Lula: Não podemos permitir que Bolsonaro transforme a vacina contra covid em guerra, pois a grande vítima será o povo brasileiro
Tempo de leitura: 5 minCarta à ciência e ao povo brasileiro, por Luiz Inácio Lula da Silva
Uma das qualidades mais admiráveis do ser humano é a sua genialidade: a capacidade de sonhar e de transformar o sonho em realidade.
Graças ao conhecimento científico acumulado ao longo de décadas, e até mesmo de séculos, o ser humano foi capaz de viajar pelo espaço. E demonstrar assim, com provas irrefutáveis, aquilo que sábios já diziam desde a Antiguidade: que a Terra é redonda.
Graças ao esforço incansável daqueles que perderam noites de sono, abriram mão do convívio com as pessoas amadas e muitas vezes arriscaram as próprias vidas, o ser humano foi capaz de desenvolver vacinas que salvaram milhões de vidas pelo mundo afora.
No Brasil de poucas décadas atrás, os mais pobres só viviam até os quarenta anos.
Sarampo, varíola, rubéola, febre amarela, poliomielite, tuberculose, meningite, difteria, coqueluche, tétano e tantas outras enfermidades que no passado matavam populações inteiras estão hoje controladas, graças à ciência e aos médicos e pesquisadores. Atacar as vacinas, ou lançar dúvidas infundadas sobre a vacinação, é trabalhar a favor da morte.
É, portanto, com muita indignação que vejo Jair Bolsonaro festejar a morte de um voluntário que participava dos testes da vacina Coronavac –cuja morte, aliás, não teve qualquer relação com a vacina.
Em primeiro lugar, porque não se comemora a morte de ninguém.
Em segundo lugar, porque a suspensão dos testes, determinada pela Anvisa, além de errada, em nada favorece a luta contra uma pandemia que ameaça o Brasil e o mundo.
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A comemoração de Bolsonaro é uma demonstração clara da sua decisão política: negar ao nosso povo o único instrumento capaz, juntamente com o isolamento social, de frear uma pandemia que já matou mais de 160 mil brasileiros e infectou mais de 5 milhões.
Cercado de terraplanistas, obscurantistas e negacionistas de toda ordem, Bolsonaro debocha e faz piada com o conhecimento científico acumulado pela humanidade ao longo de sua história.
Insiste em vender como droga milagrosa um medicamento, a cloroquina, que comprovadamente não tem qualquer eficácia contra o coronavírus, e cujos efeitos colaterais podem ser fatais.
Ao mesmo tempo, põe em dúvida a eficácia de vacinas que consumiram meses de trabalho intenso dos maiores cientistas do planeta.
Bolsonaro faz pouco caso das boas práticas sanitárias e despreza a ciência, a tecnologia e a educação, como demonstram os cortes irresponsáveis nos investimentos públicos destes que seriam os passaportes para o nosso futuro.
Ele, ao contrário, embarca o Brasil numa máquina do tempo rumo ao passado, quando ensaia reeditar uma triste página da nossa história: a Revolta da Vacina, que, no início do século passado, deixou o Rio de Janeiro à mercê da varíola, que ameaçava ceifar milhares de vidas, sobretudo entre os mais pobres.
Bolsonaro virou motivo de anedotas ao redor do mundo.
Mas seu comportamento medieval põe em perigo 200 milhões de brasileiros, ao mesmo tempo em que despreza a ciência, os cientistas, médicos, enfermeiros e demais profissionais da saúde que diariamente arriscam suas vidas tentando salvar outras vidas –e que muitas vezes acabam, eles próprios, derrubados pela pandemia.
A verdade é uma só, e não se pode fugir dela: a vacina é um direito de todos, e a vacinação é um dever do Estado.
Ao pregar o contrário, Bolsonaro coloca em risco a saúde daqueles que teria a obrigação de defender.
Ignora a experiência do nosso SUS, que com vacinas e campanhas de vacinação é a mais extensa e bem sucedida em todo o mundo.
Agride instituições públicas reconhecidas internacionalmente, como a Unifesp e a USP, envolvidas no teste das vacinas, o Instituto Butantan, a Fundação Oswaldo Cruz e a Anvisa, que possuem competência técnica para dizer se uma vacina é segura e eficaz, independentemente do país em que foi produzida.
Quando fui presidente da República, um dos meus principais compromissos na área da saúde foi a vacinação dos brasileiros.
Promovemos todos os anos amplas campanhas de conscientização e mobilização. Trabalhadores da saúde e agentes comunitários percorriam cidade por cidade, esquadrinhavam subúrbios e visitavam casa por casa.
O próprio Bolsa Família, um dos programas de transferência de renda mais eficientes do mundo, impunha uma condição rigorosa: só recebia o benefício quem tivesse todas as crianças da família vacinadas.
Além disso decidimos que o Brasil não podia ser apenas um importador.
Era preciso conquistar nossa soberania também na produção de vacinas. Foi por isso que investimos tanto na Fundação Oswaldo Cruz, não só para que ela fosse uma das principais instituições produtoras e desenvolvedoras de vacinas do mundo, mas também para que fosse capaz de exportá-las, como ocorre no caso da vacina contra a febre amarela.
Com os investimentos que fizemos no Instituto Butantan ele se tornou um dos principais fornecedores de vacinas para o SUS.
Pouco importava que o Butantan fosse uma instituição pública de São Paulo, cujo governo na época fazia oposição ao Governo Federal. Para nós, acima da política, sempre em primeiro lugar, estão os interesses do povo.
Graças a todo esse esforço, nosso Programa Nacional de Imunização é reconhecido em todo o mundo. Conquistamos certificados de erradicação de doenças como rubéola, sarampo e paralisia infantil.
Infelizmente, desde 2019, devido às atitudes irresponsáveis e negacionistas de Bolsonaro, estamos vendo nosso programa de vacinação definhar, ser destruído. Pela primeira vez neste século, o Brasil não atingiu as metas vacinais para as crianças.
Se hoje o Instituto Butantan e a Fundação Oswaldo Cruz são capazes de produzir vacinas para Covid-19, isso é graças a uma decisão política muito clara: a vacina é uma grande descoberta da ciência, é um bem público, e é obrigação dos governos torná-la disponível para toda a população.
É urgente e inadiável, portanto, uma ampla mobilização nacional de cientistas, médicos e demais profissionais de saúde. De governadores, prefeitos, agentes da vigilância sanitária, pesquisadores e técnicos da Fundação Oswaldo Cruz e do Instituto Butantan. Do Congresso Nacional, da imprensa e da sociedade como um todo.
Não podemos permitir que a vacinação se transforme em uma guerra, como deseja Bolsonaro. Uma guerra contra o povo brasileiro, que será sem dúvida a sua principal vítima.
Este desafio gigantesco não pode ficar restrito ao esforço isolado de alguns governadores. É preciso um pacto federativo de todas as instâncias, especialmente do governo federal.
O SUS, o Instituto Butantan e a Fiocruz necessitam de apoio, de recursos orçamentários elevados e da total mobilização dos seus profissionais para assegurar a vacina para todos os cidadãos.
Se o Governo Bolsonaro continuar boicotando as iniciativas de médicos e pesquisadores, criando problemas para as instituições e os governos dos estados, não haverá vacina para o povo brasileiro em 2021.
Derrotar o vírus, retomar com segurança as atividades econômicas e a vida social são objetivos alcançáveis, mas isso depende de uma vacina eficaz e segura. Este é hoje o maior desafio do Brasil. E, mais uma vez, o governo Bolsonaro demonstra não estar à altura deste momento vital para o futuro da nação.
Tenho certeza de que você, assim como eu, está indignado com a imagem de um presidente da República fazendo chacota da vacina e gargalhando diante da trágica morte de um voluntário.
Sei que você também está indignado ao ver instituições públicas sérias como o SUS, a Anvisa, a Fiocruz e o Instituto Butantan serem arrastadas para a lama de um campo de batalha onde a vítima é o povo brasileiro.
Imagino sua repulsa ao desrespeito de Bolsonaro pelo trabalho sério dos nossos médicos e pesquisadores.
Estou certo de que você, assim como eu, não se conforma em ver o Brasil, que já foi reconhecido pelos seus feitos extraordinários na área da saúde pública, tornar-se um mau exemplo para o mundo. Um exemplo do que não deve ser feito por nenhum país que deseja defender seu povo e vencer a pandemia.
Não podemos continuar paralisados diante de tamanha irresponsabilidade. O direito à vacina é o direito à vida.
É obrigação do governo federal garantir a vacinação de todos aqueles que precisam ser imunizados.
É hora de assumirmos juntos esse desafio. Vacina para todos. Pela vida, pela recuperação de empregos e renda, pela dignidade do Brasil e do seu povo.
A Terra é redonda, gira em torno do sol, e não há no mundo força retrógada capaz de deter a genialidade humana.
Cabe a cada brasileiro comprometido com o respeito à ciência e à saúde do nosso povo dizer “Basta!” ao obscurantismo.
*Luiz Inácio Lula da Silva é Ex-presidente da República (2003-2010)
Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S.P
Comentários
Henrique Martins
Ontem Reinaldo Azevedo trouxe uma informação interessante no seu programa: a pólvora foi inventada pela China.
Risos.
Zé Maria
Sputnik V, Vacina Russa (RDIF/Gamaleya),
adquirida pelo Governo da Bahia,
aguarda registro na Anvisa.
A Rússia anunciou que a vacina Sputnik V,
desenvolvida pelo Instituto Gamaleya
contra a Covid-19, é 92% eficaz.
A informação é baseada nos dados
preliminares de Estudos da Fase 3.
“A vacina #SputnikV alcançou eficácia de 92%
na redução do contágio no grupo vacinado.
Agora já podemos aguardar a conclusão
dos estudos e o registro ANVISA.
Aqui na Bahia, o Governador @costa_rui
firmou um acordo de acesso prioritário
a 50 milhões de doses.”
Fábio Vilas-Boas
Doutor em Cardiologia (INCOR USP)
Secretário Estadual da Saúde
Governo da Bahia
pic.twitter.com/UHJEb7pfAy
https://twitter.com/fabiovboas/status/1326593112706347009
Correio24Horas, com informações da Agência Brasil e da Reuters:
https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/vacina-sputnik-v-tem-92-de-eficacia-diz-governo-russo/
https://www.correio24horas.com.br/noticia/nid/sputnik-v-vacina-russa-comprada-pela-bahia-aguarda-registro-anvisa/
Henrique Martins
https://www.brasil247.com/midia/estadao-bolsonaro-e-um-valentao-na-hora-do-recreio-e-chamou-o-pais-para-a-briga
De tudo que foi dito uma coisa é certa: chamar o povo brasileiro de maricas vai custar muito caro para o presidente ‘de alguns’.
Melhor seria que se mudasse para os EUA – sua pátria do coração – e fosse morar no cafofo de Olavo de Carvalho.
Zé Maria
É lamentável que, em pleno Século 21, com tantas necessidades básicas e
problemas de Saúde que a População Brasileira, em especial a mais Pobre,
vêm enfrentando, nós ainda tenhamos de debater temas e questionamentos
que já foram superados há Séculos, tais como: ‘a Terra é ou não é Esférica?’
ou ‘as Vacinas provocam Reações Adversas Fatais?’; questões que a Ciência
já resolveu, mas que um Bando de Desonestos Aproveitadores insiste em pôr
em Circulação – com finalidades financeiramente lucrativas – manipulando a
Informação e deturpando o Conhecimento Científico construído em Milênios
de Pesquisa.
Henrique Martins
https://www.terra.com.br/noticias/ciencia/sustentabilidade/proposta-de-expropriar-terras-e-delirio-diz-bolsonaro,68323c7e8327e5998547f6ea04d8db9f6wqz39kx.html
Parabéns a quem teve essa ideia. Uma medida deste tipo é altamente pedagógica. A turma só vai ter medo se houver algum risco para seus bolsos ou de perda de patrimônio.
Neste sentido, duvido que vá haver expropriações. O que vai haver é o término das queimadas. Isso sim.
O presidente ‘de alguns’ disse que é delírio. Espero que quando ele estiver fora do governo o tal delírio passe a ser realidade.
Quanto a propriedade ser sagrada, bem se vê que ele ensinou muito bem aos filhos esse dogma. As rachadinhas que o digam.
Henrique Martins
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2020/11/pesquisa-eleitoral-e-arma-politica-para-quem-tem-dinheiro-diz-bolsonaro.shtml
Entendo perfeitamente qual é a intenção ‘real’ dele com essa declaração. Afinal, ele é irmão siamês de Trump. Se Trump se ferrar ele se ferra também porque o esquema eleitoral dos dois é o mesmo.
Henrique Martins
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painel/2020/11/sumido-apos-ter-abrigado-queiroz-wassef-reaparece-no-palacio-do-planalto.shtml
Elementar meu caro Watson. Ele foi lá saber quais providências Bolsonaro vai tomar para abafar as investigações na PF na questão da invasão hacker no STJ. Afinal, a empresa da ex-mulher dele era responsável pela cyber segurança e o tribunal estava dormindo com o inimigo.
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