Jeferson Miola: A eleição na França tem de ser tomada como lição para derrotar o fascismo no Brasil

Tempo de leitura: 3 min
Fotomontagem: RBA

As lições da eleição na França e os desafios para derrotar o fascismo no Brasil

Por Jeferson Miola, em seu blog

O primeiro turno da eleição presidencial na França [10/4] confirma que quando se faz sempre a mesma escolha, aumenta a possibilidade de se chegar aos mesmos resultados de sempre.

Foi exatamente esse o resultado da eleição para o campo político que abarca o progressismo, a esquerda e a centro-esquerda partidária francesa – partido da França Insubmissa, Partido Comunista Francês, Verdes, Luta Operária e Novo Partido Anticapitalista.

Concorrendo mais uma vez separadamente, com candidaturas próprias, esses partidos novamente ficaram fora do segundo turno da eleição. Uma mera repetição do resultado da eleição presidencial de 2017.

Em razão disso, em 24 de abril, quando o direitista Emmanuel Macron e a ultradireitista Marine Le Pen disputarão o segundo turno, a esquerda e o progressismo mais uma vez serão decisivos; porém, novamente como atores coadjuvantes.

Ironicamente, terão como missão, mais uma vez, ajudar a eleger o candidato da direita Macron, para evitar que a candidata da ultradireita fascista Marine Le Pen vença e governe a França.

O atual presidente Macron liderou a votação do primeiro turno com 27,8%, tendo Le Pen em segundo lugar com 23,1% e Mélenchon, do França Insubmissa, em terceiro, com 22% dos votos válidos – 421.420 a menos que Le Pen.

Além de disputar votos com Macron e Le Pen, Mélenchon também teve de travar uma luta “interna”.

Ele tentou atrair os votos de eleitores ideologicamente próximos a ele mas que, no entanto, foram obrigados a se dividir no variado “bazar eleitoral progressista”, para então escolher dentre outras cinco candidaturas: Jadod/Verdes, que terminou obtendo 4,6% dos votos, Roussel/PCF-2,3%, Anne Hidalgo/PS-1,8%, Poutou/NPA-0,8% e Nathalia Arthaud/LO-0,6%.

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Se Mélenchon tivesse podido representar, de modo uníssono, as seis candidaturas do fragmentado “bazar eleitoral progressista” através de uma Frente unida de centro-esquerda, a candidatura dele teria abocanhado 32% do eleitorado – ou 11.228.720 votos [tabela acima].

Desse modo, ele teria obtido a maior votação no primeiro turno, acima de Macron e Marine Le Pen e, também, teria um desempenho superior às duas candidaturas extremistas da direita [Le Pen e Zemmour] somadas, caso tivessem se unido numa chapa única.

Ou seja, a unidade progressista e de centro não só teria derrotado a extrema-direita, como daria a Mélenchon um enorme potencial para vencer Macron no segundo turno.

Ora, se este campo tem agora sólidas razões para se unir no segundo turno, por que não priorizou o esforço de construção da unidade para se apresentar com candidatura única no primeiro turno?

Não deixará de ser irônico, por isso, ver que, no segundo turno, este campo progressista que não conseguiu caminhar junto e unido no primeiro, finalmente caminhará junto e unido no combate comum à candidata de extrema-direita Marine Le Pen para deter a ameaça fascista.

A eleição na França tem de ser tomada como lição para os desafios da luta contra o fascismo na eleição de outubro próximo no Brasil.

A mal apelidada terceira via, que na verdade é o nome do bloco anti-Lula [1], tem entre 40 e 43% das intenções de votos.

Desse total, Bolsonaro, sozinho, tem entre 27 e 30%, e Ciro entre 7 e 9%. As demais candidaturas inexpressivas, somadas, alcançam entre 4 e 6%.

Isso significa, portanto, que se o PDT retirar a candidatura do Ciro, a eleição poderá ser resolvida no primeiro turno com a vitória do Lula e, principalmente, com enorme diferença em relação a Bolsonaro.

Para a sobrevivência da democracia brasileira, esse resultado é fundamental, pois constrange o plano golpista do Bolsonaro e das Milícias Fardadas, que têm como único objetivo causar o caos e tumultuar a eleição.

Na França, o campo progressista, de esquerda e centro-esquerda desperdiçou a oportunidade de derrotar a ultradireita fascista e se habilitar para vencer a eleição no segundo turno.

No Brasil, a situação não deixa de ser análoga. O campo democrático, popular e progressista está desafiado a se unir acima de qualquer capricho ou vaidade pessoal para derrotar a contrarrevolução fascista-militar do bolsonarismo.

Para isso acontecer, um passo importante é convidar o PDT a considerar a hipótese de retirar a candidatura do Ciro e se juntar à campanha e ao futuro governo Lula para salvar o Brasil do precipício fascista.

O PDT terá muito a ganhar com esta escolha. Afinal, parte representativa da base social, assim como de candidatos do partido às assembleias legislativas, ao Congresso e aos governos estaduais já vinculam suas campanhas à candidatura do Lula, e não à do Ciro, em busca de melhor desempenho eleitoral.

Juntando-se a uma frente antifascista para derrotar Bolsonaro e as cúpulas militares partidarizadas, o PDT estará exercendo um papel histórico que homenageia a memória do Leonel Brizola, o legendário fundador do Partido.

[1] além do próprio Bolsonaro, conformam o bloco anti-Lula as candidaturas de Ciro Gomes, Simone Tebet, Doria/Leite e outras ainda mais inexpressivas.

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Comentários

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Ibsen Marques

É uma ilusão achar que Ciro abdicaria de sua condição de candidato a nada em favor do seu motivo de inveja. Seu ego e sua vaidade turvam sua visão da realidade.
Ele poderia ter sido o presidente em 2018 se tivesse atendido o convite de Lula, mas preferiu Paris. Com sua candidatura o PDT encolherá um pouco mais em termos de base parlamentar, mas principalmente em coerência ideológica.

José Espare

Diferentemente de alguns jornalistas que gostam de posar de esquerdista, mas se alinham com os interesses do imperialismo gringo (aldo fornazieri, milton blay, etc – tudo em minúscula), Jeferson Miola é um jornalista digno de respeito. No entanto, acho que a situação real pode não ser a que ele apresenta em sua análise. Não tenho vivência suficiente com a realidade francesa para ter certeza, mas a ponderação feita por alguns analistas me pareceu sensata. Os votos que poderiam ter levado Melanchon ao segundo turno não podem ser vistos como uma mera soma aritmética dos resultados dos demais partidos de esquerda. Segundo essa visão, para conseguir desviar votos que tendiam a ser dados à direita de Le Pen, era fundamental que Melanchon não fosse identificado com as forças da esquerda tradicional, que andam profundamente desgastadas em razão de seus longos anos de adesismo ao sistema e ao neoliberalismo. Portanto, de nada teria valido somar todos os votos do PCF, do PSF e do PV, se Melanchon viesse a perder parte significativa dos votos que pôde alcançar junto aos trabalhadores por não ser identificado com o sistema. Me parece bastante compreensível que a esquerda tradicional francesa tenha passado a ser um fator de afastamento das massas populares, em lugar de representar um polo de atração. Por isso, não dá para aceitar a conclusão aritmética que nosso Miola apresenta. Agora, na França, as forças populares estão diante de um dilema infernal: apoiar as forças cavernarias e anti-imigrantes de Marine Le Pen ou os baluartes do imperialismo estadunidense e do neoliberalismo representados por Macron. Não é nenhuma disjuntiva que aponte ganhos para o campo popular. É como se estivéssemos no Brasil tendo de optar entre votar em Bolsonaro ou em Sérgio Moro. Tem como definir qual das hipóteses significaria a catástrofe mais desastrosa para o povo trabalhador? O melhor mesmo, me parece, é tentar encontrar alternativas que não conduzam as massas populares por nenhum dos caminhos do inferno com os quais elas se deparam agora. Não vai ser nada fácil, mas é o jeito.

abelardo

Avalio que o PDT segue o rastro do PSDB em teimosia, em incompreensão, em egoísmo e em vaidade. Se acha mais importante e mais representativo que o PT, em função de um passado glorioso que nunca mais será alcançado caso se mantenha o atual pensamento, comportamento e casamento que fez com políticos pedetista de ocasião e não de convicção. Por todas essas contradições e também pela ambição de querer abraçar o que ainda lhe é inalcançável, apenas para se mostrar respirando enquanto o país corre um sério risco de avançar muito mais no profundo retrocesso que se encontra. Enquanto filhos do tradicional, histórico e verdadeiro PDT combate e não foge a luta que visa a união das esquerdas, os filhos de ocasião lutam para abocanhar o poder interno e continuar na trilha do abismo peessedebista.

Patrice L

Nos vários artigos que tem escrito a esse respeito, o autor aponta muito corretamente a necessidade do Ciro sair e dar lugar à vitória do Lula em primeiro turno. Mas, infelizmente, e sabe-se lá com que intenção, o PDT vem pedalando até não poder mais essa candidatura que, prova-se a cada pesquisa, tende ao total fracasso e à Paris. Ciro, nenhuma surpresa, só faz agredir e mostrar-se inconfiável tanto à esquerda quanto à direita. Como previsto, e iludindo-se de que assim ganhará os votos desse tipo lastimável de eleitor, chega a emular os trejeitos fascistas do Bozo e agora até do Moro. Ao PDT que ainda não acordou, vai vendo aí!

Zé Maria

https://twitter.com/i/status/1468667669436149763
https://twitter.com/Anne_Hidalgo/status/1468667669436149763

“Hidalgo ouviu os eleitores que temem o fortalecimento da extrema direita
frente a uma ‘esquerda fraturada’, com vários candidatos na corrida
para a presidência, oscilando entre 1% e 10% das intenções de voto.”

[ Reortagem: Charlotte Belaïch | Libération | le 8 décembre 2021 à 21h40 ]

“Esta esquerda fraturada, que desespera muitos concidadãos,
deve se unir para governar”, declarou a Prefeita de Paris,
que está estagnando em torno de 4% das intenções de voto.

“Devemos organizar uma primária de esquerda arbitrada
por nossos concidadãos.
Se não realizarmos esse rali, a esquerda não poderá mais existir
em nosso país.
Vamos restaurar essa esperança.”

Questionada sobre a hipótese de apoio a Jean-Luc Mélenchon,
se o candidato ‘rebelde’ jogasse o jogo e ganhasse,
Anne Hidalgo assegurou que “seria preciso fazer campanha
para quem ganhar” …

Íntegra:
https://www.liberation.fr/politique/elections/presidentielle-anne-hidalgo-retour-en-primaire-20211208_2GP4ZPI4DNBDLHY5TANG4Y54GY/

Zé Maria

Ainda na Fase de Pré-Campanha Eleitoral, a Prefeita de Paris,
Anne Hidalgo, que foi escolhida pelo Partido Socialista Francês,
propôs a União das Esquerdas em torno da Candidatura
que estivesse melhor posicionada nas Pesquisas Eleitorais.
Entretanto, a Proposta de Hidalgo não obteve sucesso.

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