Mortes de crianças Yanomami com menos de 5 anos por causas evitáveis aumentaram 29% no governo Bolsonaro

Tempo de leitura: 7 min
“Não estamos conseguindo contar os corpos”, afirma pessoa ouvida pela reportagem de SUMAÚMA

DIÁRIO DE GUERRA

‘Não estamos conseguindo contar os corpos’

Dados obtidos com exclusividade por SUMAÚMA mostram que, durante o governo do extremista de direita Jair Bolsonaro, o número de mortes de crianças com menos de 5 anos por causas evitáveis aumentou 29% no território Yanomami: 570 pequenos indígenas morreram nos últimos 4 anos por doenças que têm tratamento

Por Ana Maria Machado, Eliane Brum e Talita Bedinelli, na Plataforma Sumaúma

A criança Yanomami já tinha vivido 1.095 dias, mas pesava o mesmo que um bebê que acabara de nascer. Três anos e 3,6 quilos.

O número traduz o que uma série de fotografias recentes recebidas por SUMAÚMA mostram: corpos de crianças e velhos, com peles que recobrem apenas os ossos, tão fragilizados que mal parecem se equilibrar. Costelas que parecem perfurar os corpos minúsculos contrastam com barrigas enormes, povoadas por vermes.

Dados obtidos por SUMAÚMA apontam que, nos 4 anos de governo de Jair Bolsonaro (2019-2022), 570 crianças com menos de 5 anos morreram no território Yanomami pelo que as estatísticas chamam de “mortes evitáveis”.

Isso significa que 570 pequenos indígenas poderiam estar correndo, rindo e inventando brincadeiras, neste momento, se houvesse atendimento adequado de saúde ou ações de prevenção. Não houve.

O número oficial já é 29% maior do que nos 4 anos anteriores, dos governos de Dilma Rousseff (PT) e, após o impeachment, de Michel Temer (MDB).

Como o território sofreu um apagão estatístico durante o governo de extrema direita, é provável que a realidade seja ainda mais aterradora. Este é o legado de Bolsonaro.

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As imagens desta reportagem foram feitas por indígenas e profissionais de saúde que conseguiram vencer a barreira do garimpo criminoso e alcançaram a Terra Indígena Yanomami nos últimos meses.

Para publicá-las, SUMAÚMA pediu autorização para lideranças da etnia. Algumas das imagens mais chocantes não foram liberadas por afrontarem a cultura Yanomami ou por colocarem em risco de morte o autor das fotos.

Imagens são um tema difícil para os Yanomami. As lideranças que aceitaram a divulgação das fotografias só tomaram essa decisão porque estão desesperadas. Em uma delas, foi a própria liderança que pediu que uma foto fosse tirada para ser levada ao mundo. Essa atitude, tão rara para um Yanomami, dá uma medida do terror de ver crianças e velhos tombarem dia após dia.

“Não estamos conseguindo contar os corpos”, afirma uma das oito pessoas ouvidas pela reportagem nos últimos dias.

Todas relatam um cenário de catástrofe dentro da maior terra indígena demarcada do país. No território entre os estados de Roraima e Amazonas, onde vivem quase 30 mil Yanomami, a fome se alastrou em uma terra farta de comida. Fragilizados, velhos e crianças sucumbem a doenças que têm tratamento, mas com frequência ele não chega. O descaso é uma sentença de morte.

Somado a isso, o desmonte da saúde indígena durante os 4 anos do governo Bolsonaro levou várias aldeias ao colapso sanitário.

Com pouco acesso à saúde e medicamentos em falta, crianças e velhos morrem de desnutrição ou por doenças tratáveis, como vermes, pneumonia e diarreia.

“Tá tendo muito garimpeiro, muita malária. Pega malária, não aguenta fazer roça”, afirma Mateus Sanöma. A malária, assim como a dengue, é transmitida por meio de um mosquito que, ao picar uma pessoa contaminada, passa a espalhar a doença. Ela se alastra na terra indígena por meio dos garimpeiros.

Os Sanöma, um grupo da etnia Yanomami, vive na região de Auaris, no limite do Brasil com a Venezuela, onde o garimpo atua livremente dos dois lados da fronteira. A insegurança alimentar sempre foi uma questão crítica na região.

Localizada nas terras altas do território, há menos oferta de comida. Com o garimpo e a explosão da malária, o que era um problema escalou para o caos. Vários homens da etnia migram para o garimpo do outro lado da fronteira, na Venezuela, deixando as mulheres sozinhas para cuidar das crianças, fazer roça e pescar numa região escassa, desequilibrando todo o modo de vida.

Como só os homens caçam, mais uma fonte de proteínas passa a faltar. “Na minha comunidade, todos estão morrendo de fome. Já morreram 30 Sanöma e vão morrer mais. Estão morrendo rápido. Não quero que morram todos. Precisamos de apoio para não morrer meu povo todo”, desespera-se o líder Sanöma.

Nos últimos dois anos (2021 e 2022), a região de Auaris, onde vivem 896 famílias, teve 2.868 casos de malária.

Dados obtidos por SUMAÚMA apontam que, apenas em 2022, 6 crianças com menos de 1 ano morreram por causas que seriam facilmente evitáveis se houvesse acesso a serviços de saúde ou medicamentos.

Na região, 6 de cada 10 crianças menores de 5 anos apresentam déficit nutricional, ou seja, têm peso considerado inadequado para a idade, a maior parte delas já em desnutrição severa.

Na Maloca Paapiu, outra região do território Yanomami, acontece o mesmo: 6 de cada 10 crianças dessa faixa etária estão desnutridas. É de lá que nos chega uma lista, feita à mão por uma pessoa da comunidade, com as mortes ocorridas entre dezembro e os primeiros dias de janeiro: foram 4 crianças, filhas de Catiusa, Beadriz, Geovana e Briscila. E ainda outros 4 velhos. “Oito [dos] meus parentes morreram”, diz o recado.

“Na semana em que eu estava lá foram 3 óbitos de crianças, todas por pneumonia. Outra se salvou, foi removida [para o hospital de Boa Vista]”, conta um profissional que atuou na região do Xitei em dezembro para trabalhar para o Censo. Em 2022, os dados mostram que 13 crianças do Xitei com menos de 5 anos morreram por causas que seriam tratáveis: 6 delas por pneumonia, 4 por diarreia e 2 por desnutrição.

As estatísticas oficiais deveriam, mas não alcançam a tragédia humanitária vivida pela etnia e relatada pelas pessoas que habitam e trabalham no território. Os dados reais, segundo elas, são muito maiores.

Muitas das mortes que ocorrem nas aldeias sequer são informadas aos serviços médicos. Em algumas das regiões mais afetadas pelo garimpo, as equipes de saúde foram expulsas e não conseguem prestar atendimento ou contabilizar os mortos. Isso gera casos como o da região do Homoxi, onde o posto de saúde foi tomado pelos criminosos, virou depósito de combustível e foi incendiado pelos garimpeiros em dezembro, como forma de retaliação à uma operação da Polícia Federal em combate à atividade ilegal.

Segundo as estatísticas, nenhuma criança está desnutrida ali, o que não corresponde à realidade. Como não há acompanhamento das equipes de saúde, também não há dados. As crianças que passam fome, adoecem e com frequência morrem foram também apagadas do sistema. O apagão estatístico é mais uma forma de promoção da morte.

O helicóptero usado para a remoção de doentes em áreas remotas, onde aeronaves maiores não chegam, ficou quebrado por 10 dias, entre 24 de dezembro e 4 de janeiro. Danificado, demorou a ser substituído.

Neste período, segundo as lideranças e os profissionais ouvidos pela reportagem, ao menos 8 pessoas morreram – 4 na região do Surucucu e 4 entre os Sanöma. Nas estatísticas oficiais, porém, constam apenas 3 crianças mortas entre 24 e 27 de dezembro. Cinco mortes, portanto, estão em apagão estatístico.

“Em Koraimatiu acabei de receber a notícia que o helicóptero ajudou, mas ficaram 4 corpos”, avisa a mensagem de um profissional de saúde que nos chega no início de janeiro, logo após a volta do helicóptero. Ele descrevia um cenário de guerra. A comunidade não conseguia sequer fazer a cerimônia de cremação dos mortos, porque não haviam pessoas saudáveis em número suficiente.

“Em Porapë, morreram 4 pessoas. Soube agora que morreu mais uma criança. O tuxaua [liderança] morreu também. Precisamos alcançar aqueles que estão mais distantes das pistas de pouso”, continua a mesma fonte na mensagem em que pedia socorro.

A reportagem de SUMAÚMA questionou o Ministério da Saúde em 6 de janeiro sobre a situação no território. A resposta com os dados oficiais só foi enviada em 18 de janeiro. Na semana passada, o governo Lula, que herdou os anos de descaso deliberado do governo de Jair Bolsonaro, montou às pressas uma força-tarefa, com especialistas de Brasília e Boa Vista, para avaliar a tragédia na Terra Indígena Yanomami.

Desde o início desta semana, eles visitam as regiões mais afetadas para montar um plano de ação e tentar evitar mais mortes. Uma sala de situação, como a montada em momentos de guerra – ou durante crises como a da covid-19 – funcionará para assessorar as equipes de saúde. Eles também deverão avaliar em que medida os dados que constam no sistema do Ministério da Saúde correspondem à realidade. O desafio de reconstrução do sistema de saúde, entretanto, não será fácil. No território onde o crime atuou livremente nos últimos anos, as estruturas foram destruídas.

“A alimentação que os polos de saúde têm para dar aos Yanomami doentes é arroz e só, nada nutritivo”, contou outro profissional, que esteve diversas vezes no território ao longo do ano passado. “Não tinha nem remédio, nem novalgina, não chegava nada. As crianças estavam soltando vermes pela boca. Vai ter que começar do zero, tudo de novo. Os Yanomami foram jogados à própria sorte.”

Outro trabalhador do Censo, que atuou no território por décadas e voltou no ano passado, conta que a “situação é desoladora”.

“Os profissionais de saúde trabalham em condições subumanas. Postos de saúde com goteiras, sem água nem luz. O profissional tem que andar às vezes mais de 300 metros para buscar água no balde. Faltam medicamentos básicos”, relata.

“O pessoal passando fome demais, todo mundo muito magro. Até para o trabalho do IBGE estava difícil. Quando tinha que pernoitar, na hora da janta, a gente tinha levado comida, mas a aldeia inteira morrendo de fome ficava em volta da equipe, que dividia o pouco que tinha levado. Não dá para esperar mais.”

Leia também:

Pedro Carvalhaes: A indiferença bolsonarista à tragédia Yanomami

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Comentários

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Zé Maria

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Vídeo:

https://twitter.com/i/broadcasts/1mrxmkWmAoBGy

“Visita do Presidente LULA ao Povo Yanomami em Roraima”

https://twitter.com/LulaOficial/status/1616834701859393537

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    Zé Maria

    .
    .
    O Presidente Lula decretará estado de calamidade nas reservas Yanomami .

    Pelo menos 570 crianças do povo Yanomami foram mortas
    pela contaminação de mercúrio, desnutrição, fome e falta de acesso
    a medicamentos provenientes do SUS, segundo o Ministério da Saúde.

    De acordo com a pasta, além dos impactos diretos e indiretos das
    atividades de garimpo ilegal, o descaso do governo de Jair Bolsonaro (PL)
    levou às mortes que são consideradas “evitáveis”.

    Em 2022, Jair Bolsonaro determinou que qualquer indivíduo
    poderia praticar o extrativismo [Mineral e Vegetal] no local.
    [Correio Braziliense]
    https://twitter.com/pesquisas_2022/status/1616605259534684161

    ” O ex-presidente Jair Bolsonaro ignorou mais de
    21 pedidos de ajuda para os Yanomamis”
    [The Intercept Br]

    https://twitter.com/pesquisas_2022/status/1616815752903892994
    .
    .

Zé Maria

https://pbs.twimg.com/media/FnAgwjIXwAMaCYY?format=jpg

“[Micheque e Damares] dizem que
são ‘pró vida’, ‘em defesa das crianças’,
mas desde que não sejam as indígenas, né?”

https://twitter.com/FernandinhaLeao/status/1616828289087152133

Zé Maria

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Genocídio Endêmico: 4 Anos de Crimes Contra a Humanidade

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    Zé Maria

    https://pbs.twimg.com/media/Fm_fa7yWYAYoq2M?format=jpg

    “Enquanto o governo Bolsonaro torrava dinheiro no cartão corporativo,
    crianças indígenas passavam fome e estão desnutridas.”

    https://twitter.com/lfica1/status/1616756447487860738

    Zé Maria

    https://pbs.twimg.com/media/Fm_hFCeWYAEzjJm?format=jpg

    “É muito triste saber que indígenas, sobretudo 570 crianças Yanomami,
    morreram de fome durante o último Governo.
    O Ministério dos Povos Indígenas tomará medidas urgentes
    em torno desta crise humanitária imposta contra nossos povos.”
    #SOSYanomami #LutaPelaVida

    SÔNIA GUAJAJARA
    Ministra dos Povos Indígenas
    Governo LULA (2023-2026)
    https://twitter.com/GuajajaraSonia/status/1616506184378245121

    .

    Zé Maria

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    “Bolsonaro Afirma a Aliados que Não Voltará ao Brasil se Tiver Prisão Decretada”

    Ex-mandatário está na Flórida, nos Estados Unidos, desde o dia 30 de dezembro. Até o momento, as investigações sobre seu governo junto às invasões de seus apoiadores no DF já geraram 16 ações no Tribunal Superior Eleitoral contra Bolsonaro.

    A mídia afirma que Bolsonaro estuda diferentes possibilidades de países em que tentaria se asilar, mas já foi informado por conselheiros próximos de que não poderia ficar nos Estados Unidos.

    Deputados norte-americanos pediram a Joe Biden que revogue visto diplomático americano do ex-presidente e que o FBI investigue se os ataques aos três Poderes foram planejadas em território estadunidense, segundo a BBC.

    A Itália seria uma opção, mas recentemente moradores cidade de Anguillara Veneta, além de eurodeputados ambientalistas, demonstraram vontade de reverter a decisão da prefeitura local de ter dado cidadania honorária ao ex-presidente brasileiro.

    O movimento aconteceu antes das invasões do dia 8.

    Na quinta-feira (19), o Parlamento Europeu aprovou uma resolução contra as invasões no DF e culpou Bolsonaro por “difusão do ódio”, aumentando seu isolamento internacional.

    Após o ocorrido em Brasília, diplomatas europeus confirmaram que o cenário de um desembarque de Bolsonaro na Itália preocupa, principalmente diante da reação que teriam diversas forças políticas no continente.

    https://sputniknewsbrasil.com.br/20230121/bolsonaro-afirma-a-aliados-que-nao-voltara-ao-brasil-se-tiver-prisao-decretada-diz-midia-27114720.html

    Zé Maria

    .
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    Bolsonaro desiste de voltar ao Brasil e avisa:
    pode pedir asilo. Quem aceitará?

    Opções no exterior para Bolsonaro estão minguando.
    Ele está isolado até na extrema direita mundial.
    Ninguém o quer por perto

    [ Reportagem: Mauro Lopes | Revista Fórum: (https://t.co/sW1LZ0KCEX) ]

    A opção italiana parece descartada. A primeira-ministra Giorgia Meloni, apesar de ser de extrema direita, condenou a tentativa de golpe bolsonarista de 8 de janeiro e sinaliza que Bolsonaro não terá acolhida no país. O mesmo parece indicar o governo húngaro de extrema direita de Viktor Orbán.

    Com isso, Bolsonaro teria apenas governos no Oriente Médio e, mesmo lá, suas opções atualmente estariam reduzidas a duas, Catar ou Arábia Saudita -mas os interesses comerciais dos países com o Brasil podem atrapalhar os planos do ex-presidente.

    No Brasil, até mesmo os líderes do PL, que defendiam sua volta urgente para o país, para liderar a oposição ao governo Lula, começam a considerar que é mais prudente Bolsonaro permanecer no exterior. Tanto para ele, pelo isolamento político quase total, como para o PL, que quer manter distância.

    https://revistaforum.com.br/politica/2023/1/21/bolsonaro-desiste-de-voltar-ao-brasil-avisa-pode-pedir-asilo-quem-aceitara-130380.html
    .
    .
    “Bolsonaro vai pedir asilo político em Santa Catarina?” Dããã…
    https://twitter.com/Pietrorenzo_SP/status/1587825426780520448
    .
    .

    Zé Maria

    https://pbs.twimg.com/media/FnAoCfPXkAQrZFa?format=jpg

    “Ministério da Saúde decreta emergência de saúde pública
    para combater desassistência de indígenas Yanomami”

    “Bolsonaro já tem um Auschwitz para chamar de seu!”
    https://twitter.com/JP_BR__/status/1616880498122309633

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