Henrique Oliveira: 9 gramas de racismo pesam mais que 129 quilos de maconha
Tempo de leitura: 4 minBreno, Rafael e Rodolpho: questão de pele
Rafael Braga e Breno Borges: quando 9g de racismo pesam mais que 129kg de maconha
Por Henrique Oliveira, no Justificando
No dia 8 de abril o empresário Breno Fernando Solon Borges, que é dono de uma metalúrgica e serralheria em Campo Grande no Mato Grosso do Sul, foi preso carregando junto com outras pessoas em dois carros, 130 quilos de Maconha, uma pistola nove milímetros e 199 munições de fuzil calibre 7,62, de uso exclusivo das forças armadas.
As investigações da Polícia Federal sobre as ações de Breno já vinham sendo realizadas desde o mês de fevereiro, o grupo foi abordado pela Polícia Rodoviária Federal na BR 262, quando transportava as drogas e as munições para São Paulo.
Breno Borges é filho da presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Mato Grosso do Sul, a Desembargadora Tânia Garcia Freitas Borges, e uma das autoridades que preferiu anonimato, segundo o Conjur, o empresário deu o nome da sua mãe para não ser preso.
Aquela típica frase: “você sabe com quem você está falando?” uma expressão que remete a identificação social do seu enunciador no topo da hierarquia, demonstrando ter algum tipo de autoridade, que busca através do apadrinhamento político burlar as leis, conseguir proteção e vantagem.
Breno estava preso desde 8 de abril, e conseguiu no dia 17 de julho o direito de aguardar seu julgamento em liberdade, pois a sua defesa conseguiu um laudo médico psiquiátrico no qual Breno é diagnosticado com “Síndrome de Borderline”, uma doença que consiste no desvio de comportamento do indivíduo, se manifestando através das alterações de cognição, de afetividade, de funcionamento interpessoal e controle dos impulsos.
O também Desembargador, Ruy Celso Barbosa Florecence, concedeu liberdade para que Breno cumpra tratamento psiquiátrico adequado, sob a tutela e responsabilidade da sua mãe, que se comprometeu a levá-lo em todas as audiências do processo.
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E essa foi a segunda vez que a defesa de Breno Borges tentou intervir para tirá-lo da prisão com argumentos médicos, a própria desembargadora e mãe se ofereceu para ser tutora do filho, para que fosse internado em uma clínica médica, com alegação que ele sofre de problemas psicológicos, mas teve o pedido negado em um juizado de primeira instância.
O direito de responder em liberdade sob alegação médica, é mais um caso onde presos com dinheiro e influência política conseguem produzir laudos médicos para ganhar prisão domiciliar ou internação em clínica, enquanto milhares de presos estão sendo infectados e morrendo nas nossas cadeias por sífilis, tuberculose, HIV e convivendo em meio a ratos e baratas.
E mostra que membros da classe média/alta, quando são flagrados cometendo crimes, são enquadrados como doentes, desequilibrados, imaturos, sempre existindo um argumento atenuante, que visa afastar o estigma do criminoso para o do que precisa de ajuda.
Breno Borges não é o primeiro caso esse ano, em que um sujeito tem sua prisão revogada, por causa de alianças político-familiares com membros do poder judiciário.
Em janeiro no estado da Paraíba o também empresário Rodolpho Carlos Silva atropelou e matou o agente do Detran em uma blitz da Lei Seca.
Rodolpho chegou a ter a sua prisão preventiva decretada, mas doze horas depois o desembargador Joás de Brito concedeu um habeas corpus.
O desembargador é amigo da família de Rodolpho Carlos, que é filho do dono Grupo São Braz, um dos maiores produtores de café torrado do país, além de ser neto de José Carlos da Silva, ex vice-governador da Paraíba. Além de serem donos da afiliada local da Rede Globo.
Enquanto isso, Rafael Braga, um jovem negro e pobre, catador de material reciclável, e que não é filho de uma desembargadora, foi condenado a 11 anos de prisão, por tráfico e associação tráfico, por portar em um flagrante forjado 0,6 gramas de maconha e 9,6 gramas de cocaína.
No dia 19 de julho a defesa de Rafael Braga entrou com um pedido de apelação à sentença condenatória, alegando que não houve fundamentação por parte do juiz sobre a não retirada das algemas de Rafael durante as audiências, e a não autorização da realização de diligências para o esclarecimento do caso, como acesso as imagens da câmera da viatura em que Rafael Braga foi levado para a delegacia no dia 12 de janeiro de 2016.
É mais uma etapa do calvário que Rafael Braga vem passando desde a sua primeira condenação por porte de Pinho Sol e água sanitária, no contexto das manifestações de junho de 2013.
Esses dois casos envolvendo Rafael Braga e Breno Borges evidenciam toda a contradição da política criminal de drogas e a seletividade do poder judiciário; apesar de Breno Borges ter direito a responder o processo em liberdade, esse mesmo direito não é garantido a mais de 40% dos presos brasileiros, que são compostos por presos provisórios.
A política de proibição das drogas quando relacionada com questões sócio-raciais, consegue produzir uma total inversão de proporcionalidade, onde 9 gramas de racismo, pesam mais do que 129 quilos de maconha.
*Henrique Oliveira é graduado em História e mestrando em História Social pela UFBA e militante do Coletivo Negro Minervino de Oliveira/Bahia
PS do Viomundo: Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública: 67,1% dos presos no Brasil são negros ou pardos, 52,9% não completaram o ensino fundamental.
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Comentários
orlando
Está cada vez mais difícil distinguir o meritíssimo do meretrício. O judiciário brasileiro (salvo pouquíssimas exceções) são canalhas da toga que usam do cargo para atenderem seus egos.
Luiz Carlos P. Oliveira
Atenção advogados do Marcola, do Beira Mar e demais traficantes, guardem esse nome : “Síndrome de Borderline”. É um atalho para livrar-se da prisão e ser transferido para uma clínica psiquiátrica paradisíaca. E o melhor de tudo é que a lei permite que médicos particulares possam dar atestado da doença. É uma maravilha! Esse país é uma zona do meretíssimo, quer dizer, do meretrício!
Renata
Uma sociedade que permite o que acontece a Rafael Braga é uma sociedade profundamente adoecida. Quantas gramas de civilização ainda nos resta?
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