Pepe Escobar: Em busca de vassalos na Ásia, EUA blefam contra o Irã
Tempo de leitura: 6 minA guerra ao Irã e o bluff dos EUA
Escrito por Pepe Escobar, reproduzido pela AEPET*
Embargo total às exportações de petróleo iraniano é ato de guerra
O governo Trump mais uma vez demonstrou claramente que, no jovem e turbulento século XXI, “direito internacional” e “soberania nacional” já pertencem ao Reino dos Mortos-Vivos.
Como se um dilúvio de sanções contra grande parte do planeta já não fosse suficiente, a mais recente “oferta irrecusável” transmitida por um gângster que posa de diplomata, o Cônsul Minimus Mike Pompeo, agora ordena que todo o planeta se submeta a um único árbitro do comércio mundial: os Estados Unidos.
Primeiro, a administração Trump unilateralmente destruiu um acordo multinacional, endossado pela ONU, o acordo nuclear do JCPOA com o Irã.
Agora, as concessões permitindo que oito nações importassem petróleo do Irã sem incorrer na ira imperial na forma de sanções expirarão em 2 de maio — e não serão renovadas.
As oito nações são uma mistura de potências euro-asiáticas: China, Índia, Japão, Coréia do Sul, Taiwan, Turquia, Itália e Grécia.
Além do coquetel tóxico de arrogância / ignorância e infantilismo geopolítico / geoeconômico embutido nesta decisão de política externa, a noção de que Washington pode decidir quem pode ser um fornecedor de energia à superpotência emergente que é a China não se qualifica sequer de risível.
Muito mais alarmante é o fato de que impor um embargo total às exportações de petróleo iraniano é nada menos que um ato de guerra.
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O sonho supremo de neocons excitados
Aqueles que subscrevem o sonho derradeiro dos Estados Unidos, dos neocon e sionistas – mudança de regime no Irã – podem regozijar-se com esta declaração de guerra.
Mas, como argumentou com elegância o professor Mohammad Marandi , da Universidade de Teerã: “Se o regime de Trump calcula mal, a casa pode facilmente desabar sobre sua cabeça”.
A refletir o fato de que Teerã parece não ter ilusões quanto à loucura absoluta com que se depara, a liderança iraniana – se provocada a um ponto de não retorno, acrescentou Marandi – pode chegar a “destruir tudo do outro lado do Golfo Pérsico e expulsar os EUA do Iraque e Afeganistão”.
Quando os EUA escalam, o Irã escala. Agora depende dos EUA quão longe vão as coisas.
Este alerta vermelho de um acadêmico sensato encaixa-se perfeitamente com o que está a acontecer com a estrutura do Corpo de Guardas da Revolução Islâmica (IRGC) – recentemente rotulado como uma “organização terrorista” pelos Estados Unidos.
Em perfeita simetria, o Conselho Supremo de Segurança Nacional do Irã também nomeou o Comando Central dos EUA – CENTCOM – e “todas as forças ligadas a ele” como um grupo terrorista.
O novo comandante em chefe do IRGC é o general de brigada Hossein Salami, 58.
A partir de 2009 ele foi o vice do comandante anterior Mohamamd al-Jafari, um cavalheiro de fala mansa, mas extremamente duro, que encontrei em Teerã dois anos atrás.
Salami, assim como Jafari, é um veterano da guerra Irã-Iraque; ou seja, ele tem experiência de combate real. E fontes em Teerã asseguram-me que ele pode ser ainda mais duro que Jafari.
Em tandem, o contra-almirante Alireza Tangsiri, comandante da Marinha do IRGC, evocou o impensável em termos do que se poderia desenvolver a partir do embargo total dos EUA às exportações de petróleo do Irã: Teerã poderia bloquear o Estreito de Ormuz.
Inconsciência ocidental
Vastos segmentos das classes dominantes de todo o Ocidente parecem estar inconscientes da realidade de que, se Ormuz for fechado, o resultado será uma depressão econômica global absolutamente cataclísmica.
Warren Buffett, entre outros investidores, rotineiramente qualifica o mercado de 2,5 quatrilhões (10 elevado a 15) de derivativos como uma arma de destruição financeira em massa.
Tal como está, estes derivativos são utilizados – ilegalmente – para drenar nada menos que um trilhão (10 elevado a 12) de US dólares por ano fora do mercado, em lucros manipulados.
Considerando precedentes históricos, Washington pode finalmente ser capaz de montar uma operação de bandeira falsa no Golfo Pérsico, no estilo da [do golfo] de Tonkin. Mas, o que viria a seguir?
Se Teerã fosse totalmente cercada por Washington, sem saída, a opção nuclear de fechar o Estreito de Ormuz cortaria instantaneamente 25% da oferta mundial de petróleo.
Os preços do petróleo poderiam subir para mais de US$ 500 por barril, mesmo a US$ 1000 por barril.
Os 2,5 quatrilhões de derivativos iniciariam uma reação de destruição em cadeia.
Ao contrário da escassez de crédito durante a crise financeira de 2008, a escassez de petróleo não poderia ser compensada por instrumentos fiduciários.
Simplesmente porque o óleo não está lá. Nem mesmo a Rússia seria capaz de reestabilizar o mercado.
Isto é um segredo público em conversas privadas no Harvard Club – ou nos jogos de guerra do Pentágono.
No caso de uma guerra contra o Irã, a US Navy não seria capaz de manter aberto o Estreito de Ormuz.
Os mísseis russos SS-NX-26 Yakhont – com uma velocidade máxima de Mach 2,9 – estão alinhados na costa norte iraniana do Estreito de Ormuz.
Não há maneira de porta-aviões dos EUA poderem defender-se de uma barragem de mísseis Yakhont.
Depois, há os mísseis supersônicos anti-navio SS-N-22 Sunburn – já exportados para a China e a Índia – que voam ultra-baixo, a 1.500 milhas por hora [2414 km/h], com capacidade de se esquivarem e extremamente móveis.
Eles podem ser disparados de um caminhão plataforma e foram projetados para derrotar o sistema de defesa de radar Aegis dos EUA.
O que fará a China ?
O ataque frontal total ao Irã revela como a administração Trump aposta na ruptura da integração da euro-asiática através do que seria seu elo mais fraco; os três elos principais são a China, a Rússia e o Irã.
Estes três atores interconectam todo o espectro: a iniciativa da Estrada da Seda, a União Econômica da Eurásia, a Organização de Cooperação de Xangai, o Corredor Internacional de Transporte Norte-Sul, a expansão do BRICS Plus.
Assim, não há dúvida de que a parceria estratégica Rússia-China estará vigilante nas costas do Irã.
Não é por acaso que o trio está entre as principais “ameaças” existenciais aos EUA, de acordo com o Pentágono.
Pequim sabe como o US Navy é capaz de cortá-la das suas fontes de energia. E é por isso que Pequim está estrategicamente aumentando as importações de petróleo e gás natural da Rússia.
Ao engendrar a “fuga de Malaca”, também deve levar em conta uma hipotética tomada do Estreito de Ormuz.
Um cenário plausível envolve Moscou atuando para a neutralização da extremamente volátil confrontação EUA-Irã, com o Kremlin e o Ministério da Defesa tentando persuadir o presidente Donald Trump e o Pentágono a evitarem qualquer ataque direto contra o IRGC.
A contrapartida inevitável é o surgimento de operações secretas, a possível encenação de falsas bandeiras e todo o tipo de técnicas sombrias da Guerra Híbrida implantadas não apenas contra o IRGC, direta ou indiretamente, mas contra interesses iranianos por toda a parte.
Para todos os efeitos práticos, os EUA e o Irã estão em guerra.
Dentro do quadro de um maior cenário de ruptura da Eurásia, a administração Trump aproveita-se do ódio psicopata waabista e sionista contra os xiítas.
A “pressão máxima” sobre o Irã confia em Jared “da Arábia” Kushner, íntimo de Mohammad Bin Salman (MbS) em Riad e o mentor de MbS em Abu Dhabi, Sheikh Zayed, para substituir o déficit do petróleo iraniano no mercado.
Mas isso não faz sentido – pois um bom número de traders astutos do Golfo Pércico está convencido de que Riad não “absorverá a participação de mercado do Irã”, porque não há ali petróleo extra.
Grande parte do que está pela frente na saga do embargo do petróleo depende da reação de variados vassalos e semi-vassalos.
O Japão não terá coragem de ir contra Washington. A Turquia vai lutar. A Itália, via Salvini, fará lobby por uma imunidade.
A Índia é muito complicada; Nova Delhi está a investir no porto de Chabahar, no Irã, como hub chave da sua própria Rota da Seda e coopera estreitamente com Teerã dentro do quadro do INSTC.
Estaria nas cartas uma traição vergonhosa?
A China, é óbvio, simplesmente ignorará Washington.
O Irã encontrará maneiras de escoar o seu petróleo porque a procura não irá simplesmente desaparecer com a varinha mágica de uma mão americana. É hora de soluções criativas.
Por que não, por exemplo, reabastecer navios em águas internacionais, aceitando ouro, todo tipo de cash, cartões de débito, transferências bancárias em rublos, yuan, rúpias e riais – e tudo o mais que pode ser encomendado num sítio web?
Isso seria uma maneira de o Irã usar sua frota de petroleiros para fazer uma matança.
Alguns dos petroleiros poderiam estar atracados – você entendeu – no Estreito de Ormuz, com um olho no preço de Jebel Ali nos Emirados Árabes Unidos, a fim de garantir o preço.
Acrescente a isso um duty free shop para as tripulações dos navios. Quem não irá gostar?
Os proprietários de navios pouparão fortunas nas faturas de combustível, e as tripulações receberão todo tipo de material com 90% de desconto nos duty free.
E vamos ver se a UE ganhou uma espinha – e realmente turbina sua rede de pagamento alternativo Veículo de Propósito Específico (Special Purpose Vehicle – SPV ) concebida depois de a administração Trump ter abandonado o JCPOA.
Porque mais do que desmanchar a integração da Eurásia e implementar a mudança do regime neocon, trata-se do anátema definitivo.
O Irã está sendo impiedosamente punido porque se evadiu do US dólar no comércio de energia.
*Associação de Engenheiros da Petrobrás; Pepe Esvobar é jornalista, brasileiro, correspondente do Asia Times, de Hong Kong. Seu último livro é 2030.
O original encontra-se em consortiumnews.com/2019/04/24/pepe-escobar-war-on-iran-calling-americas-bluff/
PS do Viomundo: Assim como na Ásia, os Estados Unidos estão empenhados em acabar com o multilateralismo, que os enfraquece. Querem agir vis-a-vis “parceiros” fracos como o Brasil, de onde poderão extrair mais concessões em negociação um-a-um. Acabar com o Mercosul, portanto, interessa aos EUA — e o vassalo Bolsonaro segue a cartilha de Washington.
Comentários
Zé Maria
“Warren Buffett, entre outros investidores, rotineiramente qualifica o mercado
de 2,5 quatrilhões (10 elevado a 15) de derivativos como uma arma de destruição financeira em massa.
Tal como está, estes derivativos são utilizados – ilegalmente – para drenar
nada menos que um trilhão (10 elevado a 12) de US dólares por ano
fora do mercado, em lucros manipulados.”
Ah, Lucros Manipulados … Por Fora do Mercado…
Não pagam um imposto sequer, em lugar algum.
“Se Teerã fosse totalmente cercada por Washington, sem saída, a opção nuclear de fechar o Estreito de Ormuz cortaria instantaneamente 25% da oferta mundial de petróleo.
Os preços do petróleo poderiam subir para mais de US$ 500 por barril, mesmo a US$ 1000 por barril.
Os 2,5 quatrilhões de derivativos iniciariam uma reação de destruição em cadeia.”
Crime de Lesa Humanidade
Essa Corja sempre atuando na Clandestinidade
para Destruição em Massa de Povos e Nações.
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