Fátima Oliveira: Grávida de anencéfalo é livre para decidir sobre parto

Tempo de leitura: 3 min

Fátima Oliveira, no Jornal OTEMPO

Confortada pela vitória do mérito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54 (ADPF-54) no Supremo Tribunal Federal (STF), compartilho que, desde 11.4.2012, a grávida de anencéfalo é livre para decidir se quer prosseguir a gravidez ou antecipar o parto, sem anuência judicial.

A ADPF-54, proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) e pelo advogado Luiz Roberto Barroso, com apoio da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e consultoria da Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero -, instou o STF a apreciar o mérito: não equiparar a antecipação de parto de anencéfalo a aborto. A base argumentativa é brilhante: a antecipação terapêutica do parto não é um eufemismo para o aborto (Débora Diniz).

Em 1º.7.2004, o ministro do STF Marco Aurélio Mello concedeu liminar abolindo autorização judicial para interromper a gestação; bastava o laudo médico de anencefalia, alterando pela primeira vez, desde 1940, a lei: criando mais um “permissivo legal” – eram dois desde 1940: gravidez resultante de estupro e risco de vida para a gestante. Dezenas de mulheres foram beneficiadas, mas a liminar foi cassada (20.10.2004) por exigir julgamento prévio do instrumento jurídico (ADPF)!

Oito anos se passaram. Participei da idealização das Jornadas Brasileiras pela Maternidade Voluntária, que viraram Jornadas Brasileiras pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, em parte decorrentes da ostensiva perseguição fundamentalista corporificada na Câmara dos Deputados para viabilizar teses contra o aborto e aprovar o Dia do Nascituro. Era novembro de 2003.

Viver de “apagar incêndios” tem limites. Era urgente romper os grilhões da solidão política feminista, e a conjuntura nos favorecia: o “núcleo duro” do governo dizia amém ao Vaticano, mas o Ministério da Saúde e a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM) faziam a disputa ideológica sem medos.

A Rede Feminista de Saúde coordenou a formalização das Jornadas (Brasília-DF, 5 e 6.2.2004), visando a: estimular e organizar mobilização nacional pelo direito ao aborto legal e seguro, através de debate público; apoiar projetos de lei que ampliam os permissivos legais; se contrapor aos projetos de lei contra o aborto; e ampliar o leque de aliados para a descriminalização/legalização do aborto. Nem mais, nem menos.

Três posições estavam postas: lutar apenas por mais permissivos; a pecha de que as Jornadas abriam mão do radicalismo, apoiando posições gradualistas (permissivos); e a ideia das Jornadas, que avaliava que as três visões não eram excludentes. Na 1ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (julho, 2004), aprovamos moção de apoio à liminar do STF e a revisão da lei punitiva sobre aborto, materializada na Comissão Tripartite sobre Aborto, que valeu a Lula interpelação da CNBB; ao que ele respondeu que era contra o aborto, mas o governo trabalharia a revisão da lei. Depois roeu a corda: não encaminhou a proposta da Tripartite ao Congresso Nacional!

Hoje, o “chicote moral” do Vaticano impõe ao governo desta República laica e democrática toque de silêncio, mas ele terá de cumprir, sem chiar, a decisão do guardião da Constituição, o STF, e incrementar medidas preventivas de anencefalia (taxas adequadas de ácido fólico), com vistas a diminuir a alta incidência de anencefalia: 4º lugar no mundo – um caso a cada 700 nascimentos. Fala-se de cerca de 500 nascimentos de anencéfalos/ano! “C’est la vie”…

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Comentários

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luiza hernandez

Fátima, tiro o chapeu. "Era urgente romper os grilhões da solidão política feminista" que isso quer mesmo dizer? Quanta falácia! Está ficando cômico ler seus textos. Cômico também ver seu séquito de seguidores doutrinados.

Adrienne Mateus

Para mim a garantia da LIBERDADE é o centro, pois quem quer faz e quem não quer não faz. Parabéns ao STF

Milena

Fátima, eu acho que foi uma vitória e tanto. Demorou, mas chegou

Alberto

Discutindo com uma amigo o artigo de Fátima Oliveira ele discordou em um ponto. Acha que ela centra muito poder e fogo no Vaticano, esquecendo-se dos evangélicos, hoje uma força política de peso e descoberta na base aliada e no Congresso Nacional. Disse-lhe que a tal base evangélica é acomodável no toma lá da cá do jogo de interesses da política fisiológica, a exemplo do acontecceu agora na Votação do Supremo, já que as notícias que se tem é que até rachou a tal Bancada Evangélica, claro que tudo a ver com a Multiplicação dos Peixes (Ministério). Já o Vaticano, perdeu todas as suas bandeiras no mundo, só restou a que empunha: a defesa do feto e não pode perdê-la, porque ficará sem ter o que defender. E por ser bandeira única o Vaticano centra toda a sua ação nela e se investe de poder para meter o bico na vida política de outros países. Tem nome: é ingerência estrangeira mesmo!

abolicionista

Decisão importante, mas insuficiente para amainar a escalada de fanatismo religioso que mantém a consciência das massas no mais pantanoso dos obscurantismos. Há muito mais a fazer. Sem esperanças de conseguir uma vida renovada, é fácil compreender por que parcelas cada vez maiores de nossa população abracem o fanatismo religioso, ainda mais quando esse é de tipo puritano (ou seja, do tipo que promove, de fato, uma pequena melhora das condições financeiras de existência, pago com extremo sacrifício). O fato mostra que, apesar de ter chegado ao poder, a esquerda brasileira (e eu faço parte dessa esquerda) não possui projeto de país que motive políticamente as massas, que conquiste suas paixões. A política, no fundo, só merece esse nome quando ela consiste em uma movimentação de um grupo de pessoas em torno de uma ideia que as apaixona. Infelizmente, ao abandonar o projeto socialista, grande setores da esquerda brasileira vêm pensando a política como gestão, como administração. A evangelização da sociedade brasileira pode ser entendida também, levando-se em conta a dimensão do desejo, como uma paixão sem objeto: um desejo de utopia que não encontra possibilidade de realização terrestre. Será que não está na hora de começarmos a falar em uma mudança mais profunda?

    luiza hernandez

    Abolicionista, que tipo de pessoa é você? Quer então implantar aqui uma mudança mais profunda??? Seria algo do tipo um estado ateísta com uma doutrina de materialismo dialético marxista? Vamos então perseguir instituições religiosas e seus fieis? Melhor matá-los, pois deve ser melhor morrerem do que serem evangelizados. É isso mesmo?

Marduk

Pelo menos os aborteiros reconhecem este direito…

Marta

Fátima Oliveira, adorei. Massa demais mesmo. Parabéns

Elias

“Hoje, o “chicote moral” do Vaticano impõe ao governo desta República laica e democrática toque de silêncio”.

O mesmo silêncio obsequioso que Leonardo Boff cumpriu e mesmo assim foi banido por Ratzinger.

É vexaminoso ver o Vaticano influenciar mais o Brasil e menos a Itália, onde o aborto é liberado.

Messias Macedo

A BANDEIRA DOS DIVINOS REAÇAS!

… Urge sempre a necessidade de tremular uma bandeira, defesa de uma causa [ainda que estúpida], ou, simplesmente, a contestação irracional do inteligível… Eis a postura/atitude dos sectários, fundamentalistas, refratários ao aperfeiçoamento intelectual,biológico, moral e espiritual…
["O Sol gira ao redor da Terra!" (sic )]

República Destes Bananas
Bahia, Feira de Santana
Messias Franca de Macedo

EM TEMPO:

Bandeira do Divino
Ivan Lins

Os devotos do Divino vão abrir sua morada
Pra bandeira do menino ser bem-vinda, ser louvada, ai, ai
Deus nos salve esse devoto pela esmola em vosso nome
Dando água a quem tem sede, dando pão a quem tem fome, ai, ai

A bandeira acredita que a semente seja tanta
Que essa mesa seja farta, que essa casa seja santa, ai, ai
Que o perdão seja sagrado, que a fé seja infinita
Que o homem seja livre, que a justiça sobreviva, ai, ai

Assim como os três reis magos que seguiram a estrela guia
A bandeira segue em frente atrás de melhores dias
No estandarte vai escrito que ele voltará de novo
E o Rei será bendito, ele nascerá do povo,ai, ai

Messias Macedo

… Somente os anencéfalos são contrários à interrupção da gravidez nos casos de feto acometido de anencefalia! É lastimável que uma prerrogativa tão elementar necessite julgamento pelo STF – o mínimo de racionalidade mediana e bom senso são suficientes para determinar o veredicto…

República de 'Nois' Bananas
Bahia, Feira de Santana
Messias Franca de Macedo

josé gilvar gonzaga

ANTES IMPORTA OBEDECER A DEUS DO QUE AOS HOMENS. ( Atos dos apostulos 5, 29 ).

    Marta

    Concordo e respeito que use para você; não queira descer goela abixo de quem não pensa assim. Se manque, deixe a vida dos outros em paz

    Marcelo

    José seu comentario foi a prova final e irrefutavel de que pessoas sem cerebro podem sobreviver .

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