STF fez imenso favor ao PSDB e deu péssimo exemplo ao Brasil
Os tucanos colecionaram mais um caso em que foram acusados de inúmeros crimes, mas tudo ficou por isso mesmo. Em ano eleitoral, a decisão vale ouro.
por Antonio Lassance, em Carta Maior
O Supremo Tribunal Federal fez um imenso favor ao PSDB. Livrou Eduardo Azeredo, do PSDB-MG, de responder, perante o STF, pelos crimes de que é acusado, no chamado “mensalão tucano”.
Alívio para o réu e seu candidato, Aécio Neves. Eles podem comemorar, quem sabe, com um vinho da mesma marca que Merval Pereira e Carlos Alberto Sardenberg apostaram, na CBN, em tom de chacota, para se enebriar com a prisão dos petistas. “Tim-tim”! Um brinde aos dois pesos e duas medidas.
Comparada à fúria com que tratou os petistas na Ação Penal 470, a sessão que tirou Azeredo da reta do Supremo marcou a volta da tranquilidade e da troca de gentilezas às quais a Suprema Corte já parecia desacostumada.
Ninguém bateu boca, ninguém insultou ninguém. Nada como um julgamento de tucano para que os ministros do STF demonstrem que todos estão entre amigos, e o quanto suas excelências são homens cordiais, e não chefes de capangas. Águas passadas, pelo menos, até que apareça outro petista na reta.
Em ano eleitoral, a decisão vale ouro. O STF aliviou para Azeredo, que viu seu processo voltar à estaca zero. Agora, vai responder perante um juiz de primeira instância. Depois, poderá recorrer indefinidamente, até ver sua ação retornar, mais uma vez, ao Supremo.
Quando isso acontecer, muitos dos atuais ministros não mais estarão por lá. Os remanescentes, com mais cabelos brancos, ou cabelo algum, terão que reavivar a memória ou fazer um Google para relembrar quem é Azeredo e o que disseram a seu respeito.
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Aécio e o PSDB, ao contrário do que aconteceu com o PT, enfrentarão as urnas sem um condenado enclausurado para ser utilizado pela campanha adversária. Melhor, impossível.
Péssimo exemplo para a Justiça brasileira
O inquérito e a ação penal contra Azeredo tornaram-se um péssimo exemplo para a Justiça brasileira. Para quem dizia que a AP 470 era um divisor de águas, a ação penal contra Eduardo Azeredo foi uma ducha de água fria.
As denúncias contra o tucano vieram à tona no mesmo ano de 2005 e pelo mesmo Marcos Valério, pivô do escândalo contra os petistas. Tudo na mesma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, a CPMI “dos Correios”.
Por alguma razão misteriosa, enquanto a PGR autuou o inquérito contra os petistas em 2007, o de Azeredo só foi providencialmente enviado em 2009.
Agora é tarde para julgar Azeredo
O então Procurador, Roberto Gurgel, demorou quatro anos para constatar o óbvio: que o mensalão tucano “retrata a mesma estrutura operacional” e “envolve basicamente as mesmas empresas do grupo de Marcos Valério e o mesmo grupo financeiro (Banco Rural)” que estavam presentes na AP 470. Quatro anos para se chegar a essa conclusão banal merecem um sorvete na testa.
A única diferença substancial entre os dois escândalos era justamente o tempo. As acusações contra Azeredo eram do século passado. Se referiam à sua campanha a governador em 1998.
Tivesse Gurgel dado prioridade à acusação mais antiga, os principais crimes de que Azeredo é acusado não estariam prescritos.
No STF, o inquérito contra Azeredo virou a Ação Penal 536. Seu primeiro relator foi ninguém menos que Joaquim Barbosa.
Barbosa, sem alarde, sem esbravejar, declarou Azeredo livre do crime de formação de quadrilha “até mesmo porque já estaria prescrito pela pena em abstrato”, disse no voto em que se desmembrou aquele processo.
Azeredo também está livre de ser julgado por corrupção ativa e corrupção passiva. Tudo prescrito, graças à demora da Procuradoria e ao “cochilo” do STF.
Contra o tucano, ninguém gritou pela urgência dos prazos, ao contrário do que fez Gilmar Mendes com Joaquim Barbosa, publicamente acusado de demorar demais a trazer os petistas a julgamento.
Sobre Azeredo, apareceu um Joaquim Barbosa de cabeça baixa e discurso modorrento, que esboçou uma desavença meramente protocolar com a decisão de tirar do Supremo o julgamento desse acusado.
Barbosa, mais uma vez, jogou para a plateia, sem antes sonegar um fato tão concreto quanto seu apartamento em Miami: o julgamento de Azeredo, seja onde for, não levará a nada.
A impunidade já está sacramentada, em grande medida, com o festival de prescrições que o ex-Procurador e o Supremo lhe deram de presente. Belo trabalho.
Critério claro e cristalino
Foi uma tarde triste para o Supremo, mas Joaquim Barbosa sequer se deu ao trabalho de franzir a testa. Nem gastou sua saliva para cuspir uma única diatribe.
De maneira patética, a maior parte da sessão que livrou Azeredo foi gasta com a tentativa de se dizer que haverá algum critério para novos julgamentos em que acusados renunciem a seus mandatos. Critério?
Marco Aurélio Mello foi o primeiro a reagir que não se pode obrigar os ministros do Supremo a decidirem sempre do mesmo jeito.
Luís Roberto Barroso pediu, encarecidamente, a compreensão de todos para se dar uma resposta à opinião pública. Como explicar que se julgou os petistas de um jeito, e os tucanos, de outro? Como evitar que isso seja considerado um casuísmo? Impossível. Casuísmo feito, casuísmo é.
Resultado? A sessão acabou sem se definir critério algum. Para contribuir com a discussão, Joaquim Barbosa reclamou que estava atrasado para um evento.
Assim sendo, o único e verdadeiro critério já está claríssimo. Só não vê quem não quer. Para ser condenado, o réu tem que ser filiado ao PT, de preferência, ou ter sido apoiador de algum de seus governos.
Enquanto isso, os tucanos colecionaram mais um caso em que foram acusados de inúmeros crimes, mas tudo ficou por isso mesmo.
Antonio Lassance é cientista político.
Leia também:
Exceção: Só o mensalão do PT cabe no Supremo Tribunal Federal
Comentários
Fabio Passos
Revoltante.
A farsa do mentirão escancarada como perseguição política
A “elite” branca e rica está com saudades da ditadura… e contratou canalhas para atirar na cadeia heróis do povo brasileiro como José Genoíno e José Dirceu.
Libertem os presos políticos!
Patricio
Questão de classe, colega. A elite criou as leis para favorecer a si e para eliminar seus inimigos. Quando houver alguma contradição que cause dano aos seus interesses, é simples. É só desobedecer. Improvisar. A lei (o roteiro) pertence só a ela. Se tiver poder para isso e platéia consentir, tudo bem. O show tem que continuar.
E a platéia sempre consente. Dá aos atores toda a liberdade para atuar em cena. Sua natureza é ser espectadora, jamais sobe ao palco. No máximo, alguns de seus membros se alternam na coxia.
Esse enredo é clássico. Ou seja, os diálogos podem mudar, mas o final é o mesmo. É previsível desde o primeiro ato quem serão os perdedores. Os perdedores se conformam pois o final é definido, está escrito. Para ter um final diferente seria preciso escrever uma nova história. Quem se atreve?
Quem dirige o espetáculo não altera nada, não ousa dar uma versão nova ao script. Conveniências, sabe como é.
Alguns chamam isso de jogo de cena, de jogo político e até de jogo de cartas. O nome certo é luta de classes.
Marcelo
A porcaria do mensalão petista levou cinco anos pra ser julgado, uma eleição quase duas.
ninguém reclamando.
hipocrisia é tenso
ricardo silveira
E os parlamentares petistas vão continuar quietinhos, obedientes à Casa Grande, não dirão nada por medo da opinião pública criada pela mídia monopolizada e partidária, medo de não se reelegerem. Mas, enquanto isso o STF faz o que faz e o Congresso cria a CPI que bem entender.
Sagarana
O missivista quer que acreditemos que Lula e Dilma indicaram tucanos para o STF?
HomoSapiensDemens
Faltou só um pequeno detalhe nessa história: Barbosa poderia sim ter determinado que o Mensalão do PSDB fosse julgado no STF, pois essa é uma prerrogativa do presidente da corte. Acontece que depois de pensar, pensar e pensar com seus botões resolveu levar a questão para o plenário do STF e deu no que deu…E ainda por cima saiu bem na foto, como o único voto a favor…isso é estratégia para legitimar aquele papo de “sanha de reformadores”, quando houve a absolvição da formação de quadrilha na AP 470.
C.Paoliello
E o princípio constitucional de que são todos iguais perante a lei? Tornou-se letra morta?
Erich
Esse princípio da igualdade diante da lei faz tempo que foi pro ralo!
Mário SF Alves
Então, é ou não é a justiça do tudo [só e somente só] contra o PT? Alguém ainda duvida? E por quê o STF agiu e age dessa maneira, alguém se arriscaria a explicar?
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Só não vale respostas do abolicionista, rs, rs, rs, rs. Essas a gente sabe quais seriam.
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E por falar nisso, tá bem na hora de uma nova abolição, hein, prezado abolicionista?
abolicionista
Caro Mário, eu não uso esse codinome à toa. Acho que o vaticínio de Joaquim Nabuco continua de pé, o passado escravagista é a grande característica nacional. Qual a relação dela com o que acontece no STF? Vejamos…
Segundo o Luiz Felipe de Alencastro, desde a proibição do tráfico negreiro, em 1831, até a abolição da escravatura, mais de 700 mil africanos chegaram ao país. A escravização desses homens e mulheres era ilegal até mesmo para as leis brasileiras da época. “E isso foi ocultado a eles e a seus descendentes até 1888 [quando acabou a escravidão]“. No momento da abolição, muitos afrodescendentes enfrentaram as políticas de branqueamento da sociedade e, além de serem deixados à própria sorte, muitos foram perseguidos. Ou seja, o Estado brasileiro adotou a ilegalidade sob uma fachada de legalidade.
Quando um blogueiro disse que o Barbosa era “um preto de alma branca”, segundo a letra da Constituição, ele certamente cometeu um crime. Isso seria algo indiscutível num país europeu (principalmente naqueles de formação puritana). Mas, no Brasil, mais importante do “qual seja” o crime é “contra quem” ele tenha sido cometido. Nesse sentido, Barbosa ajuda sim a dar continuidade ao personalismo iniciado com a escravidão. Ou seja, ele age em prol de manter ranços que atingiram não somente, mas principalmente os afrodescendentes que aqui foram traficados como reles mercadorias e que continua a vitimar afrodescendentes nas periferias das grandes cidades.
Ora, que o estado brasileiro tenha adotado práticas ilegais e contrariado, já naquela época, as leis que ele mesmo preconizava (que funcionavam como fachada, coisa pra gringo ver) determinou a volubilidade de nossas leis, algo que perdura até hoje. Por isso um policial militar não vê nenhuma contradição em meter a mão na cara de um favelado, invadir um barraco e pedir desculpas quando descobre que o portador de alguns papelotes de cocaína era filho de um juiz (ou quem sabe o próprio juiz). Por isso o padrão das “batidas” varia de acordo com a aparência do suspeito. É triste, mas PM está sendo coerente, ele tem a história do Brasil atrás dele. Também Antonio Candido, talvez o maior pensador brasileiro, percebeu algo análogo no que chamou de “Dialética da Malandragem”, a saber, uma constante reversibilidade entre os pólos da ordem e da desordem vigente na sociedade do século XIX e que serviu de mola criativa no romance Memórias de um Sargento de Milícias. O mito da cordialidade de Darcy Ribeiro sempre possui seu lado perverso, de violência e desmando, e disso acho que ninguém mais duvida.
Enfim, caríssimo Mário, tudo isso pra dizer que não quero uma nova abolição: quero sim que, pela primeira vez, realizemos a abolição de fato e de direito, aquela que nunca foi feita.
Mario SF Alves
De fato.
Ou a democracia se espalha pelo mundo ou mundo encolhe ate uma desumana e estúpida senzala constituída por escravos em ambos os lados.
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Abs.,
Mario.
Urbano
Tudo isso já estava escrito nas estrelas… E o melhor é não nos enganarmos, pois a pisada nessa charneca será como sempre foi…
Rafael
concordo em partes. Parte do STF se vendeu ao PSBD, mas não acho que seja o caso de todos.
O Barroso julgou certo. Pela lei o Azeredo não podia ser julgado pelo STF, pois o mesmo renunciou antes. Foi sacanagem do Azeredo? foi.
O Barroso cumpriu a constituição. Poderia ter optado por não seguir? sem duvida, pois ele tem poder de sobra para isso. Mas o trabalho dele é garantir a aplicação da lei como ela está definida no momento do crime. Se hoje ela tem brechas ela deve ser alterada, mas não pode ser desacatada, para que nos casos futuros a justiça seja feita, afinal leis podem ser mudadas. Elas não servem para nada se não servirem a uma sociedade melhor.
Foi uma chance desperdiçada, mas não é isso que vai dar esperança para o Aécio.
Eu espero…
Rafael
Se bem que pensando bem, em Minas a justiça não será feita. O STF vacilou nesse ponto.
Retiro o que eu disse o STF deveria ter segurado o Azeredo para ser julgado pelos ministros.
Carlos Ribeiro
A Justiça de MG está para o PSDB assim como a do RJ está para a Globo, ou seja: ganham todas.
Cissa
Lassance, concordo plenamente com você. Porém, olhando o lado positivo, se é que se pode falar assim, agora os réus da AP470 tem mais um motivo para contestar esse julgamento medieval. Ora, se Azeredo não pode ser julgado pelo STF porque renunciou ao mandato, então, muitos dos réus da AP470 jamais poderiam ter sido julgados lá.
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