Wesley Clark: A lista de governos que os EUA queriam derrubar

Tempo de leitura: 4 min

Em 2 março de 2007 Amy Goodman, do site estadunidense Democracy Now, entrevistou o general Wesley Clark, ex-comandante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que considerava concorrer novamente à Casa Branca.

No vídeo, publicado pelo site, ele fala de uma lista de países que seriam atacados pelos Estados Unidos.

A pedido do leitor Melinho, aqui, traduzimos o trecho relevante:

Amy Goodman: Agora vamos falar sobre o Irã. O sr. tem um site devotado a evitar a guerra.

Wesley Clark: www.stopiranwar.com.

Amy Goodman: O sr. vê uma reprise do que aconteceu antes da guerra contra o Iraque — as alegações de armas de destruição em massa, a mídia embarcando no vagão da guerra?

Wesley Clark: De certa maneira. Mas, como você sabe, a História nunca se repete exatamente. O que eu alertei quando dei depoimento no Congresso em 2002 é que, se devíamos nos preocupar com um estado, não deveria ser com o Iraque, mas com o Irã. Mas nosso governo queria se preocupar com o Iraque, não com o Irã. Eu sabia o motivo, já que tinha passado pelo Pentágono logo depois dos atentados de 11 de setembro. Dez dias depois dos atentados, passei pelo Pentágono e vi o secretário da Defesa [Donald] Rumsfeld e o subsecretário [Paul] Wolfowitz. Fui dar um alô para algumas pessoas que trabalharam comigo no Estado Maior e um dos generais me chamou. Ele disse, “venha falar comigo por um segundo”. Eu disse,  “não, você está muito ocupado”. Ele disse, “não, não”. “Tomamos a decisão de ir à guerra contra o Iraque”. Isso foi mais ou menos no 20 de setembro [de 2001]. Eu disse, “vamos à guerra contra o Iraque? Por que?”. Ele disse: “Não sei”. “Acho que eles não sabem mais o que fazer”. Eu disse, “eles encontraram alguma informação conectando Saddam à al-Qaeda?”. Ele disse “não, não”. “Não há nada de novo. Eles decidiram ir à guerra contra o Iraque”. “Acho que, como não sabemos o que fazer com os terroristas, mas temos uma boa força militar e podemos derrubar governos…”. Disse também: “Se a única coisa que você tem é um martelo, faz todo problema se parecer com um prego”.

Voltei a vê-lo algumas semanas depois e àquela altura estávamos bombardeando o Afeganistão. Eu disse, “ainda vamos à guerra contra o Iraque?”. Ele disse, “é pior que isso”. Procurou na mesa. Achou um pedaço de papel. E disse, “acabei de receber isso lá de cima”– se referindo ao escritório do secretário de Defesa — “hoje”. E disse, “esse memorando descreve que vamos enfrentar sete países em cinco anos, começando com o Iraque, depois Síria, Líbano, Líbia, Somália, Sudão e, para terminar, o Irã”. Eu disse, “o papel é secreto?”. Ele disse, “sim, senhor”. Eu disse, “então não me mostre”.

Eu encontrei essa mesma pessoa um ano atrás e disse a ele “se lembra daquele nosso encontro?”. Ele disse, “comandante, eu não te mostrei o memorando! Eu não te mostrei!”.

Apoie o VIOMUNDO

Amy Goodman: Desculpe, mas qual era o nome dele?

Wesley Clark: Não vou dar o nome dele.

Amy Goodman: O senhor poderia falar de novo quais eram os países?

Wesley Clark: Bem, começando com o Iraque, em seguida a Síria e o Líbano, depois Líbia, em seguida Somália e Sudão e de volta ao Irã. Assim, quando você olha para o Irã e diz “é uma reprise?”, não é exatamente uma reprise. Mas a verdade é que o Irã, desde o início, viu a presença dos Estados Unidos no Iraque como uma ameaça e uma benção, já que derrubamos Saddam Hussein e os Baathistas [do Partido Baath, secular, do nacionalismo árabe, que dava sustentação política a Saddam]. O Irã não conseguiu lidar com eles. Nós resolvemos o problema para o Irã. Mas somos também ameaça, porque eles sabem que eram os próximos na lista. E assim, naturalmente, se engajaram no Iraque. Perderam [os iranianos] um milhão de pessoas na guerra contra o Iraque e tem uma fronteira longa, insegura e desprotegida. Assim, era do interesse vital dos iranianos se envolverem profundamente no Iraque. Eles toleraram nossos ataques contra os Baathistas. Ficaram felizes quando capturamos Saddam Hussein.

Mas estão construindo uma rede de influência e para cimentá-la, ocasionalmente, dão apoio, treinamento e assessoria militar, direta ou indiretamente, tanto a insurgentes quanto a milícias. Nesse sentido tem havido, acredito, continuo engajamento iraniano, legítimo e ilegítimo. Quero dizer que você não pode culpar o Irã por oferecer cirurgias oculares a iraquianos que precisam de atenção médica. Não é uma ofensa que justifique uma guerra. Mas é uma tentativa de conseguir influência.

E nosso governo tem teimosamente se negado a conversar com o Irã, em parte porque não quer pagar o preço doméstico — com nossa base política doméstica, a base direitista, mas também porque não quer dar legitimidade a um governo que vem tentando derrubar. Se você fosse o Irã, você provavelmente acreditaria esta quase em guerra contra os Estados Unidos, já que temos dito que é preciso mudar o regime em Teerã, e pedimos ao Congresso para dar U$ 75 milhões para esse objetivo, e estamos apoiando grupos terroristas, aparentemente, para se infiltrar e detonar coisas dentro do Iraque e do Irã. E se não estivermos fazendo isso, vamos dizer que sabemos quem está fazendo e estamos encorajando. Não é surpreendente que estamos a caminho de um ponto de confronto e crise com o Irã. Meu ponto não é que os iranianos sejam bonzinhos — eles não são — mas que não devemos usar a força, com exceção como último, último, último recurso. Existe uma opção militar, mas ela é ruim.

Leia também:

Os olhos dizem muita coisa. Disseram?

Ricardo Antunes: Para onde vão nossas universidades

Maria Izabel Noronha: Atualização do professor deve ser no local de trabalho

“Professora, já imaginou, eu deixar de ser servente de pedreiro e virar engenheiro?!”

Marinalva Oliveira: Crise internacional não justifica precariedade nas universidades federais

Apoie o VIOMUNDO


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Melinho

Puxa, Azenha, muito obrigado pela sua gentileza.De fato, a entrevista com o General reformado (aposentado) Wesley Clark é muito longa, e você optou por traduzir o essencial. Muito obrigado.

Regina Braga

Ah! No Brasil eles não querem derrubar o Governo,só aviões com cientistas.Muito humano.

    Aldo

    Aquele acidente da Gol até hoje está realmente muito mal explicado, como também o acidente na base de lançamento de foguetes…

    Tiago Tobias

    Aldo, me desculpe a ignorância, mas qualé a suspeita do acidente da Gol?

Fabio Passos

Os ianques e seus planos de destruir nações e aniquilar populações… para roubar riquezas.

A farsa da “democracia ocidental” só convence os tolos. Os estadunidenses elegem um relações públicas dos interesses do capital.

Deixe seu comentário

Leia também