Mirko Casale: Estado de Israel, um ‘país’ artificial até nos sobrenomes; vídeo
Tempo de leitura: 5 minEstado de Israel: Um país artificial
Mirko Casale*, transcrição do vídeo
Alô, estou falando com Benjamin Mileikowsky? Ah, número equivocado?
Essa é a residência da família Netanyahu? Desculpe-me.
Alô, estou falando com Ariel Scheinerman? Ah, número equivocado?
Esse é o domicílio da família Sharon? Desculpe-me.
Alô, estou falando com Golda Mabovitch? Ah, número equivocado?
Esse é o domicílio da família Meir? Desculpe-me.
Não sei se para vocês, mas para mim está parecendo que aqui quem está equivocado não sou eu.
Um importante número de israelenses tem de semita o que Michael Jackson, que em paz descanse, tem de caucásico. E a comparação escolhida não é nada gratuita. Ao contrário. O pai de Benjamin Netanyahu, por exemplo, não tinha esse sobrenome.
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Benzion Mileikowsky nasceu na Polônia. Ao mudar para a Palestina sob o mandato britânico mudou seu sobrenome, para que soasse mais judeu.
Netanyahu quer dizer em hebraico “Onde está Deus”. O que, sem dúvidas, é bastante mais grandioso que apropriado, dada a fama merecidamente adquirida pelo Primeiro Ministro israelense.
Esta prática de trocar de nome é muito comum entre os imigrantes, em sua maioria europeus, que vêm nutrindo a população israelense nos últimos 75 anos.
David Ben-Gurion que foi, com o perdão pela redundância, o primeiro Primeiro Ministro de Israel, também nascido na Polônia, se chamava na verdade Grün.
Golda Meir, com perdão por também redundar na redundância, em seu momento, a primeira Primeira Ministra israelense, havia nascido na atual capital de Ucrânia, Kiev, e tinha originalmente o sobrenome Mabovitch.
A lista de funcionários do alto escalão é longa. Por exemplo, Ariel Sharon tinha o sobrenome Scheinerman. E Simon Peres era em realidade Simon Persky.
E não creiam que é um assunto circunscrito exclusivamente ao passado. Não!
No atual gabinete do governo israelense, quem não é diretamente filho de alemães, poloneses, romenos, ucranianos ou irlandeses, é neto de russos, húngaros ou britânicos.
Isso para não falar do ministro Haim Katz, nascido na Alemanha, ou o de assuntos estratégicos, Ron Dermer, que é estadunidense.
Esta realidade, mais do que uma nota curiosa, colorida ou multicultural, tem um profundo significado histórico e geopolítico.
Assim, dito muito por cima, o Estado de Israel é uma criação artificial, no qual a grande maioria de seus habitantes diz ser ancestralmente originária dessas terras, porque, ou bem, “tenho antepassados que viveram aqui há 3.000 anos”, ainda que depois tenham ido embora e não voltaram por centenas de gerações, ou bem, “o tataravô do tataravô de meu tataravô decidiu converter-se ao judaísmo em algum lugar indeterminado do leste da Europa,” ainda que jamais em sua vida tenham estado a menos de 2.000 km de Jerusalém.
Hoje, há 75 anos da admissão do Estado de Israel na ONU, muitos israelenses podem argumentar que têm pais e inclusive avós nascidos nos territórios atualmente controlados por Tel Aviv.
Mas, a população com bisavós ou mais além nascidos no que era o Mandato Britânico da Palestina, Império Otomano, etc., é sensivelmente menor.
Em outras palavras, é difícil encontrar um israelense de duas ou três gerações sem, digamos, topar com importados em sua árvore genealógica.
Desde meados do século XX, o Estado de Israel vem fazendo ingentes esforços, para dizê-lo de alguma maneira, para encontrar ou, melhor dizendo, criar israelenses.
E fez isso de duas maneiras, principalmente. Uma, flexibilizando a definição formal de judeu. E dois, animando a população com esse perfil flexibilizado a imigrar.
Desde um ponto de vista formal, em seu enfoque religioso, o judaísmo é transmitido pelo ventre materno.
Dito de outra maneira, a única forma de ser judeu de nascimento é ter uma mãe judia. Ponto.
O que ocorre é que, primeiro paulatinamente e decididamente a partir de 1970, o Estado de Israel ampliou essa definição também aos casais de um homem ou mulher judia, seus filhos e filhas e netos e netas, sem importar se se identificavam muito, pouco ou nada com o judaísmo, como um estratagema para facilitar uma migração que povoasse os territórios ocupados.
Assim, um homem com sobrenome judeu nascido nos Estados Unidos, Polônia ou onde fosse, tanto se fosse praticante da religião judaica ou não, casado com uma não judia com quem tivesse dois filhos, e estes, por sua vez, outros dois filhos, seriam considerados uma família composta por um judeu e sete não judeus de um ponto de vista formal ou não religioso, mas, do ponto de vista dos papeis, para Tel Aviv seriam considerados como oito israelenses em potencial, se pleiteassem esse passaporte.
Com essas considerações legais e seguindo as proporções do exemplo, de um milhão de pessoas formalmente judias nascidas na Europa ou nos Estados Unidos, poderão ser criados sete milhões de israelenses formalmente não judeus, sem que nem um sequer desses oito milhões de pessoas com futuro passaporte israelense tivesse nascido nem posto um pé durante sua vida nos territórios que o Estado de Israel considera como ancestralmente próprios.
Porém, ampliar a concepção de judeu para além de sua acepção religiosa com um objetivo demográfico, não basta para atender os desejos de Tel Aviv, se essas pessoas efetivamente não imigram.
Ao fim e ao cabo, muitos estados concedem passaporte aos filhos e netos de seus cidadãos.
E é aqui que entre o segundo objetivo israelense que havíamos comentado antes. Incentivar a população potencialmente israelense a imigrar.
Quando uma pessoa se qualifica como potencial cidadão israelense e decide fazer a chamada ‘alliya’, ou imigração ao que Tel Aviv denomina “Terras de Israel”, o tesouro do Estado hebraico ou, como vimos, não de tudo hebraico, pagam por seu voo. E não apenas isso.
Ao aterrissar no aeroporto Ben-Gurion, ou, como já sabem, seria melhor chamá-lo de aeroporto Grün, ela recebe um cartão telefônico com 5.000 minutos de chamada e 6 gigas de dados grátis.
Pagam-lhe o transporte dali até o local escolhido como seu primeiro destino e lhe dão em mãos um maço de notas cujo montante varia conforme sua origem e situação familiar, para sua primeira etapa no lugar.
Não somos nós que estamos dizendo. Isto consta nas páginas de organismos oficiais israelenses criadas para atender aos imigrantes.
Esse pagamento mensal se estenderá por um ano, embora diminua na segunda metade, e gira por volta de 700 dólares para um latino-americano solteiro até por volta de 2.500 para uma família chegada da Europa. Para citar apenas dois exemplos dos muitos possíveis.
Além disso, os recém chegados também terão um seguro médico gratuito no primeiro meio ano, 500 horas grátis de aulas de hebraico, ajudas para o aluguel e uma redução de até 90% dos impostos sobre a moradia, automóveis e importações.
Assim, a combinação dessas vantajosas condições de imigração e a flexibilidade anteriormente citada relativa à definição de quem é e quem não é um potencial cidadão do autoproclamado Estado Judeu fez com que Tel Aviv recebesse autênticas marés de imigrantes em diferentes momentos da história.
Com ênfase especial após a queda da União Soviética.
Na década de 1990, o Estado de Israel engordou sua demografia em quase 30%, graças a imigrantes provenientes de Rússia, Ucrânia e Bielorus, principalmente.
Essa ansiedade por absorver imigrantes potencialmente israelenses é tão intensa que, naquela década, com boa parte da população judia soviética migrando para os Estados Unidos e Alemanha, Tel Aviv pressionou Washington e Berlim para que fechassem suas portas a esses migrantes para que eles se motivassem a ter Israel como seu destino.
E assim ocorreu. Ainda que nunca com a mesma intensidade, essa tendência de buscar possíveis israelenses por todo o mundo para depois atraí-los tem se mantido e se manterá.
Porque isso é parte fundamental da lógica israelense.
É que o Estado de Israel, longe de ser uma criação ancestral, é uma invenção principalmente europeia, concebida em fins do século XIX e implementada em meados do seguinte.
Assunto ao qual, por certo, dedicamos um vídeo completo em seu momento.
Como ocorre com todas as entidades de tipo colonial, em Tel Aviv, eles sabem que necessitam de colonos, e os necessitam do jeito que for.
Mesmo que isso implique ter de modificar a gosto uma definição claramente religiosa para moldá-la a objetivos muito menos divinos.
Atrair imigrantes de todo o mundo, sem se importar com seu remoto ou mesmo nulo vínculo com o judaísmo, que o Estado de Israel diz representar, mudar os nomes e sobrenomes dos colonizadores para dar a impressão de que sempre estiveram por ali e, sobretudo, expulsar e massacrar a população verdadeiramente originária, que sim vem vivendo nessas terras há muitas gerações.
*Mirko Casale é o roteirista, apresentador e diretor do programa Ahí les va! (Aí, está!), que há cinco anos a RT transmite para países de língua espanhola.
*Tradução e legendas: Jair de Souza
*Jair de Souza é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.
*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
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Comentários
Morvan
A prática de “formatar” e harmonizar nomes começou bem cedo, por motivos diferentes dos citados pelo articulista, agradecendo pelo excelente texto, pasmem, também por judeus, legítimos ou não, já que a legitimidade girava, ora, em torno de ser ou não ser cristão.
Durante a maldita Santa Inquisição, o maior medo de um judeu era ser descoberto, quer pelo nome (Shwartzkopp, Nietzmann ou Krykalev não soam tão bem como, por exemplos, Machado, Carvalho, Aroeira, Madeira, etc., aos ouvidos de um bom inquisidor…) ou mesmo por um inocente menorah guardado entre farrapos, admitamos.
Muitos sobrenomes, aqui e na Terrinha vêm desse maquiamento providente.
Haroldo Cantanhede
Ótimo artigo, Português escorreito, muita informação e conteúdo. Parabéns a todos os envolvidos! Agradeço a oportunidade de aprender e refletir sobre tantas farsas e fabricações!
Zé Maria
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“Comunicação como Arma no Enfrentamento aos Genocídios”
Na Palestina e no Brasil, Mídias Comunitárias e Ativistas
Denunciam o Racismo por trás dos Massacres e Matanças
Estudos destacam a parcialidade da cobertura brasileira pró-Israel
e a sonegação de informações de origem palestina.
Os veículos brasileiros produzem uma cobertura enviesada ao invisibilizar
o debate sobre o “apartheid” existente em Gaza, ao ignorar o contexto
histórico do conflito e ao encobrir os crimes cometidos por Israel.
O texto “A contribuição da mídia para o ciclo de violência”
(https://diplomatique.org.br/a-contribuicao-da-midia-para-o-ciclo-de-violencia/) traz exemplos, como o uso de fontes majoritariamente
israelenses nas matérias.
Além das mídias comunitárias, também destaca-se na produção de informação contra-hegemônica o que a jornalista Alane Reis classifica
como “mídias ativistas”, a exemplo da Revista Afirmativa, mídia negra surgida na Bahia em 2014.
A jornalista, que é coordenadora da Afirmativa, considera que nos últimos
anos houve um aumento do alcance desses veículos junto à sociedade.
De acordo com ela, as mídias ativistas têm um papel fundamental no
processo de sensibilização, informação e educação da sociedade sobre
o genocídio das populações negras e indígenas, contrapondo as mídias
comerciais “que sempre legitimaram o genocídio”.
Para Alane Reis, essa relação é intrínseca.
“A imprensa que surgiu no Brasil negava o racismo,
relativizava a escravidão e hierarquizava as pessoas
da sociedade”, afirma a coordenadora da Revista
Afirmativa, que avalia que marcos recentes obrigaram
os grupos midiáticos a passarem a reconhecer o racismo,
mas, ainda assim, negando o genocídio.
Segundo a jornalista, “é mais palatável falar em
‘racismo estrutural’ do que reconhecer os racistas
e a política de morte contra a população negra”.
Alane pontua também que somente a sensibilização
nunca foi suficiente para impedir a matança,
o que exige ações diretas de incidência política.
Por Alex Pegna Hercog, no Le Monde Diplomatique: https://t.co/sb2gq7YxyM
Íntegra em:
https://diplomatique.org.br/gaza-comunicacao
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“Os veículos brasileiros [de Mídia Comercial] também
produzem uma cobertura enviesada ao invisibilizar
o debate sobre o Apartheid existente em Gaza, ao ignorar
o contexto histórico do conflito e ao encobrir os crimes
cometidos por Israel.”
https://x.com/INTERVOZES/status/1828777552472674710
https://bsky.app/
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Zé Maria
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isRéu foi artificialmente criado por europeus
sobre um território assintosamente roubado.
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Excerto
O Estado de Israel é uma criação artificial, no qual a grande maioria
de seus habitantes diz ser ancestralmente originária dessas terras,
porque, ou bem, “tenho antepassados que viveram aqui há 3.000 anos”,
ainda que depois tenham ido embora e não voltaram por centenas de
gerações, ou bem, “o tataravô do tataravô de meu tataravô decidiu
converter-se ao judaísmo em algum lugar indeterminado do leste da
Europa”, ainda que jamais em sua vida tenham estado a menos de
2.000 km de Jerusalém.
Hoje, há 75 anos da admissão do Estado de Israel na ONU, muitos
israelenses podem argumentar que têm pais e inclusive avós nascidos
nos territórios atualmente controlados por Tel Aviv.
Mas, a população com bisavós ou mais além nascidos no que era o
Mandato Britânico da Palestina, Império Otomano, etc., é sensivelmente
menor.
Em outras palavras, é difícil encontrar um israelense de duas ou três
gerações sem, digamos, topar com ‘importados’ em sua árvore genealógica.
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