Eliara Santana, jornalista, doutora em Estudos Linguísticos, pesquisadora do Observatório das Eleições.
Comentários
Zé Maria
As Ameaças à Deputada Federal Talíria Petrone (PSOL=RJ)
Quem é “Capo di Tutti Capi”, no Rio de Janeiro e no braZil?
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“A Violência Política no Brasil Caminha para Inviabilizar a Democracia”
Por Silvio Almeida*
Talíria Petrone, deputada federal pelo PSOL-RJ, relata
que foi notificada de pelo menos seis planos que tinham
como objetivo seu assassinato.
De acordo com a deputada, as primeiras ameaças datam de 2016,
quando foi eleita vereadora da cidade de Niterói.
Já eleita deputada federal, Petrone foi oficialmente informada
pela Polícia Civil do Rio de Janeiro que, em junho deste ano,
foram interceptadas mais de cinco gravações planejando sua morte.
Além de devastar a vida pessoal de quem as recebe, ameaças de morte
a parlamentares podem significar que a violência política no Brasil
ruma a um novo patamar.
Ao que tudo indica, estamos diante da consagração definitiva da
ameaça e do assassinato como peças centrais da política institucional.
Em teoria, instituições têm a função de manter sob controle o
potencial destrutivo do conflito político.
Nesse jogo institucional, o opositor se torna adversário, e não inimigo,
e grupos divergentes são tratados como “oposição” e não como “facção”.
A situação de Talíria Petrone pode ser o balão de ensaio para que se
impeça a livre participação política, sem suprimir o voto, ou mesmo a
possibilidade de ser eleito.
Quando alguém que almeja a vida política é ameaçado, forçado ao
exílio ou assassinado sem que isso gere grandes consequências, o
recado me parece evidente: nem tente se candidatar, mas caso se
candidate, não vai ganhar; e se ganhar, não termina o mandato.
É bom que se diga que Talíria Petrone não aparece sozinha no quadro
da violência política no Brasil.
O caso mais emblemático de nossa história recente — o Assassinato
da Vereadora Marielle Franco em março de 2018 — segue sem resolução.
Após desistir de assumir seu terceiro mandato, Jean Wyllys optou por
deixar o Brasil devido a constantes ameaças.
A escolha do ex-deputado não é sem razão se analisarmos os dados
sobre violência politica no Brasil.
Segundo pesquisa das organizações Terra de Direitos e Justiça Global,
o Brasil registrou, desde 2016, 125 casos de assassinatos e atentados
contra políticos.
Qualquer cidadão ameaçado deve ser motivo de indignação, repulsa e,
mormente, abertura de investigação.
Entretanto, o Brasil é um país em que é muito fácil matar ou fazer
desaparecer alguém, especialmente se a pessoa é negra ou pobre.
Segundo pesquisa do Instituto Sou da Paz, 70% dos homicídios
no Brasil não são solucionados.
Em um quadro como esse não há que se falar sequer em democracia
formal.
Estamos vivendo um grande processo de negação, quase um delírio
coletivo.
É um país que caminha para uma delinquência sistêmica, que mata,
deixa morrer e que é incapaz de cumprir as próprias leis, como evidencia
a situação carcerária e seus milhares de presos sem condenação.
Mais não se poderia esperar de um país em que o presidente e o vice-
presidente tomam como exemplo de brasileiro um notório torturador
[Carlos Alberto Brilhante Ustra]*.
É difícil surgir um cenário de valorização da vida quando parte da
imprensa e do empresariado abre mão de qualquer compromisso
com o país e tenta transformar um presidente que já afirmou que
sua “especialidade é matar” em um moderado, por interesse na
manutenção de uma determinada agenda econômica.
É importante que fique registrado para o futuro: autoridades brasileiras, ao negligenciar a violência política, tornam-se jurídica e moralmente responsáveis pelos desdobramentos de tais ameaças na vida pessoal dos indivíduos, bem como por todos os prejuízos causados à sociedade brasileira.
*Silvio Luiz de Almeida é Advogado; Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo-SP, e da Universidade Presbiteriana Mackenzie;
Professor Convidado da Universidade de Duke;
Doutor e Pós-Doutor em Filosofia e Teoria Geral do Direito (USP);
Bacharel e Mestre em Direito (Mackenzie) e em Filosofia (FFLCH-USP);
Presidente do Instituto Luiz Gama e
Consultor Técnico da Federação Quilombola do Estado de São Paulo
e na Área de Ações Afirmativas, Políticas Públicas e Compliance
Antidiscriminatório.
Autor da Obra “Racismo Estrutural” (Editora Pólen).
*[O Coronel da Reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra foi condenado,
em 3 Instâncias Judiciais (Processo Nº 0347718-08.2009.8.26.0000),
por Seqüestro e Tortura praticados nos anos de 1972 e 1973, quando, ainda Capitão, exercia a Chefia do DOI-CODI do II Exército (SP), no
período da Ditadura Militar no Brasil (1964-1985):
(https://www.oab.org.br/noticia/14836/juiz-condena-coronel-ustra-por-sequestro-e-tortura)
(https://tj-sp.jusbrasil.com.br/noticias/100029802/tjsp-confirma-decisao-que-reconhece-coronel-brilhante-ustra-como-torturador)
(https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/165437937/recurso-especial-resp-1434498-sp-2013-0416218-0)]
https://www.camara.leg.br/noticias/217381-conselho-de-etica-decide-arquivar-processo-contra-bolsonaro/
https://ambito-juridico.jusbrasil.com.br/noticias/112029631/conselho-de-etica-aprova-arquivamento-de-processo-contra-jair-bolsonaro
https://www.redebrasilatual.com.br/politica/2016/04/bolsonaro-homenageia-torturador-em-seu-voto-pelo-impeachment-2649/
https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2016-11/conselho-de-etica-arquiva-processo-contra-bolsonaro-por-apologia-tortura
https://www.dw.com/pt-br/deputado-entra-com-representa%C3%A7%C3%A3ocontra-mour%C3%A3opor-elogios-a-ustra/a-55289609
Zé Maria
FreiKorps braZil
Comandos de Caça aos Comunistas (CCC), Esquadrões da Morte,
Grupos de Extermínio, Milícias Nazifascistas estão livres e soltos.
Zé Maria
Entrevista: Deputada Federal Talíria Petrone (PSoL=RJ)
Perseguida Política e Ameaçada de Morte,
teve de se mudar do Rio de Janeiro e enfrenta
o desafio de cuidar da filha de quatro meses,
manter a organização da casa com o marido
e participar de sessões da Câmara.
| Reportagem: Fabiana Batista | Colaboração para Universa: (https://t.co/QL2S2hzUF4) |
No dia 25 de setembro, a deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ),
35, enviou uma carta de denúncia à ONU relatando ameaças a sua vida.
Apesar de ainda não ter obtido retorno da entidade, o Parlamento do
Mercosul aprovou uma moção em seu apoio.
E, em documento, pede que o governo brasileiro tome medidas
concretas para garantir a segurança da congressista.
Eleita a vereadora mais votada de Niterói em 2016, a professora
de história, negra e feminista ganhou mais de 100 mil votos em 2018
quando se candidatou a deputada federal em 2018, defendendo
o legado da amiga e colega de partido Marielle Franco, vereadora
assassinada no Rio também em 2018.
Por medida de segurança, a deputada se mudou do
Rio (e, pelo mesmo motivo, prefere não revelar pra onde),
com a família em meados de setembro e enfrenta
o desafio de cuidar da filha de quatro meses,
Moana Mayalú, manter a organização da casa
– tarefas que compartilha com o marido – e
participar de sessões do plenário da Câmara.
Pergunta: Você recebe ameaças desde que se tornou vereadora
em Niterói (RJ). O que aconteceu de diferente dessa vez?
Por que decidiu recorrer à ONU?
Talíria Petrone: Ainda quando era vereadora, houve uma série de
ligações para a sede do PSOL com ameaças contra a minha vida.
Em uma delas, a pessoa afirmou que tinha o objetivo de “jogar uma
bomba na piranha que o PSOL elegeu”.
No entanto, naquela época, nós compreendemos que as ameaças
eram suscitadas por grupos organizados da cidade e que, de alguma
maneira, conseguiríamos monitorar.
Quando a Marielle foi assassinada, essa percepção mudou, e passamos
a entender que as violências que eu vinha sofrendo poderiam resultar
em ações mais graves contra a minha vida.
Por isso, dias depois do assassinato dela, eu passei a ter escolta da
Polícia Militar, que durou até o primeiro dia da campanha eleitoral
daquele ano.
Já como deputada, outra ameaça fez com que a escolta da polícia
legislativa fosse necessária.
Mas, em meados do ano passado, o então governador do Rio, Wilson
Witzel, recusou que eu recebesse escolta.
A decisão de recorrer a ONU é por identificar que há riscos objetivos
contra a minha vida. Mas não só. A falta de resposta sobre quem
mandou matar Marielle, o aumento do domínio armado das milícias
nos territórios cariocas e, sobretudo, um país em que há uma crescente
violação dos direitos humanos colocam também a vida de outros
ativistas em perigo.
A ONU ainda não retornou. O Estado do Rio nos acionou, mas propõe
garantir a minha proteção apenas para as agendas oficiais no Estado,
medida avaliada por profissionais como insuficiente. Pois, além das
viagens oficiais, eu vou ao Rio para fins pessoais. E, se há riscos de eu
ser executada, não é apenas durante o meu trabalho, não é?
Pergunta: Logo depois que Marielle foi assassinada, você teve sua primeira escolta feita pelo Estado e foi criticada por isso.
Qual a diferença entre defender uma segurança pública
desmilitarizada e ser acompanhada por seguranças armados?
Talíria Petrone: Eu não defendo que um policial esteja desarmado,
mas que haja controle efetivo de armas e munições. A situação do Rio
é alarmante. Há fuzis espalhados por toda cidade, pelo comércio ilegal
de drogas, pelas milícias e por policiais que os ostentam na janela do
carro. Ao contrário desse cenário, eu defendo uma polícia integrada
com outros serviços, pois segurança é um direito assim como saúde,
educação e emprego.
Dito isso, não é contraditório defender a necessidade de uma escolta armada para proteger a minha vida e, ao mesmo tempo, reivindicar outro modelo de segurança pública.
O tema que me leva a essa situação são exatamente as denúncias que
faço contra a violência policial nas favelas e o aumento das milícias nos
territórios. Garantir a minha segurança é a forma de certificar que eu
cumpra um mandato para o qual fui eleita com mais de 100 mil votos.
Pergunta: Você saiu do Rio na última semana.
O que te levou a tomar essa decisão?
Talíria Petrone: Quando as denúncias passaram a identificar detalhes
sobre planos contra a minha vida, não encontrei esforços suficientes
do poder público para garantir minha segurança. Não há, por exemplo,
uma análise de risco dos órgãos competentes para direcionar quais
medidas são necessárias para a minha proteção. Diante disso, fui
orientada por especialistas a sair do estado.
Pergunta: Acha que as ameaças que vem sofrendo e o que aconteceu
com Marielle podem impedir outras mulheres, e principalmente
mulheres negras, de entrarem na política e de se candidatarem
por medo?
Talíria Petrone: Não tenho a menor dúvida. O nível de violência política que os corpos de mulheres, especialmente de mulheres negras, experimentam quando ocupam a política é muito grande. Eu, por exemplo, sou criticada pelo modo de me vestir e fala. Já ouvi que a política não é para mim. Além disso, sou ofendida nas redes sociais e por colegas da casa legislativa. Já fui chamada de louca, barraqueira e burra. Eu sou mestre, professora, e eles me chamam de burra, acredita? Essas são formas de imprimir nos corpos de mulheres negras a negação daqueles espaços. São ofensas que podem se agravar e levar à morte, como foi com Marielle.
Pergunta: Como foi o parto em meio à pandemia?
Teve medo de ir ao hospital e se contaminar ou ao bebê?
Talíria Petrone: Pude optar por um parto domiciliar e estava empolgada.
Fiz comida para as parteiras e meu companheiro estava comigo.
No entanto, depois de 12 horas de trabalho de parto, foi constatada
pressão alta e precisei ser encaminhada para o hospital. A ideia de parir
em um hospital em tempos de covid-19 me deu muito medo de morrer,
já que hipertensão é comorbidade para o coronavírus. Entrei em pânico.
Mas foi um alívio quando, mesmo fora de casa, consegui ter um parto
tranquilo, com uma equipe que assistiu Moana e a mim muito bem.
Apesar do medo, foi a experiência mais linda que eu já vivi.
Infelizmente, essa não é a realidade de todas as mulheres.
Na mesma época, uma situação me chocou: uma mulher gestante
dormiu na fila para conseguir garantir os documentos e solicitar o
auxílio emergencial.
Não posso imaginar como é viver uma gestação sem comida na mesa
e que, em meio a uma pandemia global, você precise se arriscar para
garantir um auxílio que é seu por direito.
Pergunta: Agora que se tornou mãe, sua vida na política pode tomar
outro rumo?
Talíria Petrone: Na prática, a minha vida na política já mudou.
Ser mulher, mãe, trabalhadora e ter uma licença-maternidade de
apenas quatro meses é vergonhoso, uma vez que a OMS orienta a
amamentação exclusiva de seis meses. Vivenciar a realidade da
maternidade tem me dado mais certeza da urgência de priorizar as
políticas que ampliem os direitos das mulheres, mães e crianças.
Nós temos, por exemplo, um projeto de lei para aumentar a licença
parental para dois anos, no qual o cuidado do bebê é compartilhado
entre os responsáveis.
Pergunta: Como tem sido a vida como parlamentar nessas primeiras
semanas, após a licença-maternidade?
Talíria Petrone: O cotidiano tem sido muito difícil. Eu acordo – quando
durmo – no mesmo horário da minha filha: às 6h.
Leio as notícias, verifico as demandas do mandato e, nos dias que tem
sessão, me organizo para participar. Faço reuniões, me reúno com
movimentos sociais e participo de agendas de campanha.
Apesar do Felipe [Rimes], 29, meu companheiro, compartilhar o
cuidado da nossa pequena, a amamentação é exclusiva e de hora em
hora.
Por isso, é um dia inteiro com a bebê no colo. Com esse cotidiano
frenético, passei a entender porque muitas mulheres que são mães
não se propõem a exercer um cargo na política. Eu já chorei de exaustão
e fiquei na dúvida se dou conta das responsabilidades como deputada.
Além de ter de lidar com as tarefas de casa, o cuidado com a minha
filha e os trabalhos do mandato, as ameaças das quais sou vítima me
deixam ainda mais tensa e amedrontada.
Pergunta: Entre os 513 deputados federais, apenas 13 são negros.
Há diálogo entre vocês?
Talíria Petrone: Essa é uma pergunta ótima, e a resposta é chocante.
A sociedade brasileira, apesar de pouco, já avançou no debate sobre
a ampliação dos direitos das mulheres.
Há consenso entre esquerda e direita de que devemos ocupar a política
e de que sofremos machismo no plenário. Mas, apesar das tentativas
de articulação de uma bancada negra, como no caso do projeto de lei
apresentado em 2019 para o enfrentamento da violência racista
institucional, ela ainda é frágil.
Não há, assim como a bancada feminina, uma instância formal na
Câmara.
E, em um país em que a escravidão nos formou e o racismo estrutura
as nossas relações, a luta antirracista ainda é invisibilizada.
Pergunta: Tem algum receio de que candidatos negros possam virar
laranjas pela possibilidade da cota financeira aprovada no STF como
aconteceu em alguns casos com a cota das mulheres?
Talíria Petrone: Não tenho a menor dúvida. A decisão do STF foi uma
vitória conquistada com muita luta por movimentos sociais.
Mas é preciso criar mecanismos de fiscalização para que essa resolução
se traduza na efetivação de figuras negras eleitas.
Pergunta: que falta para que mais pessoas negras, especialmente
mulheres, sejam eleitas?
Talíria Petrone: Hoje, temos mais condições de garantir recursos do
que antes para pessoas negras, mas ainda é insuficiente porque a
distribuição nas estruturas dos partidos é desigual.
Não apenas a distribuição de verba, mas também de apoio político,
que são fundamentais. Além disso, ocupar os espaços de poder e as
instâncias de decisão é cotidianamente violento para um corpo negro.
O conceito de racismo estrutural nos mostra que ele está em todo
lugar e nos afasta dessa disputa.
https://twitter.com/universa_uol/status/1316635927662469120
Zé Maria
‘Existem, Sim, Juízes no Brasil’ [Não muitos, mas há, Valdete* é uma]
Por Valdete Souto Severo*, na Revista Consultor Jurídico (ConJur)
Em artigo publicado nesta revista eletrônica no último
dia 24 de novembro, defendendo a necessidade de isenção
da magistratura, o juiz Otávio Amaral Calvet imputa
ao Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
prejulgamento de questões trabalhistas em casos concretos.
O artigo já inicia com um erro básico: confunde imparcialidade
com isenção ideológica e, nesse sentido, simplesmente ignora
todos os estudos, doutrinas, filosofias que se debruçam sobre o tema.
Ignora até mesmo o conceito das palavras que utiliza.
Imparcialidade é o ato de não assumir o lugar da parte e, pois,
não julgar a partir da identificação pessoal com determinada situação
concreta.
Isenção é “falta de comprometimento moral; desinteresse”.
Em sentido figurado, o dicionário aponta, ainda, isenção
como “demonstração de desprezo; indiferença, desdém”.
Isenção ideológica é a ausência de ideologia.
Para afirmar que alguém é isento de ideologia
é preciso ignorar também o conceito de ideologia.
Ideologia, como ensina Ovídio Baptista (“Processo e Ideologia”),
é um conceito apresentado na obra de Francis Bacon,
um dos preconizadores do racionalismo. Bacon aponta
quatro “idola” que nos impediriam de chegar à essência das coisas,
por criar “pré-juízos”.
Na obra, de 2004, Ovídio alerta para o fato de que tratar opositores
como ideológicos pressupõe sermos detentores da “verdade única”,
elemento central do pensamento conservador.
Aponta como marca da modernidade a “ideologia da neutralidade”,
que naturaliza a realidade que o próprio sistema elabora, de modo
que toda a pessoa que destoar dessa realidade será ‘acusada’
de ideológica. É, pois, um argumento autoritário.
No âmbito do processo, segundo Ovídio, “essa naturalização
da realidade tem uma extraordinária significação”, apontada
pelo professor como um dos pilares do sistema:
“É através dela que o juiz consegue tranquilidade de consciência,
que lhe permite a ilusão de manter-se irresponsável”
(BAPTISTA DA SILVA, p. 16).
E conclui que os dois principais compromissos ideológicos inerentes
a essa compreensão do Direito e da missão do Poder Judiciário são:
“A ideia de que o juiz somente deve respeito à lei, sendo-lhe vedado
decidir as causas segundo sua posição política” e a “tirania exercida
pela economia sobre o resto”, um “sonho racionalista” que “possui
um imenso componente autoritário, correspondendo a um modelo
político propenso mais às tiranias do que a um regime democrático,
como hoje tornou-se fácil perceber” (Idem, pp. 22-5).
Impressionante a atualidade da lição.
No artigo publicado no dia 24, sob o argumento de que a magistratura
deve observar “sobriedade no falar”, Calvet imputa ao TRT da 4ª Região
“prejulgamento”, afirmando ter fixado “uma pauta abstrata de valores
e conceitos que, depois, irá apreciar ao julgar o caso concreto”.
A pauta, no caso, é o antirracismo.
E realmente essa é uma pauta que, aliás, me faz ter orgulho
de pertencer a esse tribunal.
Se é abstrata, como afirma o articulista, não está relacionada
ao caso concreto, outro equívoco básico que faz perder-se
o próprio fundamento da crítica.
Também não compromete, evidentemente, a imparcialidade
em eventual julgamento de questão trabalhista.
O articulista acusa o tribunal de “expressar sua revolta, externalizar
seus sentimentos, mormente quando se conecta com o evento
pessoalmente”, como se o erro estivesse na manifestação pública
de repúdio a um assassinato que foi filmado, do início ao fim,
e que torna nítida a existência de um racismo estrutural
que nos atravessa. E não na omissão diante de todo o flagelo social
que faz com que trabalhadores precarizados se arvorem a ‘justiciar’
um cliente de uma grande rede de supermercados,
que há menos de quatro meses foi notícia por haver coberto
o corpo de um empregado que morreu no ambiente de trabalho,
com guarda-sóis, para seguir em funcionamento.
O mínimo que se espera de um Tribunal do Trabalho
em uma realidade democrática é a indignação e o firme
posicionamento diante de atos que banalizam a morte.
Note-se que o autor refere que não se trata de concordar
ou discordar da afirmação de que houve um brutal assassinato
revelador do racismo que estrutura nossa sociedade,
fazendo lembrar a frase célebre de Lacan:
“O desejo enquanto real não é da ordem da palavra e sim do ato”.
É preciso refletir sobre a escolha que fazemos acerca dos lugares
discursivos e políticos onde colocamos nossa energia.
Em uma realidade marcada pela violência, pelo desemprego
que atinge parcela significativa da população economicamente ativa
e pela apatia diante do flagelo da Covid-19, que já provocou,
apenas em números oficiais, mais de 170 mil mortes em nosso país,
é muito simbólico que se gaste energia com a crítica à ideologia,
em lugar da denúncia da barbárie, como se todos não fôssemos
seres políticos, sociais e, portanto, ideológicos.
Ou por acaso há isenção ideológica em um texto
em que o autor sugere ser possível “a arguição de suspeição
para os futuros julgamentos em tal jurisdição pelas empresas
envolvidas”?
Em lugar de se preocupar com o fato de que alguma juíza
ou juiz do TRT-4 possa julgar ações trabalhistas decorrentes
do tenebroso episódio, a preocupação deveria voltar-se ao evento
em si, a revelar tenhamos ultrapassado mais uma barreira de civilidade,
capaz de comprometer todas as conquistas sociais que nos separam
hoje de um ambiente de barbárie.
Impressiona a dificuldade na compreensão da nota pública do TRT-4,
pois em momento algum imputa-se às pessoas que espancaram
João Alberto “motivação racial”. Ao contrário, o recado é claro:
“Sem prejuízo da devida apuração dos fatos, é importante salientar
que João Alberto era um homem negro, vivendo em uma sociedade
marcada pelo racismo estrutural, que tende a naturalizar violências
praticadas contra a população negra e indígena.
Salientamos, assim, a necessidade de políticas públicas e institucionais
— aí incluídas as empresas privadas — que tragam à tona o debate racial.
Como nos ensina o professor doutor Silvio Almeida, “as instituições
que não tratarem de maneira ativa e como um problema
a desigualdade racial irão facilmente reproduzir as práticas racistas
já tidas como ‘normais’ em toda a sociedade”.
Talvez seja esse convite à reflexão que tanto incomode.
O que dignifica a função da magistratura não é a covarde omissão
ou a inércia que mal se disfarça sob a desvirtuada noção de isenção
ideológica.
Comportar-se de forma prudente é tornar claro à sociedade
que um Tribunal do Trabalho repudia atos de morte por espancamento
e reconhece a existência de racismo estrutural.
Causa estranheza, portanto, que depois de tantos avanços,
sobretudo no âmbito da ciência processual, ainda estejamos
sonhando com juízes neutros, desconectados da realidade,
alheios às questões sociais.
Se tal pensamento foi sustentado à época de Montesquieu
e sob a lógica de um direito pautado pelo falso paradigma
da igualdade, é certamente anacrônico em um Poder Judiciário
inscrito na ordem democrática e contaminado por valores
que não estão à disposição do intérprete, pois presentes
no texto da Constituição da República.
Com algo concordamos, vivemos mesmo tempos difíceis,
diante dos quais nenhum ser humano pode calar-se, exerça
ou não a função jurisdicional.
Não é apenas em Berlim: há juízes também no Brasil,
e eles não são cegos, surdos ou imunes à realidade.
São seres políticos, comprometidos com a ordem
constitucional e com toda a carga ideológica
que ela contém.
*Valdete Souto Severo é Juíza do Tribunal Regional do Trabalho
da 4ª Região e presidente da Associação Juízes para a Democracia (AJD).
Zé Maria
Olha só como as ‘Novas’ Celebridades políticas adolescentes da Globo
já estão fazendo sucesso na Casa Grande dos Senhores de Engenho:
‘Futura primeira-dama [SIC] do Recife,
Tabata Amaral já virou meme na capital’
Defensora do # voteemmulheres, a deputada federal
Tabata Amaral (PDT) fez campanha para um homem
no Recife: o namorado João Campos (PSB), eleito
prefeito da capital pernambucana.
A futura primeira-dama da cidade
já virou meme entre os recifenses.
Tradicionalmente, o baile municipal, um dos eventos
mais importantes do carnaval do Recife, tem as
primeiras-damas como inspiração.
Os foliões brincam estarem tensos como será
ter uma paulistana nesse posto.
[Coluna do Lauro Jardim – O Globo]
Zé Maria
A Plataforma Política Eleitoral da Globo
até 2022 será o Centro Unificado (CU),
nem tão limpinho nem tão cheiroso,
com PSDB, DEM, PSD, PP, MDB e, quiçá,
o PSB, do Bebê Campos, o PDT, da Tábata,
e o ‘Novo’, possivelmente com o Hulk.
Desta forma, a Direita quebra as pernas
do Ciro e do Lula/Haddad, por um lado,
e do Bolsonaro, por outro.
Zé Maria
‘escolheram candidatos moderados, rejeitando extremos e optando pelo equilíbrio’
Quem disse isso foi o RR Soares, o Edir Macedo, ou o Feliciano?
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