Fátima Oliveira: Chegou meu tempo de morar num “loft”

Tempo de leitura: 3 min

Vida básica e vida simples como opções filosóficas
CHEGOU MEU TEMPO DE MORAR NUM “LOFT”, PARA SIMPLIFICAR A VIDA

Fátima Oliveira, no Jornal OTEMPO
Médica – [email protected] @oliveirafatima_

Nem gosto de pão. Sequer consigo comer um pão francês inteiro, apenas a metade, mas devo declarar que não tê-lo fresquinho à mesa no café da manhã me incomoda, pois pão dormido não é pão; e congelado também não é pão. Meras imitações. Meu sonho de consumo é uma entrega de pão fresco cedinho em minha casa.

É um serviço que faz falta, porque levantar num friozinho para buscar um pão, para quem só come meio, beira as raias da insanidade… Fico na vontade e descongelo “minha banda” de pão francês e como aquela coisa quase ogra com manteiga… Como, mas não é pão!

Uma das minhas filhas ficou com ar patético quando falei que odeio não ter quem busque o pão e sonho com a entrega de pão fresco a domicílio… “Como a senhora complica a vida! Vai tomar café lá no Diniz (mercearia/padaria da Cidade Jardim). Eita preguiça! Essa de querer pão fresco delivery é demais! Sua doença é não ter mais a gente aqui pra fazer mandados. Sabia que mandar vicia?”. Retruquei: “Saber mandar é uma arte que domino, esqueceu?”.

Carro para mim
não é exibicionismo
de como anda o meu bolso. “Ora, pra ter
um carro melhor!”
Melhor pra quê e
pra quem?

Tomo café na padaria quando vou trabalhar, mas amo café da manhã em casa, uma zona de conforto e de ternura, como disse em “A mesa posta para o café da manhã é uma cultura de ternura” (O TEMPO, 19.7.2011). Comer bem é um direito humano fundamental. Detesto fast-food, comida “Frankestein”.

Nunca comi nos Macs da vida! Talvez, ranhetices sertanejas da velhice, mas meu norte é a filosofia “slow food”, uma face da ecogastronomia que defende a herança culinária, as tradições e culturas que tornam possível esse prazer.

É o tipo da conversa que descamba nos estilos culturais de vida e que viver na cidade grande interdita a adoção filosófica de vida básica e/ou vida simples: a simplicidade voluntária como opção – não é vida da penúria imposta pela pobreza nem de “canhenguices” franciscanas – de estilos de vida: a simplicidade como filosofia, que é um longo caminho, mas não exige viver em bolhas de simplicidade, como ecovilas, que é pra quem pode até dispensar veículos pessoais motorizados. O resto é sectarismo.

Sempre fui criticada por não levar uma vida segundo o “padrão de vida de médico”, coisa antiga, antes da proletarização da profissão, sobretudo por passar décadas (isso mesmo!) com o mesmo carro – ora, se eu uso um carro que, depois de mais de dez anos, não chega a 50 mil quilômetros rodados, por qual motivo tenho de trocá-lo, se carro para mim não é um cartão de exibicionismo de como anda o meu bolso? “Ora, pra ter um carro melhor!” Melhor pra quê e pra quem?

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Meu carro não é uma moldura de minha vida, ao contrário: eu sou a moldura dele! A diferença é enorme e nada sutil se comparada a uma amiga que troca de carro religiosamente a cada dois anos. Eu a conheço há mais de 20 anos, sempre apertada, “pagando o carro”. É que ela diz que só usa “carro, carro, e não carroça!”. No sábado à noite, sabendo que ela “precisa” trocar o carro até julho, sugeri que poderia se libertar de passar o resto da vida pagando carro: vender o turbinado dela, que, com quase dois anos de uso, tem preço de mercado de cento e poucos mil, e comprar um Veloster, que é lindo, tem presença e enche os olhos por onde passa… E ainda sobraria um troco.

Ela: “Imagina eu de repente aparecer num carrinho desses, vão dizer que fali. Minha marca registrada é ter carrão”. E quando falei que chegou meu tempo de morar num loft, para simplificar a vida, ela disse: “Ai, que alívio! Pensei que simplificaria para uma quitinete!”. Ai, ai…

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Comentários

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Fátima Oliveira

Obrigada a tod@s pela leitura e pelos comentários. Em agrdecimento indico-lhes algumas leituras curtas sobre simplicidade voluntária. Espero que gostem:
Site Lima Coelho Especial sobre Simplicidade Voluntária:
SUMÁRIO

. De ponta-cabeça – Priscila Simões
. Escritor Odir Cunha leva uma vida simples. Mas complexa…
. A cultura do consumismo vende vergonha
. ATIVISMO CONSTRUTIVO
Viver com Simplicidade – Bo Lozoff
. Harmonia – Simplificar para viver melhor – Adília Belotti
. Viver com simplicidade – Divaldo Franco
. Limpando a área
Quando a casa está entulhada de coisas, é hora de parar e pensar no que pode ser doado: desapegar é de lei – Chantal Brissac
. Simplicidade Voluntária, meu modo de viver
. TEMA: A FELICIDADE PELA SIMPLICIDADE VOLUNTÁRIA – Antonio de Andrade http://www.limacoelho.jor.br/vitrine/ler.php?id=2593
Água de quartinha – Melissa Costa (07.06.2009)www.limacoelho.jor.br/vitrine/ler.php?id=2588
Alguém ainda se lembra da deliciosa água de quartinha? – Fátima Oliveira (18.08.2009)
http://www.limacoelho.jor.br/vitrine/ler.php?id=2745

Nádia

Olá Fátima, porque não? Moro em um JK já faz 13 anos, a d o r o. Moro sozinha, é a melhor opção,quanto ao pão, tenho até vergonha de comprar, compro 2 para não ficar chato, mas como 1, também tenho saudades quando o padeiro deixava pão e leite na porta de casa, lá no interior paulista. Vamos ao JK, deixei bem aconchegante, não preciso de ajudante para faxina, pois é pequeno faço eu mesma. Não tenho carro, pois, não sinto falta, até poderia ter, mas acho bobagem. Isso que criaram que tem que ter carro do ano, a melhor casa, melhor em tudo é pura ignorância e falta de bom senso e agride a natureza. Isso é para os tolos quererem mostrar seus status, outra bobagem. A vida é breve, temos que aproveitá-la cada momento, passar a vida toda pagando dívidas somente para manter status, que me desculpem as pessoas que faz isso, mas é burrice, é perder os melhores momentos com preocupação, poderia pegar esse dinheiro e ir viajar, de ônibus mesmo que é muito melhor, pois aproveita mais a viagem, sem preocupação em dirigir.

    Maria das Graças Reis

    Diferença entre JK, Quitinete, flat e loft?

    JK é um apartamento de 3 peças: sala/quarto em um espaço só, banheiro e cozinha (com área junto ou aberta).

    QUITINETE é um apartamento em que somente o banheiro é separado. A sala e dormitório e a cozinha é integrada isto é, não a porta separando-a(tipo americana a separação é com o balcão). Geralmente não tem área externa.

    FLAT é um apartamento em condomínio que oferece serviço de hotel (paga-se o condomínio) e há no prédio lavanderia, camareira, faxineira, cozinheiro, enfim é como se você morasse em um hotel, só que o apartamento é seu.

    LOFT é um imóvel com pé direito duplo (em torno de 6 metros de altura do piso ao teto). No conceito criado pelos americanos no loft não há paredes; os ambientes são integrados e a divisão é feita com os móveis delimitando cada área. A cozinha é tipo americano integrada a sala. O quarto fica no andar superior tipo um mezanino, sem paredes (pode ser no térreo). O único local que há terá parede e porta é no banheiro.
    Não esquecer que no Brasil há as imitações de loft, muitas até grotescas e mais caras que apartamentos comuns, que são os: loft-fake ou loft-inspired (pé-direito duplo, muita iluminação natural porém com divisórias para os banheiros e quartos).

    Escrito por Maria Ângela
    http://br.answers.yahoo.com/question/index?qid=20080507181424AAsiOuL

Milton Ferreira

ORIGEM E SITUAÇÃO ATUAL DOS LOFTS NO BRASIL

Os lofts foram criados pelo arquiteto e urbanista francês Le Corbusier, na década de 1920, as Ville Contemporaine, depois nas não concretizadas Ville Radieuse ou Cité Radieuse (Cidade Radiante), em 1924 e, em 1925, no Plan Voisin.
No final da década de 60 e início da década de 70, houve a explosão dos lofts urbanos contemporâneos em Nova Iorque e só eram conceituados de lofts, somente os grandes espaços convertidos, situados nos andares superiores de industriais, galpões e armazéns abandonados viravam moradias amplas sem paredes dividindo os ambientes, sala e cozinha integrados, com mezaninos de madeira ou ferro e seus grandes elevadores de carga, além de pés-direitos altos e grandes janelas envidraçadas.
Os lofts contemporâneos têm projetos arquitetônicos inspirados no estilo de morar que nasceu em Nova York na década de 1970. Lá, velhos galpões e armazéns de edifícios foram reformados para servir de moradia para profissionais liberais, artistas, publicitários e executivos. Os lofts de Nova York eram conhecidos por não terem paredes dividindo os ambientes, pelos mezaninos de madeira ou ferro e seus grandes elevadores de carga, além de pés-direitos altos e grandes janelas.
Hoje no Brasil LOFT é uma moradia que simplifica a vida por ser um espaço amplo e único, sem paredes divisórias, com um banheiro e um mezanino para dormitório, mesmo que seja uma construção nova.

Milton Ferreira

No sentido de esclarecer que loft não tem nada a ver com moradia luxuosa e tem uma origem popular

“O nome loft se refere a água furtada, mezanino, mansarda, sótão ou espaço semelhante (geralmente usado para armazenagem) sem repartições, situado logo abaixo do teto de uma casa, fábrica, celeiro, galpão ou armazém. Seu uso na arquitetura, pode ser encontrado desde o século XIII, na expressão hayloft, onde é um depósito de feno situado em mezanino de celeiros, sendo também usado como alojamento de empregados da fazenda”.

Meire Melo

Morar em Brazabrantes, ou no sítio, é melhor do que no “loft”… vem p/cá… tem pão quentinho e pamonha da hora, lá na Dona Maria… rsrsrsrs…

    Iraneide

    Brazabantes deve ser ideal pra quem quer morar na roça. Acho que não é caso da autora.
    Achei o nome bem bonito e fui ver onde era. E a grande descoberta é que lá há mais homens do que mulheres!
    Brazabrantes, Goiás, (em homenagem a Brás Abrantes, um general goiano), com população estimada, segundo o IBGE, em 2011:

    População em Brazabrantes: 3.240
    Domícilios ocupados em Brazabrantes: 1.047
    Crescimento populacional em Brazabrantes na última década: 16,88%
    População masculina em Brazabrantes: 1.649 (Quantidade de homens em Brazabrantes)
    População feminina em Brazabrantes: 1.591 (Quantidade de mulheres em Brazabrantes)
    Em Brazabrantes existem 0.96 mulheres para cada homem
    Em Brazabrantes existem 1.03 homens para cada mulher
    População urbana em Brazabrantes é de: 2.179 e representa 67,3% da população de Brazabrantes
    População rural em Brazabrantes é de: 1.061 e representa 32,7% da população de Brazabrantes
    Em Brazabrantes 50,9% são homens
    Em Brazabrantes 49,1% são mulheres
    Em Brazabrantes existem mais homens do que mulheres

Marcos Loro

Muito legal o texto Fátima! Nós, médicos, somos “pressionados” por amigos, familiares e colegas médicos que acreditam num estilo de vida “alto padrão” como regra para uma renda de médico (que há muito não é tão alta como muitos acham, mas mesmo assim nos permite ter uma vida muito confortável).

Tento, a meu modo, sempre ressaltar isso para meus colegas (muitos médicos) sobre essa “necessidade” inventada pela indústria e pela mídia, de trocar de carro todo ano, de ter o último modelo de celular, o último computador, o último tablet, etc.

Alice Matos

Os significados e o sentido filosófico da vida simples ou da simplicidade voluntária são profundos para pessoas que conseguem se despojar do maldito consumismo. Também acho que não precisamos viver em bolhas de simplicidade, como a ecovilas, claro que respeito quem faz tal opção, mas ela não é a única para quem quer simplificar a vida. Bonita crônica.

Mardones Ferreira

Quando era criança, o carrinho do pão de açúcar, passava na frente da minha casa. E a minha mãe esperava comigo e meu irmão caçula todos os dias a passagem do vendedor. Era o acontecimento do dia para mim! k k k
Um pão de leite (assim a gente chama em Salvador) com açúcar por cima.

Mardones Ferreira

Sensacional! Depois que mudei para Curitiba, sou soteropolitano, percebi o quanto sinto sinto falta da minha cidade natal (ainda que tão maltratada!).
Aqui em Curitiba há uma verdadeira demonstração de viver para os outros, de mostrar o que não se tem.
Nas ruas, muitos carros são da BMW e da Audi. É um verdadeiro endeusamento dos importados, da origem dos avós, bisavós. Se não tiver DNA europeu na família, de preferência alemão, toma emprestado do marido. O importante aqui é exaltar a herança europeia, branca. Até hoje, as pessoas clamam por uma nevasca. E a guarda municipal, esse ano, baixou o cacetete em alguns curitibanos que queriam comemorar o carnaval. Foi uma mensagem aos que ousam lembrar que aqui é Brasil também. k k k k

Simonebh

Olá Fátima, entendo e concordo plenamente com você. No meu caso, depois de me divorciar e tendo reduzido meu status de mulher de médico(já sendo avó), passei a trabalhar em três turnos para juntar um dinheirinho e construir uma casinha no meu estilo: cabe meus filhos e netos no fim da semana, apertadinhos, mas de forma aconchegante. Continuo a trabalhar em casa, no meu ritmo, mais devagar, com direito a parar de vez em quando para um concerto ou só para olhar a paisagem lá fora. Se o pensamento voa e vem a vontade de sair bailando, aparece logo uma pontadinha no joelho, obrigando-me a colocar os pés no chão. Com tudo isso e beirando meus setenta anos, sinto-me inteira e em meus melhores momentos. Sempre gostei de vida mais simples, como agora. Obrigada e um abraço.

Gerson Carneiro

Dona Fátima, dependendo do lugar para onde for, se não for muito chique, a Sra. me contrata para ser o entregador de pão?

    Fátima Oliveira

    Amigo Gerson, imagina se eu tenho jeito de morar em lugar MUITO chic. Lugar muito chic é só trabalheira e eu agora só quero SIMPLIFICAR a minha vida, daí a opção por morar num lugar espaçoso e gostoso, mas de um só ambient, que eu dê conta de cuidar com prazer enquanto tiver coragem para tanto. Com certeza vou encontrar outro entregador de pão porque não moramos na mesma cidade rsrsrsrs.

Gerson Carneiro

Quando criança, por algumas vezes, acompanhei a entrega do pão, no povoado chamado Cachoeirinha, próximo à cidade de Senhor do Bonfim, na Bahia.

O entregador me levava na garupa da bicicleta. Na frente ia um compartimento aonde ele colocava o balaio de pão.

E o hoje chamado “pão francês” era “pão de sal”. Era feito em forno à lenha. Era compacto e pesado. Diferente do pão francês de hoje, oco e leve, mais parecido com um suspiro, um avoador.

    Fátima

    Gerson, adorei a comparação do atual “pão francês”. Há muito tempo substitui por tapioca e cuscuz. Raramente como pão.

Gerson Carneiro

Por ser de lá
Do sertão, lá do cerrado
Lá do interior do mato
Da caatinga do roçado.
Eu quase não saio
Eu quase não tenho amigos
Eu quase que não consigo
Ficar na cidade sem viver contrariado.

Por ser de lá
Na certa por isso mesmo
Não gosto de cama mole
Não sei comer sem torresmo.
Eu quase não falo
Eu quase não sei de nada
Sou como rês desgarrada
Nessa multidão boiada caminhando a esmo.

Lamento Sertanejo – Gilberto Gil

http://www.youtube.com/watch?v=Blgzu0r-OUk

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