Dr. Rosinha: Roberto Alvim foi demitido. E, daí? O que pouca gente entendeu
Tempo de leitura: 3 minpor Dr. Rosinha*, especial para o Viomundo
Alvim é demitido. E, daí!
Jair M. Bolsonaro foi “obrigado” a exonerar Roberto Alvim do cargo de Secretário Especial da Cultura.
Coloco obrigado entre aspas porque faço duas leituras desta exoneração.
Primeira, exonerou, segundo a história oficial (ou é fake?) por pressão do embaixador de Israel, portanto não é pelo discurso feito. Bolsonaro concorda com o discurso
Segunda, no sentido de obrigado mesmo, do tipo, “Obrigado pelo trabalho. Você é importante para o nosso projeto, talkei”.
O vídeo de Alvim, até prove em contrário, foi planejado para ver até onde dá para ir.
E o resultado provou a Bolsonaro e sua turma que dá para ir longe, que dá para avançar mais. Sim, dá para avançar mais, a reação foi pouca perante o perigo que o fascismo representa.
— Obrigado, Alvim, você foi útil para o nosso teste, e tenha a tranquilidade, não te abandonaremos.
Esta frase não foi dita, mas ficou nas entrelinhas da exoneração.
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Demite-se o secretário e mantém-se a política de “guerra à cultura”. Não se fala em mudança de rumo.
A nova secretária — veio primeiro para namorar e depois casar — não se contrapôs ao projeto e tampouco apresentou outro, ou seja, tudo será mantido.
Para namorar as ideias de Bolsonaro não precisa abraçá-lo fisicamente, tampouco fazer um teste de afeto ideológico. Isso tem sido demonstrado fartamente nos últimos tempos.
A dúvida se aceita ou não deve estar na questão financeira e/ou administrativa. Ou até mesmo na incapacidade política para desenvolver o papel de secretária, o que, em se tratando de governo Bolsonaro, não é problema.
O discurso de Alvim foi todo elaborado (visual, posição da câmera, cortes, música, discurso, gestos, etc.) para deixar claro a sua ideologia e a ideologia do governo a que serve.
Novamente aqui faço duas observações.
Primeira, o discurso foi feito justamente para explicitar àqueles que ainda não entenderam que o governo é nazifascista. E, segunda, veio também para deixar claro a disputa ideológica na sociedade tendo a cultura como um dos principais pontos.
A “guerra cultural” é executada desde antes de Bolsonaro tomar posse. No primeiro dia de governo, para os que ainda não tinham entendido, explicitou ao extinguir o Ministério da Educação.
Nesta “guerra”, que será longa, esta foi a primeira batalha e há que se admitir: eles venceram. Nós perdemos.
Após nos derrotarem nesta primeira batalha, começaram a desestruturar todo o sistema de atenção e incentivo à cultura.
A lista é imensa: destruição da Ancine, Funarte; censura a filmes (por exemplo, Marighela) e a peças publicitárias (publicidade do Banco do Brasil que mostrava a diversidade racial); desfinanciamento e boicote a projetos culturais que não rezam pelo seu catecismo ideológico/religioso.
Tão forte a censura que ultrapassou as fronteiras do Brasil. O governo Bolsonaro mandou cancelar, no Festival de Cinema Brasileiro, em Montevidéu, a exibição do filme “Chico: artista brasileiro”.
A Secretaria sistematicamente tem suspendido edital de contratação de projetos de cinema, teatro e música.
E, agora, sem o Alvim, implementou uma nova política: publica o edital e limita a certos setores; por exemplo, proibiu a participação das bandas de rock.
Desde a campanha, quando Bolsonaro era candidato, muitas ações e sinais em defesa do nazifascismo estavam presentes: posições racistas, machistas, homofobicas, xenófobas. Também estavam e continuam presentes a apologia à ditadura e aos torturadores e a constante ameaça à volta do AI-5.
Alvim é demitido.
E, daí?
A “guerra cultural” permanece, o discurso e a prática totalitária permanecem e o projeto de implantar a cultura em defesa da pátria, família e religião persiste.
E daí?
Os sinais de apologia à ditadura e aos torturadores continuam presentes.
Nesta semana, por exemplo, o livro “A verdade Sufocada – A história que a esquerda não quer que o Brasil conheça”, do coronel torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra, se destacava na mesa de Abraham Weintraub durante reunião com Jair e Eduardo Bolsonaro.
E daí?
O Alvim explicitou a posição do governo Bolsonaro e pouca gente entendeu.
Muitos ficaram satisfeitos com a exoneração do nazista achando que ganhou uma batalha.
Ledo engano: perdemos outra batalha. Ou se reage com organização e contundência ou perderemos a guerra.
*Dr. Rosinha é médico pediatra, militante do PT. Pelo PT do Paraná, foi deputado estadual (1991-1998) e federal (1999-2017). De 2015 a 2017, ocupou o cargo de Alto Representante Geral do Mercosul.
Comentários
Antonio José Ribeiro Dias
Belo artigo. Vai-se o Alvim e ficam as ideias! Muda quase nada! Só um reparo quanto ao edital da Funarte e o veto às bandas de rock. Esse programa e antigo, não e do governo Bolsonaro. O veto já existia, pois o projeto é dirigido às tradicionais “bandas de música” baseadas em instrumentos de sopro e percussão. Precisamos ter cuidado com as meias verdades, que podem se tornar munição para a artilharia da direita!
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