Biden abraça neofascismo à brasileira em nome do projeto de “conter” a China na América Latina

Tempo de leitura: 4 min

Por Luiz Carlos Azenha

O presidente Jair Bolsonaro foi um dos últimos a reconhecer a vitória do democrata Joe Biden sobre Donald Trump. O filho do ocupante do Planalto, deputado federal Eduardo, o “chanceler paralelo” do Brasil, lamentou o fracasso da ocupação do Capitólio, promovida por Trump, lamentando erros táticos dos invasores.

Ainda assim, o homem que assumiu a diplomacia dos EUA, ex-senador John Kerry, adotou em relação ao Brasil uma postura conciliatória. Encarregado por Biden de cuidar da crise do aquecimento global, diz ter ficado positivamente impressionado com o discurso de Jair Bolsonaro na Cúpula do Clima.

Por outro lado, o diretor da CIA, William Burns, encontrou-se recentemente com Jair Bolsonaro. Também se reuniu com o ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Augusto Heleno, o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência, Alexandre Ramagem e o ministro da Defesa, Walter Braga Netto.

Antes, ele visitou a Colômbia, o principal parceiro diplomático dos EUA na região.

Para dezembro está planejado um exercício militar conjunto batizado de “Southern Vanguard”, no Brasil, com a presença aqui de soldados da 101a. Divisão Aérea do Exército dos Estados Unidos.

Desde que assumiu, Biden reafirmou seu apoio ao autointitulado presidente da Venezuela Juan Guaidó e liberou U$ 20 milhões para ações de propaganda contra o governo de Cuba.

Em outras palavras, Biden dá prosseguimento à política de Estado que Barack Obama determinou em seu segundo mandato, de fazer um movimento (pivot) em direção à Ásia.

Trata-se de conter a China em seu próprio espaço, além de fustigar os laços chineses no mundo.

Basicamente, como disse Noam Chomsky ao Viomundo (ver entrevista acima), o eixo formado por Donald Trump, que ele chama de Internacional Reacionária, não foi descartado por Biden.

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Ele inclui Brasil, Colômbia, Marrocos, Hungria, Israel, Egito e as monarquias reacionárias do Golfo Pérsico.

A tarefa é dar sustentação política, diplomática, econômica e militar aos Estados Unidos, reproduzindo em outras regiões o papel de gendarme que Israel desempenha no Oriente Médio.

O único país da América do Sul que não reconhece a China Comunista é o Paraguai. Mas, com a pandemia do coronavírus, o Senado do Paraguai chegou a votar para cortar relações com Taiwan. 16 senadores disseram sim, mas a direita reuniu 25 votos.

Mesmo assim, num gesto diplomático, a China enviou ajuda humanitária ao Paraguai pela primeira vez em junho de 2020.

É a tentativa de repetir o que a China já conseguiu recentemente na República Dominicana, El Salvador e Panamá, que abandonaram Taiwan para receber as benesses vindas de Beijing.

Nicarágua, Honduras, Belize, Guatemala e Haiti continuam alinhados a Taiwan.

A decisão do Panamá foi a que mais enfureceu Washington. Empresas chinesas representam 40% da zona de livre comércio estabelecida no país.

O reconhecimento de Beijing pelos panamenhos veio depois do início da construção de um porto de águas profundas na ilha de Margarida. A China Landbridge Group vai investir U$ 1 bilhão num terminal de contêineres.

Simbolicamente, o novo terminal vai ocupar parte da terra onde ficava a sede do Comando Militar Sul dos Estados Unidos, que monitorava o continente a partir do Panamá e foi transferido para a Flórida.

Aproveitando-se do vazamento dos Panama Papers, Washington começou a exercer pressão sobre o governo local, colocando o país na lista de países que não combatem suficientemente a lavagem de dinheiro.

O governo de Laurentino Cortizo, que assumiu em julho de 2019, já cancelou cinco dos 16 projetos que seriam implementados com ajuda da China.

Quando Washington estava focada quase que exclusivamente no Oriente Médio, os chineses já trabalhavam na oferta de projetos de infraestrutura em praticamente todos os 52 países da África, sem as condicionalidades do FMI ou do Banco Mundial.

Na África, os chineses oferecem o projeto, os engenheiros e muitas vezes até os trabalhadores para realizar a obra.

Além disso, como forma de reduzir a pressão populacional, Beijing financia comerciantes interessados em migrar para os mais diversos pontos do mundo.

Eles tiram proveito do baixo custo das mercadorias chinesas para conquistar mercado local.

Hoje a China é o maior parceiro comercial da América do Sul.

As empresas chinesas despejaram quase U$ 13 bilhões em investimento no continente só em 2019. O foco, mais uma vez, é construir a infraestrutura que facilite as exportações de commodities.

Por exemplo, a construção do porto de Chancay, no Peru, ao custo de U$ 3 bi.

No Brasil, os chineses investem em produção de energia, especialmente em fazendas eólicas. Compram 80% da soja exportada pelo país. A relação comercial é hoje de U$ 100 bilhões.

Isso faz com que, em Washington, diplomatas estadunidenses tenham reciclado a retórica anticomunista: “A China é uma influência maligna”, disse à revista Time um diplomata sênior. “Isso é parte de um plano global do Partido Comunista Chinês para exportar ideias e más práticas chinesas além da região da Ásia-Pacífico”.

A pressão sobre governos frágeis tem dado resultados. Ainda no governo Trump, Washington pediu que El Salvador cancelasse um projeto de cooperação com a China envolvendo uma grande área de livre comércio.

O presidente Nayib Armando Bukele Ortez, pouco depois de assumir, em 2019, refez o projeto radicalmente.

Este é o contexto em que é preciso entender não só a “adesão” de Biden ao neofascismo de Bolsonaro, mas a pressão que os Estados Unidos pretendem intensificar contra Cuba e a Venezuela, parceiros ideológicos da China na América Latina.

Como nos disse Noam Chomsky, é uma nova guerra fria.

Porém, muito menos focada em movimentos militares e muito mais em psyops, espionagem comercial, sabotagem política de adversários e interferência indireta.

Não se pode esquecer da ação dos Estados Unidos, através da OEA, para afastar Evo Morales do poder na Bolívia. Agora, o ex-presidente denuncia que a Argentina sob Maurício Macri e o Equador sob Lenín Moreno teriam enviado armas ao governo golpista de Jeanine Añez.

Macri e Moreno eram aliados preferenciais de Washington.

Em 2019, um consórcio chinês havia sido escolhido para explorar as reservas de lítio da Bolívia. A estatal boliviana YLB ficaria com 51% das ações e o desembolso de U$ 2,3 do projeto seria feito pelos chineses.

A China consome 800 mil toneladas de lítio por ano em sua crescente produção de carros elétricos.

O outro parceiro da Bolívia na exploração do lítio escolhido durante o governo de Evo foi o grupo alemão ACI Systems GmbH.

Além de acesso a matéria prima, conglomerados chineses começam a disputar mercado na região.

No Brasil, Eduardo Bolsonaro transformou-se num dos maiores opositores do 5G da empresa chinesa Huawei, que é um dos principais alvos da diplomacia norte-americana.

Partiu dos Estados Unidos a denúncia de que, através do 5G, os chineses poderiam espionar milhões de usuários da internet.

Assim, a retórica bolsonarista do “perigo vermelho”, por mais distante que esteja da realidade, cai hoje como uma luva para os interesses de Washington.

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Comentários

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Guanabara

E seguem as veias abertas da América Latina… Só muda o receptor…

maria icléa furtado macedo

Não consigo alcançar a submissão ao poder hegemônico de quem quer que seja, seja boa. Na atual conjuntura fico apreensiva em relação à soberania brasileira. Gostaria que o meu país jamais tivesse que submeter-se ao domínio de quem quer que seja. Que Deus nos proteja e permita que o que for melhor nos seja propiciado.

maria icléa furtado macedo

Não me espanta o atual presidente democrata do EUA ter essa postura. Afinal as ditaduras militares da America Latina nos anos 60, foram gestadas e ocorreram sob a égide do Democrata Kennedy. O imperialismo dos EUA, é capaz de qualquer coisa para não ser abalado em sua sanha por hegemonia. Lastimável é o atual presidente do Brasil estar a serviço disso de forma subserviente.

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