Jeferson Miola denuncia senador Hamilton Mourão ao MPF por crime de racismo; íntegra da representação
Tempo de leitura: 3 minDa Redação
No sábado, 11 de novembro, em entrevista à Folha de S. Paulo, o general Hamilton Mourão, senador pelo Republicanos do Rio Grande do Sul, acusou negros e pobres pelo roubo de 21 fuzis e metralhadoras do Arsenal de Guerra do Exército em Barueri, estado de São Paulo.
No mesmo dia, em artigo publicado em seu blog, o jornalista Jeferson Miola denunciou: General Mourão reincide no crime de racismo e na aporofobia.
Ainda no sábado, Jeferson Miola entrou com representação contra o senador Hamilton Mourão no Ministério Público Federal (MPF) pelo crime de racismo e conduta típica de aporofobia — aversão e nojo de pobres que normaliza ataques, segregação e violência social e institucional contra pobres pelo fato de serem pobres.
Miola indicou a Procuradoria Geral da República (PGR) para tramitação.
Abaixo a íntegra da representação ao MPF.
REPRESENTAÇÃO CONTRA SENADOR HAMILTON MOURÃO NO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELA PRÁTICA DE RACISMO
Prezados/as senhores/as,
Apresento a presente Representação contra o senador Hamilton Mourão pela prática do crime de racismo e, também, por conduta típica que caracteriza Aporofobia – aversão e nojo de pobres que normaliza ataques, segregação e violência social e institucional contra pobres pelo fato de serem pobres.
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O senador é reincidente nessas práticas abjetas, conforme amplamente repercutido na imprensa nacional.
Em 2018, na condição de candidato a vice-presidência da República, o senador associou o subdesenvolvimento e o atraso do Brasil à “indolência” dos indígenas e à “malandragem” dos negros.
Diante da forte reação àquela manifestação, e para se imunizar de eventual responsabilização pela prática de racismo, ele então alegou possuir ascendências indígena e afro, o que supostamente seria incompatível com a prática de racismo.
Entretanto, na véspera da eleição presidencial de 2018, no dia 6/10, o então candidato a vice traiu a desculpa de ocasião e elogiou a “beleza do neto” como consequência do “branqueamento da raça”.
No dia 20 de novembro de 2020, exatamente na data que se celebra a Consciência Negra, e já então como vice-presidente da República, Mourão repercutiu o assassinato bárbaro do negro Beto Almeida por seguranças do grupo Carrefour em Porto Alegre com uma frase que, segundo farta literatura sobre o assunto, caracteriza racismo: “no Brasil não existe racismo”, afirmou.
Tal afirmação caracteriza racismo porque legitima e justifica de todo tipo de violência, opressão, exclusão e segregação historicamente sofrida pelo povo negro.
A negação do racismo, a despeito do racismo cruel que vitimiza cotidianamente as pessoas negras, é um procedimento político, social e institucional que desumaniza o negro para banalizar as práticas desumanas, discriminatórias, violentas e cruéis contra negros como normais e aceitáveis.
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo na edição de 11/11/2023, o senador acusou negros e pobres pelo roubo de 21 fuzis e metralhadoras do Arsenal de Guerra do Exército em Barueri, estado de São Paulo [link da entrevista: https://www1.folha.uol.com.br/poder/2023/11/tomaria-um-chope-com-dino-mas-nao-voto-nele-para-o-stf-diz-mourao.shtml?fbclid=IwAR3N7IjknvsX4leOzZ6pk4S61sxqJPyPyxqd5V0orjYXtEWjK301egoZbQA]
O general fez uma dedução simplista, a partir do que pode ser considerada uma lógica racista elementar, e criminalizou genericamente –e sem nenhuma prova– os negros e pobres pelo roubo das armas numa unidade do Exército brasileiro.
“Os soldados que nós temos”, disse Mourão, “é a garotada que vem da periferia. Quem serve ao Exército é a turma preta, pobre, analfabeta. Essa é a turma que serve ao Exército, na sua grande maioria”.
O senador então deduziu que o soldado com tal perfil –“turma preta, pobre, analfabeta”– deixa as unidades militares “sujeitas a essa ação do crime organizado”.
Pode-se deduzir, a partir desta caracterização que faz o senador Mourão, que os negros e pobres –simplesmente pelo fato de serem negros e pobres– são, a priori, e em qualquer situação, criminosos.
Sempre. E independentemente de qualquer prova ou fundamento.
A criminalização que o senador faz de soldados negros e pobres por desvios, malfeitos, e ilegalidades no Exército contrasta, no entanto, com as provas reveladas em inúmeras investigações criminais em curso envolvendo oficiais de alta patente e comandantes das Forças Armadas brasileiras – na totalidade homens brancos e com salários elevados, mas nenhum soldado e, menos ainda, negro.
Tal realidade seria suficiente para o senador Mourão se abster de conclusão tão agressiva e vil contra pobres e negros. Talvez, no entanto, o racismo nele entranhado turve a capacidade de discernimento deste parlamentar.
A prática de “racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei”, diz o inciso XLII do artigo 5º da Constituição brasileira.
Em vista do exposto, solicito providências do MPF a respeito do que caracteriza ser uma prática contumaz e reincidente de crime de racismo pelo senador Hamilton Mourão.
Cordialmente
Comentários
Sebastião Guimarães de Carvalho Filho
Deixo apenas o registro do meu agradecimento por tudo que li, à mais o silêncio oportuno de um ancião cansado das atrocidades e do cinismo dos cínicos que só a si e seus interesses vêem!
Zé Maria
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“Na língua do Führer, as ‘impurezas’ eram de ordem étnica (não-brancos,
judeus, ciganos), sexual (gays, lésbicas), psíquica (esquizofrênicos,
bipolares), física (pessoas com deformidades ósseas, limitações de
movimento), genética (portadores de autismo, síndrome de Down) e,
evidentemente, ideológica (socialistas, comunistas).
“Para que a analogia histórica não soe descabida, as diversas declarações
da caricatura tropical de Mussolini sobre os negros, os índios, os gays,
as mulheres, os portadores de HIV e os comunistas, por exemplo, mostram
que as semelhanças entre ontem e hoje não são mera coincidência (essas
faces sinistras do neofascismo serão detalhadas em outros artigos desta
série 1-3; 5-9).”
Professor Paulo César de Carvalho*, no EsquerdaOnLine
“As Faces do Neofascismo de Bolsonazi” (Parte 4)
[…]
Não é novidade que o “adestrador” de acéfalos ufanistas rapidamente
ergueu a mão direita para ser convocado para o time verde-amarelo, ao
comemorar hiperbolicamente a vitória do facínora:
“[Jair Bolsonaro] trouxe imensa carga de esperança, com o intenso desejo
de que os últimos resquícios do socialismo sejam escoimados dentre nós”.
Não é demais lembrar que o verbo “escoimar” tem vários sentidos:
na língua enrolada com sotaque autoritário farsesco, foi empregado na
acepção de “limpar, livrar de impurezas”.
Para não perder o trocadilho, isso deixo bem claro que a “faxina” prometida
pela “vassoura” neofascista tem a finalidade de tirar definitivamente
as “manchas vermelhas” do verde-louro desta flâmula.
Como vociferou o bárbaro ex-capitão terrorista, logo após a vencer
o primeiro turno das eleições presidenciais [de 2018], “a faxina agora
será muito mais ampla [do que foi na Ditadura Militar]. (…) Esses
marginais vermelhos serão banidos de nossa pátria”.
Os termos “escoimar” e “faxina” – vale sublinhar – foram traduzidos
como “despetização” pelo ex-ministro da Casa Civil, falante in/fluente
da novilíngua (mal)criada pelos epígonos de Big Brother do desgoverno
distópico do estúpido “Trump dos Trópicos”.
Não é redundante retomar este trecho do pronunciamento oficial
de Onyx Lorenzoni (citado na parte 2 desta série), explicando a “limpeza”
das “impurezas” petistas nos órgãos públicos:
“Sobre o episódio da exoneração, a gente brincou em ‘despetização’,
o presidente gostou do exemplo, e todos os ministros estão autorizados a,
dentro das suas pastas, proceder de maneira semelhante (…). Esse conceito
(…) está perpassando todo o governo”.
Não é novidade que as palavras do ex-capitão terrorista, do professor
emérito dos milicos e do articulador político do governo fazem parte do
mesmo universo de sentido: em termos mais técnicos, pode-se dizer que
pertencem ao campo semântico “higienista” típico dos discursos
totalitários, cuja expressão mais grotesca foi o nazismo.
No vocabulário do nazismo de Adolf Hitler, nunca é redundante lembrar,
“faxina” significava campo de concentração, “escoimar” era sinônimo
de exterminar, “limpeza” era um perverso eufemismo para genocídio.
Na língua do Führer, as “impurezas” eram de ordem étnica (não-brancos,
judeus, ciganos), sexual (gays, lésbicas), psíquica (esquizofrênicos,
bipolares), física (pessoas com deformidades ósseas, limitações de
movimento), genética (portadores de autismo, síndrome de Down) e,
evidentemente, ideológica (socialistas, comunistas).
Para que a analogia histórica não soe descabida, as diversas declarações
da caricatura tropical de Mussolini sobre os negros, os índios, os gays,
as mulheres, os portadores de HIV e os comunistas, por exemplo, mostram
que as semelhanças entre ontem e hoje não são mera coincidência (essas
faces sinistras do neofascismo serão detalhadas em outros artigos desta
série).
Não é novidade que a raiz do “pau-brasil” neofascista é fascista.
Em busca da matriz genética do discurso autoritário verde-amarelo,
o historiador Fernando Rodrigues encontrou no Estado Novo o DNA
ideológico da tragédia política que se repete como farsa:
“O estabelecimento do pensamento político autoritário brasileiro
correspondeu ao momento de aproximação com matrizes de pensamento
autoritário, principalmente com a implantação de regimes totalitários
na Europa, contextualizado pelo medo dos movimentos radicais de
trabalhadores urbanos e pelo medo do comunismo nacional e internacional”.
[Militares e política no Brasil. Barbosa, Jefferson Rodrigues et al. (Orgs.).
São Paulo: Expressão Popular, 2018, p. 309].
O trio teórico ufanista de ataque contrarrevolucionário da seleção
bonapartista de Vargas era formado por Francisco Campos, Oliveira Viana
e Azevedo Amaral. O primeiro, aliás, foi o primeiro ministro da Educação
do país (a pasta foi criada em 1930), sendo nomeado ministro da Justiça
poucos dias antes do golpe, para cumprir o papel de elaborador da
Constituição de 1937.
Não é demais repetir que a terceira Carta Magna da República – conhecida
como Polaca – foi inspirada na legislação fascista do ditador polonês Józef
Pilsudski, concentrando nas mãos do Bonaparte dos Pampas os poderes
Executivo e Legislativo, extinguindo os partidos políticos, instituindo a pena
de morte e proibindo o direito de greve (as leis trabalhistas foram inspiradas
na Carta del Lavoro do Partido Nacional Fascista de Benito Mussolini).
Não é novidade que a “campanha sanitária” anticomunista desencadeada
pelas fake News do Plano Cohen serviu de pretexto para legitimar as normas
jurídicas de exceção redigidas por Campos e outorgadas por Getúlio.
[…]
Não é novidade que a ideia de “unidade” implica a noção de “pureza”:
depurar é tirar as impurezas; limpar é tirar a sujeira;
fazer a “faxina” é eliminar as manchas – pretas, vermelhas ou arco-íris.
Na perversa lógica política higienista, a “consciência nacional” deve ser
a expressão da ordem e progresso, “branca” como o estrelado do lábaro:
todas as cores diferentes, pois, seriam sinais indesejáveis de atraso.
Essa visão “eugênica” é partilhada pelos outros dois intelectuais do ‘Estado
Novo’:
“Tanto Oliveira Viana quanto Azevedo Amaral deram ao fator racial papel
relevante nas explicações sobre o Brasil. Oliveira Viana, desde os seus
primeiros trabalhos, defendeu a necessidade de branqueamento do povo
para torná-lo capaz de construir a nação. Azevedo Amaral deu à questão
racial papel especial nas suas formulações. Para Amaral, a formação de um
tipo étnico, condizente com a tarefa de construir a nação, era um dever do
Estado, a quem caberia, através da promoção da eugenia, incentivar as
uniões convenientes e a seleção das etnias interessantes no processo de
imigração estrangeira” (idem, p. 321).
Infelizmente, essas ideias estão presentes no governo neofascista:
o vice-presidente Hamilton Mourão, por exemplo, disse que seu neto “
é um cara bonito” graças à política de “branqueamento da raça”,
defendendo a tese de que o subdesenvolvimento do Brasil seria
consequência da “indolência dos indígenas” e da “malandragem
dos negros”.
Outro exemplo inequívoco, enfim, de que as semelhanças entre os tiranos
não são mera coincidência:
a tese de doutorado de Vélez Rodríguez [ex-MEC do Capitão do Exército], intitulada ‘Oliveira Viana e o Papel Modernizador do Estado Brasileiro’
é sobre o pensador eugenista da Era Vargas.
Não é novidade que no discurso de posse, em 2 de janeiro de 2019,
o seguidor de Oliveira Viana deixou bem claro o tom autoritário –
nacionalista e anticomunista – de sua obscura gestão:
“Combateremos o marxismo cultural, hoje presente em instituições de
educação básica e superior. Trata-se de uma ideologia materialista alheia
aos nossos mais caros valores de patriotismo e de visão religiosa do mundo”.
Ferrenho defensor do projeto Escola sem Partido (sic) – cuja estratégia seria
a erradicação da “doutrinação ideológica” nas salas de aula – e apologista
do modelo educacional das escolas militares, argumentou que nessas
rígidas instituições “há patriotismo, disciplina, valorização dos docentes e
amor pelo Brasil”.
Ouvindo essa pregação reacionária, reverberam ecos verde-amarelos
do bonapartismo semifascista (nos termos de Felipe Demier), o tétrico
espectro do Estado Novo assombra a frágil democracia da “República
das Bananas”, o fantasma do ministro da Guerra de Getúlio arrasta
correntes nos corredores do Ministério da Educação de Bolsonazi.
O trecho a seguir deixa mais nítido o reflexo fantasmagórico das diretrizes
pedagógicas do general Eurico Gaspar Dutra no discurso de posse do
ex-ministro Ricardo Vélez Rodríguez:
“Na seção sobre o ensino militar e o recrutamento dos chefes,
Dutra registra que a finalidade de toda educação moderna
é a formação espiritual da nação, do melhor dirigente nacional
e a seleção dos chefes.
Seria toda uma obra de autoridade e de respeito, fundada em
critério severo (…). Criticava o ensino liberal, o qual pregava
publicamente o desacato à disciplina e o descaso à autoridade,
tornando a educação artificial, pois não atingia a alma do futuro
cidadão.
Segundo o general Dutra, o modelo ideal era fundado nos princípios
psicológicos e autoritários, calcado nas regras da disciplina social,
cujo fim era formar valores reais e positivos que fossem úteis e
socialmente aproveitáveis.
Tornar negligentes as normas da disciplina seria estragar completamente
o caráter do adolescente; seria enfraquecer-lhe a vontade, entregá-lo ao
acaso dos caprichos, deixá-lo vacilar entre o bem e o mal, torná-lo incapaz
de tomar uma forte resolução, de praticar sólidas virtudes e de fixar-se
invariavelmente no caminho do bem” [RODRIGUES, Fernando da Silva. “Intelectuais e Militares Brasileiros: a Construção do Estado Autoritário
e do Pensamento Nacionalista (1930-1945)”. In ‘Militares e Política no Brasil’. Barbosa, Jefferson Rodrigues et al. (Orgs.). São Paulo: Expressão Popular, 2018, p. 327)].
Íntegra:
https://esquerdaonline.com.br/2020/02/18/as-faces-do-neofascismo-de-bolsonazi-parte-4/
https://esquerdaonline.com.br/2020/01/22/as-faces-do-neofascismo-do-bolsonazi-parte-1/
https://esquerdaonline.com.br/2020/01/27/as-faces-do-neofascismo-do-bolsonazi-parte-2/
https://esquerdaonline.com.br/2020/02/04/as-faces-do-neofascismo-do-bolsonazi-parte-3/
*Paulo César de Carvalho, o Paulinho, é bacharel em Direito (USP), mestre em Linguística e Semiótica (USP), professor de Língua Portuguesa (lecionou na ECA-USP) e autor de materiais didáticos de Gramática, Redação e Interpretação de Texto. Publicou seis livros de poesia, constando em antologias literárias no Brasil e em Portugal (como em É agora como nunca, da Companhia das Letras, organizada por Adriana Calcanhoto). Compositor, tem canções gravadas por diversos músicos da cena contemporânea.
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Zé Maria
O Moirão é Adepto da Teoria Eugenista,
“quer fazer Branqueamento da Raça”.
para “Aprimoramento de uma Linhagem”.
O Exército está Cheio de Oficiais assim.
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