Rogério Tomaz: Matéria do Estadão distorce acintosamente o cenário eleitoral do Uruguai
Tempo de leitura: 3 minpor Rogério Tomaz Jr*, especial para o Viomundo
O Estadão publicou neste domingo (23/06) a matéria Candidatura de bilionário cresce e vira surpresa das eleições no Uruguai.
Refere-se ao bilionário Juan Sartori, 38 anos, fã dos presidentes dos EUA, Donald Trump, e do Brasil, Jair Bolsonaro (PSL).
Parece informação plantada por fontes interessadas em influenciar a eleição no país vizinho.
O texto traz meias-verdades e mentiras factuais, além de dados descontextualizados que induzem o leitor desinformado – especialmente o conservador – a crer que a direita representada pelos “blancos” está a poucos passos de retornar ao governo.
Por isso, vamos ponto a ponto:
1.A matéria diz: Um bilionário de 38 anos bagunçou a eleição presidencial uruguaia. FALSO.
Qualquer analista ou jornalista que cobre a política uruguaia dá como certa a vitória de Luis Alberto Lacalle Pou nas prévias do Partido Nacional.
É fato que Sartori aumentou sua visibilidade e deverá ter boa votação na disputa interna, mas ninguém sério acredita que ele poderá vencer alguém que teve 43% dos votos no segundo turno da eleição presidencial de 2014 e segue desde então como a principal voz da oposição uruguaia.
2. A matéria diz:Embora a governista Frente Ampla lidere com 36% das intenções de voto, a sensação é a de que o próximo presidente sairá das prévias do conservador Partido Nacional. FALSO
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O favoritismo para a eleição de outubro segue com a Frente Ampla, que tem crescido de forma constante e sólida nas pesquisas desde o início do ano.
A tendência é que a coalizão de centro-esquerda cresça após a definição da chapa, ainda mais se for confirmado o nome de Daniel Martinez, membro do Partido Socialista e carismático intendente de Montevidéu de 2015 até abril passado, quando deixou o cargo para disputar a indicação da Frente Ampla à disputa presidencial.
3.A matéria diz: Historicamente conhecidos como “blancos”, eles estão em segundo com 29%, o suficiente para disputar o segundo turno e atrair o voto da oposição ao desgastado governo de centro-esquerda. MEIA-VERDADE.
O Partido Nacional está exatamente na mesma posição que ocupava na última eleição, quando alcançou 30% dos votos no 1º turno, contra 44% de Tabaré Vázquez, da Frente Ampla, que deverá ter votação próxima a esse número em outubro.
O desgaste do governo foi maior entre 2016 e 2017. Desde o ano passado, o eleitorado cativo frenteamplista que se declarava indeciso tem voltado, paulatinamente, a indicar o voto na coalizão progressista.
4. A matéria diz: As chances de vitória dos esquerdistas da Frente Ampla esbarram no desgaste dos últimos 15 anos, no aumento da criminalidade e na estagnação econômica. MEIA-VERDADE E FALSO.
Dizer que um governo de 15 anos acumula desgaste é uma obviedade rasa. Mas esse desgaste, por exemplo, não impediu que a Frente Ampla siga governando Montevidéu e vencendo com folga as eleições desde 1989 no departamento, que concentra quase metade da população do país.
O falso está em falar em estagnação econômica. Apesar da desaceleração no último quinquênio e da profunda crise que vivem Brasil e Argentina, que possuem enorme peso sobre a economia uruguaia, o governo da Frente Ampla registra números que fazem inveja a qualquer país do mundo:
*Crescimento do PIB acumulado de 59,5%, entre 2005 e 2018
*Crescimento médio anual de 4,25% em 14 anos
*16 anos consecutivos de crescimento do PIB (somando dois anos do governo anterior), feito jamais igualado por qualquer país da América do Sul
Os dados são do https://datosmacro.expansion.com/pib/uruguay?anio=2019
O mais provável é que, em outubro, o Uruguai terá que escolher entre Daniel Martínez – como favorito – e Lacalle Pou, filho do ex-presidente Luis Alberto Lacalle.
Correndo por fora virá o tradicional Partido Colorado, que deve apresentar como candidato Julio Sanguinetti, 83, que governou o país entre 1985-1990 e 1995-2000, período em que a economia do país foi à bancarrota.
Numa coisa a matéria do Estadão está correta, embora não afirme explicitamente isto: os métodos do bilionário Sartori são os mesmos de qualquer grupo de extrema-direita do mundo, marcados pela produção e distribuição em escala industrial de notícias falsas.
No Uruguai, porém, isso não cola tanto.
*Rogério Tomaz Jr. é jornalista, viveu em Montevidéu em 2017 e escreve o livro “Conversando com Eduardo, viajando com Galeano”.
Uruguaios celebram vitória da Frente Ampla em 2014.Foto: Rogério Tomaz Jr.
Comentários
a.ali
tomara os uruguaios tenham juízo e não caiam, que nem no br., nos fake…a vontade do irmão do norte em destruir a soberania dos latinos é uma coisa que, parece, ñ ter fim!
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