Dr. Rosinha: Negacionismo já matou 161 mil brasileiros por covid; infectados somam 5,5 milhões

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Por Dr. Rosinha

Foto Alex Pazuello

Negacionismo

Por Dr. Rosinha*

O poeta e filósofo Miguel de Unamuno, reitor da Universidade de Salamanca, na Espanha, fazia uma palestra quando foi interrompido – pelo general fascista, José Millán-Astray – aos gritos de “abajo la inteligencia, viva la muerte”.

Era o princípio da sangrenta guerra civil e a frase do general enunciava a cláusula pétrea da ideologia nazifascista e da extrema direita em geral: o culto da violência e a negação da própria humanidade pela adoração da morte.

A frase – “abajo la inteligencia, viva la muerte” – gritada pelo general fascista, ainda, não foi gritada a plenos pulmões por Bolsonaro, nem por qualquer um dos membros do seu governo ou por governadores de alguns estados.

Porém, apesar de não gritada, já foi dita explicitamente várias vezes,  em várias ocasiões.

Além disso, através de decisões políticas, também está sendo colocada em prática no cotidiano do exercício de mandatos (federal e algum estadual, como aqui – com sutileza – no Paraná).

Na Espanha, esta frase foi um dos símbolos do início da guerra civil espanhola que matou mais de meio milhão de pessoas.

Após as devidas escaramuças e acusações contra os republicanos e a esquerda (comunistas, socialistas e anarquistas), a guerra civil espanhola foi declarada por meio de pronunciamento de um grupo de generais liderados por José Sanjurjo.

Guerra contra o povo espanhol e o governo republicano de seu próprio país.

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No artigo Pronunciamento, escrevi que as políticas de Bolsonaro poderiam levá-lo a alcançar o sonho que tanto almejava de matar 30 mil pessoas.

Mal sabia eu, àquela altura, que Bolsonaro, com sua política negacionista, iria superar em muito a sua meta.

Do início da pandemia até esta quarta-feira, 4 de novembro de 2020, já causou a morte de 161.106 brasileiros e brasileiras. E os casos confirmados de infecção pelo novo coronavírus somavam 5.590.025.

O número de mortos é igual ou superior aos atingidos por algumas guerras. Parte deles foi vítimas das políticas negacionistas do governo federal e de muitos governos estaduais e municipais.

Ao longo dessa pandemia, os seus seguidores rejeitam, entre outras coisas, o isolamento social como meio de prevenção da doença e o uso de máscaras.

E, quando acometido da doença, negam a ciência e querem impor medicamentos inócuos ou com eficiência questionada.

Em plena pandemia – quando sequer há vacina disponível –, os negacionistas constroem um movimento antivacina, que tem como um dos baluartes o presidente Bolsonaro. ”Inteligentemente’‘, ele já declarou que ninguém deve ser obrigado a tomar vacina.

Inegavelmente, o acesso à informação facilitado pela internet fomenta debates inteligentes nas redes sociais online.

Poderia, portanto, democratizar o conhecimento.

Porém, por razões diversas, frequentemente isso não acontece.

Por exemplo, algumas pessoas não sabem usar esse instrumento direito.

Já outras pessoas usam a internet e as redes sociais visando à desinformação, ao mal, à destruição. Propositalmente disseminam mentiras, preconceitos, ódio.

Há também aquelas que não conseguem distinguir o falso do verdadeiro,  acreditando cegamente no que leem, especialmente se as ”informações” forem passadas nos grupos de WhatsApp de conhecidos, do pessoal da igreja.

Parte desses insuficientes intelectuais nega a pandemia pela covid-19, nega a ciência com um simples grito: “NÃO!”.

No século XX, houve reações negacionistas semelhantes, mas não com tanta repercussão talvez por não termos internet.

O caso do HIV/Aids é um exemplo.

Outro é o câncer do pulmão pelo fumo. Apesar das robustas evidências científicas que comprovam que o tabaco pode causar uma porção de doenças, entre as quais o câncer do pulmão, há até hoje quem divulgue que isso não seja verdade.

Nos dois casos, a ciência casada com as políticas públicas venceu o negacionismo coletivo.

No momento, o “NÃO” dos negacionistas tem dois componentes e podem ser a razão da mobilização de muitas pessoas.

Um deles, o mais forte na minha avaliação, é a simples negação da ciência. Consequentemente, negação da existência do vírus e da doença. Eles são  seguidores do general José Millán-Astray.

Outro componente, menos expressivo, é o exposto por Giorgio Agamben, um filósofo italiano.

Para Agamben, o governo da ciência pode trazer perigos à vida social.

Um exemplo que ele dá: a ciência pode tomar decisões contrárias à democracia, como o isolamento social e o fechamento de fronteiras que impede o direito de ir e vir, adotados agora na pandemia por covid-19.

Em artigo recente, Entre cientificismo e negacionismo, Gabriel Ferreira reflete que as autoridades ao tomarem decisões levem em consideração a ciência, mas não a use para atingir seus objetivos autoritários.

Muitos dos que estão indo às ruas contra o isolamento social e a vacina para covid-19 estão mais identificados com o grito “abajo la inteligencia, viva la muerte”, do general José Millán-Astray, do que com as preocupações levantadas pelo filósofo Giorgio Agamben.

No Brasil, os negacionistas negam a ciência e a inteligência.

Só não refutam que são de direita, autoritários, limitados intelectualmente, em sua maioria fascistas, que vivem esperando o pronunciamento de um general, mas que aqui no Brasil pode ser de um capitão, mandando um “cabo e um soldado” para fechar o STF e quem sabe até o Congresso Nacional.

*Dr. Rosinhaé médico pediatra, militante do PT. Pelo PT do Paraná, foi deputado estadual (1991-1998) e federal (1999-2017).  De maio de 2017 a dezembro de 2019, presidiu o PT-PR. De 2015 a 2017, ocupou o cargo de Alto Representante Geral do Mercosul. 

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Dr. Rosinha

Médico pediatra e militante do PT. Pelo PT do Paraná, foi deputado estadual (1991-1998) e federal (1999-2017). De maio de 2017 a dezembro de 2019, presidiu o PT-PR. De 2015 a 2017, ocupou o cargo de Alto Representante Geral do Mercosul.


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