José Dirceu: Não se pode registrar a história do 8 de janeiro sem cobrar a responsabilidade das Forças Armadas

Tempo de leitura: 4 min
Foto: Joedson Alves/Agência Brasil

O golpe de 8 de janeiro

Por José Dirceu*, em Congresso em Foco

O caminho para a construção do golpe de 8 de janeiro começou com o suporte das Forças Armadas ao golpe jurídico-parlamentar contra a presidente Dilma Rousseff e foi pavimentado pelo apoio dos militares à eleição de Jair Bolsonaro em 2018, pela forte presença em seu governo autoritário e negacionista, e pela conivência dos chefes militares com os acampamentos em frente aos quartéis após a eleição de Lula.

Podemos afirmar, sem nenhuma dúvida, que o golpe de 8 de janeiro foi uma consequência natural do ciclo que se abriu com a volta dos militares à politica, uma vocação histórica não resolvida na transição democrática e na Constituinte de 1988.

O ovo da serpente manteve-se preservado dentro da instituição militar uma vez que os militares não foram julgados e responsabilizados nem pelo golpe de 1964, nem pelos crimes e violações dos direitos humanos cometidos em nome do Estado durante a ditadura por eles comandada.

Trinta anos após o restabelecimento da democracia no Brasil, a mão invisível dos militares esteve presente no golpe parlamentar-judicial que depôs a presidente constitucional Dilma Rousseff.

Ela foi personificada na figura do general Sergio Etchegoyen, fiador da posse do vice-presidente Michel Temer e delegado das Forças Armadas junto à presidência.

Ele iniciou o processo de reorganização e controle da Inteligência do Estado, depois consumado pelo seu colega de armas, general Augusto Heleno.

Em entrevista, Sergio Etchegoyen listou as três razões para a deposição da presidente Dilma Rousseff: instalação da Comissão da Verdade, promoção nas Forças Armadas e educação nas escolas militares.

Ou seja, disse textualmente que as Forças Armadas não aceitavam as iniciativas de submeter o poder militar ao poder civil como manda a Constituição, já que a presidente ou o presidente da República é o comandante supremo das Forças Armadas.

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Em seguida, mais uma intervenção militar na vida política do país: o tuíte do então comandante do Exército, general Villas Boas, sugerindo (mais que sugestão, uma voz de comando) ao STF para não conceder um habeas corpus ao presidente Lula, preso injustamente num processo político, sumário e de exceção promovido pela Lava Jato. Do ponto de vista jurídico, é bom lembrar, o habeas corpus era um direito líquido e certo de Lula.

Na esteira desses acontecimentos, as Forças Armadas retomaram sua ilegal e inconstitucional atuação, com o objetivo de voltar a dirigir os destinos do Brasil.

Apoiaram e sustentaram a candidatura de Jair Bolsonaro, apesar de ele ter sido processado e julgado por violar o juramento militar, na prática uma expulsão branca.

Depois de sua eleição para a Presidência da República, grande parte do generalato de quatro estrelas foi para o governo e milhares de oficiais da reserva e da ativa ganharam cargos públicos, numa demonstração do caráter militar do governo.

Durante os quatro anos de mandato, Jair Bolsonaro montou sua estratégia golpista e autoritária ou com apoio explícito das Forças Armadas ou, pelo menos, com sua complacência.

Não foi diferente durante a epidemia da Covid-19, quando os militares apoiaram ou fizeram vista grossa à atuação criminosa de Jair Bolsonaro, ao seu negacionismo e obscurantismo.

Também não foi diferente quando Jair Bolsonaro empreendeu campanha com o objetivo de descredenciar e desmoralizar as urnas eletrônicas e o processo democrático.

Apesar da resistência dos partidos de oposição aos atentados à democracia, das reiteradas denúncias sobre a politização das forças militares – Polícia Militar, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Abin e das Forças Armadas – e do aumento de seu poder, o Congresso Nacional e o STF foram tímidos em suas respostas. Tímidos e tíbios. A única exceção foi a ação imediata do STF na pandemia.

Caminho pavimentado

Esse roteiro abriu caminho para Jair Bolsonaro construir o golpe de 8 de janeiro, com apoio de empresários, principalmente do agronegócio; de setores beneficiados pelo seu governo; de deputados e senadores, partidos e governadores.

A preparação para o golpe explica a escalada de atos e mobilizações em todo país durante o ano eleitoral e, após a derrota de Jair Bolsonaro e vitória de Lula, os acampamentos em frente aos quartéis do Exército, fator decisivo para o sucesso do dia 8 de janeiro com a ocupação e destruição das sedes dos Três Poderes da República.

Capítulo à parte foi a atuação, nas redes sociais, dos financiadores e controladores de várias contas e perfis e de dezenas de meios de comunicação que sustentaram Jair Bolsonaro desde a campanha de 2018.

Embora acampamentos em áreas militares, quartéis ou qualquer outra instalação militar seja crime, os chefes militares não fizeram nenhum movimento para impedir a sua instalação ou desmobilizá-los.

Ao contrário, viram os acampamentos com tolerância e benevolência, o que estimulou sua permanência.

Assim, a responsabilidade civil e penal dos chefes militares é mais do que evidente e sua atitude omissa em relação aos acampamentos, para não dizer cúmplice, foi decisiva para a mobilização de 8 de janeiro e para fortalecer a confiança dos manifestantes de que teriam apoio militar para um golpe de Estado.

Não se pode registrar a história do dia 8 de janeiro – o dia da infâmia – sem cobrar a responsabilidade das Forças Armadas e de seus chefes e cadeia de comando.

Ou seja, daqueles que no governo e na PM de Brasília, na Polícia Federal e na Polícia Rodoviária Federal apoiaram abertamente o golpe.

Golpe que foi derrotado graças à falta de suporte aos golpistas em outras partes do país fora de Brasília, à pronta resposta do STF e do TSE, à ação imediata do presidente Lula e de seu governo, Ministério da Justiça à frente, dos presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, que encontraram forte respaldo na sociedade civil, na maioria dos partidos políticos e governadores, em parte das Forças Armadas, nos meios de comunicação e na comunidade internacional.

O que a sociedade quer saber é se todos os implicados nesse crime de traição à Constituição e à democracia em nosso país, sejam eles civis ou militares, populares ou empresários, responsáveis pelas redes sociais, políticos ou não, vão ter as penas que merecem.

Só teremos as respostas com a conclusão dos inquéritos e processos conduzidos legitimamente pelo ministro Alexandre de Moraes.

A verdade histórica é que se pregou e se tentou um golpe de Estado sob a inspiração e direção de Jair Bolsonaro.

Todos os responsáveis, independentemente de sua origem e status, devem ser processados. E, os que forem condenados, devem ser impedidos de participar da vida política do país.

*José Dirceu foi ministro da Casa Civil no primeiro governo Lula. Autor, entre outros livros, de Memórias – Vol. 1 (Geração editorial, 2018, 496 págs.). [https://amzn.to/3H7Ymaq]

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Comentários

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Zé Maria

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Mensagens no acervo da Operação Spoofing Detalham Bastidores
dos Preparativos na Força-Tarefa da Operação Lava-Jato para apresentar
uma Denúncia Infundada contra Camila Ramos de Oliveira e Silva,
Filha do ex-deputado federal e ex-ministro José Dirceu, Liderança Histórica
do Partido dos Trabalhadores.

Na Sequência dos diálogos dos Procuradores
e acontecimentos indica que a ofensiva da
Força-Tarefa da Lava-Jato contra a Filha de
José Dirceu serviria como estratégia de
“Pressão” Psicológica sobre o ex-ministro,
que já estava detido, sob prisão preventiva.

Os diálogos ocorreram a partir da noite
de 30 de agosto de 2015, via Telegram.

Semanas antes, Dirceu havia sido preso
pela Polícia Federal na 17ª fase da Lava Jato.

A denúncia contra Camila foi oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) no início de setembro daquele ano (2015). Foi acusada na mesma peça que envolveu Dirceu e mais 15 pessoas.

Às 23h29 de 30 de agosto de 2015, conforme o material da Spoofing,
o procurador Roberson Pozzebom escreveu:

“O que acham de denunciarmos a filha [SIC] do JD [José Dirceu]
por lavagem? Acabei de achar comprovante cabal que ela recebeu
por fora do MILTON 250 paus”.

Às 23h34, Roberson Pozzebom diz que “o homem vai ficar puto”, provavelmente em referência a Dirceu, ao que o então chefe
da força-tarefa, Deltan Dallagnol, respondeu:

“Paus nela”.

Na sequência, Deltan acusa Camila de ajudar a “esconder dinheiro de crime”.

Logo em seguida, ele escreve: “Resta discutir se sabia que vinha de criem [crime]”.

Pozzebom, então, rebate: “Essa prova do conhecimento específico
já será mais complicada”, mas que “brinde ela sabia que não era”.

“Não precisa específico. Genérico ta bom. Embora esse seu argumento
corte pros dois lados, acho que dá também”, disse, por fim, Deltan Dallagnol,
já no início da manhã de 31 de agosto de 2015.

(Eventuais erros de gramática
ou de digitação nas mensagens
foram mantidos pela reportagem)

Ìntegra da Reportagem:
https://www.cartacapital.com.br/politica/o-homem-vai-ficar-puto-dialogos-detalham-acusacao-da-lava-jato-contra-filha-de-jose-dirceu/
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Leia também Reportagem da Revista Fórum: https://bit.ly/3SkoRQw

Deltan e Lava Jato Indiciaram Filha de José Dirceu Sem Provas: “Paus nela”

Indiciamento foi sugerido por Roberson Pozzebon no grupo de Telegram
para fazer “uma pressão danada” sobre o ex-ministro José Dirceu,
que havia sido preso preventivamente menos de um mês antes.

https://twitter.com/RevistaForum/status/1747295525081145742

https://revistaforum.com.br/politica/2024/1/16/deltan-lava-jato-indiciaram-filha-de-jose-dirceu-sem-provas-paus-nela-152298.html
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Cadê o ‘Novo’ PGR, hein?
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Marco Antonio do Nascimento Sales

O que estão fazendo com o Ricardo Capelli é “COVARDIA E INGRATIDÃO”! Parece muito com a maneira bolsoloide de comportamento, onde toda e qualquer loucura ou burrice é engolida sem nenhum espírito crítico! Faço votos que o Presidente Lula não precise mais passar por outro 08/01/2023, porque se precisar, não terá um Capelli para trabalhar, mas verá os “puxa-sacos-acríticos”, fujindo da responsabilidade e o abandonando à própria sorte!

Zé Maria

O ZéDi é Preciso na Avaliação Política
da História Contemporânea Brasileira.

marcio gaúcho

Os azeitonas terão de entregar os seus anéis ou ficarão sob suspeita para a eternidade. A história das Forças Armadas está há, muito tempo. Muitas mentiras, crueldades e mortes estão na conta desses milicos .E a impunidade sempre lhes favoreceu. Agora é a hora de dar um ponto final para as suas atrocidades. Ou, a democracia é uma fantasia e não existe!

ed.

Embora a cultura das FFAA esteja contaminada cada vez mais pelas laranjas podres, é preciso parar de culpá-las como um todo, o que só reforça esta cultura, que precisa ser mudada dentro das academias, dos quartéis e até mesmo no seio de nossa sociedade onde parte importante, incluindo a “míRdia” tem um entendimento e sentimento de que elas nos “tutelam”. Precisamos sim dar nome aos bois ou aos grupos podres que assim equivocadamente se assumem, como p.ex. Heleno, Braga Neto, Ramos, Mourão, Pazuello, Dutra e diversos outros de terra, mar e ar. No dia em que tais representantes do que há de pior em nossas necessárias FFAA forem punidos exemplarmente até pelo simples fato de se imiscuirem em politica civil publicamente, enquanto fardados, esta sina bananeira de nosso país minguará. Indiciamento, processo e CANA neles!

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