Celso Tres: A política, não o aparelho de justiça, é a alma do estado de direito; judiciocracia é o pior dos sistemas
Tempo de leitura: 13 min‘Até a virtude precisa de limites’. A política, não o aparelho de justiça, é a alma do estado de direito. Entrevista especial com Celso Tres
por Patricia Fachin, no IHU On-Line
“A Lava Jato é a maior e irrepetível investigação da história” porque “quebrou a cinematografia da corrupção” e “por mais imaginativo que fosse o cineasta, jamais teatralizaria tantos valores bilionários, modus operandi mais abusado e desavergonhado, servindo às mais altas autoridades da República e à privataria dos empresários que canibalizam o Estado brasileiro”, diz o procurador Celso Tres à IHU On-Line.
Apesar de reconhecer a relevância da operação, Tres avalia que a Lava Jato “pecou” em três dimensões: “falta de ponderação econômico-social, política e atropelo ao devido processo legal”.
Ele também comenta o recurso de delação premiada, empregado pela Lava Jato para desmontar o esquema de corrupção.
“A delação data de 1990, Lei nº 8.072/90. Em 2012, ela teve uma disciplina mais detalhada. Combate-se a máfia pactuando leniência com Al Capone? Delação deve ser pontual e dos intermediários para chegar aos criminosos principais. Sendo efeito dominó, produz impunidade dos protagonistas da criminalidade, a exemplo de Marcelo Odebrecht”, adverte.
Na entrevista a seguir, concedida por e-mail, Celso Tres também comenta a atuação do Ministério Público e frisa que o “saldo” dos trinta anos de atuação da instituição “é por demais positivo”, o que não significa que não deva ser aprimorada.
“Por que tantos membros do Parquet atuando nos tribunais? São realmente necessários? Nenhum país do mundo tem estrutura judiciária quanto a do Brasil, tanto na Justiça (Estadual, Federal, Trabalho, Eleitoral e Militar), Ministério Público (Federal, Trabalho, Distrito federal, Estados), Defensoria (União, Estados), Procuradoria (União, Esta-dos, Municípios), sendo, disparado, a mais cara do mundo (proporção do gasto orçamentário em face do PIB). Só nós estamos certos?”, questiona.
Celso Tres é formado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. Foi auditor do Tribunal de Contas e Procurador do Estado/RS e desde 1996 atua como Procurador da República.
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Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como o senhor avalia a decisão do STF de restringir o foro privilegiado de deputados e senadores?
Celso Tres – Mais um capítulo de nossa judiciocracia. Constituição já trintenária, apenas agora o STF descobre que o foro especial deve restringir-se aos atos funcionais no mandato.
Entrementes, a exemplo da ditadura militar que a cada revés criava nova regra eleitoral, o STF consagrou escrachado casuísmo, aplicando a regra apenas aos membros do Congresso, deixando os próprios ministros, juízes, ministério público e cerca de 50 mil outros a salvo.
Mais. O que é delito funcional? Última denúncia da procuradora-geral da República Raquel [Dodge] contra [Jair] Bolsonaro, em razão de ofensas discriminatórias contra negros e índios, diz com o exercício do mandato parlamentar ou pré-campanha presidencial?
De outra face, alguém acha que oligarquias pátrias, a exemplo de Collor em Alagoas, Sarney no Maranhão e Magalhães na Bahia, serão processados e condenados em primeira instância no Brasil?
IHU On-Line – Na prática, quais são as implicações e o impacto dessa decisão, por exemplo, em situações como a do senador Aécio Neves que, segundo acusação feita contra ele, recebeu propina no valor de 5,2 milhões da Odebrecht entre 2003 e 2010, quando era governador de Minas Gerais? Sendo ele senador no momento em que a denúncia foi feita, o julgamento será em primeira instância ou não? A decisão abre algum tipo de brecha para a realização dos julgamentos?
Celso Tres – Seria no 1º grau de Minas Gerais. O ministro Alexandre de Moraes já declinou. Correligionário de Aécio, Eduardo Azeredo (PSDB/MG) — fatos de 1998 — apenas agora teve condenação pelo Tribunal de Justiça/MG. Seguindo idêntico rito, em 2038 Aécio poderia ser preso.
IHU On-Line – Na semana passada divulgou-se a notícia de que a segunda turma do STF fará um julgamento virtual de um novo recurso do ex-presidente Lula para deixar a prisão (Veja PS do Viomundo). Se esse julgamento virtual for favorável ao pedido do ex-presidente, qual é o próximo passo? Se a prisão for revogada, há possibilidade de ele concorrer às eleições presidenciais?
Celso Tres – Inexplicável que a turma contrariasse o pleno do STF, libertando Lula. Mesmo solto, ele estaria condenado por juízo colegiado, inelegível. Alternativa seria sua célere absolvição ou anulação do processo em sede de recursos extraordinário ou especial interpostos. Porém, isso é de todo improvável. Com a advocacia que Lula teve na sua defesa não há inocência de réu que resista. Ela sempre foi trágica.
IHU On-Line – Como o senhor avalia a decisão do STF de manter a prisão em segunda instância? Alguns alegam que esse tipo de decisão fere o princípio de presunção de inocência garantido na Constituição. Outros argumentam que a Justiça brasileira permite um excesso de recursos, de modo que alguns criminosos possam recorrer sem nunca serem punidos pelos crimes cometidos. Como resolver esse tipo de conflito?
Celso Tres – Certo que a quase totalidade das nações entende suficientemente formada a culpa quando da condenação na instância recursal. Também não menos certo a inexistência de previsão explícita quanto é nossa Constituição, no sentido da presunção de inocência até o trânsito em julgado.
Defendo que possa ser executada a pena, porém não obrigatoriamente, ou seja, tanto o tribunal que condenou (TJ/RS, TRF/4ª) quanto o destinatário do recurso (STF, STJ, TSE), avaliando o caso concreto e a solidez do novo apelo, possam permitir a prisão aguardado o trânsito em julgado.
IHU On-Line – Que avaliação faz da decisão do STF no julgamento do pedido de habeas corpus do ex-presidente Lula?
Celso Tres – Mercê da mudança de posição do ministro Gilmar Mendes, revertendo o 6 vs. 5 em prol da execução da pena em 2ª grau, coerente seria a concessão do habeas a Lula.
Contrariamente ao dito, Rosa Weber foi nada coerente. Invocando posição colegiada que fora vencida, ela denegara liberdade em outros processos, é verdade. Porém, ali reunido estava o pleno do STF, concretizada a mudança de paradigma pela nova maioria. Aliás, por que Rosa Weber é ministra do STF?
Morreu Antonin Scalia, expoente conservador da suprema corte americana. Barack Obama tentou substituí-lo por juiz que alteraria, entre outras posições, a visão da corte sobre a pena de morte.
O senado americano obstruiu a nomeação. Por seu turno, Trump assumiu e obteve a designação de Neil Gorsuch, cuja primeira decisão foi, precisamente, confirmar a pena capital. Lá isso é normal, corolário da democracia que a doutrina eleita na urna seja projetada na justiça.
Aqui no Brasil, em 13 anos de poder, o Partido dos Trabalhadores não nomeou um sequer jurista de esquerda ao STF.
À exceção de Dias Toffoli, dileto de José Dirceu, todos preencheram os requisitos constitucionais do notável saber jurídico e reputação ilibada. Porém, todos liberais, centro-direita. O decisivo à nomeação de Rosa Weber foi sua relação de amizade com a família de Dilma.
Roberto Barroso, ora quem corre o mundo falando mal do Brasil, foi guindado porque defendeu o criminoso Battisti contra a extradição pedida pela Itália.
Teori Zavascki porque era a favor dos embargos de divergência no mensalão, situação que absolveu Dirceu do delito de quadrilha. Edson Fachin porque articulou manifesto de juristas em prol da reeleição de Dilma, tendo recorrido ao lobby da JBS no Senado para aprovar sua indicação.
Em suma, todos foram nomeados por alguma circunstância, menos a mais nobre causa de um estado democrático, qual seja, a doutrina escolhida pelo povo na urna.
IHU On-Line – Como o senhor avalia o desenvolvimento da Operação Lava Jato? Quais diria que são seus principais acertos e, de outro lado, equívocos, e qual possivelmente será seu legado para o país e para a área jurídica?
Celso Tres – A Lava Jato é a maior e irrepetível investigação da história. Os Procuradores da República que nela atuam perpetuaram em bronze seus nomes no memorial da Justiça. Quebrou a cinematografia da corrupção.
Por mais imaginativo que fosse o cineasta, jamais teatralizaria tantos valores bilionários, modus operandi mais abusado e desavergonhado, servindo às mais altas autoridades da República e à privataria dos empresários que canibalizam o Estado brasileiro.
Obra de tamanha envergadura, natural algumas ressalvas. Pecou pela falta de ponderação econômico-social, política e atropelo ao devido processo legal.
Âmbito econômico-social
No âmbito econômico-social, sob pena de vitória de Pirro, onde o próprio exército vencedor da guerra resta estraçalhado pela indevida gestão do conflito, as repressões criminais que atingem empresas e investimentos estatais devem resguardar a continuidade econômica.
Quem comete crime e deve ser punido é a pessoa física. A pessoa jurídica privada deve seguir, até para poder ressarcir o prejuízo causado. Nos diversos acordos do Ministério Público, nenhum teve cláusula social, manutenção de empregos etc.
A cidade de Rio Grande quebrou, milhares de empregos foram perdidos pela desativação das plataformas da Petrobras, ora produzidas na China, podendo ter seguido aqui no Brasil. Em razão de colaboração com a Lava Jato, a Embraer deu aos americanos US$ 206 milhões por ter pago propina na venda de aviões na África, como se os seus concorrentes ianques vendessem naquele mercado sem pagar vantagem.
Também nos EUA, mercê de insólito acordo com acionistas de lá, a Petrobras pagou cerca de R$ 10 bilhões a título de prejuízo daqueles. Acionistas do Brasil nada receberam e o montante é maior que todo o valor da corrupção recuperado pela Lava Jato.
Entrementes, Marcelo Odebrecht, maior corruptor da história, após apenas dois anos de prisão especial na Polícia Federal, acomoda-se em paradisíaca prisão domiciliar. Outros ícones, especialmente do mundo empresarial, também restaram impunes, sob sanções risíveis, incluindo até pena de estudo como acordo da delação.
Político
No aspecto político, a Lava Jato não se restringiu a imputar delitos às pessoas, mas derrubou governo e instituições da política.
O impeachment de Dilma capitaneado por [Eduardo] Cunha estava controlado, dormitava, bastando consultar a opinião dos analistas políticos de então, quando a criminosa — obtida sem outorga judicial e publicada contra o sigilo legal — divulgação da interlocução entre Dilma e Lula irrompeu o vulcão que levou de roldão o governo até sua decapitação sob a inexplicável justificativa de pedalada fiscal, tão insólita quanto a própria Janaína Paschoal.
Pior. Há muito, presentes provas da corrupção de Temer, então vice e sem imunidade, a exemplo do momentoso caso do porto de Santos, sem que o procurador-geral da República [Rodrigo] Janot tomasse qualquer medida sequer para iniciar apuração.
É inegável que a Lava Jato decolou no vácuo da sanha em destronar o PT. O atropelo do TRF/4ª, precipitando seu julgamento e obstando sua candidatura, é categórico.
Ações cíveis indenizatórias contra os partidos, cuja procedência leva sua extinção é outro exemplo da criminalização da política. Na Itália, Mãos Limpas, em apenas dois anos (1992/94), condenou cerca de 1,8 mil pessoas, extinguiu partidos tradicionais e o resultado foi Berlusconi, ícone da corrupção, nesta eleição de 2018 ainda hegemônico no país da bota. Agora, a Lava Jato faz campanha para ninguém do Congresso ser reeleito.
Pretende combater delitos ou usurpar a soberania do povo em escolher governo?
Processo legal
Sob a ótica do espezinhamento do devido processo legal, tomemos a presente decisão do Exmo. juiz Marcelo Bretas, com a prisão preventiva de 43 pessoas, doleiros de todo o país, alguns de POA , valendo elencar as motivações da reclusão em massa por ele invocadas:
a) resguardar a integridade física ou psíquica do próprio preso;
b) preservar a credibilidade do Poder Judiciário;
c) garantir a visibilidade da política pública de persecução;
d) recuperar o produto do crime — sequer tendo sido determinado o sequestro dos bens, ou seja, soltos os bens e preso o proprietário.
Invocou convenções da ONU e Interamericana contra a corrupção, as quais apregoam restrição à liberdade de infratores, porém, depois de formada a culpa, condenação, jamais antes consoante juiz Bretas impôs.
A motivação das prisões é genérica, não havendo qualquer individualização em face de cada detido do que justificaria sua detenção.
A individualização reporta-se apenas a delitos de lavagem (sequer apontado pretenso crime antecedente) e sistema financeiro que cada um teria perpetrado, tudo baseado apenas em dois delatores. Raros dos detidos têm sequer antecedentes delituosos provados na decisão.
É acaciano lembrar regra elementar do devido processo legal, havendo razões de prisão preventiva, salvo exceções, ainda com muito mais razões devem já existir fundamentos ao ajuizamento da denúncia, da ação penal.
Prisão temporária, mais restrita, prazo determinado, é a própria para investigar. No caso, apenas duas das 45. O Juiz da Lava Jato/RJ sequer deu tutela à produção probatória, inelutável em delitos de lavagem e sistema financeiro, a exemplo da quebra de sigilo bancário, fiscal, telefônico, busca domiciliar etc. Ou seja, prende-se para depois investigar o que preso eventualmente fez.
Dr. Bretas prolatou a decisão dia 02.05.18, determinando ‘SEGREDO ABSOLUTO DE JUSTIÇA enquanto durar a operação’, sendo que no dia seguinte, início das prisões, a íntegra de seu édito imperial foi repassada a toda mídia.
Arrematando, o Exmo. Juiz também acolheu o muro da vergonha, cadafalso da execução moral dos investigados em praça pública, típico das fogueiras medievais, marca da Lava Jato, mandando já de plano escrachar a antecipação de culpa dos autos sob o demagógico fundamento: ‘… direito ínsito a todos os brasileiros de conhecer e acompanhar as conclusões e o trabalho do Poder Judiciário nacional’.
Sempre exibindo sua religiosidade, messiânico, o Exmo. Juiz Bretas apenas não invocou o acautelamento de pecados dos reclusos para motivar o seriado de prisões.
De público, solenemente, o procurador da República coordenador da Lava Jato no RJ declarou que, tendo a Lava Jato de Curitiba iniciado com a prisão e posterior delação do doleiro [Alberto] Youssef, pretendiam idêntico com as detenções desses 45 doleiros, ou seja, detiveram para que eles delatassem.
Óbvio que esse quadro pinta arrematado escárnio à lei e à constituição, em hipótese alguma dando fundamento legítimo às detenções.
Qualquer país sério, de um mínimo estado de direito, entenderá absurda, ridícula a motivação exposta nesta decisão. Porém, aqui no Brasil é o retrato do histérico estado policial que, engalanado de salvador da pátria, hoje defenestra o devido processo legal.
IHU On-Line – Desde que se iniciou a investigação da Lava Jato, muitos especialistas da área do Direito criticaram as delações premiadas, enquanto outros argumentaram que essa era a única maneira de desmontar um esquema de corrupção como o que tem sido investigado. Apesar das críticas, acordos desse tipo também foram feitos no caso do Banestado, no qual o senhor atuou. Pode nos contar em que consistiram esses acordos à época? Eles foram fundamentais para a investigação? Eles se diferem dos acordos da Lava Jato em algum sentido? Como foi a repercussão acerca desses acordos à época?
Celso Tres – A delação data de 1990, Lei nº 8.072/90. Em 2012, ela teve uma disciplina mais detalhada. Combate-se a máfia pactuando leniência com Al Capone?
Delação deve ser pontual e dos intermediários para chegar aos criminosos principais. Sendo efeito dominó, produz impunidade dos protagonistas da criminalidade, a exemplo de Marcelo Odebrecht. Exemplo americano do escândalo da Fifa. O brasileiro J. Hawilla (Traffic), por dois anos, em segredo, sem vazamentos, colaborou e arrecadou provas. Eficiência total.
Nossa lei diz que a delação deve ser mantida em segredo até apresentação da denúncia pelo Ministério Público. Ela protege tanto a necessária produção de prova que corrobore os fatos delatados, quanto a chance de defesa do delatado, então indefeso.
No início de 2017 tivemos o vídeo show de delações da Odebrecht. Cardume de delatores, foram 78 exibindo-se em big brother da criminalidade, mencionados 415 pretensos delinquentes. Como eu então previ (entrevistas à Folha, 17.03.17, e Estadão, 07.05.17), não haveria provas para sustentar acusações.
Resultado até agora é um número pífio de denúncias recebidas, sendo a grande maioria arquivadas pelo próprio Ministério Público, valendo lembrar o episódio do Partido Popular do RS, todos os parlamentares mencionados, sendo que apenas um teve denúncia acatada. Veja, por exemplo, Estadão: ‘escândalo pelo escândalo’ (01.05.18) e Folha S. Paulo: ‘Polícia Federal aponta falhas e vê dificuldades de investigar delações da Odebrecht’ (31.07.17).
IHU On-Line – Como foi para o senhor atuar no caso Banestado? Que avaliação faz do caso quase duas décadas depois? Houve muita pressão da classe política naquela investigação?
Celso Tres – Nos anos 90 eu instalei a Procuradoria da República em Cascavel/PR. Após, chegou Sérgio Moro, oportunidade em que ele foi titularizado como Juiz Federal, passando a atuar em matéria criminal. Após inúmeras apurações, à época também tramitando a CPI dos Bancos no Senado, meu feito foi obter a quebra de sigilo de todas as remessas para o exterior — via contas CC5 — relativamente ao período de 1992/98, que totalizaram US$ 124 bilhões.
Muito desta cifra era legal, a exemplo da remessa dos lucros de multinacionais. Mas havia também muito de valores sonegados à Receita Federal e produto de crime, tráfico, corrupção etc.
Dividi de acordo com o domicílio fiscal dos remetentes, pessoas físicas e jurídicas, enviado às diversas unidades do Ministério Público Federal para que fosse apurada a origem do dinheiro. A Receita Federal foi a mais produtiva, autuando inúmeros por sonegação.
Na Procuradoria da República, algumas fizeram andar a investigação, outras não. Aqui no RS nada aconteceu. O Banestado, assim como o banco Araucária, eram dos tantos operadores da lavagem.
IHU On-Line – Que semelhanças e diferenças o senhor estabelece entre a investigação do Banestado e da Lava Jato?
Celso Tres – O Banestado, especificamente, teve apuração concentrada em Curitiba, após inaugurada vara de lavagem de dinheiro, em 2003, então já titulada pelo Sérgio Moro, onde eu não atuei. Os instrumentos de investigação de então não eram os da Lava Jato. Inúmeros fatos eram anteriores à lei de lavagem, editada em 1998.
Não havia como rastrear dinheiro no exterior, saber quem de fato eram os destinatários, consoante êxito da Lava Jato. Dentro do possível, conseguiram salvar repressão que já se encaminhava para prescrição.
IHU On-Line – Alguns têm avaliado que há uma nova geração de juízes e procuradores no país, que têm uma visão messiânica, como seria o caso do juiz Sérgio Moro e do procurador Deltan Dallagnol. O senhor percebe diferenças, digamos assim, entre uma velha e uma nova geração de juízes e procuradores? O que distinguiria ambas?
Celso Tres – Montesquieu, ideólogo da tripartição dos poderes, celebrizou: ‘até a virtude precisa de limites’. Se eles, virtuosos que são, cometem excessos, desvios, é porque o sistema de freios e contrapesos não funciona. Está omisso, acadelado.
IHU On-Line – Alguns especialistas em Direito têm defendido que é preciso fazer uma reforma no Judiciário. Quando se trata desse assunto, que tipo de questões precisariam entrar nessa pauta, na sua avaliação?
Celso Tres – Relevante é alterar a forma de designação dos ministros do STF. O modelo da Alemanha é interessante. Há mandato de oito anos, listas de entidades submetidas à escolha do Executivo e do Parlamento.
IHU On-Line – Como o senhor entende o fenômeno da judicialização da política? Por que ele tem acontecido no país e quais são suas consequências, de um lado, para o Judiciário e, de outro, para a própria política?
Celso Tres – Winston Churchill, brilhante ironia, celebrizou: “a democracia é o pior dos sistemas, excluídos os demais”.
Certamente, a judiciocracia, esta sim sem ironia, é o pior dos sistemas. A política, não o aparelho de justiça, é a alma do estado de direito. Não há nação que tenha encontrado prosperidade no governo dos juízes. Se os franceses, receosos com os desvios da judiciocracia sentenciam que deve ser o juiz apenas a ‘boca da lei’, aqui no Brasil a lei é que tem sido a boca do juiz. Pior, sob o pálio da demagogia, buscando cativar as massas.
IHU On-Line – Quais diria que são hoje os principais problemas do Judiciário brasileiro?
Celso Tres – Repito Sepúlveda Pertence, ex-ministro do STF: “o Judiciário é o menos impuro dos poderes”. Tem mais virtudes que defeitos. Aliás, valendo também para o Ministério Público, lembrando, inclusive a ícones da Lava Jato, e a quem gosta de idolatrar o sistema norte-americano, que lá, ao contrário daqui, não há concurso público de ingresso nessas carreiras, todos são eleitos ou de designação política. Numa penada, Trump demitiu todos os 98 procuradores federais distritais.
IHU On-Line – Neste ano a Constituição completa 30 anos e alguns têm feito a avaliação de que ela concedeu um poder muito grande ao Ministério Público. De outro lado, alguns argumentam que o MP tem tido uma atuação essencial na defesa de interesses coletivos da sociedade. Como o senhor avalia a atuação do MP desde a promulgação da Constituição?
Celso Tres – O saldo é por demais positivo, situação que não prescinde de ajustes.
Por que tantos membros do Parquet atuando nos tribunais? São realmente necessários?
Nenhum país do mundo tem estrutura judiciária quanto a do Brasil, tanto na Justiça (Estadual, Federal, Trabalho, Eleitoral e Militar), Ministério Público (Federal, Trabalho, Distrito Federal, Estados), Defensoria (União, Estados), Procuradoria (União, Estados, Municípios), sendo, disparado, a mais cara do mundo (proporção do gasto orçamentário em face do PIB). Só nós estamos certos?
IHU On-Line – Como o senhor avalia o projeto do MPF, “Dez medidas contra a corrupção”? Quais os pontos fortes e fracos dessa proposta?
Celso Tres – Teve um vício de origem. A iniciativa legislativa popular, consoante a própria nomenclatura, é da sociedade civil, jamais de um órgão de estado, no caso o Ministério Público, que proponha norma e saia arrecadando assinaturas de quem sequer sabe o seu conteúdo.
O anteprojeto foi autoral, de integrantes da Lava Jato, e sequer foi discutido na procuradoria da República. Seu argumento principal, leniência da legislação vigente com a corrupção, foi desmentido pela própria Lava Jato, condenações de 20, 30, 40… anos, próprias de assassinato qualificado. A pedido do senador Roberto Requião, escrito que foi publicado e distribuído a todos os membros do Congresso, escrevi ‘colaboração crítica às 10 medidas contra a corrupção’ .
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Comentários
Hildermes José Medeiros
Pelo que se lê, dito por quem é do ramo e atuante, não restam dúvidas: nosso sistema de Justiça está com muitos problemas, os principais: falta de recato, uso político das Leis e de dispositivos constitucionais (inclusive os pétreos), uso do poder judicial como apoiador de um lado da política, vazamento de dados e informações de processos com segredo de justiça, promiscuidade com as partes, manifestação fora dos autos antecipando sentenças, invasão das atribuições legislativas do Congresso, confusão entre defender e fiscalizar a aplicação da Constituição com revisor de seus dispositivos, inclusive cláusulas pétreas, Nesse envolvimento promíscuo da Justiça com o poder econômico, com a mídia, e mesmo países estrangeiros (nesse caso sem passar pelo crivo do Senado), esses com interesses que podem divergir do poder político, seja no Parlamento, seja os eleitos para dirigir o aparelho do Estado, com base no programa aprovado por partidos políticos apoiadores e a população votante que ois elegeu. Esse comportamento da Justiça foi a peça principal que levou ao golpe de 2016, A promiscuidade é tanta, que hoje temos juízes como verdadeiros astros na mídia, que foi e é peça fundamental do golpe, Globo à frente, quando os golpistas do Judiciário, acusa ou sentencia um opositor. O empenho é tanto, que já não restam mais dúvidas de que o Judiciário é o comando do golpe, centralizado no Supremo Tribunal Federal. De tudo uma certeza: seja qual for o resultado do embate político, de que sem sombras de dúvidas também se ocupa o STF, que se dá para que a oposição não volte a ocupar a Presidência com Lula, preso ou solto, presidente ou não, muitos juízes estão com o prazo de validade vencido, rasgaram suas togas, estão sem condições de serem vistos como isentos, mesmo numa normalidade democrática. Na sequência deve o país procurar modernizar e simplificar as estruturas do Judiciário, como dá mostras um de seus membros.
Kenedy
O juiz quer votar pelo povo, mas não abre mão do auxílio moradia e de outras benesses pagas com o dinheiro do povo.
Alguns juízes tem que aprender o que é vontade da maioria.
Democracia não é a vontade do juiz, mas a vontade do povo. É preciso respeitar as pessoas mais humildes que pagam o salário deles.
Tá aí o resultado da operação Moro, PSDB aniquilado, destruído, não ganha a presidência nem a pau, Juvenal.
É além da operação Moro, o PSDB pretende ferrar o povo com a reforma da previdencia. Quem aguenta.
Depois que a Dilma saiu e o pt, sua vida melhorou ou piorou ?
MDB e PSDB são sinônimos de apertar o cinto, do povo. O cinto deles é bem folgado.
Pq o Aécio sequer perdeu o mandato, preso então é que não será mesmo.
Jose fernandes
Quer vê tucano preso?? Vai no zoológico.
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