Marcos de Oliveira: Arábia encerrou acordo de petrodólares? Não, mas…

Tempo de leitura: 2 min

Arábia encerrou acordo de petrodólares? Não, mas…

Acordo formalmente nunca existiu, mas petrodólares garantiram força econômica dos EUA – até agora

Por Marcos de Oliveira, no Monitor Mercantil

Uma mensagem correu o mundo no final do mês passado: a Arábia Saudita encerrou acordo de petrodólares de 50 anos com os EUA.

O complemento dizia que o acordo do petrodólar foi originalmente assinado em 8 de junho de 1974 e foi uma parte fundamental da influência econômica global dos EUA e do domínio do dólar. Matéria apareceu com mais força em redes sociais e sites indianos.

De toda a mensagem, uma verdade é que os petrodólares foram uma pedra fundamental na estrutura do dólar.

Especialistas garantem que o acordo de junho de 1974 era outro, e que um acerto sobre compra de óleo saudita somente com dólares dos EUA nunca existiu – ao menos formalmente – nem tinha prazo de validade.

Editor da RT – rede financiada pelo Estado russo – Henry Johnston, que trabalhou com finanças por mais de uma década, diz que o acordo é uma peça de ficção.

Mas os petrodólares desempenharam papel fundamental após os EUA abandonarem a indexação do dólar ao ouro em 1971, pondo assim fim ao acordo de Bretton Woods.

“O dólar desvalorizou-se, sem surpresa, e a inflação disparou. No verão de 1973, tinha perdido um quinto do seu valor face a outras moedas importantes.”

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Ao conseguir dominar o comércio de petróleo, começando com os sauditas, em 1974 – dando em troca a venda de armas avançadas, vulgo, proteção – e logo depois se estendendo a toda a Opep, os EUA mantiveram a supremacia.

“Dado que o mercado do petróleo é muito maior do que o mercado do ouro, na verdade deu ao dólar um alcance ainda maior”, anota Johnston.

“Após o choque de 1973-74, o petróleo foi negociado num intervalo notavelmente estável de cerca de US$ 15 a US$ 30/barril durante os 30 anos seguintes.” Exceções nesta “pax do petrodólar” marcaram crises nos EUA e aumento vertiginoso dos juros.

Esse sistema está ruindo, pela própria situação econômica dos EUA e pelo surgimento de novos atores, notadamente China, Rússia e Índia – ou seja, 3 dos 5 fundadores dos Brics, bloco que estuda adotar uma cesta de moedas comuns, para começar o processo de desdolarização.

A Arábia Saudita, aceita no grupo em agosto de 2023, apesar de ainda não ter finalizado a adesão, segue participando das reuniões dos Brics. Além disso, amplia a venda de petróleo em outras moedas – tem um acordo cambial com a China. Índia, Rússia e China negociam óleo em suas moedas.

“Um sistema tão profundamente enraizado como o petrodólar não desaparecerá da noite para o dia, mas quando a sua base econômica estiver desgastada, só poderá ser mantido durante algum tempo através de ruído, fumaça e espelhos”, conclui Henry Johnston.

Bye, bye, petrodólares

Por trás da fake news sobre o fim do acordo, há outro fato: a Arábia Saudita juntou-se em junho ao mBridge, projeto transfronteiriço de moeda digital utilizando blockchain que envolve o BIS (Banco de Compensações Internacionais) e os bancos centrais da China, Hong Kong, Tailândia e Emirados Árabes Unidos.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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Comentários

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Zé Maria

China faz o Feitiço [do Petrodólar]
se Virar contra o Feiticeiro (EUA)

“Uma consequência não intencional das sanções impostas
pelos Estados Unidos da América e outros países ocidentais
à Rússia, ao Irã e à Venezuela foi a redução dos custos de
importação de petróleo para as refinarias da principal rival
econômica, a China, que frequentemente critica essas
penalidades unilaterais.”
[…]
“A China embarcou um recorde de 2,765 milhões de barris por dia (bpd)
de petróleo bruto por via marítima do Irã, Rússia e Venezuela nos primeiros
nove meses de 2023, de acordo com uma média de dados fornecidos pelos
rastreadores de petroleiros Vortexa e Kpler.

Os três países foram responsáveis por um quarto das importações da China
entre janeiro e setembro, acima dos cerca de 21% em 2022 e o dobro da
participação de 12% em 2020, segundo análise da Reuters.”
[…]
“De janeiro a setembro, a Rússia forneceu 1,3 milhão de bpd de petróleo
marítimo, com base na média dos dados fornecidos por Vortexa e Kpler.

A China também importou cerca de 800.000 bpd de petróleo bruto ESPO (East Siberia – Pacific Ocean) via oleoduto, de acordo com fontes comerciais chinesas.

As importações marítimas são principalmente ESPO enviadas do porto
russo de Kozmino, no Pacífico, bem como Urals do Mar Báltico.

De janeiro a setembro, o total de remessas russas cresceu mais de 400.000
bpd em relação ao ano anterior, liderado pelo Urals, de acordo com a
Vortexa, já que as sanções desencadeadas pela invasão da Ucrânia por
Moscou provocaram um desvio maciço de seus fluxos de petróleo da Europa
para a Índia e a China.”
[…]
“Para as importações de petróleo venezuelano, principalmente o Merey
de grau pesado, a China economizou uma média de US$ 10 por barril
em comparação com o petróleo bruto colombiano Castilla, mostraram
os cálculos com base nos dados do trader.” [ Trade News]
.
.
O Irã é o terceiro maior produtor da Organização dos Países Exportadores
de Petróleo (OPEP) e produz cerca de três milhões de barris de petróleo
por dia (bpd), o que corresponde a cerca de 3% da produção mundial total.

As exportações de petróleo do Irã atingiram no início de 2024
seu nível mais alto dos últimos anos, mesmo com sanções
impostas ao país persa.

As vendas externas de petróleo iraniano chegaram a US$ 35,8 bilhões
no primeiro trimestre deste ano, seu nível mais alto em seis anos,
segundo dados da alfândega do Irã.

A China foi o destino de 80% das exportações iranianas de cerca
de 1,5 milhões de barris por dia, de acordo com relatório do Comitê
de Serviços Financeiros da Câmara dos EUA.

Os analistas acreditam que o Irã e a China desenvolveram ao longo dos
anos um sistema sofisticado para comercializar o petróleo e desviar das
sanções dos Países Ocidentais liderados pelos Estado Unidos da América.

“Os elementos-chave deste sistema comercial são os ‘teapots’ chineses
[termo usado para se referir a pequenas refinarias independentes],
os navios-tanque da ‘frota oculta’ e os bancos regionais chineses com
exposição internacional limitada”, diz Maia Nikoladze, diretora-adjunta
de política econômica do centro de pesquisa Atlantic Council.

Os ‘teapots’ (que, em tradução literal, significam ‘bules de chá’) onde
o petróleo iraniano é refinado são pequenas refinarias semi-independentes,
uma alternativa às grandes empresas estatais.

“É um jargão industrial”, explica Falakshahi, “porque as refinarias
inicialmente pareciam bules de chá, com instalações muito básicas,
localizadas principalmente na região de Shandong, no sudeste de Pequim”.

Essas pequenas refinarias representam menos riscos para a China
quando comparadas a empresas estatais que operam internacionalmente
e precisam de acesso ao sistema financeiro dos EUA.

“As pequenas refinarias privadas que não têm operações no exterior
não negociam em dólares, não precisam de acesso a financiamento
estrangeiro”, diz Falakshahi à BBC Persian.

[BBC, Londres, 15 de Maio de 2024]
.
.

Zé Maria

Onde há Fumaça Há Combustível Fóssil [Ainda]

Realmente houve um Acordo Tácito entre Arábia Saudita e EUA,
que já perdura 50 Anos, em que os Sauditas só negociariam
Petróleo em Dólares Estadunidenses.

Mas certo é que atualmente, embora a Arábia Saudita continue sendo
um dos Maiores Exportadores Globais de Óleo Bruto, a Rússia já chegou
à Condição de Maior Fornecedor de Petróleo da China, que é de longe
o 2º Maior Consumidor do “Ouro Negro” do Mundo e vem se aproximando
da Liderança dos Estados Unidos da América (EUA).

E a Demanda por Petróleo da Índia é a que Mais cresce globalmente.

“A Agência Internacional de Energia (AIE), com sede em Paris, prevê que
a Índia está a caminho de registrar um aumento na sua demanda por
petróleo de quase 1,2 milhão de barris por dia, respondendo por mais
de um terço do incremento de 3,2 milhões de barris por dia previsto
para todo o globo até 2030.
Com essa perspectiva, o país deve se tornar o maior propulsor do
crescimento da demanda de petróleo entre hoje e 2030, assumindo
uma pequena margem de liderança ante a China, projeta a AIE.”
https://www.udop.com.br/noticia/2024/02/14/india-se-tornara-principal-motor-do-crescimento-da-demanda-de-petroleo-ate-2030-diz-aie.html

Sabendo que esses 3 Grandes Países Asiáticos – China, Índia e Rússia –
são Membros do Bloco BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul)
e negociam Mercadorias em suas próprias Moedas – sendo o Petróleo o
Principal Produto – e que a Arábia Saudita, o Egito e o Irã (3º Maior Produtor
da OPEP) estão aderindo ao Bloco, parece difícil que os EUA mantenham
a Hegemonia do Petrodólar por muito mais tempo.
.
.
Excerto

Os petrodólares desempenharam papel fundamental após os EUA
abandonarem a indexação do dólar ao ouro em 1971, pondo assim
fim ao acordo de Bretton Woods.

“O dólar desvalorizou-se, sem surpresa, e a inflação disparou.
No verão de 1973, tinha perdido um quinto do seu valor face
a outras moedas importantes.”

Ao conseguir dominar o comércio de petróleo, começando com os sauditas,
em 1974 – dando em troca a venda de armas avançadas, vulgo, ‘proteção’ –
e logo depois se estendendo a toda a Opep, os EUA mantiveram a supremacia.

“Dado que o mercado do petróleo é muito maior do que o mercado do ouro,
na verdade deu ao dólar um alcance ainda maior”, anota Johnston.

“Após o choque de 1973-74, o petróleo foi negociado num intervalo notavelmente estável de cerca de US$ 15 a US$ 30/barril durante
os 30 anos seguintes.”
Exceções nesta “pax do petrodólar” marcaram crises nos EUA
e aumento vertiginoso dos juros.

Esse sistema está ruindo, pela própria situação econômica dos EUA
e pelo surgimento de novos atores, notadamente China, Rússia e Índia
– ou seja, 3 dos 5 fundadores dos Brics, bloco que estuda adotar uma
cesta de moedas comuns, para começar o processo de desdolarização.

A Arábia Saudita, aceita no grupo em agosto de 2023, apesar de ainda
não ter finalizado a adesão, segue participando das reuniões dos Brics.

Além disso, amplia a venda de petróleo em outras moedas – tem um acordo
cambial com a China. Índia, Rússia e China negociam óleo em suas moedas.

“Um sistema tão profundamente enraizado como o petrodólar
não desaparecerá da noite para o dia, mas quando a sua base
econômica estiver desgastada, só poderá ser mantido durante
algum tempo através de ruído, fumaça e espelhos”,
conclui Henry Johnston (no artigo: https://www.rt.com/business/599637-us-dollar-oil-deal/)
.
.

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