Sabesp: A toque de caixa, sem transparência, governo Alckmin privatiza; a maioria das ações vai ficar nas mãos do mercado
Tempo de leitura: 4 minpor Conceição Lemes
De 1997 até hoje, os sucessivos governos tucanos já venderam mais de R$ 100 bilhões em empresas estaduais e participações no Estado de São Paulo.
A bola da vez é a Sabesp, responsável pelo fornecimento de água, coleta e tratamento de esgotos de 367 municípios paulistas.
A Assembleia Legislativa (Alesp) deve dar o aval nesta terça-feira (05/09) ou quarta-feira (06/09).
Está na ordem do dia, pronto para ser votado em plenário, o projeto de lei 659-2017, do governador Geraldo Alckmin (PSDB), que “dispõe sobre a reorganização societária da Sabesp”.
A tramitação foi a toque de caixa:
3 de agosto – Em regime de urgência, o projeto de Alckmin deu entrada na Alesp.
16 de agosto — Partidos da base do governo fazem o chamado congresso de comissões. É um recurso regimental, para acelerar a tramitação, mas que limita o debate. Em vez de o projeto passar pelas três comissões que teria que percorrer normalmente, é feita uma sessão conjunta.
22 de agosto – Finalmente, acontece a audiência pública. Cerca de três horas depois, como já se tornou praxe, a base de Alckmin tentou dar como aprovado o projeto para ir a plenário para votação.
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Na pressa de aprovar rápido, acabou atropelando o regimento interno.
Os deputados da oposição apresentaram então emendas e o resultado do primeiro congresso foi anulado.
29 de agosto – A base do governo convocou um novo congresso para apreciar as emendas da oposição. Nenhuma foi aprovada, já que Alckmin tem folgada maioria na Casa.
5 de setembro – A qualquer momento, nesta semana, o projeto deverá ser votado pelo plenário. Deve ser aprovado com folga, praticamente sem contraditório, apenas com o tempo de discussão habitual no plenário da Alesp, para poucas pessoas presentes e uma audiência baixíssima da TV ALESP.
A grande mídia ignorou o assunto, possivelmente por afinidade ideológica dos donos dos veículos ou por ser a Sabesp um dos grandes anunciantes no mercado paulista.
A “oposição” partidária, parlamentar e sindical também não tem força para barrar o processo.
Resultado: a população desconhece o que vai acontecer, os deputados não estão sendo pressionados a dar explicações e o governo Alckmin vai vender mais um patrimônio do povo paulista. É uma velha história que se repete.
Com lucro de R$ 2,94 bilhões em 2016, a Sabesp tem assim distribuído assim o seu capital social.
NYSE é a sigla de New York Stock Exchange. Ou seja, ações na Bolsa de Valores de Nova York.
Não será a primeira vez que a Sabesp venderá seus ativos.
Anteriormente, já fez três grandes operações para venda dos seus ativos, que os tucanos chamam eufemisticamente de Programa Estadual de Desestatização:
Julho de 1997: R$ 406,770 milhões
Maio de 2002: R$ 537 milhões
Outubro de 2004: R$ 687,986 milhões
Uma vez aprovado o projeto de lei 659/2017, os próximos passos:
1) O governo Alckmin criará uma outra empresa (sociedade controladora/holding), que controlará a Sabesp e outras empresas/subsidiárias que venham a surgir para operar ações relacionadas a saneamento.
2) O Estado transferirá suas ações da Sabesp para o capital da sociedade controladora.
3) O capital social desta nova empresa será formado por ações ordinárias (com direito a voto no Conselho de Administração) e ações preferenciais, uma característica específica do mercado acionário brasileiro.
4) Nesta nova empresa/sociedade controladora, o Estado terá apenas a maioria (ou o controle) das ações ordinárias, com direito a voto no Conselho de Administração.
Em consequência, a Sabesp será controlada por outra empresa, que terá a maioria de suas ações nas mãos do mercado.
5) Essa nova empresa controlará a Sabesp através de um contrato de gestão bem amplo, que interferirá completamente na sua administração.
Realmente, o assunto é árido e levanta questões óbvias, como estas, respondidas para o Viomundo pelo consultor econômico Paulo Copacabana.
— Por que uma empresa estadual pública superavitária deve sofrer radical transformação, de forma tão acelerada e sem amplo conhecimento pela sociedade?
Não há resposta minimamente razoável apresentada nas justificativas da mensagem do governador e no texto do projeto.
— Mas para que tamanha urgência na tramitação?
Especula-se que seria para fazer caixa de campanha para a eleição de 2018.
— Como ficam os investimentos para universalizar o tratamento do esgoto, que é um problema sério no Estado de São Paulo?
Não ficam. Por uma razão: as metas de desempenho previstas no projeto não detalham os planos de investimentos.
–O Estado terá poder para interferir na Sabesp através da nova empresa?
O governo pode até ter o controle do conselho administrativo da nova empresa, direcionando a política mais geral, mas o contrato de gestão é que definirá os detalhes do funcionamento da SABESP. E nos detalhes é que está o problema.
— Mas isso tudo será transparente?
Não. No projeto de lei e no contrato de gestão falta transparência tanto em relação ao detalhamento dos investimentos quanto ao cumprimento de metas. A transparência existente, na verdade, é sempre voltada aos investidores, não para os cidadãos paulistas. É aí que também mora o perigo.
— O que o governo do Estado ganha com essa venda?
Arruma um jeito de captar mais recursos em bolsa de valores, sobretudo na de Nova York, com o argumento de que precisa investir mais, principalmente neste momento em que o Estado de São Paulo também enfrenta crise orçamentária e financeira e as operações de financiamento tradicionais junto aos bancos nacionais (BNDES, CEF, Banco do Brasil) e estrangeiros estão restringidas.
— E os dividendos como ficam?
A nova empresa/controladora, com ações preferenciais crescentes nas mãos do mercado, distribuirá ainda mais dividendos.
— Será uma privatização branca?
Uma nova modalidade de privatização, digamos assim, com a Sabesp sendo administrada através de um contrato de gestão e mantendo a falta total de transparência nos investimentos.
— Então não seria melhor debater antes com a sociedade?
Obviamente, mas o governo Alckmin sempre tem pressa neste tipo de negócio. Além disso, Alckmin tem aversão à participação da sociedade. Está no DNA dos tucanos. Aqui no Estado de São Paulo não temos cidadãos, temos apenas consumidores e investidores. Tudo é privatizado e privatizável.
— Qual o resultado provável disso tudo?
Atualmente, a Sabesp já não cumpre a sua obrigação natural de promover saneamento para todos, ou seja, água tratada, esgoto coletado e tratado.
Agora, imagine como será com a nova controladora que terá absoluta autonomia para fazer o que quiser e com a crescente força de acionistas privados, querendo mais e mais dividendos.
Os investimentos prometidos podem ficar mais uma vez “na saudade”.
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Comentários
Nelson
Nada de novo. Como mostra o texto, a toada já é antiga, vem de vinte anos atrás, com Covas, Serra, FHC, Alckmin. A doação, por que é disso que se trata, a uns poucos grandes grupos privados, do patrimônio pertencente a todo o povo é prática corrente do PSDB.
E os paulistas, com sua impávida arrogância de se acharem os mais mais do país, seguem apostando suas fichas nos tucanos.
–
Tive um professor na faculdade que dizia assim: “Eu vou fazer vocês capinarem de croque [cócoras]”. Acho que é mesmo o que merecem os arrogantes paulistas.
Roberto
Privatizar um bem de primeiríssima necessidade como é a água é o caminho para o desastre ambiental, econômico e social.
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