Daniel Valença: Diretas Já, a única palavra de ordem possível agora

Tempo de leitura: 3 min

Foto: Paulo Pinto/Agência PT

A única palavra de ordem possível é “Diretas Já”

 por Daniel Valença, especial para o Viomundo

Palavras de ordem nem sempre refletem uma realidade dada, materializada. Elas, isto sim, acalentam esperanças, impulsionam o desejo de lutar e, ao fazê-lo, anunciam um possível porvir.

Quando, em meio à crise aguda, como diria Gramsci, o velho não morre e o novo tem dificuldades em nascer, elas cumprem um papel central.

Há um ano, quando centrais sindicais reivindicaram a “Greve Geral”, não faltou quem, à direita e à esquerda, arguisse pelo “fim da classe trabalhadora”, dos sindicatos e organizações “do século passado”.

Ocorre que, com a paralisação de 28 de abril e os cinco bilhões de prejuízos ao comércio nacional, o governo não eleito pela primeira vez tremeu em seus alicerces.

Na esfera jurídica, a palavra de ordem “Diretas Já” aparece como um anacronismo, pois a Constituição determina, em seu artigo 81, eleições indiretas em caso de vacância de Presidente e Vice-Presidente.

Como bem lembra Salomão Leite, em caso de cassação da chapa Dilma-Temer pelo TSE (que não constitui a vacância prevista na CF 88), contudo, a Lei 13.165/2015, ao alterar o Artigo 224 do Código Eleitoral, estabeleceu eleições diretas para cassações ocorridas antes dos últimos seis meses de mandato.

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De qualquer forma, em uma conjuntura nacional em que a Presidenta sofreu impeachment sem crime de responsabilidade, em que atos que beiram ao AI5, como o “deferimento” do fechamento do Instituto Lula sem pedido do MPF, ou, para ser ainda mais didático, em um momento nacional em que o Ministro da Defesa de Temer se reúne, em meio à crise,  a portas fechadas com os chefes militares (o mesmo que no passado afirmou que os militares “estão preocupados com a perspectiva de, não revertido o quadro de deterioração em curso, se verem convocados a intervir em nome da Garantia da Lei e da Ordem”), ater-se meramente às formas políticas e jurídicas pode levar a classe trabalhadora brasileira a uma derrota sem precedentes.

 Marx, em O 18 de Brumário, alertava que as formas políticas e jurídicas restavam desnudas quando a luta de classes se agudizava.

O sufrágio universal, conquista da revolução burguesa francesa, viu-se cancelado com a marcha vermelha de operários em Paris.

Estes “poderiam e deveriam votar”, pois era “um direito universal” (!), desde que seus votos não implicassem algo além da manutenção de tudo como estava.

O golpe de Estado de 2016 teve caráter patronal-jurídico-parlamentar-midiático.

Sua razão de existir está nas reformas trabalhistas, previdenciária e neoliberais em geral, que o governo Dilma negou-se a implementar (por mais que tenha acreditado ser possível conciliar).

Ocorre que, para o golpe, foi necessário um acordo amplo, envolvendo setores muito diversos: grande capital internacional, capital financeiro, grandes empresas (inclusive as envolvidas na Lava Jato), Globo, STF, Moro, etc.

As contradições deste acordo — e a resposta popular a ele — se desenvolvem de maneira a crescerem e sempre ensejarem novos e mais difíceis arranjos.

Tende-se, portanto, a levar a conjuntura nacional a situações-limite.

Com os assombrosos fatos revelados neste 17/05, buscar-se-á, como diria o ilegítimo, a manutenção de Temer no governo, a eleição indireta via parlamento ou posse da ministra Carmen Lúcia ou, opção que ganha corpo, a intervenção militar.

O rearranjo de forças no interior do bloco golpista determinará a saída buscada pelas forças conservadoras-restauradoras.

Todo este caminho não é contra o Lula ou o PT, é para manter o tênue acordo que possibilita as reformas neoliberais.

Neste momento, ou o capital impõe uma derrota histórica ao trabalho, ou privilégios seculares poderão vir a ser postos em debate.

As classes trabalhadoras, por sua vez, nunca tiveram tão perto do céu e do precipício nesse 1 ano de golpe.

Lutar pelas Diretas Já, neste momento palavra de ordem restrita à esquerda e suas franjas, é a única saída para restaurar a democracia e derrubar as reformas neoliberais.

Mas, quando a palavra de ordem transformar-se em realidade, ela, por si só, não bastará: ou a classe trabalhadora brasileira acerta as contas do país com sua história — de submissão ao imperialismo, de superexploração do trabalho, de racismo e patriarcado — e constrói um programa democrático-popular e socialista, ou a restauração será ainda mais violenta.

Todas e todos, impreterivelmente, ÀS RUAS DOMINGO!

Daniel Araújo Valença, professor de Direito da UFERSA e doutor em Ciências Jurídicas pela UFPB

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