Povos Indígenas de Roraima: Lula participa de assembleia, ouve denúncias e garante demarcação de terras
Tempo de leitura: 7 minNa 52ª Assembleia do CIR, presidente Lula assegura que irá demarcar terras indígenas
A 52ª Assembleia do Conselho Indígena de Roraima (CIR) foi realizada de 11 a 14 deste mês; a comitiva presidencial contou com a presença de cinco ministros e Funai
Por Adi Spezia e Ligia Apel, da Assessoria de Comunicação do Cimi
Com o tema “Proteção Territorial, Meio Ambiente e Sustentabilidade, o Conselho Indígena de Roraima (CIR), realizou entre os dias 11 a 14 de março, a 52ª Assembleia Geral dos Povos Indígenas do estado, no Centro Regional Lago do Caracaraña, Terra Indígena Raposa Serra do Sol (TIRSS).
Com a presença de 2.500 indígenas dos povos Macuxi, Wapichana, Taurepang, Wai Wai, Ingaricó, Patamona, Ye’kuana, Sapará e Yanomami, a assembleia teve por objetivo discutir e avaliar a situação dos povos indígenas de Roraima.
O evento contou com uma Feira do Plano de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas (PGTA), com produtos orgânicos das comunidades indígenas, a escolha da nova secretária Geral do Movimento das Mulheres Indígenas do CIR, e a participação do Presidente da República Luís Inácio Lula da Silva.
Cinco ministros integraram a comitiva presidencial: Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social), Márcio Costa (Secretaria-Geral da Presidência da República), Nísia Trindade (Saúde) , José Mucio Monteiro Filho (Defesa) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas).
Também compuseram a comitiva oficial a presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, e o prefeito de Boa Vista, Arthur Machado.
Já o governador de Roraima, Antônio Denarium (PP), não foi recebido pelos indígenas devido a posição política favorável à exploração do garimpo em terras indígenas.
Denúncias das lideranças
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Um momento histórico para os povos de Roraima, em 52 anos do Conselho Indígena do estado.
Foi a primeira vez que a Assembleia recebe um chefe da nação. Tal acontecimento revela a força da mobilização e organização indígena do estado.
Em seu discurso, Davi Kopenawa, do povo Yanomami, pediu à comitiva e a todos os brasileiros que assumam o compromisso de “tirar o garimpeiro da Terra Yanomami, os garimpeiros estão aí escondidos, queremos que tirem todos os garimpeiros”.
Cobrou assistência à saúde em todas as comunidades, pois ainda há aldeias sem nenhum tipo de atendimento médico.
Davi Kopenawa, do povo Yanomami. Foto: Adi Spezia / Cimi
“Estou muito preocupado, no Surucucu pousa avião, pousa helicóptero, mas presidente, precisamos chegar nas comunidades onde estão os parentes doentes, tomando água contaminada. Precisamos ir lá com os ministros, Funai, junto com a Hutukara, não posso ir agora porque os garimpeiros estão lá esperando para acabar com minha vida”, denuncia Davi.
A estruturação da saúde indígena, da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) e Casa de Saúde Indígena (Casai) também esteve entre os temas cobrados pelas lideranças.
“Já morreu muita gente, 577 crianças. Vamos lutar pela saúde, vamos trazer medicamento, médico, enfermeiro, técnicos, dentistas, a doença não tem fronteira, não tem policial para tirar e mandar embora, a doença continua”, reforça a liderança do povo Yanomami.
Representando as mulheres indígenas de Roraima, Maria Betânia Mota de Jesus, liderança do povo Macuxi, destacou o papel da mulher nos espaços de decisão e poder, “somos mães, mulheres, protetoras de nossa Mãe Terra, dos nossos territórios”.
Pediu ao presidente que “cumpra com seu compromisso de retirar todos os invasores dos territórios, a destruição da nossa Mãe Terra, representa nossa destruição”.
Betânia cobrou a demarcação e a proteção das terras indígenas, bem como a ampliação das terras demarcadas em ilhas.
“Cobro o apoio às ações e aos nossos projetos para a sustentabilidade. Garimpo não é desenvolvimento para o nosso povo. Garimpo e a destruição da nossa Mãe Terra e do nosso povo, pedimos a retirada dos invasores”, reforçou a liderança Macuxi.
Aos ministros de Estado, Betânia é enfática, “nunca negocie os direitos dos povos indígenas com ninguém” e ainda completa, “vidas indígenas importam, queremos ser sempre povos originários, livres e com autonomia, e claro que essa autonomia vem com nossas terras demarcadas e ampliadas para o bem viver do povo indígena”.
Por sua vez, o ancião do povo Wapichana, Clovis Ambrósio, destacou a importância e o respeito aos direitos dos povos originários como consta na Constituição de 1988, especial no que diz respeito a educação, saúde e a proteção do meio ambiente e dos territórios indígenas.
“Hoje, sofremos com a falta de medicamento, transporte, não existe estrutura para conduzir esses indígenas que estão sofrendo de malária, covid-19 e outras doenças. Na educação, espero que o senhor apoie essa juventude no estudo, com estrutura renovada”, apela seu Ambrósio.
Com anos vividos, o ancião Whapichana também destacou a importância de os povos indígenas serem consultados sobre quaisquer medidas que possam afetá-los, antes mesmo que sejam adotadas, “é um direito nosso, nós temos um protocolo de consulta e queremos que vocês, os senhores respeitem a nossa comunidade”.
Compromissos do presidente Lula com os indígenas
Na presença de anciões, tuxauas, lideranças e organizações indígenas presentes na 52ª Assembleia do CIR, em seu discurso, o presidente Lula assume pelo menos quatro compromissos.
O primeiro está relacionado à sustentabilidade. Em sua chegada à Assembleia, a comitiva presidencial foi recebida por uma feira de produtos orgânicos, artesanatos e cerâmicas produzidas na TIRSS.
Presidente Lula na feira de produtos orgânicos, cerâmicas e artesanatos produzidos na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Foto: Adi Spezia/Cimi
“Uma demonstração de que à medida que vocês têm oportunidade, que tem garantida a Terra e incentivo financeiro para produzir, produzem. Soube que vocês não têm ajuda do governo para financiar a produção”, destacou.
Impressionado com a diversidade produtiva, Lula afirmou ter algo errado, “como pode ter emprestado tanto dinheiro para produção agrícola e esse dinheiro não ter chegado para agricultura indígena? Prometo a vocês, vou colocar vocês dentro de um programa de financiamento da produção agrícola indígena. Queremos mostrar que dá para produzir alimentos sem destruir a Amazônia, sem precisar estragar os rios, sem contaminar as águas”.
O segundo compromisso está relacionado à demarcação das terras indígenas, reivindicação histórica e vital para os povos originários, a quem o presidente Lula reforçou, “temos pedido tanto para Funai quanto para o Ministério dos Povos Indígenas me apresentar todas as terras que estão prontas para ser demarcadas, porque a gente precisa demarcar logo, antes que as pessoas invadam as terras, antes que inventem documentos de escrituras falsos e digam que são donos. Precisamos rapidamente tentar legalizar todas as terras que estão já quase prontos os estudos para que os indígenas possam ocupar o território que é deles”, afirmou.
As terras indígenas com pendências administrativas no Brasil, em alguma fase do processo demarcatório, somam um total de 871.
Destas, 598 estão sem nenhum tipo de providência; 143 a identificar, 44 foram identificadas, 73 estão declaradas, 5 com portaria de restrição, e 8 homologadas, aponta o relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2021, publicação anual do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
A demarcação das terras indígenas está intrinsecamente relacionada à proteção dos territórios, à preservação da biodiversidade, ao enfrentamento das mudanças climáticas, à alimentação e à saúde, quando este direito originário é desrespeitado.
Crianças, jovens e anciões estão entre os mais afetados. Assim, Lula apresenta aos indígenas seu terceiro compromisso: a saúde.
“O objetivo é retomar todos as políticas públicas que deem conta de cuidar do povo pobre, do povo abandonado, e aí entra a questão indígena”, afirmou o presidente.
Com lágrimas nos olhos contou o que viu quando visitou os indígenas na Casai, em Boa Vista (RR).
“Não acreditava que era possível deixar uma criança chegar naquelas condições, eu não acreditava que num país, que é o terceiro produtor de alimento, um país que é o primeiro produtor de carne do mundo, pudesse deixar aquelas crianças ficarem subnutridas, quase sem força de parar em pé de fome, porque não receberam a comida e o tratamento necessário”.
E ao assumir o compromisso de resolver a crise humanitária que enfrenta os povos na TI Yanomami, o Chefe de Estado garantiu, “nós vamos tirar definitivamente os garimpeiros das terras indígenas, mesmo que tenha ouro aqui em Roraima, mesmo que tenha ouro na terra indígena ninguém tem o direito de mexer sem a autorização dos donos da terra, que são os indígenas”.
Esse é o quarto compromisso assumido junto aos indígenas de Roraima: impedir a destruição dos territórios.
Antes de encerrar a visita da comitiva à Assembleia, Edinho de Souza, atual coordenador do CIR, afirmou que os povos indígenas de Roraima vão estar acompanhando os compromissos assumidos: “É promessa, nós também queremos a intensificação e a punição dos criminosos que estão matando nossos parentes Yanomami”, afirmou.
Na ocasião, os indígenas entregaram ao Presidente Lula uma carta com as demandas dos povos indígenas de Roraima sobre a saúde, educação, medicina tradicional, proteção territorial, retirada de garimpeiros, valorização da cultura, tradição, território e sustentabilidade indígena.
Confira a Carta entregue ao Presidente Lula.
Comentários
Zé Maria
“Virá, que eu vi”
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