Márcio Pochmann: Acabou o tempo de esperar crescer para depois distribuir
Tempo de leitura: 3 minEmergência da economia social
Márcio Pochmann
Valor Econômico – 29/07/2010
O ciclo de expansão produtiva entre as décadas de 1930 e 1980 estabeleceu à economia social papel secundário e subordinado às decisões de gastos privado e público. Imperava até então a máxima de crescer para depois distribuir, o que implicaria continuadamente no tempo um espaço, em geral estreito, para o avanço da autonomia relativa do gasto social.
A partir da Constituição Federal de 1988, quando se consolidam os grandes complexos do Estado de Bem-Estar Social no Brasil, especialmente no âmbito da seguridade social (saúde, previdência e assistência social), cresceu significativamente o gasto social como proporção do Produto Interno Bruto (PIB). Atualmente, o gasto social agregado deve aproximar-se dos 23% do PIB, quase 10 pontos percentuais a mais do verificado em 1985 (13,3%). Em síntese, percebe-se que a cada R$ 4,00 gastos no país, R$ 1,00 encontra-se vinculado diretamente à economia social. Se for contabilizado também o seu efeito multiplicador (elasticidade de 0,8) pode-se estimar que quase a metade de toda a produção de riqueza nacional se encontra relacionada direta e indiretamente à dinâmica da economia social.
O impacto econômico do avanço do Estado de Bem-Estar Social no Brasil ainda não tem sido percebido adequadamente. Tanto assim que continua a reinar a visão liberal-conservadora que considera o gasto social secundário, quase sempre associado ao paternalismo de governantes e, por isso, passível de corte. O Ipea tem se debruçado sobre o tema, trazendo à luz recentes referências técnicas que colocam em relevância o novo papel da economia social no País.
Inicialmente pelo fato de o rendimento das famílias depender, em média, de quase 1/5 das transferências monetárias derivadas das políticas previdenciárias e assistenciais da seguridade social brasileira. Antes da Constituição Federal de 1988, as famílias não chegavam a obter, em média, 10% dos seus rendimentos das transferências monetárias. Os segmentos de menor rendimento foram os mais beneficiados pela constituição do Estado de Bem-Estar Social, uma vez que em 2008, a base da pirâmide social (10% mais pobres) tinha 25% do seu rendimento dependente das transferências monetárias, enquanto, em 1978, essa razão era somente de 7%. Uma elevação de 3,6 vezes. No topo da mesma pirâmide social (10% mais ricos), as transferências monetárias respondiam, em 2008, por 18% do rendimento per capita dos domicílios ante 8% em 1978. Ou seja, aumento de 2,2 vezes.
Adicionalmente, observa-se que, em 1978, somente 8,3% dos domicílios cujo rendimento per capita situava-se no menor decil da distribuição de renda recebiam transferências monetárias, enquanto no maior decil, as transferências monetárias alcançavam 24,4% dos domicílios. Quarenta anos depois, constata-se que 58,3% das famílias na base da pirâmide social recebem transferências monetárias, assim como 40,8% do total dos domicílios mais ricos do País. Aumento de 7 vezes para famílias de baixa renda e de 1,7 vez nas famílias de maior rendimento.
Em virtude disso, pode-se concluir a respeito do impacto das transferências previdenciárias e assistências sobre a pobreza. Sem as transferências monetárias, o Brasil teria, em 2008, 40,5 milhões de pessoas recebendo um rendimento de até 25% do salário mínimo nacional. Com a complementação de renda pelas transferências, o Brasil registra 18,7 milhões de pessoas com até ¼ de salário mínimo mensal. Resumidamente, são 21,8 milhões de pessoas que conseguem ultrapassar a linha de pobreza extrema (até 25% do salário mínimo per capita). Em 1978, o efeito da política de transferência monetária impactava somente 4,9 milhões de pessoas.
No caso do efeito das transferências monetárias nas unidades da federação, identificam-se dois aspectos inovadores que decorrem da emergência da economia social. O primeiro se relaciona ao maior peso das transferências no rendimento médio das famílias nos estados nordestinos, como Piauí (31,2%), Paraíba (27,5%) e Pernambuco (25,7%), bem acima da média nacional (19,3%). Até aí, nada muito destoante do senso comum, salvo pela constatação do Rio de Janeiro ser o quarto estado da federação com maior presença das transferências no rendimento das famílias (25,5%, ante São Paulo com 16,4%). O segundo aspecto decorre da constatação de que as famílias pertencentes aos estados mais ricos da federação absorvem a maior parte do fundo público comprometido com as transferências monetárias. Assim, a região Sudeste incorpora quase 50% do total dos recursos anualmente comprometidos com as transferências previdenciárias e assistenciais da seguridade social, estando São Paulo, com 23,5% do total, à frente, seguido do Rio de Janeiro (13,7%) e de Minas Gerais (10,9%).
A descoberta dessas novidades no interior da dinâmica econômica brasileira atual impõe reavaliar a eficácia dos velhos pressupostos da política macroeconomia tradicional. A economia social sustenta hoje parcela significativa do comportamento geral da demanda agregada nacional, ademais de garantir a considerável elevação do padrão de vida dos brasileiros, sobretudo daqueles situados na base da pirâmide social.
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Marcio Pochmann é presidente do Ipea e professor licenciado do Instituto de Economia e do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho da Unicamp. Escreve mensalmente às quintas-feiras.
Comentários
Urbano
O delgrossim apregoou sempre que tinha que fazer crescer o bolo para depois distribuir. O bolo cresceu, eles abocanharam todo e o povo ficou faminto, de água na boca e com a fatura para pagar.
José
Modelo de Distribuição de renda do psdm-dem: acabar com o PROUNI (Segundo teses deles,só os ricos devem ter curso superior)-acabar com as COTAS(conforme teses demotucanas,negros não têm direito à faculdade)- acabar com o BOLSA FAMILIA (segundo a coligação psdb-dem, com FOME, as pessoas aprendem mais e ao mesmo tempo conseguem ter mais saúde e assim progredir na vida) por isso, se o serra ganhasse, esses 3 programas seriam,sumariamente,EXTINTOS.
alex
tchê, será que tu não entende que esse negócio de "todo poder emana do povo", "governo da maioria" é só pras teses acadêmicas e para os jantares dos filantropos…
Ed.
Agora o lema é: "Quanto mais distribuir, mais vai crescer!"…
Milton Hayek
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/desmisti…
Desmistificando o ProUni
Enviado por luisnassif, qui, 29/07/2010 – 16:07
Por Bruno Moreno
Desmistificando o apoio ao PROUNI e esclarecendo o REUNI
É errôneo que se diga que os estabelecimentos de ensino privado apoiaram o PROUNI, ou gostaram dele. A contrapartida que deve ser ofertada por estas entidades não os agradou, pois antes gozavam de isenção fiscal sem ter que dar contrapartidas.
Para quem não sabe, poucas são as universidades privadas em sentido estrito, ou seja, que podem ter lucro. Em regra temos as filantrópicas e as comunitárias, que já gozavam de uma série de benefícios e sem gerar contrapartidas reais. Obviamente iriam se insurgir contra uma MP que as obrigasse a dar a referida contrapartida.
Para que não reste dúvida sobre isto é só analisar a ADI 3330 – Ação Direta de Inconstitucionalidade proposta pela Confenem – Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino contra o PROUNI, que tem a petição inicial feita pelo escritório de ninguém menos que Ives Gandra Martins. Quem é a favor de uma medida, ou acha que ela a beneficia não propoe uma ação dizendo que ela é inconstitucional. No mesmo sentido veio o DEM, que propos outra ADI contra o PROUNI, a ADI 3314. Aliás seria uma boa o nosso Índio da Costa explicar porque seu partido é contra o PROUNI, já que ele é o responsável por trazer a juventude para a campanha do Serra.
Carlos
ADI 3330
ADI 3314
Mesma fundamentação? Quando foram apresentadas?
Marcos Batista
Se considerarmos a paridade do poder de compra o PIB per capita já ultrapassou od dez mil dolares!
MarcosC. R. Carvalho
PIB per capta do Brasil vai atingir US$ 10 mil no final do ano e será maior que média mundial.
http://economia.ig.com.br/brasil+chega+a+pib+per+…
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