Por Marco Aurélio Mello
por Marco Aurélio Mello
Enquanto uma parte grande da sociedade brasileira está “vendendo o almoço para pagar a janta”, como se diz no popular, um seleto grupo de brasileiros tem preocupação diferente: como educar seus filhos na fartura.
Acabo de ver o convite de um evento que está sendo organizado em São Paulo, um café da manhã, que pretende reunir donos de “empresas familiares”, dessas que começaram pequenas, cresceram e seus patriarcas e matriarcas, agora, temem se os negócios sobreviverão ou não às próximas gerações.
O medo não é descabido. Entre os abastados, é muito comum a fantasia persecutória da ruína. Meu pai sempre lembra de uma frase que considera emblemática nesta lógica que insiste em se repetir: “pai rico, filho nobre, neto pobre.”
Por isso, para eles, valores como autoridade, dedicação aos estudos e segurança estão no topo das necessidades de quem nunca teve que se preocupar com o básico da sobrevivência: um teto e um prato de comida.
Para muitos, a programação do evento pode parecer piada: A educação das filhas pré-adolescentes; Como proteger o patrimônio dos descendentes; Minha filha entrou na USP, e agora?; Meu filho tem menos de um ano e sua educação já me preocupa e O futuro de jovens bem-nascidos no mercado de executivos.
Os palestrantes são: empresário, advogado, acionista, herdeiro e headhunter (caçador de talentos), todos com os seus filhos bem criados.
A questão que para mim é importante nem é a preocupação, legítima, dos pais com o futuro dos filhos.
Mas é com como nossa sociedade, sobretudo a classe social mais aquinhoada, não se preocupa com o que é essencial, relevante para um futuro melhor para todos.
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Fico a perguntar: — O que na educação de uma filha pré-adolescente é importante? Será que vão discutir machismo e feminismo, misoginia, abuso e violência sexual no ambiente doméstico, liberalização sexual, emancipação de gênero, ou amor maduro? Duvido.
— Proteger o patrimônio dos descendentes levará em consideração a necessidade de afirmação dos despossuídos e socialmente vulneráveis? Pouco provável.
— Minha filha entrou na USP, e agora? Será que vai virar comunista? Vai frequentar o DCE? Vai começar a andar com aqueles cabeludos da Marcha da Maconha? Acho que a abordagem de uma palestra sobre a inquietação da filha na USP está mais para como ela pode formar networking, né?
— Com menos de um ano a educação do filho já preocupa, é verdade. Há escolas, como o Dante Alighieri, nos Jardins, que já tem fila de espera de matrículas antes ainda da criança entrar em idade escolar, por exemplo.
Será que o autor dA Divina Comédia, que dá nome à escola, inspirará esses pais tão ciosos e severos a entender os valores do humanitarismo? Ou, ao contrário, vai incentivá-los a aprofundar o fosso, como forma de depurar nossa sociedade preservando os “bons e os justos” no juízo final?
Depois a gente não entende o que deu errado na educação dos nossos filhos quando, em vez de criar pessoas compassivas, solidárias e generosas, criamos herdeiros dispostos a uma guerra sangrenta para saber quem vai ficar com o quê, quando o patriarca e matriarca partirem desta para “melhor”.
Nessas horas sorte têm os advogados especializados em Direito de Família.
Fez até eu lembrar daquela charge que circulou na internet tempos atrás, de um pai diante de uma cela da prisão. É mais ou menos assim: – Não sei onde eu errei, meu filho! A resposta vem da cela ao lado: – Pai, eu sou este aqui!
Quanta falta de amor…
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Marco Aurélio Mello
Jornalista, radialista e escritor.
Comentários
estudante da USP
http://www.mattosfilho.com.br/Convites/Convite_180517.aspx?__dtracking=13932.1969.49590.d9e8a
Lukas
Pode ser só preconceito do autor.
Edgar Rocha
Eu, se fosse estes pais, não me preocuparia se meu filho virasse um cabeludo da marcha da maconha. Estes pais sabem muito bem que, filhinho de papai, quando entre pra esquerda, é fase mesmo. Como já disseram alguns esquerdistas de antanho: todo jovem é de esquerda, depois cresce e vira de direita. Claro, isto vale se você nasceu em berço esplêndido e descobre que pra manter seus ideais terá de abrir mão da boa vida do passado. Boa vida conseguida muitas vezes com a “adequação” de seu pai “empreendedor” ao sistema: sonegando imposto, corrompendo a deus e o mundo, passando a perna nos outros e explorando funcionário. Caso contrário, fica meio estranho lutar contra vinte centavos de aumento da passagem sem nunca ter tomado um ônibus.
Por outro lado, tá cheio de maconheiro de direita, ué. Quem falou que usar droga é o mesmo que ser progressista ou de esquerda???
O problema é se a filha passar na fefeleche. Periga sair de lá sem prestar nem pra ser historiadora, coitada.
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