Pesquisa mostra que metade de apoiadores de Bolsonaro são robôs; íntegra da pesquisa
Tempo de leitura: 2 minDa Redação
Nos últimos dias, o Twitter e o Facebook — que controla o Instagram — apagaram ou sinalizaram publicações do presidente Jair Bolsonaro, da ministra Regina Duarte e do pastor Silas Malafaia, relativas ao coronavírus.
As plataformas alegaram que as postagens poderiam representar ameaça à Saúde Pública.
Hoje, o candidato a prefeito de São Paulo, Guilherme Boulos, perguntou numa publicação o motivo de o ministro da Justiça, Sergio Moro, não ter determinado até agora uma investigação das milícias digitais — apoiadoras do presidente Bolsonaro, elas tem agido para disseminar informação contrária a medidas de controle da pandemia do coronavírus tomadas por governadores.
“Estudo inédito da UFRJ comprovou que mais da metade das publicações em redes sociais a favor de Bolsonaro são feitas por robôs. Quem paga? Quem coordena? Por que Sérgio Moro nunca investigou essa milícia digital?”, perguntou Boulos.
Um estudo feito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Fundação Escola de Sociologia Política de São Paulo, divulgado inicialmente pelo diário conservador Valor Econômico, mostra que 55% dos que impulsionaram a hashtag Bolsonaro Day no dia 15 de março eram robôs (ver íntegra abaixo).
O estudo também demonstrou que 1.700 contas que publicaram a hasthag no Twitter foram em seguida apagadas — depois de fazer 22 mil postagens.
Um recorte da pesquisa mostra que, além de apoio a Jair Bolsonaro, os disseminadores também usaram mensagens contra o presidente da Câmara Rodrigo Maia, a Globo, o presidente do Senado Davi Alcolumbre e o STF.
“O bot não vota nem adoece de covid-19, por exemplo, mas influencia a forma como os humanos votam e se previnem ou não diante da pandemia”, disse a doutora em antropologia social Isabela Kalil ao Valor.
Coronavirus e infodemia de Luiz Carlos Azenha
Apoie o VIOMUNDO
Comentários
Zé Maria
https://image.slidesharecdn.com/coronavirus-e-infodemia-200403161145/95/coronavirus-e-infodemia-6-1024.jpg
2018 Brazilian Election ‘Logic’:
“one man, one bot, many votes”
[Lógica das Eleições Brasileiras em 2018:
“um homem, um robô, muitos votos”]
Excerto do Estudo da UFFRJ/FESPSP, postado acima.
Muitas vezes o efeito da ação dos robôs na rede é subestimado
por serem considerados personagens irreais.
Dentro da lógica “one man, one vote” [“um homem, um voto”],
muitas pessoas consideram que esses perfis são irrelevantes
para construção do cenário político por não votarem,
não tomarem decisões, e no caso do Covid-19,
não transmitem doenças.
Entretanto, há uma consolidada literatura internacional no campo da
comunicação e da sociologia que evidencia que o uso de robôs
nas redes sociais direciona a conversação online, rouba a atenção
dos usuários, e funciona como uma nova forma de agendamento
da Imprensa e cria uma opinião pública artificial.
Ou seja, ainda que os robôs não possam votar ou transmitir doenças,
sua atuação nas redes sociais (ao se confundirem com usuários comuns),
pode orientar o comportamento dos humanos e alterar de maneira
significativa a tomada de decisão ou o comportamento.
No caso da campanha de apoio ao governo [de Bolsonaro/Mourão],
a atuação de perfis automatizados no 15M serve como exemplo
dessa estratégia.
[…]
A Universidade de Oxford (2019) sistematizou a tipologia de mensagens
que as tropas cibernéticas costumam utilizar, em diferentes países,
para se envolver em conversas com usuários online e como estratégias
de validação:
(1) espalhar propaganda pró-governo ou pró-partido;
(2) atacar a oposição ou montar campanhas de difamação;
(3) distrair ou desviar conversas ou críticas para longe de questões importantes;
(4) estimular a divisão e polarização da população; e
(5) suprimir a participação de determinadas pessoas na rede
através de ataques pessoais ou assédio.
Os diferentes tipos de mensagens podem servir como teste para definir
as narrativas e estratégias de desinformação que serão investidas
pelos governos.
Essa foi provavelmente a estratégia do governo brasileiro [de Bolsonaro/Mourão] ao lançar a campanha #BrasilNaoPodeParar nas redes sociais.
A peça foi distribuída, em forma de teste, primeiramente para as redes
bolsonaristas no WhatsApp e depois veiculada pela Secom no Instagram
e por Flavio Bolsonaro no Facebook e Twitter.
A campanha, contrária ao isolamento social recomendado pela maioria
dos governos no mundo e pelo Ministério da Saúde [e pela OMS],
criou um ambiente de controvérsia e contribuiu para a transformação
da pandemia em “infodemia” …
A Organização Mundial da Saúde [OMS] declarou que estamos vivendo
uma “infodemia” de informações sobre o coronavírus 2019 (COVID-19).
A infodemia é caracterizada por uma quantidade e variedade excessiva
de informações de diferente qualidade e credibilidade (algumas falsas,
outras imprecisas, outras baseadas em evidências).
A infodemia dificulta que as pessoas encontrem fontes e orientações
confiáveis quando precisam, o que representa riscos para a saúde global.
Após o surto inicial da doença de Covid-19 [e não foi diferente durante
a Campanha Presidencial de 2018], teorias da conspiração, desinformação
e fake news surgiram on-line em relação à origem, escala, prevenção, tratamento
e vários outros aspectos da doença. Informações falsas e deturpadas foram
disseminadas pelas mídias sociais e por aplicativos de mensagens de texto
(como Whatsapp) no Brasil e no mundo.
Porém, o tipo de desinformação que tem maior repercussão e impacto
na opinião pública e no comportamento coletivo são aquelas produzidas
e disseminadas pelos governos e chefes de estado, devido à visibilidade,
alcance e poder simbólico que possuem.
Além disso, os governos e chefes de estado contam com a cobertura
constante da imprensa e mídia tradicional, que divulga seus discursos
e falas ampliando ainda mais o alcance de suas mensagens.
[…]
A “nova política” da qual Bolsonaro se diz representante é marcada
por uma lógica de comunicação denominada pelos norte-americanos
de “campanha permanente”, que ocorre especialmente nas redes sociais.
Significa adotar métodos de campanha durante períodos não eleitorais,
que inclui a ativação constante da militância virtual para se defender
e atacar seus adversários, e o uso de narrativas de testemunho de
diferentes atores sociais para a construção “do bem e do mal”.
O objetivo dessa forma de comunicação, marcada por informações
enganosas e exaltação de si, é provocar o “contágio” emocional e
respostas viscerais do público – como raiva, medo, desorientação,
negacionismo e indignação.
Para investigar a campanha permanente e suas formas de “contágio”,
coletamos dados sobre as hashtags mais utilizadas pelos grupos de
apoio a Bolsonaro no Twitter no período de 01 de janeiro a 15 de março
de 2020 referentes ao 15M, incluindo o tema da pandemia.
A primeira seleção das hashtags foi realizada a partir de etnografia digital
com o monitoramento qualitativo dos movimentos, lideranças e atores sociais
relevantes no contexto com pesquisa realizada entre janeiro e março.
A partir da análise qualitativa, foram selecionadas 30 hashtags mais relevantes
que foram analisadas a partir de métodos quantitativos com auxílio de
inteligência artificial.
Foram coletados todos os tuites com as 30 hashtags.
Porém, como elas são frequentemente utilizadas junto com outras
em um mesmo tuite, após a coleta, identificamos o número de total
de hashtags únicas em nosso dataset.
Ao final, identificamos 22 mil hashtags que foram rankeadas novamente
em uma lista das mais frequentemente usadas.
… as hashtags [#] somostodosbolsonaro, stfvergonhanacional, foramaia,
globolixo, bolsonaro2022, somostodosmoro, bolsonaropresidenteate2026, bolsonaro2026 fazem parte da estratégia de campanha permanente e
representa a agenda política de Bolsonaro.
Dentre as pautas fixas dessa agenda estão o enfraquecimento das instituições
democráticas como STF e Congresso, a reeleição de Jair Bolsonaro em 2022
e a eleição de um de seus filhos [ou de Moro] em 2026.
O volume de uso das hashtags da campanha permanente no Twitter
se mantém homogêneo ao longo das semanas e dos meses do ano
desde seu surgimento, evidências de uma ação de comunicação
planejada, orquestrada e automatizada.
As hashtags # foraalcolumbre e # maiavaiserpreso surge no início de fevereiro,
quando começa a disputa do governo com o Congresso e o Senado pelo veto
do orçamento impositivo.
A hashtag # bolsonaroday foi ativada na véspera da manifestação do dia 15,
em inglês, com o objetivo de alcançar o trending topic do Twitter.
De acordo com o levantamento realizado a partir dos compartilhamentos
de mensagens no Twitter, mais de cinquenta por cento dos tuítes que
usaram a hashtag # bolsonaroday no 15M foram postados por perfis
automatizados ou robôs.
A # bolsonaroday foi a mais compartilhada na plataforma no dia 15 de março
de 2020, conforme levantamento das hashtags mais utilizadas no dia do evento
por apoiadores do governo.
A hashtag teve aproximadamente 1 milhão e duzentas mil menções
e chegou a trending topic mundial no dia 15 de março.
Os dados apontam uma ação expressiva de perfis não humanos
(tanto de robôs, contas automatizadas, como de ciborgues,
contas semiautomatizadas) nas postagens do Twitter,
chegando a atingir picos de 55% de automatização das postagens
no dia do evento.
… [Também a] estratégia de comunicação baseada no “contágio”
é desenhada e atualizada por meio do uso de anabolizantes virtuais
e testes na rede, que funciona como um laboratório.
Um exemplo de teste ocorreu antes do pronunciamento do presidente
quando grupos bolsonaristas disseminaram na internet vídeos de
empresários brasileiros contestando as medidas de isolamento da Covid-19.
Os depoimentos dos donos da Havan, Madero, Giraffas e de Roberto Justus
serviram como uma forma de testar o potencial impacto do discurso presidencial
que seria veiculado na TV horas depois.
Esses testes nas redes sociais servem tanto para guiar o comportamento dos
militantes online, quanto para preparar o terreno para novas narrativas,
ou ainda manipular a opinião pública e medir o potencial contra-ataque
de seus adversários.
[…]
A partir do universo de pouco mais de três milhões de postagens do Twitter
foram identificados quatro padrões distintos de mensagens.
O primeiro padrão se relaciona com a campanha permanente tendo o STF
como alvo de forma relativamente constante.
Ainda que o Congresso tenha ganhado maior destaque mais recentemente,
a campanha permanente se nutre do universo lavajatista [SIC] que vê no STF
um obstáculo para a continuidade da operação, além da questão da prisão
em segunda instância.
O segundo padrão está relacionado com a mobilização de internet no 15M.
Pela contingência da recomendação de isolamento pelas autoridades,
o chamamento para as manifestações virtuais ganhou destaque com a
chamada “avalanche digital”, especialmente representada pela # Bolsonaroday.
Já o terceiro padrão diz respeito às mensagens compartilhadas que procuravam
fornecer respostas às mudanças impostas pela dinâmica de prevenção da Covid-19
com chamados para a participação dos atos em si com protestos em forma de
carreatas pelas cidades.
Por fim, o quarto padrão se relaciona com o incentivo para que os apoiadores
participassem das manifestações nas ruas, a despeito dos riscos de contágio
da Covid19.
Neste sentido, destaca-se a figura do “patriota” como alguém que poderia
“morrer pelo Brasil”.
Este perfil específico com a figura do “patriota” é mobilizado pelo apelo a
um imaginário militar e de guerra.
Íntegra em:
https://www.fespsp.org.br/store/file_source/FESPSP/Documentos/Coronavirus-e-infodemia.pdf
Deixe seu comentário