Pedro Augusto Pinho: Grandes presidentes e reflexões históricas oportunas

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Segundo Pedro Augusto Pinho, os grandes presidentes brasileiros são o Marechal Floriano Peixoto, Getúlio Vargas e General Ernesto Geisel. Fotos: Wikipédia

Grandes presidentes do Brasil e reflexões históricas pertinentes

Por Pedro Augusto Pinho*

Paulo Nogueira Batista Jr., economista defensor da soberania brasileira, em Viomundo, recordando a morte do Estadista Brasileiro, Getúlio Dornelles Vargas, no artigo de 23 de agosto de 2024, relaciona os que foram, em sua avaliação, os grandes presidentes do Brasil.

Em primeiro lugar, obviamente, Vargas; no honroso segundo lugar, Luiz Inácio Lula da Silva, seguem-se, pela ordem, Juscelino Kubitschek de Oliveira e Ernesto Geisel.

No artigo esclarece: “Não é por duração no cargo, evidentemente, que Getúlio deve ser considerado o maior presidente de todos os tempos. O que importa é a sua extraordinária quantidade de grandes feitos, que deixaram marcas indeléveis”.

Logo são os feitos destes presidentes, isto é, os dirigentes da República brasileira, aqueles 35 homens e única mulher, que, por uma ou diversas vezes, ocuparam em distintos períodos o comando do executivo nacional, que devem ter suas contribuições ao Brasil observadas.

O conhecimento de nossa história não é muito estimulado pelos poderes que nos governam. Se o brasileiro tiver informações e capacidade crítica, poucos políticos, neste trágico período em que vivemos, escaparão do opróbio, quiçá da prisão.

Como é evidente, devemos ter um parâmetro para julgar coerentemente estes dirigentes, e este deve estar relacionado ao momento em que ocuparam a presidência.

Num país como o nosso, que ainda tem quase 10% da população analfabeta, onde ronda permanentemente algum interesse estrangeiro para nos saquear, que a elite local sonha com o escravismo e não o revela salvo na exceção que confirma a regra, qualquer amor à Pátria, juntar quatro nomes, como o fez Nogueira Batista Jr, é feito notável.

Vamos enumerar o resultado de nossa avaliação, dentro da reflexão histórica de nossa origem e das ideologias e políticas que nos impuseram ou construímos.

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Portugal, avozinho de péssimo exemplo

Portugal levou mais longe o feudalismo europeu do que outros reinos. Este atraso fazia do país a propriedade pessoal do rei e seus habitantes obrigados à prestação de gêneros, de trabalho não industrial mas de caráter doméstico, características de Reino pobre.

E à pobreza juntava-se a pequena população que permitia à nobreza viver ociosamente na Corte sendo possível ser mantida pelo duro trabalho dos camponeses.

A peste de 1348 levou este país pobre ao abandono, particularmente observado nas terras da Igreja Católica.

Entender os nossos descobridores é importante para que se possam analisar os valores que nos trouxeram quando vieram nos colonizar.

Os heróis lusitanos, Viriato e Sertório, lutaram contra as legiões romanas que, pouco mais de duzentos anos antes de Cristo, procuraram submetê-los à República Roma.

Mas Portugal surgiu em 1143, com o acordo Tratado de Zamora que reconheceu o país como reino independente e foi entre D. Afonso Henriques, o primeiro rei de Portugal, e Afonso VII, de Leão e Castela.

Portugal foi constituído Reino principalmente para lutar contra os mouros, que dominavam a península ibérica.

Não foram outros os objetivos dos descendentes de D. Henrique até D. Fernando (9º rei), com poucas exceções que exemplificamos com o “Lavrador”, D. Dinis, 6º rei português, buscando trazer algum desenvolvimento agrícola para Portugal.

Eram todas, corte e trabalhadores, de modo geral, pessoas rudes e poucas naquele “Condado Portucalense”.

A partir de D. João I (1385-1433) tem início a Dinastia de Avis e a expansão portuguesa pela África que leva à descoberta do Brasil com D. Manuel (1495-1521).

Como aconteceu com outros países europeus, as descobertas nas Américas enriqueceu e transformou a Europa. Portugal teve a infelicidade de cair sob o domínio espanhol entre 1581 e 1640, e precisar lutar para reconquista da governança do Reino.

E a Coroa Portuguesa buscou apoio e a proteção na Inglaterra que, oportunisticamente, foi transferindo receitas brasileiras para aristocracia das Ilhas Britânicas.

De tal sorte que foram as mãos inglesas que salvaram D. Maria I e D. Pedro III (1777-1816) da invasão francesa de Portugal por Napoleão Bonaparte (1807). Os ganhos do Brasil foram transferidos, tanto no período colonial quanto após, já Independente (1822), para Inglaterra.

Diferentemente da América Espanhola, a Portuguesa não fez da Independência a mudança de regime nem mesmo trocou a família real: o Brasil continuou o reinado dos Braganças.

Esta situação será importante na análise da transição para República.

Chegou a República e ninguém notou

A ordem privada prevaleceu desde o descobrimento da Colônia. A feição do Estado reduziu-se à defesa externa e à interna e ao envio das riquezas para Portugal, destinadas à Corte, depois à Espanha e, por fim, à Grã-Bretanha.

A Carta Régia de D. João III, criando o Governo Geral, durou, na realidade, desde 1549 até a Constituição de 1934, ou seja, por 385 anos.

Além de não haver sido constituído um Estado com incumbências típicas e mínimas de educação, saúde, construções civis, incentivo à produção, era um governo sem projeto algum, exceto a manutenção de sua existência e da escravidão étnica.

O Brasil até a República foi um país sem futuro, sem projeto, sem mesmo um governo nacional. Este momento de efetiva transformação não foi, no entanto, uma conquista popular nem mesmo das elites mais avançadas.

Recordemos o fim do Império. Era o único país ocidental que tinha a escravidão legalmente aceita, não criminosamente mantida como neste século XXI. E D. Pedro II era apenas um monarca vaidoso, um velho mimado, que entendia serem-lhe devidos favores não conquistados.

Havia algum progresso, limitado à agricultura, no Vale do Paraíba e em São Paulo, graças ao café, produto de exportação, que cumpria exigências dos compradores.

O restante da produção agrícola brasileira era destinado ao açúcar, sob regime escravista, principalmente do Nordeste.

Isso ficava nítido na quantidade de parlamentares e ministérios, majoritariamente ocupados por nordestinos, de nascença ou descendência.

Os republicanos eram, quase sempre, também abolicionistas, concentrados na classe média, civil e militar, das cidades do sudeste e sul do País.

Os feitos militares do Império (Guerra contra o Paraguai e dos Canudos) provocaram mais debates e revoltas do que orgulho. Em 1870, lançam o manifesto dirigido à classe militar.

Muitos se tornam republicanos, ainda que sem saber exatamente o que significava. Em 1886, o visconde de Pelotas, chefe militar, descendente do também militar Patrício José Correia da Câmara, dirige aos senadores demonstrando a situação crítica de homens e recursos financeiros do Exército.

Para dispersão de contingentes do Exército, evitando atos de rebeldia, parte da tropa foi selecionada para transferência para o Norte do País, provocando revolta entre os militares.

Em 15 de novembro de 1889, vitimado por asma, o Marechal Deodoro da Fonseca, amigo de Pedro II, levanta da cama e, para evitar movimento de revolta militar, monta seu cavalo, seguido por militares de sua confiança, se dirige para onde, supostamente, se concentravam os revoltosos.

O povo analfabeto, desinformado, preocupado com seus problemas diários, ainda mal refeito da libertação dos escravos, apático e apolítico, pensava ver um desfile militar.

Afinal, a questão que a história trata de militar era apenas uma questão entre os militares.

O Império caiu pelos próprios méritos. E não há maior prova do que o Governo de Deodoro. Além de militares, quase todos civis no Ministério poderiam ter sido escolhidos por Pedro II, inclusive o 1º Ministro, o baiano José Antônio Saraiva, Conselheiro Saraiva, que já ocupara cargos relevantes no Império.

Ou seja, o Governo Provisório repetia o Governo Imperial deposto.

Mas o Estado Moderno deve estar nas mãos de quem controla os meios de produção, e este grupo estava mais na oposição do que no Governo. Isso explicará o Governo de Floriano Peixoto e a 1ª República, de Prudente de Moraes a Washington Luis.

Os grandes presidentes

Que “grandes feitos, deixaram marcas indeléveis”?

O maior dos feitos é a garantia e todo empenho e coragem para manter sempre e contra todos inimigos a Soberania nacional brasileira.

Neste breve apanhado histórico pode-se constatar que esta Soberania nunca existiu até a República, e, com tristeza, verificamos que nem neste mais longo período republicano.

Portanto, grandes presidentes tem como avaliação fundamental manter, no mínimo, por todo período do seu governo, o Brasil Soberano.

Há também outro fator eliminatório. A plena cidadania de seus habitantes. Ou seja, a garantia da educação, ampla, completa, crítica, que faz do habitante um cidadão.

E, sendo cidadão terá direito à saúde, habitação com o complemento indispensável do saneamento básico, à mobilidade urbana e todas facilidades de deslocamento e à garantia dos direitos.

E, como resultante da cidadania, a efetiva e permanente participação nas decisões da Nação, para o que se necessita da organização do Estado que permita esta participação popular.

Apenas o estadista Getúlio Vargas correspondeu aos critérios adotados, e, se não fosse a articulação da direita à esquerda impedindo a eleição de Leonel Brizola, logo após os governos miliares, teríamos certamente seu nome entre os grandes presidentes.

Porém, dois presidentes, considerando as dificuldades internas e externas do período de seus governos, merecem compor este quadro: Floriano Peixoto e Ernesto Geisel.

Marechal Floriano Peixoto — 23 de novembro de 1891 a 15 de novembro de 1894

O caboclo Floriano Vieira Peixoto (30/04/1839-29/06/1895) foi o quinto dos dez filhos do agricultor Manoel Vieira de Araújo Peixoto e Ana Joaquina de Albuquerque Peixoto. A penúria da família fez de seu tio, Coronel José Vieira de Araújo Peixoto, mais abastado, seu padrinho e pai de criação. E este tio o orientou para formação militar.

Francolino Camêu e Artur Vieira Peixoto, este último primo do Presidente Floriano Peixoto, deixaram para Coleção Temas Brasileiros, da Editora Universidade de Brasília, detalhada narrativa de “Floriano Peixoto, Vida e Governo” (Brasília, 1983).

Como se observava, a convivência de políticos do Império com os que já clamavam pela República e pelo fim do direito de ter escravos, e, pior, compondo o mesmo governo, gerava desinteresse do povo pela política, o que sempre foi objetivo dos poderes, e cada um tratava apenas dos seus mais mesquinhos interesses. Era um país parado no tempo.

A República surgia como sacudidela nesta apatia egoísta, e procurava a contemporaneidade do Brasil na própria América do Sul, subcontinente ao qual pertence.

Porém, o Marechal Manuel Deodoro da Fonseca não era a pessoa indicada para comandar esta transformação. Além da amizade com o Imperador, os mais de sessenta anos não lhe davam a vitalidade necessária para tal empreitada.

Seu vice, Floriano Peixoto completava 50 anos e tinha se preparado para comandar militares e, por que não?, civis.

O exército mais profissionalizado era recente. Estudiosos dão-lhe nascimento em 1865, com a Guerra contra o Paraguai. Até então era milícia de senhores de terra para aprisionar escravos fugitivos. Consequentemente, não era também popular nem democrático.

As medidas de Deodoro, como dissolução do Congresso e entrega a Floriano da Presidência, provocaram em diversos pontos do Brasil reações de todo tipo, inclusive no meio militar.

Personalidade reservada, disciplinada e disciplinadora, dotado de forte amor pela Pátria, Floriano impôs a República como, pessoalmente, deu voz de prisão a generais que desterra e reforma.

Os interesses estrangeiros já não são uniformes como no Império. Ingleses e estadunidenses disputam as riquezas brasileiras. Floriano combate a ambos com energia.

Pode-se afirmar com segurança que, contra todos contrários e hesitantes, Floriano consolidou a República e deu novo rumo à política brasileira, no sentido da contemporaneidade econômica e com fundamentos éticos.

Extenuado não resistiu nem um ano após deixar a presidência para o advogado paulista Prudente de Morais.

General Ernesto Geisel — 15 de março de 1974 a 15 de março de 1979

Dois trabalhos publicados são importantes para se conhecer o Governo Geisel.

Suas próprias palavras, no depoimento a Maria Celina D’Araujo e Celso Castro do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (FGV/CPDOC), em “Ernesto Geisel” (Editora da Fundação Getúlio Vargas, RJ, 1997), e Felipe Maruf Quintas, “Regime Militar A Construção do Brasil” (Editora Clube dos Autores, Niterói, 2024).

Filho de emigrantes alemães, de formação luterana, o gaúcho Ernesto Geisel (03/08/1907-12/09/1996) foi tomado pela agitação tenentista da década de 1920 que o levou a participar da Revolução de 1930. E logo combateu a contra revolução paulista de 1932 e ocupou a Secretaria da Fazenda da Paraíba.

Sua vida decorreu na carreira militar, onde chegou ao posto de General de Exército, e em funções civis, chegando a Presidente da República.

De 1930 a 1979, quando entregou a presidência do País ao General João Batista Figueiredo, pelo golpe aplicado pelas finanças internacionais para controlarem a transição dos governos militares para os governos civis, foi quase meio século de dedicação ao Brasil.

Geisel se destacou pela autonomia e hombridade com que sempre se conduziu e impôs a seus comandados. Foi senão o que melhor trabalhou até hoje, 2025, para fazer da Petrobrás das mais avançadas tecnologicamente, das mais rentáveis e das maiores empresas mundiais.

Ganhou a inimizade e perseguição do secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger (setembro de 1973 a janeiro de 1977), quando se recusou a ser mero executor das ordens de Washington.

Geisel, tendo como Ministro das Relações Exteriores Antônio Francisco Azeredo da Silveira (1974-1979), transformou o comportamento subserviente nas relações internacionais em “altivo e ativo”, no que dão mostras as ações na África, no Oriente Médio e no Acordo Nuclear com a Alemanha.

O II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND) ainda hoje, com a facilidade de não depender mais do petróleo, por ser o Brasil autossuficiente, é exemplo de planejamento desenvolvimentista integrando economia e questões sociais e culturais.

Conclusão

Apenas três dirigentes dignificarem a condução do País mostra o baixíssimo nível da política brasileira. E, não por acaso, serem todos os três qualificados, pelos interesses estrangeiros e seus representantes no Brasil, de “ditadores”.

*Pedro Augusto Pinho é administrador aposentado.

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