16 de março de 2010, Palácio do Itamaraty, Brasília – Entrevista do ministro Paulo Vannuchi sobre alterações no PNDH-3
Eu torço pra que em torno das 500 propostas haja um grande consenso. Estamos todos unidos em defesa dos direitos humanos. Em torno das 21 propostas em que há controvérsias, haverá controvérsias que são opiniões diferentes e haverá aquelas que localizam aspectos do programa que realmente merecem reparos. Então, sobretudo no tema do aborto, no tema de como está redigida a questão dos temas religiosos, e sobre como está redigida a proposta de mediação pacífica de conflitos, são três pontos que nós já temos um entendimento de alterar, corrigindo, aperfeiçoando. E dia 8 de abril estarei no Senado, dependendo do que se debater em outros convites do Senado ou da Câmara, nós publicaremos novamente com a intenção que é sempre prioridade dos Direitos Humanos que é construir largos consensos. Então, onde houver desacordo, não tem jeito. No Legislativo ele seguirá as regras de definição do processo legislativo, a regra da maioria. E onde houver acordo o Brasil avança melhor e passa a entender que ele tem um bom Programa Nacional de Direitos Humanos, consistente, apoiado por todos os organismos especialistas em Direitos Humanos no Brasil. E esse trabalho de esclarecimento e de aperfeiçoamento e correção, está voltado para que o Brasil compreenda que deu mais um passo adiante no fortalecimento na democracia.
Vanildo, Estadão – No capítulo da imprensa há algum reparo ou não?
No capítulo da imprensa não estamos fechados para fazer reparos. Agora, eu há pouco ainda relia, pela milésima vez, “definir critérios editoriais de ranking”, e não conseguimos nos convencer de que haja aí a menor intenção de censura a imprensa. Esse governo, por todos os seus ministros, pelo presidente, dezenas de vezes, reafirma, que é absolutamente contra qualquer tipo de censura à imprensa. O presidente Lula declara: “Eu sou fruto da liberdade de imprensa”. Então, nesse sentido, foi interpretado como se fosse intenção de censura aquilo que é um chamamento à mídia para parcerias, para engajamento, das próprias entidades empresariais, dos sindicatos de jornalistas do Brasil inteiro, dos profissionais, para entendermos juntos as nossas co-responsabilidades. Então o que está dito lá é definir critérios editoriais de ranking, pra premiar, pra valorizar as boas matérias, como já há em inúmeras experiências, o prêmio Vladmir Herzog, jornalismo e Direitos Humanos, os prêmio da ANDI, e também no ranking, localizar na programação programas que eventualmente tenham conotação racista, de discriminação à mulher, que sejam homofóbicos, e o Brasil já tem instrumentos, pra esse ranking sendo feito, o MP, defensores, as autoridades constituídas tomarem as iniciativas adequadas. Então, nesse sentido o ranking pode ser feito em parceria com as próprias empresas, elas podem ser convidadas a isso, seja com os Direitos Humanos, seja com o MJ, onde está sediada a classificação indicativa, seja no próprio Ministério das Comunicações. Então o que nós estamos fazendo no momento é fazer o diálogo sereno, o debate, explicando que não há nenhuma. E se houver uma argumentação de que determinado aspecto, determinada ação, das 521, 500 de grande acordo e polêmica em torno de 20, que merece reparo porque pode suscitar uma interpretação equivocada, também incluiremos esse reparo.
Cristina Serra, TV Globo – Ministro, na questão agrária o senhor foi mais específico, o senhor falou por exemplo que vai retirar a oitiva…
Nós vamos retirar quando estabelece passo prévio. Porque o passo prévio cria uma anterioridade e existe toda uma tratativa com a ouvidoria agrária nacional, o próprio Conselho Nacional de Justiça, o presidente Gilmar Mendes esteve recentemente em Marabá para isso, a AMB, estão trabalhando um diálogo que vai muito nesse sentido. Então a ideia, quando tem lá, como primeiro passo, e depois no lugar em que se diz ouvir o MP, se dizia também os atores da ocupação, são as duas eliminações que nós vamos fazer atendendo então a essa crítica que, num sistema democrático, a crítica leva exatamente a compreender que aqui a formulação tem que ser alterada e será alterada.
Cristina Serra, TV Globo – De qualquer maneira, o texto final só depois de o senhor ir ao Congresso?
Havia a opção de fazer uma coisa ou outra. Já ir ao Congresso com as alterações, e entre as duas analisamos, achamos melhor, de maior respeito com o Poder Legislativo, aguardar do que já incorporar eventuais sugestões construtivas de diálogo que sejam pertinentes pra fazer uma republicação só.
Cristina Serra, TV Globo – Mas aí o Plano todo é republicado?
Ele é republicado mas ele não precisa de ter páginas de Diário Oficial. Ele é republicado assim: “O Programa Nacional de Direitos Humanos passa a ter a seguinte redação”. E aí só publica no Diário Oficial os itens que receberam mudanças.
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Cristina Serra, TV Globo – Com relação ao aborto e aos símbolos religiosos…
Estou conversando com o movimento de mulheres, recebi onze lideranças de mulheres do Brasil inteiro, que vieram insistentemente pedir que eu não alterasse. Eu lamentei, disse que já era um compromisso meu de público, com a imprensa, com a Igreja, a CNBB, e sobretudo porque expressava a convicção do presidente da República, o decreto é do presidente, não é nosso. Estamos ainda dialogando sobre isso. O PNDH 1 e 2 abordam o tema e as declarações das mulheres das duas conferências nacionais abordam. Decisões da ONU abordam. Então faremos uma redação que retoma uma construção semelhante aos do PNDH 1 e 2, na linha de estimular o debate, mesmo porque não há mais um projeto de lei em tramitação, ele parou, então tecnicamente a formulação já estava errada. Fortalecer o debate, a discussão, as iniciativas legislativas, que superem a visão punitiva do aborto, tendo em conta que ele é um grande problema de saúde pública, e considerando as recomendações das Nações Unidas, especialmente na Conferência de Pequim, de 1995, onde por unanimidade, eu não sei se estava presente, mas unanimidade pode significar que o próprio Vaticano apoiou, a formulação não usa a palavra aborto, mas defende o direito de as mulheres controlarem todos os aspectos que envolvem sua fertilidade. Então nós não temos ainda a redação. E sobre os símbolos religiosos, a redação está ruim porque tem o conteúdo impositivo. Impedir a ostentação. Então vamos trocar por estimular o debate na sociedade, especialmente com as religiões, sobre a conveniência ou não da exibição de símbolos religiosos, nas instituições públicas, levando em conta o caráter laico do Estado. E há teólogos que argumentam que não é bom que haja essa exibição. Assim como entre as mulheres que recebi, as Católicas pelo Direito de Decidir, que argumentam que também na própria teologia, até o século III, Santo Agostinho entendeu que a vida não começava com a concepção, começava mais tarde, o que leva a maioria dos países europeus, a América do Norte, a terem uma legislação de aborto mais flexível, permite o aborto até determinado mês e o fato de que na lei brasileira atual já há desacordo entre a Igreja, a que não aceita modalidades de abortamento que a lei brasileira permite. Estupro, ameaça de risco à vida da mãe, e ainda está em tramitação no Supremo a questão da anencefalia. Eu não lembro se exatamente há 30 anos, mas eu vivi bem, uma polêmica sobre o divórcio no Brasil, em que a Igreja Católica foi radicalmente contra, o senador Nelson Carneiro, do Rio de Janeiro, tinha uma enorme dificuldade… Hoje o divórcio é um tema absolutamente aceito no Brasil. Eu sou de uma família católica de formação, e não vejo que na vida da Igreja Católica haja um combate sistemático aqueles católicos que terminaram se divorciando. É muito provável que como aconteceu na Europa, América do Norte, a visão sobre o aborto no Brasil seja uma visão ampla. Agora, como a redação concreta teve os problemas de desacordo com o pensamento do presidente e de uma crítica da Igreja, que tem um papel fundamental na luta pelos DH no Brasil, foi a primeira alteração que nós anunciamos publicamente e vamos promover agora.
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