Orlando Silva: Bolsonaro nem assumiu e já é exemplo de despreparo e improviso
Tempo de leitura: 3 minO Barão de Itararé e os primeiros dias de Bolsonaro
por Orlando Silva
Passados dez dias da eleição, o presidente eleito e sua equipe de transição têm dado sucessivas mostras de que o improviso e despreparo que marcaram a campanha projetam-se, perigosamente, nos primeiros sinais do que promete ser o novo governo.
Não se vislumbra, até o momento, um projeto para o país, prioridades delineadas ou programas estruturantes.
Alguns dirão que é uma crítica por demais antecipada, mas a situação se torna mais grave à medida que o debate de propostas inexistiu na campanha vencedora.
Até o momento, o que se viu foram ditos e contraditos em temas econômicos, disputas internas por protagonismo na equipe de governo e um espantoso e alarmante desconhecimento sobre política externa e diplomacia – uma política de Estado, que deveria estar preservada das intempéries de governos.
Quanto ao presidente eleito, embora este tenha jurado respeito à Constituição, persiste a postura autoritária, como demonstra ao escolher veículos de comunicação para dar entrevistas e ignorar temas que não lhe agradam.
A fusão de ministérios e concentração de poderes – mero ilusionismo marqueteiro de enxugamento da máquina pública – parece ser uma obsessão do futuro governo.
A que custo de políticas públicas, ninguém sabe ao certo.
O futuro Ministério da Economia, a ser dirigido por Paulo Guedes (vulgo “Posto Ipiranga”), unificará as funções da Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio Exterior.
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Como a anunciar seu privilégio para os interesses do mercado financeiro nas contradições que a nova pasta deverá arbitrar, Guedes já afirmou que o Mercosul, um dos nossos principais mercados para exportação, não será sua prioridade e que salvará a indústria nacional “apesar dos industriais”.
A pretensão de acabar com o Ministério do Meio Ambiente, submetendo-o à pasta da Agricultura, só não foi adiante por pressão da sociedade e de setores mais dinâmicos do próprio agronegócio, temerosos em perder mercados globais ciosos de salvaguardas ambientais nos processos de produção.
Aliás, a indicação da deputada Tereza Cristina para a Agricultura gerou ruídos na base de apoio, com reclamos públicos do líder da UDR contra a escolha.
A obsessão por desconstruir chegou ao ápice com o anúncio de extinção do Ministério do Trabalho e Emprego, órgão fundamental que existe há mais de 80 anos, responsável por liderar políticas essenciais para a geração de empregos, arbitrar conflitos entre trabalhadores e empresários, fiscalizar e coibir o trabalho escravo e infantil, entre outras atribuições.
Ainda antes de assumir, o novo governo já protagoniza episódios humilhantes para o Brasil no exterior.
No que seria uma cambalhota na história do Itamaraty, a política externa de não ingerência em conflitos foi colocada na berlinda com a estapafúrdia ideia de transferência da embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém – uma agressão injustificável aos países árabes.
Ato contínuo, o Egito, um de nossos principais parceiros comerciais no mundo árabe, cancelou missão diplomática brasileira ao país.
Afora os impactos políticos que a eventual mudança na linha histórica das relações exteriores pode acarretar, os prejuízos econômicos ao país podem ser enormes.
Para ficar em um único exemplo, o Brasil é o maior exportador de carne Halal (método de abate exigido pelos muçulmanos) do mundo e apenas as vendas de frango Halal nos trouxeram U$ 3,2 bilhões em 2017, segundo a Associação Brasileira de Proteína Animal.
Por que colocar essas relações em risco?
O presidente eleito Jair Bolsonaro também conseguiu o prodígio de causar melindres na relação brasileira com a China.
Ainda como candidato, ele fez questão de visitar a ilha de Taiwan, clara provocação em relação ao contencioso interno do país, e fez declarações desastrosas, como “a China não está comprando no Brasil, ela está comprando o Brasil”.
Trata-se “apenas” da 2ª maior economia do mundo e o maior parceiro econômico do Brasil, destino de 26,7% de nossas exportações em 2018, segundo dados do candidato à extinção Ministério da Indústria e Comércio Exterior.
As relações diplomáticas exigem que o chefe de Estado seja o algodão entre cristais, mas Bolsonaro insiste em se portar como um elefante que invade a loja de cristais.
Logo ele, que tanto falava em “desideologizar” a política externa, vai brigar com meio mundo justamente por ideologia?
Oras, o Brasil tem uma tradição para lá de centenária de boa diplomacia e cultura da paz, basta que o novo governo não a atrapalhe.
No conjunto da obra, até agora, os primeiros sinais emitidos pela equipe do futuro governo só corroboraram a máxima do Barão de Itararé: “de onde menos se espera, daí é que não sai nada”.
*Orlando Silva é deputado federal pelo PCdoB de São Paulo e líder da bancada comunista na Câmara
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Comentários
Jardel
Bolsonauro segue mais perdido que cego em tiroteio.
Vive a patética tarefa de desdizer em tom ponderado aquilo que disse enfaticamente na semana anterior.
O seu “garoto” não para de dizer asneiras que, são imediatamente desautorizadas pelo pai no dia seguinte.
Só quero ver esse “governo”… Como diria o Cabo Daciolo: Deuxxxx me livre!
maria nadiê rodrigues
Mas, com certeza, tá chegando a hora de deixar bravatas de lado, porque não adianta ser sabujo dos EUA e por isso acreditar em governo bem-sucedido. As nações do mundo são como gente: precisam umas das outras, e, às vezes, por preconceitos ou outros coisos dessas natureza, nem precisa Deus intervir com Sua mão pesada. As autocríticas, se não vindas a tempo de uma correção, podem ser um tiro no pé.
Prefiro acreditar que a tolice será superada pela sabedoria. Do contrário, não podemos esperar coisa boa no futuro próximo, a começar pelo 2019.
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