Marcelo Zero: Para a fantasia de Bolsonaro, só faltam as camisas negras de Mussolini
Tempo de leitura: 4 minQuem Quer as Hemorroidas do Povo?
por Marcelo Zero*
Em sua característica linguagem castiça, o presidente Bolsonaro afirmou, na latrina de caserna em que se transformou o Palácio do Planalto, que “eles querem nossas hemorroidas”.
O, por assim dizer, pensamento do presidente é tortuoso e de difícil exegese.
Porém, no contexto das miasmas externadas na surreal reunião tornada pública, é razoável supor que por “eles” o supremo capitão estivesse se referindo aos “comunistas”, que, após mais de três décadas da queda do Muro de Berlim e mais de seis décadas depois do macartismo, ainda teimam em conspirar para implantar uma ditadura nestas paragens tropicais.
Afinal, no mundo delirante e submerso em fake news do fascismo bolsonarista tudo é possível.
Conspirações comunistas, marxismo cultural, globalismo maléfico, mamadeiras de pênis, terra plana e drogas miraculosas não cientificamente testadas para outros usos, como a cloroquina.
O astrólogo da Virgínia, maravilha da intelectualidade tupiniquim, atesta.
Nesse mundo de delirantes fantasias ideológicas, avulta a fantasia singular de que o governo Bolsonaro apoia os interesses populares contra as elites e os políticos corruptos.
Com efeito, em toda a reunião o presidente e ministros reservaram a si mesmos o surpreendente papel de “defensores do povo”.
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Nós somos “diferentes”, chegou afirmar o ministro Guedes, egresso das fileiras de organizações populares que defendem o rentismo do proletariado e do campesinato.
Bolsonaro, povero capitão que ingressou com toda sua família no mundo da política, se viu obrigado a fazer “rachadinhas” e a ingressar no doce mundo achocolatado das milícias, já que seus parcos vencimentos de deputado federal não conseguiam satisfazer seu apetite voraz de “atleta”.
Uma tragédia popular, sem dúvida.
Weintraub, nosso fulgurante Gene Kelly, disse, confundindo cidade com relações políticas, como muitos, que odeia a Brasília afastada do povo (como se a cidade não tivesse povo) e que colocaria todos esses “vagabundos” na cadeia, a começar pelos ministros do STF.
Um homem do povo, semelhante àqueles que habitavam os subúrbios da Alemanha, nas décadas de 1920 e 1930.
Só falta o uniforme das Sturmabteilung (SA).
Contudo, apesar dessa fantasia coletiva de serem gente “diferente”, que defende os interesses do povo brasileiro, o que dizem e, sobretudo, o que fazem indicam o oposto.
Na realidade, para ficar no mesmo nível argumentativo dos “diferenciados” da latrina palaciana, Bolsonaro e sua “coproequipe” de anões desbocados e incompetentes querem mesmo é ir com tudo nas doloridas hemorroidas do povo do Brasil.
De preferência, armados.
Armados contra a população, que não tem dinheiro para comprar armas e pode apenas vender sua força de trabalho para os “diferentes”.
Querem armas para formar milícias e escravizar o povo.
Só faltam as vistosas camisas negras de Mussolini, que poderão ser eventualmente substituídas por camisetas da CBF.
O capitão protervo e sua turma de boçais foram colocados lá para isso mesmo.
Essa é a missão política que justifica sua malcheirosa existência e sua presença hedionda no poder.
Guedes, que leu Keynes três vezes sem conseguir entender uma vírgula sequer, façanha intelectual de vulto, considerando-se a clareza de pensamento do Lorde do King`s College, resumiu bem os objetivos.
O negócio é reduzir substancialmente o papel do Estado, aniquilar direitos sociais, sucatear serviços públicos e aumentar as desigualdades, a pobreza e a precariedade laboral.
O negócio é colocar os custos da crise, que se arrastra há anos, nas costas, ou nas hemorroidas, dos trabalhadores, dos aposentados, dos funcionários públicos e da população que necessita de serviços públicos.
Agora mesmo, vão tentar ampliar a redução dos direitos trabalhistas com o projeto da carteira verde e amarela, cheio de cores, mas vazia de direitos.
Ademais, Guedes confessou, na reunião, que colocou uma bomba no bolso dos funcionários públicos, seus “inimigos”.
Ante essa sociopatia econômica e política, entende-se a indiferença com relação à tragédia da saúde humana criada pela pandemia, ignorada na reunião, e o desprezo pela saúde do meio ambiente, a ser atropelada pela “boiada” proposta pelo ministro Salles, atitude que vais nos custar muito caro, em termos comerciais e econômicos e políticos.
Outra atitude que vai nos custar muito caro foram as absurdas agressões à China, nosso principal parceiro comercial, com o qual estabelecemos frutíferas relações bilaterais desde 1974, no governo “comunista” do general Geisel.
Mas afinal, nada, nem mesmo a vida dos brasileiros pobres, pode atrapalhar o “ambiente de negócios”.
Dado o evidente corte social, racial e etário dos afetados pelo Covid-19, é melhor deixar a seleção natural seguir seu curso, de forma a promover salutar eugenia da raça e conveniente eliminação de gente inativa e inútil.
No entanto, se o povo e o planeta merecem indiferença, o destino da família palaciana merece a irrestrita solidariedade de máquina governamental.
Aliás, a reunião foi convocada para esse exato propósito: fazer com que não apenas a Política Federal, mas todo o aparelho de Estado proteja o capitão, filho, sobrinhos e demais das investigações sobre “rachadinhas”, lavagem de dinheiro, articulação com criminosos agrupamentos milicianos, interferências na Polícia Federal etc.
A reunião demonstrou claramente que o capitão está, por assim dizer, com as “hemorroidas na mão”, crescentemente isolado e com a popularidade em queda.
Nessas circunstâncias, o capitão, encurralado, ataca. Tudo e todos.
Ataca a razão, a ciência, a Constituição, o STF, o Congresso, a democracia, a vida etc.
Tudo para tentar permanecer politicamente vivo, com o apoio daqueles que querem reabrir a economia a qualquer custo.
A morte (dos outros) lhe cai bem.
O capitão está se tornando, cada vez mais, um inconveniente para os poderosos interesses nacionais e internacionais que o colocaram lá.
Sua incompetência monumental e a sujeira que arrasta atrás de si o tornaram disfuncional.
É ingênuo pensar, porém, que tais interesses estão realmente preocupados com a restauração da democracia brasileira e com o destino do povo do Brasil.
A bem da verdade, eles desejam que a agenda antipopular e autoritária continue, porém de forma mais discreta e eficiente.
Nesse sentido, o bolsonarismo é o perigoso inimigo tático imediato da democracia e dos interesses populares, mas o ultraneoliberalismo é o grande adversário estratégico.
Ambos querem, talvez com métodos distintos, as hemorroidas do povo.
* Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais
Comentários
OtacielMelo
UM EXEMPLO DE COMPETÊNCIA, DIGNIDADE E AMOR PELO SEU PAÍS E PELO SER HUMANO
Não dá para não se apaixonar pelas duas: pela Nova Zelândia e pela sua primeira ministra Jacinda Ardern.
E a quem primeiramente ela recorreu na luta contra o coranavírus? AOS CIENTISTAS NEOZELANDESES.
E o resultado é apresentado neste vídeo:
Segure as lágrimas, pois eu não consegui
Uma grande mulher! Um exemplo de dignidade e amor pelo seu país e pela humanidade!
Vídeo legendado:
https://youtu.be/IV-utAIoMmA
Zé Maria
Quando os formadores de opinião, os tais ‘influencers’, deixarem de considerar para crítica comportamentos individuais no Governo e passarem a criticar o conjunto da Administração Governamental, como um todo, talvez a população brasileira comece a entender que o exercício da Boa Política não depende de nomes, mas de Programas, Projetos, Plataformas de Governo, apresentados à População na Eleição por Partidos ou Coalizões Partidárias.
No mundo real, não é um candidato a messias que vai melhorar a vida material das pessoas ou lhas proporcionar Dignidade Humana.
Edgar Rocha
Não vejo Bolsonaro como algo tão disfuncional a quem interessa tê-lo no poder. O mercado reage a cada vitória do governo, reduzindo o dólar e vitaminando a bolsa de valores. O limite deste apoio parece o bastante para manter Bolsonaro no cargo, apesar de toda a péssima repercussão de suas ações e as de seus ministros. Para o mercado tudo é tolerável, desde que o Guedes continue sua “política econômica” de terra arrasada em favor dos investidores e dos mais ricos. O ônus político já recaiu sobre o povo brasileiro. Foram seus eleitores que colocaram o miliciano no poder, juntamente com toda a turba nazi-fascista que se elegeu com ele nos Estados e nos Parlamentos. A narrativa será esta no futuro. E o grande motivador desta guinada ultra-liberal e fascista no Brasil será o PT, o Lula e a Dilma.
Não vejo perspectiva de queda de Bolsonaro. Nem pelas mãos do judiciário. O poder das armas está totalmente em suas mãos e o povo acuado, com a esquerda enfraquecida e “pacifista” deste momento, só poderá ficar em casa mesmo. Sei que vão dizer pra falarem por mim. Espero até que estejam certos. Mas, há poucas evidências de que as coisas poderão ser diferentes.
Até agora, temos as torcidas organizadas botando bolsonarista pra correr; temos os grupos organizados no RS oferecendo resistência ao bolsonarismo nas ruas; uma ou outra reação mais individualizada. Tudo isto é importante. O problema é que, mesmo os governadores estaduais não estão seguros quanto disposição das forças estaduais em defender a democracia. Se juntarmos as PM’s até agora bolsonaristas por vocação, mais as milícias, mais as forças armadas, mais a logística as milícias digitais do escritório do ódio… Acho que quem vai precisar só ficar em casa assistindo a tudo de camarote será o véio da Havan e seus pares do empresariado financiador do fascismo e a classe média boboca que não aguenta o tranco num conflito.
O Brasil deveria se preparar para uma guerra civil iminente. Só acho que a resistência continuará sendo localizada e espasmódica sem que os agentes sociais mais proeminentes demonstrem ao menos algum apoio aos atos em que haja conflito. Caso não façam isto, Bolsonaro e os fascistas poderão até cair, mas o vácuo político só se aprofundará, já que quem pegar em arma não vai ter respeito algum por quem vier com o ‘xá-comigo” ou se tornar guerrilheiro de última hora.
Espero ao menos, que surja alguma força política que não fique esperando resoluções institucionais diante de um ditador fascista.
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